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AIJRLD
DESPEDIMENTO
FALTAS
VERIFICAÇÃO DA DOENÇA
SEGURANÇA SOCIAL
Sumário
I - As entidades empregadoras não estão impedidas de, dentro dos seus poderes de direção e regulamentação das relações laborais, emanar ordens de serviços e regulamentos que definam internamente regras respeitantes aos aspetos referentes ao regime das faltas que não se acham cobertos pelo disposto no artigo 250.º do CT/2009 ou outros dispositivos legais, mas sempre respeitando o âmbito das normas e as fronteiras definidas pelos demais artigos do Código de Trabalho ou de outra legislação avulsa, complementar e aplicável que regulam tal regime das faltas justificadas ou injustificadas; II - Logo, esses regulamentos ou ordens de serviço não podem arredar, contrariar ou alterar unilateralmente e de acordo com as conveniências de funcionamento, organização e atividade do empregador o conteúdo e os limites traçados por tais dispositivos legais [cf. os artigos 97.º, 99.º, 126.º, 127.º e 129.º de tal diploma legal]; III - No caso de faltas fundadas em motivo de doença, as mesmas só podem ser provadas por declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou ainda por atestado médico; IV - A entidade patronal pode requerer a verificação por médico da doença invocada pelo trabalhador para fundar as suas faltas ao trabalho, sendo tal verificação efetuada pelos clínicos da Segurança Social ou por médico designado pela empregadora e estando a sua decisão de «APTO» ou «NÃO APTO» sujeita a reavaliação por junta médica a funcionar junto daquela entidade. V - A decisão de tal comissão de verificação produz efeitos jurídicos simultaneamente em dois planos distintos, a saber, na relação laboral estabelecida entre a entidade empregadora e o trabalhador ausente por motivo de doença e na relação jurídica prestacional do sistema de segurança social. VI - A ser assim, há que encarar aquela declaração de «APTO» da Comissão de Verificação de 28/9/2018 como produzindo efeitos ao nível do CITT que justifica as faltas dadas pelo Autor até ao dia 1/10/2018. VII - Os serviços da Segurança Social onde se reuniu a Comissão de Verificação que proferiu um parecer negativo quanto à incapacidade temporária do beneficiário que ali se apresentou a pedido da sua entidade empregadora, devem comunicar de imediato ao Centro de Saúde e ao médico-assistente de tal beneficiário [trabalhador], o «APTO» por aquela declarado, de maneira a que o mesmo possua uma informação atualizada acerca da situação médico-legal do seu doente/utente, conforme foi avaliada pelos peritos da Segurança Social. VIII - Esse médico-assistente, face a tal informação da Segurança Social, tem duas atuações possíveis a adotar, do ponto de vista técnico e clínico: ou concorda e se conforma com o referido parecer, entendendo que o referido beneficiário afinal está laboralmente capaz para se apresentar ao serviço ou, ao invés e porque não aceita nem subscreve o mencionado parecer, mantém ou até altura a sua posição clínica mas continua a entender que o referido utente/trabalhador não está em condições de saúde para voltar a assumir as suas funções profissionais e emite novo CITT em que lhe reconhece a manutenção da mesma doença e prorroga os anteriores CITT ou, caso esse seja verdadeiramente o caso que tem perante si, elabora um outro em que declare uma outra e nova doença. IX - Estando-se perante um caso como o dos autos, em que o aludido médico-assistente considerou que a doença natural ou não-profissional que já havia fundado os dois anteriores CITT se conserva [ou até se agravou], mantendo o seu parecer médico-legal e assim contrariando o da Comissão de Verificação, então a opção que a entidade empregadora possui como forma de reação a esses novos CITT não é simplesmente olhar para eles como se não existissem ou se se limitassem a ser uma folha de papel em branco sem valor algum mas antes, de acordo com as competências definidas no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de Dezembro, vir reclamar ou recorrer para a comissão de reavaliação de incapacidade temporária territorialmente competente, com vista a rebater aquela nova emissão de CITT e a obter um parecer médico-legal que resolvendo o diferendo existente, seja a palavra definitiva na matéria e coloque assim uma pedra final no assunto. X - Se tal Comissão de Reavaliação, confirmar o parecer de «APTO» da primeira Comissão, à entidade empregadora não será exigível mais nenhum procedimento ou diligência, podendo então e sem margem para dúvidas tomar a decisão desfavorável para o trabalhador a que se refere o artigo 22.º da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro. XI - No quadro exposto e face ao teor da alínea b) do artigo 14.º, a questão de ter sido prorrogada a anterior doença natural ou de ter sido declarada uma nova doença pelo médico-assistente, para efeitos de se considerarem legítimas ou não as posteriores faltas ao trabalho dada pelo trabalhador, para além de ser de ordem essencialmente formal, perde a relevância e importância que quer a Ré, como o tribunal da 1.ª instância, lhe vieram a conferir. XII - Houve uma manifesta precipitação legal da parte da Ré que, ao invés de desenvolver aquela última diligência junto da Comissão de Reavaliação da Segurança Social, com vista a abalar a credibilidade e valor médico-legal dos novos CITT, deixou os mesmos intocados e a produzir os seus normais, válidos e legítimos efeitos e avançou logo para o regime jurídico-laboral das faltas injustificadas e para o procedimento disciplinar com base nas mesmas com vista ao seu despedimento com justa causa, como efetivamente veio a acontecer, o que, em nosso entender, tem efeitos jurídicos importantes na economia dos autos, em termos de ponderação da adequação, proporcionalidade e justiça da justa causa do despedimento aplicada pela Ré ao Autor. XIII - O quadro fáctico e jurídico muito particular que ressalta dos autos não consente que a sanção de despedimento com justa causa seja a única adequada, possível e exigível à conduta do Autor, face ao disposto no artigo 330.º do Código do Trabalho de 2009, aos elementos de antiguidade, passado disciplinar e reputação profissionais e uma conduta disciplinar com uma ilicitude e culpa de reduzido alcance e relevo, sem uma gravidade ou consequências minimamente alegadas e demonstradas e cujo sancionamento com o despedimento mereceu parecer negativo da Comissão de Trabalhadores. XIV - Tal comportamento não acarreta assim uma qualquer quebra inevitável e irrecuperável de confiança, que torne nessa medida inexigível para a Ré a manutenção do vínculo laboral em questão, sendo ainda perfeitamente adequada e proporcional a aplicação de uma sanção disciplinar que fosse claramente conservatória do vínculo laboral.
Texto Parcial
ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I – RELATÓRIO
AAA, … residente na Rua … Seixal, veio, através de formulário próprio, em 24/02/2019, instaurar contra BBB, com sede na Av. … LISBOA, a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento com processo especial, nos termos dos artigos 98.º-B e seguintes do Código do Processo do Trabalho.
Juntou, com o referido Formulário, notificação efetuada pela Ré da decisão do despedimento com justa causa.
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Foi agendada data para a realização da Audiência Final (despacho judicial de fls. 16), tendo a Ré sido citada para o efeito, por carta registada com Aviso de Recepção, como resulta de fls. 18 dos autos.
Mostrando-se inviável a conciliação das partes no âmbito da Audiência de Partes (fls. 21 e 21 verso), foi a Ré notificada para, no prazo e sob a cominação legal apresentar articulado motivador do despedimento e juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o que a Ré fez, em tempo devido, e nos moldes constantes de fls. 22 a 32, vindo a alegar, muito em síntese, ter o Autor dado 17 faltas injustificadas em dias consecutivos sendo que, não obstante alertado pela entidade empregadora, nada fez, violando o dever de assiduidade e pontualidade, tornando imediata e praticamente impossível a subsistência do contrato de trabalho.
Conclui, requerendo que seja declarada a regularidade e licitude do despedimento e, em consequência, improceder a oposição ao despedimento, com todas as consequências legais.
Juntou processo disciplinar, conforme resulta de fls.34 a 148 [cópia] e do original apenso por linha aos presentes autos.
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O Autor, notificado para o efeito, contestou dentro do prazo legal e nos moldes constantes de fls. 149 a 164, tendo concluído tal articulado nos seguintes moldes:
«a) Declarar-se a ilicitude do despedimento do Autor;
b) Condenar-se a Ré na reintegração do Autor, ou no pagamento de indemnização por antiguidade, de acordo com a opção do Autor até à audiência de julgamento;
c) Condenar-se a Ré no pagamento ao Autor das retribuições intercalares já vencidas desde a data do despedimento, no montante de € 2.151.52, e das vincendas que lhe forem devidas até à data do trânsito em julgado da sentença, acrescidas dos correspondentes juros de mora à taxa legal contados desde o vencimento de cada uma delas.
d) Condenar-se a Ré no pagamento ao Autor do subsídio de natal proporcional ao tempo de serviço prestado até 16.09.2018, no valor de € 763,34.
e) Condenar-se a Ré no pagamento ao Autor da retribuição de férias e respetivo subsídio correspondente ao tempo de serviço prestado no ano de início da suspensão do contrato, no valor de € 1.526,68.
f) Condenar-se a Ré no pagamento da formação não proporcionada ao Autor, no valor de € 651,67.
g) Condenar-se a Ré no pagamento ao Autor da indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 30.000,00.
h) Para o caso do Autor optar pela indemnização por antiguidade, condenar-se a Ré a pagar-lhe todos os créditos exigíveis por força da cessação do contrato, a liquidar.»
Alega o Autor, em síntese, o seguinte:
- Ser o despedimento disciplinar inválido;
- A Ré tinha conhecimento que o Autor se encontrava em situação de doença incapacitante para o exercício da sua atividade profissional, do foro psiquiátrico;
- Não obstante, assumiu uma atitude persecutória para com o Autor com missivas e telegramas e, inclusivamente, com visitas a sua casa;
- A Junta Médica pedida pela Ré teve uma antecedência de 4 dias para a sua realização, não estando o Autor munido com a documentação necessária, razão pela qual foi considerado apto;
- Não obstante, a sua médica de família emitiu novos certificados de incapacidade para o trabalho, que lhe justificavam as faltas.
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A Ré respondeu à questão relativa à invalidade do procedimento disciplinar e exerceu o contraditório quanto ao pedido reconvencional. (fls. 176 e seguintes).
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Foi proferido, em 28/5/2019, despacho saneador, com o reconhecimento da regularidade e validade da instância, o julgamento no sentido da improcedência da exceção perentória da invalidade do processo disciplinar, não identificação do objeto do litígio e fixação dos temas da prova, admissão dos requerimentos de prova e deferimento de diversas diligências probatórias [vindo ainda a ser proferido, rem 12/6/2019 e a fls. 194, 2.ª parte, um despacho judicial complementar, quanto ao requerimento probatório do Autor de fls. 192 e 193 e um outro a fls. 217 e 217 verso, quanto a outros pedidos das partes desse mesmo cariz jurídico], determinação do registo-áudio da prova a produzir na Audiência Final e designação da data para a realização desta última (fls. 188 a 189 verso) ….
*
Procedeu-se à realização da Audiência de Discussão e Julgamento, com observância do legal formalismo, tendo a prova aí produzida sido objeto de registo-áudio [fls. 289 e 290, 293 a 296, 301 e 301 verso, 306 a 308 verso, 321 e 321 verso].
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Foi então proferida a fls. 322 a 341 verso e com data de 17/2/2020, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes:
«Pelos fundamentos de facto e de direito supra expostos, o tribunal julga a ação parcialmente procedente porque parcialmente provada e, em consequência, decide:
a) Declarar ilícito o despedimento promovido pela Ré contra o Autor;
b) Consequentemente, condenar a Ré na reintegração do Autor no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
c) Condenar a Ré no pagamento ao Autor das retribuições e subsídios que este deixou de auferir desde 01.02.2019 até trânsito em julgado da presente decisão, que se liquidam até 01.02.2020 em € 15.970,44, deduzidas as seguintes quantias, a liquidar em incidente próprio:
a. Quantias que o Autor tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b. Subsídio de desemprego eventualmente atribuído ao Autor, devendo a Ré entregar essa quantia à segurança social.
d) Condenar a Ré a entregar à Segurança Social todos os montantes auferidos pelo Autor a título de subsídio de desemprego, a liquidar.
e) Absolver a Ré do demais peticionado.
Custas a cargo de ambas as partes na medida do respetivo decaimento, fixando-se o decaimento da Ré em 48,48% e o do Autor no remanescente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido (art.º 527.º do Código de Processo Civil).
Valor da ação: € 15.970,44 (art.º 98.º-P n.º 2 do Código de Processo do Trabalho).
Registe e Notifique.».
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A Ré BBB inconformado com tal sentença, veio, a fls. 345 e seguintes, interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 412 e 419 dos autos, como de Apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito também suspensivo, face à caução prestada pela recorrente [fls. 417 e 418].
*
A Apelante apresentou, a fls. 346 verso e seguintes, alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões:
(…)
*
O Autor apresentou contra-alegações (…) tendo formulado igualmente as seguintes conclusões (fls. 381 e seguintes):
(…)
*
O ilustre magistrado do Ministério Público deu parecer no sentido da improcedência do recurso de Apelação (fls. 425), que não foi objeto de resposta por parte do Autor e da Ré, dentro do prazo legal, apesar de notificados para esse efeito.
*
Tendo os autos ido aos vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – OS FACTOS
O tribunal da 1.ª Instância considerou provados e não provados os seguintes factos:
«Com relevância para a decisão da causa, resultam provados os seguintes factos:
A. O Autor foi admitido nos quadros da Ré em 21-06-1995 tendo em 6 de fevereiro de 2019, sido notificado da deliberação da Comissão Executiva, que lhe aplicou a sanção disciplinar de Despedimento, aplicada por (…) de 01-02-2019, com efeitos imediatos.
B. À data do despedimento, o Autor auferia as seguintes remunerações:
a) Vencimento base, € 909,80;
b) Diuturnidades, € 152,85
c) Diuturnidade especial, € 13,11.
C. No âmbito da categoria de carteiro (CRT), desenvolvia a sua atividade no Centro (…) 45) Amora.
D. Ao Autor foi instaurado processo disciplinar n.º (…) e que culminou com seu despedimento.
E. O presente processo teve início no dia 04 de Outubro de 2018, com a comunicação via E-mail do Diretor de Operações Sul 4, (…), sobre a não apresentação ao serviço do trabalhador no dia útil seguinte à avaliação de APTO, emitida pela Segurança Social no dia 28 de Setembro de 2018.
F. Foi deduzida nota de culpa contra o trabalhador, nos seguintes termos:
« Nota de Culpa
(…), QDR/Lic. Direito - na qualidade de Instrutora mandatada pelos BBB, conforme Despacho de nomeação da Diretora dos Serviços Jurídico-Laborais datado de 08-10- 2018- deduz contra AAA CRT, n.º (…), nota de culpa nos termos e com os fundamentos seguintes:
1.- O arguido é trabalhador dos BBB e presta serviço de Carteiro Distribuidor no Centro de Distribuição Postal 2845 Amora
2.- No âmbito do contrato de trabalho, o arguido está obrigado a prestar serviço diariamente no período normal de trabalho designado pela empresa.
3.- Em 22 de Setembro de 2018, o trabalhador entregou à entidade patronal Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho (doravante CITT) – prorrogação, da situação de doença anterior – com termo a 01 de Outubro de 2018.
4.- Os BBB promoveram a verificação da incapacidade do trabalhador que aqui se argui, junto dos serviços competentes do Instituto da Segurança Social de Setúbal.
5.- A Segurança Social de Setúbal – S.S.S.-, convocou o trabalhador para exame médico de verificação, que se realizou no passado dia 28 de Setembro de 2018, deliberando em consequência do exame que o trabalhador estava APTO para desempenhar a atividade.
6.- O trabalhador foi informado pelos serviços da Segurança Social de Setúbal de que de que caso pretendesse poderia requerer a reavaliação da deliberação da competente peritagem médica, no prazo de 24 horas, faculdade que não usou.
7.- No dia útil imediato – 01/10/2018 – o trabalhador não compareceu ao serviço, apresentando um novo Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por estado de doença com data de prorrogação a 02 e termo a 04 de Outubro de 2018.
8.- A entidade empregadora notificou o trabalhador de que se encontrava em faltas injustificadas, decorrentes da decisão da Competente Comissão de Verificação.
9.- Em 05 de Outubro de 2018 o arguido apresentou novo CITT por estado de doença, prorrogação, com data de inicio a 05 de Outubro e termo a 03 de Novembro, todos de 2018.
10.- O trabalhador em consequência da não-aceitação pelo empregador dos CITT para justificação da ausência, faltou ao trabalho, desde que foi sujeito a exame de verificação e até à presente data, durante 17 dias úteis consecutivos, a saber:
Outubro – 1, 2, 3, 4, 8, 9,10,11,12,15,16,17,18,19, 22, 23 e 24
Todos os documentos citados dão-se aqui por integralmente reproduzidos fazendo parte integrante desta Nota de Culpa
11.- Com esta atitude, o arguido violou grave e culposamente os seus deveres de trabalhador, concretamente os deveres de assiduidade e pontualidade previstos na alínea b) do art.º 128.º do C.C.
12.- As faltas injustificadas dadas pelo arguido no ano civil de 2018, constituem Infração Disciplinar prevista e punível nos termos do n.º 1 e segunda parte da alínea g) do nº 2 do art.º 351.º do CT e Justa Causa de Despedimento - na medida em que, pela sua gravidade e consequências, tornam imediata e praticamente impossível de subsistir o Contrato de Trabalho.
Fica expressamente notificado de que é intenção da empresa aplicar a pena de Despedimento.
Fixo ao arguido o prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da data em que receber cópia desta Nota de Culpa, para querendo, consultar o processo, deduzir defesa e indicar prova tudo nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 355º do Código do Trabalho.
A Instrutora
(…)”
G. Nota de Culpa que juntamente com o despacho da CE, (DE12172018CE de 08-11-2018), foram remetidos ao trabalhador no dia 13 de novembro de 2018, por meio de Registo Pessoal com o n.º (…), em cumprimento do disposto no n.º1 do artigo 353.º do Código do Trabalho.
H. O trabalhador foi regularmente notificado da Nota de Culpa no dia 14 de novembro de 2018, cumprindo-se o determinado no n.º 1 do artigo 355.º do CT.
I. A Nota de culpa deduzida contra o trabalhador, bem como o referido (…) 08-11-2018, foram igualmente remetidos à Comissão de Trabalhadores, no dia 13 de novembro de 2018, por carta registada com aviso de receção n.º (…) em cumprimento com o disposto no n.º 2 do artigo 353.º do CT.
J. A Comissão de Trabalhadores, foi regularmente notificada da Nota de Culpa no dia 14 de novembro de 2018.
K. Regularmente notificado, no dia 30 de novembro de 2018 o trabalhador apresentou defesa, que deu entrada na Assessoria Jurídico-laboral, no dia 3 de dezembro de 2018.
L. Foram realizadas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador, findas as quais foi elaborado Relatório.
M. No dia 17 de janeiro de 2019, foi entregue cópia integral do processo disciplinar à Comissão de Trabalhadores.
N. A Comissão de Trabalhadores, depois de analisar o processo, emitiu parecer.
O. No âmbito do contrato de trabalho, estava obrigado a prestar diariamente serviço no Centro de Distribuição Postal de Amora, no período normal de trabalho- horário de trabalho designado pela empresa.
P. O trabalhador entregou à entidade patronal Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho (doravante CITT), emitido pela Dra. (…) - por Doença Natural (DN) - Prorrogação, com início no dia 22 de Setembro de 2018 (2018-09-22), e termo a 01 de Outubro de 2018 (2018-10-01), e data de emissão 26 de setembro de 2018.
Q. O CITT supra referido foi emitido pela prorrogação da situação de doença anterior (Constante de CITT emitido pela Dra. (…), por Doença Natural (DN), Inicial, com início no dia 17 de Setembro de 2018 (2018-09-17), e termo a 21 de setembro (2018-09-21), emitido no dia 20 de setembro de 2018).
R. Os BBB, requereram junto dos serviços competentes do Instituto da Segurança Social- Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal, a submissão do trabalhador (ausente com justificação de doença), a exame de verificação da Comissão de Verificação da Incapacidade para o Trabalho.
S. Na sequência do solicitado pelo Empregador, o Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal- S.S.S - Serviço de Verificação de Incapacidade Temporária, convocou o trabalhador para exame médico de verificação da incapacidade para o exercício da sua atividade profissional, a realizar no dia 28 de setembro de 2018.
T. Realizado o exame médico de verificação, por aquela entidade foi deliberado que o trabalhador estava APTO para desempenhar a sua atividade profissional.
U. Nessa data, o trabalhador foi informado pelos serviços da Segurança Social de Setúbal, que caso pretendesse, poderia requerer a reavaliação da deliberação da competente peritagem médica, no prazo de 24 horas, faculdade que não usou.
V. O trabalhador não fez pedido de reavaliação, ou seja, não usou da supra referida faculdade.
W. Nem se apresentou ao trabalho no dia útil imediato 01 de Outubro de 2018 (2.ª feira).
X. O trabalhador entregou ao Empregador, Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho - CITT, emitido pela Dra. (…) - por Doença Natural (DN), Prorrogação, com início no dia 02 de outubro de 2018, e termo a 4 de Outubro de 2018.
Y. No dia 2 de outubro de 2018, foi remetido telegrama e correspondência registada ao trabalhador, com informação de que se encontrava em situação de faltas injustificadas, por não se ter apresentado ao serviço, depois de ter sido considerado apto pela Comissão de Verificação.
Z. O trabalhador foi devidamente informado pelo empregador, por meio de correspondência remetida para a morada que consta dos registos biográficos da empresa, Rua (…), da situação de faltas injustificadas em que se encontrava, desde a data em que se deveria ter apresentado ao trabalho, ou seja, desde o dia 1 de Outubro de 2018, durante 17 dias consecutivos, até ao dia 24 de outubro, mais concretamente nos dias 1, 2, 3, 4, 8, 9,10,11,12,15,16,17,18,19, 22, 23 e 24 de outubro de 2018.
AA. O Autor está diagnosticado com ansiedade marcada e depressão, como também sabia a Ré, pelo menos a partir de 03.12.2018.
BB. Desde o início da situação de baixa médica o Autor está medicado para essas doenças do foro psiquiátrico e que o tem incapacitado para o exercício da sua atividade profissional, razão pela qual lhe foi prescrita baixa pela sua médica assistente do Centro de Saúde para fazer o devido tratamento, repouso e a recuperação que a situação clínica impõe.
CC. No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de ausência ao trabalho, vindo esses dias a serem retroativamente abrangidos pela baixa por doença, concedida através de CITT emitido no dia 20 de setembro de 2018. [CC. No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de baixa médica.]
DD. Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré dirigiu-se pessoalmente à morada que o Autor indicou na empresa como sendo a sua residência, aí se tendo deparado apenas com a mãe do Autor, pessoa idosa e doente, que ali também habitava.» [DD. Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré, dirigiu-se pessoalmente à casa da mãe do Autor, sendo esta na morada que o Autor indicou à Ré como sendo a sua, sendo a mãe do Autor uma pessoa idosa e doente.]
EE. Nestas circunstâncias perguntou pelo Autor.
FF. Após a visita à casa do Autor e da sua mãe por parte desse funcionário, no dia 19/9/2018, e do recebimento na empresa Ré do CITT de 20/9/2018, o trabalhador recebeu nesse mesmo dia 20.09.2018 uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade [FF. Após a visita à casa da sua mãe recebeu logo no dia seguinte, a 20.09.2018, uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade.]
GG. O Autor recebeu ainda uma carta no dia 19.10.2018, subscrita pelo Sr. (…), Diretor de Operações, na qual alegava que o mesmo se encontrava em faltas injustificadas ao trabalho.
HH. Toda esta situação deixou o Autor ainda mais ansioso, nervoso e desestabilizado.
II. Também a sua mãe, que foi vítima recentemente de acidente vascular cerebral, ficou bastante perturbada, nervosa e inquieta, por aperceber-se que o filho, para além de não estar bem de saúde, ainda se encontrava com problemas no trabalho.
JJ. Como sabe a Ré o Autor entrou para a faculdade no ano letivo de 2017/2018.
KK. [ELIMINADO] KK. O Autor encontra-se doente, não está em condições de trabalhar.
LL. Toda esta situação foi denunciada por escrito mediante carta dirigida no dia 23.10.2018 para a sede da Ré, na qual foi relatado o sucedido, bem como foram juntas cópias dos CITT que já se encontravam na posse da Ré.
MM. O Autor não tem qualquer sanção disciplinar averbada.
NN. A Comissão de avaliação teve lugar no dia 28.09.2018.
OO. Na Comissão, o Senhor Perito pediu-lhe um relatório médico.
PP. O Autor estava doente no dia 28.09.2018, quando ocorreu essa Comissão, e assim permaneceu nos dias seguintes, o que não lhe permitiu que recuperasse e se apresentasse ao serviço, nem no dia 01.10.2018, nem nos dias seguintes.
QQ. Por decisão da sua médica do Centro de Saúde, o mesmo manteve-se em situação de incapacidade para o exercício das suas funções, tendo-lhe sido atribuída novamente baixa médica, devidamente comprovada junto dos serviços da Ré, após a decisão da referida Comissão.
RR. A médica do Centro de Saúde emitiu um CITT ao Autor referente ao período 22.09.2018 e 01.10.2018.
SS. No dia 02.10.2018 o Autor enviou uma mensagem escrita para o telemóvel com o número 926390126 por volta das 6:00 horas da manhã, na qual informava que não se sentia bem e que não estava em condições de ir trabalhar.
TT. Ainda nesse dia o Autor foi à sua médica no Centro de Saúde, tendo a mesma decidido que devia ficar em situação de baixa, pelo que emitiu o competente CITT, datado de 2.10.2018 e que veio a ser prorrogado.
UU. O respetivo subsídio de doença está a ser atribuído ao Autor pela Segurança Social, porque se encontra em situação de baixa médica por doença.
VV. Os CITT são válidos para a Segurança Social desde o dia 20.09.2018 em diante, que sempre atribuiu o subsídio de doença ao Autor, pelo menos até 02.02.2019.
WW. A Segurança Social convocou o Autor para exame médico de verificação a 11.01.2019.
XX. O Autor compareceu nessa data no serviço de verificação de incapacidades de Almada e foi considerado pela Comissão NÃO APTO, porque subsistia nessa data a incapacidade temporária para o trabalho.
YY. A Comissão de Trabalhadores dos BBB fez constar do parecer “...ainda que seja entendimento que aquele se sobrepõe ao CITT, considerando que aquele suspende a decisão da médica de família quanto à situação de ausência em concreto, não nos parece legítimo o entendimento da empresa de recusar novas situações de doença, no caso concreto e ainda o que no CITT emitido em 02/10/2018 a médica entenda que é uma prorrogação da situação de doença nada inviabiliza que o estado de saúde do doente se tenha agravado nos dias que medeiam a decisão de equipa de verificação de incapacidade e o momento da avaliação do doente pela médica assistente (4 dias).”
ZZ. O Autor é reconhecido pela chefia hierárquica como trabalhador educado, de fácil trato, sem registo de reclamações sobre a sua prestação.
AAA. A situação de saúde do Autor degradou-se face ao processo disciplinar e ao despedimento de que foi alvo.
BBB. Como consequência direta e adequada dos factos supra descritos, o Autor sentiu-se e vexado na sua dignidade e brio profissional.
CCC. A sua sujeição doente a um processo disciplinar que culminou no seu despedimento provocou no Autor sofrimento e um estado de angústia constante.
DDD. Passou a ter dificuldades em dormir, vivendo ensombrado pelas preocupações com a sua vida profissional e a sua situação económica.
EEE. O Autor passou a isolar-se, a furtar-se ao convívio com a família e com os amigos.
FFF. Em virtude do despedimento de que foi alvo o Autor viu-se acometido de dificuldades económicas.
GGG. O Autor paga mensalmente uma prestação relativa ao crédito habitação no valor de € 196,58; prestação mensal referente ao seu carro no valor de € 295,90; a título de despesas fixas mensais, aproximadamente, os seguintes valores: água (€ 7,14), luz (€ 84,29), gás (€ 28,43), televisão (35,87), telecomunicações (€ 15,90), condomínio (€ 26,67) e alimentação.
HHH. [ELIMINADO] [HHH. Por isso teve, por várias vezes, de recorrer à ajuda monetária da sua família para fazer face às suas despesas diárias, para promover a satisfação das suas necessidades mais básicas.]
Factos não provados: Com relevância para a boa decisão da causa, resultam não provados os seguintes factos: a) Que no documento entregue ao Autor na sequência do facto vertido em U. tinha como nota informativa: “Importante
O trabalhador ou a entidade empregadora, nos termos do art.º 195.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, podem requerer a reavaliação da situação de doença nas 24 horas subsequentes ao conhecimento do resultado da verificação da mesma, devendo, na mesma data, comunicar esse pedido à contraparte.
O requerente deve indicar o médico referido no n.º 3 do art.º 194.º ou declarar que prescinde dessa faculdade.
Obs: Documento a ser entregue ao trabalhador e a remeter à entidade empregadora” b) Que relativamente ao facto vertido em AA. a Ré tivesse conhecimento desde 17.09.2018 que o Autor estava diagnosticado com tais patologias. c) Que o Autor, desde o primeiro dia de baixa médica, em 17.09.2018, tenha recebido dos serviços da Ré telegramas, alegando que o mesmo se encontrava em faltas injustificadas ao serviço. d) Que nas circunstâncias vertidas em EE. o funcionário da Ré fez à mãe do Autor perguntas sobre o Autor, acabando por dizer àquela que o Autor não se tinha apresentado ao trabalho. e) Que o comportamento vertido em DD. consubstancie uma forma de pressão, constrangimento, intimidação e desestabilização quer do Autor, quer de um familiar, neste caso, a sua mãe. f) Consequentemente, que na senda do referido em e) o estado de saúde do Autor, atento o seu quadro clínico, se tenha agravado. g) Que o facto vertido em HH. tenha agravado o estado clínico do Autor. h) Que o estado de exaustão, cansaço e stress que o Autor acumulou tenha sido agravado pela atuação da Ré e tenha levado a que nem sequer conseguisse continuar a frequentar as aulas na faculdade, não tendo o Autor voltado a requerer à Ré o estatuto de trabalhador-estudante. i) Que para as circunstâncias vertidas em KK. tenha contribuído a atuação da Ré. j) Que o objetivo da Ré tenha sido despedir o Autor. k) Que nas circunstâncias vertidas em NN. o Autor estivesse sob efeito de forte medicação psiquiátrica, confuso, nervoso e apreensivo. l) Que o Autor tenha estado 5 minutos na Comissão com o Sr. Perito. m) Que nas circunstâncias descritas em OO. o Autor não levasse qualquer relatório e que o Senhor Perito apenas lhe tenha dito que tinha de o considerar apto para o trabalho, sem sequer o questionar sobre a sua situação de saúde, nem o sujeitar a qualquer exame médico ou dar-lhe um prazo para apresentar o dito relatório e que tal deliberação ocorreu simplesmente porque o Autor não levava um relatório médico. n) Que o número referido em SS. fosse do seu Supervisor, (…). o) Que nas circunstâncias vertidas em TT. se tenha verificado que o Autor apresentava um agravamento no seu estado de saúde. p) Que a baixa médica apresentada pelo Autor a partir do dia 02.10.2018 não foi contestada pela Ré. q) Que nas circunstâncias vertidas em BBB. o Autor se tenha sentido frustrado nas suas expetativas; r) Que os níveis de ansiedade do Autor tenham vindo a aumentar. s) Que o Autor tenha passado a ter falta de apetite. t) Que o Autor pague mensalmente uma prestação relativa ao crédito habitação no valor de € 310. u) Que o Autor se veja na eminência de ter de entregar a casa onde vive ao banco por não conseguir continuar a cumprir as suas responsabilidades nomeadamente o pagamento da prestação do crédito habitação e a prestação do carro.»
NOTA: Este Tribunal da Relação de Lisboa já eliminou, na Factualidade dada como Provada, os Pontos de Facto KK. e HHH. encontrando-se o seu teor transcrito por debaixo da menção de «ELIMINADO», entre parênteses, a itálico e em letra mais pequena
Mostram-se igualmente inseridos no seu lugar próprio os Pontos CC., DD. e FF., que foram alterados por este tribunal de recurso na sequência da impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto suscitada pela Ré, encontrando-se os mesmos, na sua nova redação, identificados a negrito e o seu anterior teor por debaixo dos mesmos, entre parênteses, a itálico e em letra mais pequena.
*
III – OS FACTOS E O DIREITO
É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 639.º e 635.º n.º 4, ambos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.º n.º 2 do NCPC).
A – REGIME PROCESSUAL APLICÁVEL
(…)
B – IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
Logo, por uma questão de rigor e objetividade, o Ponto CC. não pode manter tal redação e deverá ser substituída pela seguinte:
«CC. No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de ausência ao trabalho, vindo esses dias a serem retroativamente abrangidos pela baixa por doença, concedida através de CITT emitido no dia 20 de setembro de 2018.»
Logo, haverá que modificar tal Ponto nos seguintes moldes:
«DD. Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré dirigiu-se pessoalmente à morada que o Autor indicou na empresa como sendo a sua residência, aí se tendo deparado apenas com a mãe do Autor, pessoa idosa e doente, que ali também habitava.»
Logo, esse Ponto FF., deverá passar a ter a seguinte redação:
«FF. Após a visita à casa do Autor e da sua mãe por parte desse funcionário, no dia 19/9/2018, e do recebimento na empresa Ré do CITT de 20/9/2018, o trabalhador recebeu nesse mesmo dia 20.09.2018 uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade».
Sendo assim, julga-se parcialmente procedente o recurso de Apelação da Ré nesta sua vertente fáctica, com a inerente modificação da Matéria de Facto dada como Provada nos moldes acima determinados e que, em síntese, são os seguintes:
- Eliminação dos Pontos KK. e HHH. KK. O Autor encontra-se doente, não está em condições de trabalhar. HHH. Por isso teve, por várias vezes, de recorrer à ajuda monetária da sua família para fazer face às suas despesas diárias, para promover a satisfação das suas necessidades mais básicas. - Alteração dos Pontos de Facto CC., DD. e FF.
«CC. No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de ausência ao trabalho, vindo esses dias a serem retroativamente abrangidos pela baixa por doença, concedida através de CITT emitido no dia 20 de setembro de 2018.»
«DD. Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré dirigiu-se pessoalmente à morada que o Autor indicou na empresa como sendo a sua residência, aí se tendo deparado apenas com a mãe do Autor, pessoa idosa e doente, que ali também habitava.»
«FF. Após a visita à casa do Autor e da sua mãe por parte desse funcionário, no dia 19/9/2018, e do recebimento na empresa Ré do CITT de 20/9/2018, o trabalhador recebeu nesse mesmo dia 20.09.2018 uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade».
E – OBJECTO DO RECURSO
A recorrente, na vertente jurídica da presente Apelação, contesta a sentença recorrida na parte em que muito embora tenha considerado que o Autor incorreu em infração disciplinar por ter dado faltas injustificadas ao trabalho, entendeu que a mesma, em termos de ilicitude da conduta e de culpa do trabalhador, não possuía a gravidade suficiente para tornar inexigível à entidade empregadora a manutenção da relação laboral entre as partes.
Importa talvez realçar que o Autor foi despedido com justa causa por força apenas das 17 faltas consecutivas e injustificadas dadas ao trabalho, entre o dia 1 de outubro de 2018 e o dia 24 de outubro de 2018 [dias úteis] e ao exclusivo abrigo do número 1 e do número 2, alínea g), 2.ª parte - «Faltas não justificadas ao trabalho [….] cujo número atinja, em cada ano civil, cinco seguidas ou 10 interpoladas, independentemente de prejuízo ou risco» - e já não da primeira parte dessa mesma alínea - Faltas não justificadas ao trabalho que determinem diretamente prejuízos ou riscos graves para a empresa….» - ou da alínea f) - «Falsas declarações relativas à justificação das faltas» -, ressalva que releva para efeitos dos limites impostos à apreciação da justa causa de despedimento, em função do estatuído no número 3 do artigo 387.º do mesmo diploma legal [designadamente e para o que aqui tem especial importância, quanto à emissão e à subsequente validade, fidedignidade e eficácia médico-legal dos CITT emitidos pelo Centro de Saúde desde 17 de setembro de 2018 em diante, com especial incidência para os que foram elaborados desde o dia 2 de outubro de 2018 em diante].
Interessa também realçar que o trabalhador não veio impugnar judicialmente a sentença recorrida, quer no que toca à qualificação jurídica das 17 faltas como injustificadas, quer no que respeita às consequências legais extraídas pelo tribunal da 1.ª instância da circunstância de ter declarado a ilicitude o despedimento [sem justa causa, portanto], de que o trabalhador foi alvo por parte da Ré.
Ora, sendo estes os limites objetivos traçados a este tribunal de recurso pela reação das partes à sentença recorrida, importará talvez conhecer a sua argumentação jurídica.
F – SENTENÇA RECORRIDA
A sentença impugnada, no que toca à fundamentação de direito, desenvolveu a seguinte argumentação:
«O thema decidendum consiste em (i) aferir da licitude do despedimento do Autor, promovida pela Ré; (ii) concluindo-se pela ilicitude do despedimento, da reintegração do Autor na Ré e demais efeitos.
Da cessação unilateral do vínculo laboral:
O despedimento consubstancia uma causa de cessação do contrato de trabalho promovida pelo empregador.
No entanto, esta forma de extinção unilateral do vínculo laboral apenas pode ocorrer por uma de quatro vias:
- Por facto imputável ao trabalhador;
- Despedimento coletivo;
- Por extinção do posto de trabalho;
- Por inadaptação.
Aqui chegados, e estando excluídos os três últimos fundamentos, cumpre analisar o despedimento por facto imputável ao trabalhador.
O despedimento por facto imputável ao trabalhador é uma das sanções suscetíveis de aplicação no âmbito do poder disciplinar de que é titular a entidade empregadora (cfr. art.º 328.º n.º 1 alínea f) do Código do Trabalho).
Nos termos do disposto no art.º 338.º do Código do Trabalho:
“É proibido o despedimento sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.”
A noção de justa causa consta do art.º 351.º do Código do Trabalho, com a seguinte redação:
“1 – Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. 2 – Constituem, nomeadamente, justa causa de despedimento os seguintes comportamentos do trabalhador: a) Desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores; b) Violação de direitos e garantias de trabalhadores da empresa; c) Provocação repetida de conflitos com os trabalhadores da empresa; d) Desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeto; e) Lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa; f) Falsas declarações relativas à justificação de faltas; g) Faltas não justificadas ao trabalho que determinem diretamente prejuízos ou riscos graves para a empresa, ou cujo número atinja, em cada ano civil, cinco seguidas ou dez interpoladas, independentemente de prejuízo ou risco; h) Falta culposa de observância de regras de segurança e saúde no trabalho; i) Prática, no âmbito da empresa, de violências físicas, injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa, elemento dos corpos sociais ou empregador individual não pertencente a estes, seus delegados ou representantes; j) Sequestro ou em geral crime contra a liberdade das pessoas referidas na alínea anterior; k) Incumprimento ou oposição ao cumprimento de decisão judicial ou administrativa; l) Reduções anormais de produtividade. 3 – Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes.”
Como resulta da redação das normas supra identificadas, o elenco constante do n.º 2 do citado preceito não esgota as situações suscetíveis de enquadramento na norma geral prevista no número 1 e que, consequentemente, justificam a aplicação da sanção disciplinar por parte da entidade empregadora.
Efetivamente, no âmbito da relação laboral existem direitos e deveres de ambas as partes, reciprocamente, consagradas nos artigos 126.º a 129.º do Código do Trabalho.
Da conjugação das referidas normas resulta serem os seguintes os requisitos para justa causa de despedimento:
- Um comportamento culposo e ilícito do trabalhador (ativo ou passivo), necessariamente consubstanciador de violação grave dos seus deveres profissionais;
- A imediata impossibilidade prática da subsistência do vínculo laboral com a entidade empregadora, e
- O nexo causal entre aquele comportamento e esta impossibilidade de manutenção do contrato.
Um comportamento culposo e ilícito do trabalhador (ativo ou passivo), necessariamente consubstanciador de violação grave dos seus deveres profissionais:
No âmbito do contrato de trabalho, e como referido, ambas as partes têm direitos e estão adstritas ao cumprimento de deveres.
Este primeiro requisito alude, assim, ao incumprimento das obrigações a que o trabalhador se vinculou no âmbito do contrato celebrado, recaindo sobre o mesmo um juízo de censura e de ausência de justificação relativamente à sua atuação.
Da factualidade provada resulta que o que está em causa é o dever de assiduidade do Autor, nos seguintes termos:
- O trabalhador entregou à entidade patronal Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Doença Natural (DN) -Prorrogação, com início no dia 22 de setembro de 2018 (2018-09-22), e termo a 01 de Outubro de 2018 (2018-10-01), e data de emissão 26 de setembro de 2018.;
- O CITT supra referido foi emitido pela prorrogação da situação de doença anterior por Doença Natural (DN), Inicial, com início no dia 17 de Setembro de 2018 (2018-09-17), e termo a 21 de setembro (2018-09-21), emitido no dia 20 de setembro de 2018).
- A Ré requereu junto dos serviços competentes do Instituto da Segurança Social- Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal, a submissão do trabalhador (ausente com justificação de doença), a exame de verificação da Comissão de Verificação da Incapacidade para o trabalho.
- Na sequência do solicitado pelo Empregador, o Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal- S.S.S - Serviço de Verificação de Incapacidade Temporária, convocou o trabalhador para exame médico de verificação da incapacidade para o exercício da sua atividade profissional, a realizar no dia 28 de setembro de 2018.
- Realizado o exame médico de verificação, por aquela entidade foi deliberado que o trabalhador estava APTO para desempenhar a sua atividade profissional.
- Nessa data, o trabalhador foi informado pelos serviços da Segurança Social de Setúbal, que caso pretendesse, poderia requerer a reavaliação da deliberação da competente peritagem médica, no prazo de 24 horas, faculdade que não usou.
- O trabalhador não fez pedido de reavaliação, ou seja, não usou da supra referida faculdade nem se apresentou ao trabalho no dia útil imediato 01 de Outubro de 2018 (2.ª feira).
- O trabalhador entregou ao Empregador, Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Doença Natural (DN), Prorrogação, com início no dia 02 de outubro de 2018, e termo a 4 de Outubro de 2018.
- No dia 2 de outubro de 2018, foi remetido telegrama e correspondência registada ao trabalhador, com informação de que se encontrava em situação de faltas injustificadas, por não se ter apresentado ao serviço, depois de ter sido considerado apto pela Comissão de Verificação.
- O trabalhador foi devidamente informado pelo empregador, por meio de correspondência remetida para a morada que consta dos registos biográficos da empresa, Ré (…) Seixal, da situação de faltas injustificadas em que se encontrava, desde a data em que se deveria ter apresentado ao trabalho, ou seja, desde o dia 1 de Outubro de 2018, durante 17 dias consecutivos, até ao dia 24 de outubro, mais concretamente nos dias 1, 2, 3, 4, 8, 9,10,11,12,15,16,17,18,19, 22, 23 e 24 de outubro de 2018.
- O Autor está diagnosticado com ansiedade marcada e depressão, como também sabia a Ré, pelo menos a partir de 03.12.2018.
O comportamento aqui em causa é o da ausência do Autor ao trabalho a partir do dia 01.10.2018 considerando que, não obstante ter sido considerado APTO para o trabalho por junta médica da Segurança Social, requerida pela Ré, não se apresentou ao trabalho, tendo, no entanto, apresentado Certificados de Incapacidade para o trabalho entre 22.09.2018 e 03.03.2019, todos com a menção de Prorrogação de doença natural, com início a 17.09.2018.
A verificação ou não deste requisito passa pela análise da Lei n.º 105/2009, de 14.09, nos artigos 17.º a 22.º, que regem sobre o pedido de verificação de situação de doença do trabalhador por parte da entidade empregadora com a seguinte redação (para o que ora importa considerar): Art.º 17.º Verificação da situação de doença por médico designado pela segurança social: “1 - Para efeitos de verificação de incapacidade temporária para o trabalho por doença do trabalhador, o empregador requer a sua submissão à comissão de verificação de incapacidade temporária (CVIT) da segurança social da área da residência habitual do trabalhador. 2 - O empregador informa, na mesma data, o trabalhador do requerimento referido no número anterior. 3 - A deliberação da CVIT realizada a requerimento do empregador produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social de que o trabalhador é titular. 4 - Os serviços da segurança social devem, no prazo de 48 horas a contar da recepção do requerimento: a) Convocar o trabalhador para apresentação à CVIT, indicando o dia, hora e local da sua realização, que deve ocorrer num dos três dias úteis seguintes; b) Comunicar ao empregador a convocação efectuada; c) Informar o trabalhador de que: i) Deve apresentar, aquando da sua observação, informação clínica e os elementos auxiliares de diagnóstico de que disponha, comprovativos da sua incapacidade; ii) Em caso de impossibilidade de comparência por motivo atendível, deve comunicar o facto nas vinte e quatro horas seguintes à recepção da convocatória; iii) A sua não comparência, sem motivo atendível tem como consequência que os dias de alegada doença podem ser considerados faltas injustificadas ou que, caso ocorram em período de férias, são considerados na duração do gozo destas. (…) 6 - Consoante o impedimento do trabalhador, os serviços da segurança social marcam nova data para o exame médico pela CVIT, a ter lugar nas 48 horas seguintes e, se necessário, no domicílio do trabalhador, dando ao mesmo tempo conhecimento do facto ao empregador. 7 - Os serviços da segurança social devem comunicar ao empregador e ao trabalhador se este está ou não apto para desempenhar a actividade, nas vinte e quatro horas subsequentes à realização do exame médico pela CVIT. (…)” Art.º 19.º Reavaliação da situação de doença “1 - Quando a deliberação da CVIT ou parecer de médico designado pelo empregador divirja da declaração ou atestado apresentado pelo trabalhador para prova da situação de doença, qualquer das partes pode requerer aos serviços da segurança social da área da residência habitual do trabalhador que o caso seja apreciado por comissão de reavaliação. (…) 4 - A verificação da situação de doença pela comissão de reavaliação produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social.” Artigo 20.º Procedimento para reavaliação “1 - A reavaliação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença pode ser requerida nas vinte e quatro horas subsequentes ao conhecimento do resultado da verificação da mesma, devendo, na mesma data, ser comunicado o pedido à contraparte.” Artigo 21.º Comunicações “As comunicações previstas no presente capítulo devem ser efectuadas por meio célere, designadamente telegrama, telefone, telefax ou correio electrónico.” Artigo 22.º Eficácia do resultado da verificação da situação de doença “O empregador não pode fundamentar qualquer decisão desfavorável para o trabalhador no resultado da verificação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença, efectuada nos termos dos artigos 17.º ou 18.º, enquanto decorrer o prazo para requerer a reavaliação ou, se esta for requerida, até à decisão final.”
Da leitura destes preceitos constatam-se duas realidades que não se confundem:
1.ª A relação entre a decisão da CVIT e as prestações da Segurança Social;
2.ª A relação entre a decisão da CVIT e a relação com a entidade empregadora.
Efetivamente, e como se constata da análise do disposto no art.º 17.º n.º 3 do diploma legal em análise “A deliberação da CVIT realizada a requerimento do empregador produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social de que o trabalhador é titular.”. Assim, e não obstante resultar dos factos provados que apesar de a avaliação da CVIT ter considerado o trabalhador APTO, os serviços da Segurança Social terem continuado a proceder ao pagamento do subsídio por doença ao Autor, esta circunstância não é argumento para considerar que tais faltas devam ser consideradas justificadas, porquanto tais pagamentos não deveriam ter sido efetuados.
Relativamente à 2.ª situação, e como resulta do disposto no art.º 22.º do mesmo diploma legal, só “enquanto decorrer o prazo para requerer a reavaliação ou, se esta for requerida, até à decisão final” é que a entidade empregadora não pode tomar qualquer decisão desfavorável ao trabalhador.
Como resulta da factualidade a que supra se aludiu, o Autor não requereu a reavaliação, estando disso informado e não obstante o seu estado de saúde não resultou provado que o mesmo estivesse de tal forma perturbado que não tivesse conseguido apreender o conteúdo dos direitos que lhe assistiam face ao resultado da junta médica.
Assim, ao não ter requerido a avaliação e tendo continuado a ausentar-se ao trabalho juntando certificados de incapacidade temporária para o trabalho – prorrogação - relativamente a uma doença natural que já se verificava anteriormente à CVIT em que foi considerado APTO para o trabalho, não podem estas ausências considerar-se justificadas sob pena de ser completamente destituído de efeito o procedimento legal previsto nas normas supra identificadas.
Em suma: a entidade empregadora, perante uma junta médica que considerou o trabalhador APTO para o exercício da sua atividade, com os fundamentos melhor descritos no documento que fundamentou a decisão, passado o prazo de reavaliação sem que esta tenha sido requerida, pode considerar como injustificadas as faltas que forem dadas pelo trabalhador ainda que sejam apresentados CITT, desde que estes se refiram à mesma doença que levou à apreciação por parte da junta médica.
O Autor não se encontrava incapaz, apesar da sua doença, de requerer a reavaliação, estava informado e por isso as ausências ao trabalho, não obstante a apresentação dos referidos CIT não justificam as mais de 10 faltas dadas ao serviço.
Conclui-se assim pela culpa e ilicitude da sua conduta, integrante do art.º 351.º n.º 2 alínea g) in fine do Código de Processo do Trabalho, violadora dos respetivos deveres profissionais.
A imediata impossibilidade prática da subsistência do vínculo laboral com a entidade empregadora, em face da gravidade e consequências dos factos praticados:
Para a verificação de justa causa de despedimento necessário se torna que a gravidade e consequências do ato praticado ou omitido torne de particamente impossível, de forma imediata, a subsistência do vínculo laboral, não sendo, de uma perspetiva objetiva, de exigir ao empregador a manutenção do vínculo laboral.
Está em causa a quebra de confiança originada pelo comportamento do trabalhador.
De salientar que a violação culposa de qualquer dever por qualquer das partes no âmbito de um contrato é suscetível de afetar o equilíbrio da relação, no que tange à confiança existente.
No entanto, no âmbito de uma relação laboral, considerando que a cessação do vínculo é a sanção disciplinar mais gravosa a aplicar ao trabalhador – pressupondo as demais sanções igualmente violação de deveres contratuais e, consequentemente, sendo suscetíveis de afetar a confiança existente – para integrar o conceito de justa causa para o despedimento, a violação do dever contratual tem que revestir gravidade ou assumir intensas consequências, nomeadamente ao nível da lesão dos interesses do empregador (cfr. n.º 3 do art.º 351.º do Código do Trabalho, já citado).
Resulta da factualidade provada que, não obstante as conclusões atestadas em sede de junta médica, o Autor continuou a faltar injustificadamente.
Resulta ainda que o Autor é reconhecido pela chefia hierárquica como trabalhador educado, de fácil trato, sem registo de reclamações sobre a sua prestação e que não tem qualquer sanção disciplinar averbada.
Aqui chegados, o que importa aferir é se este comportamento do Autor configura uma “situação de impossibilidade prática, de inexigibilidade no confronto dos interesses opostos das partes – essencialmente o da urgência da desvinculação do empregador e o da conservação do vínculo por banda do trabalhador. E de tal sorte que, face à vocação de perenidade subjacente à relação de trabalho, apenas se justifica o recurso à sanção expulsiva ou rescisória que o despedimento configura, quando se revelarem inadequadas para o caso as medidas conservatórias ou corretivas, representando a continuidade do vínculo laboral uma insuportável e injusta imposição ao empregador. (Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 24.04.2014, in www.dgsi.pt).
E aqui entendemos que não essencialmente (i) pelo reconhecimento do Autor como um bom trabalhador e sem reclamações ou averbamentos no registo disciplinar e (ii) não resultar da factualidade provada (nem estar a mesma alegada em termos concretos), circunstâncias que permitam concluir pela impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho, isto é, que em face do comportamento do Autor as consequências para a Ré, nomeadamente considerando a sua estrutura, dimensão e organização, tomaram proporções de tal forma intensas que não fosse possível manter a relação laboral.
Não olvidamos que o absentismo implica, por parte da entidade empregadora, uma afetação diferente de recursos; o que não resulta provado é a gravidade desta reafectação para a Ré, de forma a que a manutenção da relação jurídica com o Autor fosse impossível de manter.
Em face do exposto, não se verifica o segundo requisito para a integração da situação sub judicie no conceito de justa causa para efeitos de despedimento.
O nexo causal entre aquele comportamento e esta impossibilidade de manutenção do contrato:
Em face do que se expôs ao nível da análise do segundo requisito, fica prejudicada a apreciação do terceiro requisito.
Das consequências da ausência de justa causa para o despedimento:
Da análise supra resulta que o comportamento do Autor, nos termos dos factos provados, não constitui justa causa de despedimento.
Nos termos do disposto no art.º 381.º alínea b) do Código do Trabalho:
“Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes ou em legislação específica, o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito: (…) b) Se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente (…)”
Assim, o despedimento por iniciativa da Ré é ilícito.
Os efeitos da ilicitude do despedimento constam do art. 389.º.º do Código do Trabalho, com a seguinte redação (para o que ora importa considerar):
“1 – Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais; b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º (…)”
No caso dos autos o Autor não manifestou a substituição da reintegração pela indemnização.
Para além da reintegração, e nos termos do disposto no art.º 390.º do Código de Processo do Trabalho:
“1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento. 2 - Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se: a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento; c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.”
Assim, como consequência da declaração de ilicitude do despedimento, impõe-se a condenação da Ré no pagamento ao Autor das quantias determinadas nos termos do disposto no referido preceito, liquidando-se, até 01.02.2020, a título de retribuições não auferidas o montante de € 15.970,44 (incluindo os subsídios de férias e de Natal), a que terão que ser descontadas as quantias eventualmente recebidas e supra identificadas, a liquidar em incidente próprio.
Dos danos não patrimoniais:
Nos termos do disposto no art.º 323.º n.º 1 do Código do Trabalho:
“1 - A parte que faltar culposamente ao cumprimento dos seus deveres é responsável pelo prejuízo causado à contraparte.”
O ressarcimento dos danos não patrimoniais tem consagração legal no art.º 496.º n.º 1 do Código Civil, com a seguinte redação:
“Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.”
Tem sido entendido de forma unânime pela jurisprudência (a par dos ensinamentos de Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição revista e atualizada, página 499, anotação ao artigo 496.º) que são danos não patrimoniais indemnizáveis as dores físicas e psíquicas, a perturbação sofrida, os sofrimentos morais, entre outros.
No entanto, estes danos têm que ser apreciados nas circunstâncias concretas do caso, devendo ser selecionados com extremo rigor e atender-se apenas aos que, pela sua gravidade, mereçam a proteção jurídica conferida pela norma.
Alega o Autor, para este efeito, que a Ré teve para com ele uma atitude persecutória, culminando no despedimento.
Resulta da factualidade provada:
- O Autor está diagnosticado com ansiedade marcada e depressão, como também sabia a Ré, pelo menos a partir de 03.12.2018.
- Desde o início da situação de baixa médica o Autor está medicado para essas doenças do foro psiquiátrico e que o tem incapacitado para o exercício da sua atividade profissional, razão pela qual lhe foi prescrita baixa pela sua médica assistente do Centro de Saúde para fazer o devido tratamento, repouso e a recuperação que a situação clínica impõe.
- No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de baixa médica.
- Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré, dirigiu-se pessoalmente à casa da mãe do Autor, sendo esta na morada que o Autor indicou à Ré como sendo a sua, sendo a mãe do Autor uma pessoa idosa e doente.
- Nestas circunstâncias perguntou pelo Autor.
- Após a visita à casa da sua mãe recebeu logo no dia seguinte, a 20.09.2018, uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade.
- O Autor recebeu ainda uma carta no dia 19.10.2018, subscrita pelo Sr. Marco Cardoso, Diretor de Operações, na qual alegava que o mesmo se encontrava em faltas injustificadas ao trabalho.
- Toda esta situação deixou o Autor ainda mais ansioso, nervoso e desestabilizado.
- Como sabe a Ré o Autor entrou para a faculdade no ano letivo de 2017/2018.
- O Autor encontra-se doente, não está em condições de trabalhar.
Nos termos do disposto no art.º 128.º n.º 1 alínea b) do Código do Trabalho, um dos deveres do trabalhador é comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade e assiste à entidade empregadora o poder de fiscalização.
A factualidade descrita, ademais considerando que para além de se encontrar a trabalhar o Autor se encontrava a estudar, inculca no tribunal a convicção de que mais do que a atitude da Ré – que do ponto de vista do tribunal não excedeu os seus deveres de fiscalização em face ao absentismo do Autor – terá sido o cansaço acumulado que o levou um estado depressivo do qual não conseguiu recuperar.
Não se vislumbra qualquer incumprimento por parte da Ré que tenha causado danos não patrimoniais ao Autor, pelo que improcede o pedido formulado neste tocante.
Do pagamento da formação não ministrada:
Uma vez que não resulta da factualidade alegada nada a este propósito, improcede o pedido formulado neste tocante.
Do pedido de condenação de juros moratórios:
Quanto ao pedido de condenação no pagamento de juros moratórios, nos termos do disposto no art.º 798.º do Código Civil, o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que cause ao credor, incumbindo ao devedor provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua (artigo 799.º, do Código Civil).
A obrigação aqui em causa é o pagamento dos montantes devidos a título de retribuições devidas. In casu, a Ré não fez tal prova, pelo que se presume a sua culpa.
Nos termos do disposto no art.º 805.º n.º 1 do Código de Processo Civil: “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.” Acrescenta o n.º 2 do mesmo preceito: “Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação: a) Se a obrigação tiver prazo certo; (…)”
Uma vez que a retribuição e o pagamento dos subsídios têm prazo certo, os juros venceram-se a partir do momento do vencimento de cada uma das prestações e são devidos até efetivo e integral pagamento.
Uma vez que ambas as partes decaíram na ação, recai sobre ambas a responsabilidade tributária na proporção do respetivo decaimento, fixando-se o decaimento da Ré em 48,48% e o do Autor no remanescente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido (art.º 527.º do Código de Processo Civil).»
G - FALTAS AO TRABALHO POR DOENÇA – VERIFICAÇÃO DA DOENÇA - REGIME JURÍDICO
Muito embora não ignoremos que o objeto do presente recurso de Apelação in cide sobre a licitude ou ilicitude do despedimento de que o Autor foi alvo e que, nessa medida, foi adquirido pelo tribunal da 1.ª instância e aceite pelas partes que as ausências do trabalhador entre 1/10/2018 e 24/10/2018, são injustificadas e constituem infração disciplinar, afigura-se-nos juridicamente relevante fazer o devido enquadramento legal do cenário fáctico que ressalta dos autos.
Importa chamar, desde logo, à colação o regime legal que regula a matéria das faltas laborais – com particular incidência para aquelas que se radicam em doença do trabalhador, como é o caso dos autos -, sua comunicação, justificação e verificação, havendo assim que, por referência à data dos factos – setembro e outubro de 2018 -, atentar nos seguintes dispositivos normativos do Código do Trabalho de 2009 [os sublinhados a negrito são da nossa responsabilidade]:
Artigo 248.º
Noção de falta
1 - Considera-se falta a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário.
2 - Em caso de ausência do trabalhador por períodos inferiores ao período normal de trabalho diário, os respetivos tempos são adicionados para determinação da falta.
3 - Caso a duração do período normal de trabalho diário não seja uniforme, considera-se a duração média para efeito do disposto no número anterior.
Artigo 249.º
Tipos de falta
1 - A falta pode ser justificada ou injustificada.
2 - São consideradas faltas justificadas:
a) As dadas, durante 15 dias seguidos, por altura do casamento;
b) A motivada por falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos termos do artigo 251.º;
c) A motivada pela prestação de prova em estabelecimento de ensino, nos termos do artigo 91.º;
d) A motivada por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, nomeadamente observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida, doença, acidente ou cumprimento de obrigação legal;
e) A motivada pela prestação de assistência inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro do agregado familiar de trabalhador, nos termos dos artigos 49.º, 50.º ou 252.º, respetivamente;
f) A motivada por deslocação a estabelecimento de ensino de responsável pela educação de menor por motivo da situação educativa deste, pelo tempo estritamente necessário, até quatro horas por trimestre, por cada um;
g) A de trabalhador eleito para estrutura de representação coletiva dos trabalhadores, nos termos do artigo 409.º;
h) A de candidato a cargo público, nos termos da correspondente lei eleitoral;
i) A autorizada ou aprovada pelo empregador;
j) A que por lei seja como tal considerada.
3 - É considerada injustificada qualquer falta não prevista no número anterior.
Artigo 250.º
Imperatividade do regime de faltas
As disposições relativas aos motivos justificativos de faltas e à sua duração não podem ser afastadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, salvo em relação a situação prevista na alínea g) do n.º 2 do artigo anterior e desde que em sentido mais favorável ao trabalhador, ou por contrato de trabalho.
Artigo 253.º
Comunicação de ausência
1 - A ausência, quando previsível, é comunicada ao empregador, acompanhada da indicação do motivo justificativo, com a antecedência mínima de cinco dias.
2 - Caso a antecedência prevista no número anterior não possa ser respeitada, nomeadamente por a ausência ser imprevisível com a antecedência de cinco dias, a comunicação ao empregador é feita logo que possível.
3 - A falta de candidato a cargo público durante o período legal da campanha eleitoral é comunicada ao empregador com a antecedência mínima de quarenta e oito horas.
4 - A comunicação é reiterada em caso de ausência imediatamente subsequente à prevista em comunicação referida num dos números anteriores, mesmo quando a ausência determine a suspensão do contrato de trabalho por impedimento prolongado.
5 - O incumprimento do disposto neste artigo determina que a ausência seja injustificada.
Artigo 254.º
Prova de motivo justificativo de falta
1 - O empregador pode, nos 15 dias seguintes à comunicação da ausência, exigir ao trabalhador prova de facto invocado para a justificação, a prestar em prazo razoável.
2 - A prova da situação de doença do trabalhador é feita por declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou ainda por atestado médico.
3 - A situação de doença referida no número anterior pode ser verificada por médico, nos termos previstos em legislação específica.
4 - A apresentação ao empregador de declaração médica com intuito fraudulento constitui falsa declaração para efeitos de justa causa de despedimento.
5 - O incumprimento de obrigação prevista nos n.ºs 1 ou 2, ou a oposição, sem motivo atendível, à verificação da doença a que se refere o n.º 3 determina que a ausência seja considerada injustificada.
Artigo 255.º
Efeitos de falta justificada
1 - A falta justificada não afeta qualquer direito do trabalhador, salvo o disposto no número seguinte.
2 - Sem prejuízo de outras disposições legais, determinam a perda de retribuição as seguintes faltas justificadas:
a) Por motivo de doença, desde que o trabalhador beneficie de um regime de segurança social de proteção na doença;
b) Por motivo de acidente no trabalho, desde que o trabalhador tenha direito a qualquer subsídio ou seguro;
c) A prevista no artigo 252.º;
d) As previstas na alínea j) do n.º 2 do artigo 249.º quando excedam 30 dias por ano;
e) A autorizada ou aprovada pelo empregador.
3 - A falta prevista no artigo 252.º é considerada como prestação efetiva de trabalho.
Artigo 256.º
Efeitos de falta injustificada
1 - A falta injustificada constitui violação do dever de assiduidade e determina perda da retribuição correspondente ao período de ausência, que não é contado na antiguidade do trabalhador.
2 - A falta injustificada a um ou meio período normal de trabalho diário, imediatamente anterior ou posterior a dia ou meio-dia de descanso ou a feriado, constitui infração grave.
3 - Na situação referida no número anterior, o período de ausência a considerar para efeitos da perda de retribuição prevista no n.º 1 abrange os dias ou meios-dias de descanso ou feriados imediatamente anteriores ou posteriores ao dia de falta.
4 - No caso de apresentação de trabalhador com atraso injustificado:
a) Sendo superior a sessenta minutos e para início do trabalho diário, o empregador pode não aceitar a prestação de trabalho durante todo o período normal de trabalho;
b) Sendo superior a trinta minutos, o empregador pode não aceitar a prestação de trabalho durante essa parte do período normal de trabalho.
Tendo ainda em atenção o estatuído nos números 2 e 3 do artigo 254.º do CT/2009 [2 - A prova da situação de doença do trabalhador é feita por declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou ainda por atestado médico. 3 - A situação de doença referida no número anterior pode ser verificada por médico, nos termos previstos em legislação específica.], impõe-se consultar ainda o Capítulo VI da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro, com a seguinte redação [os sublinhados a negrito são da nossa responsabilidade]:
CAPÍTULO VI
Verificação da situação de doença
Artigo 17.º
Verificação da situação de doença por médico designado pela segurança social
1 - Para efeitos de verificação de incapacidade temporária para o trabalho por doença do trabalhador, o empregador requer a sua submissão à comissão de verificação de incapacidade temporária (CVIT) da segurança social da área da residência habitual do trabalhador.
2 - O empregador informa, na mesma data, o trabalhador do requerimento referido no número anterior.
3 - A deliberação da CVIT realizada a requerimento do empregador produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social de que o trabalhador é titular.
4 - Os serviços da segurança social devem, no prazo de 48 horas a contar da receção do requerimento:
a) Convocar o trabalhador para apresentação à CVIT, indicando o dia, hora e local da sua realização, que deve ocorrer num dos três dias úteis seguintes;
b) Comunicar ao empregador a convocação efetuada;
c) Informar o trabalhador de que:
i) Deve apresentar, aquando da sua observação, informação clínica e os elementos auxiliares de diagnóstico de que disponha, comprovativos da sua incapacidade;
ii) Em caso de impossibilidade de comparência por motivo atendível, deve comunicar o facto nas vinte e quatro horas seguintes à receção da convocatória;
iii) A sua não comparência, sem motivo atendível tem como consequência que os dias de alegada doença podem ser considerados faltas injustificadas ou que, caso ocorram em período de férias, são considerados na duração do gozo destas.
5 - O trabalhador que esteja impedido de se deslocar do seu domicílio para comparecer a exame médico pela CVIT deve informar os serviços da segurança social até à data prevista para o exame ou, em caso de impossibilidade, nas vinte e quatro horas seguintes ao termo da mesma.
6 - Consoante o impedimento do trabalhador, os serviços da segurança social marcam nova data para o exame médico pela CVIT, a ter lugar nas 48 horas seguintes e, se necessário, no domicílio do trabalhador, dando ao mesmo tempo conhecimento do facto ao empregador.
7 - Os serviços da segurança social devem comunicar ao empregador e ao trabalhador se este está ou não apto para desempenhar a atividade, nas vinte e quatro horas subsequentes à realização do exame médico pela CVIT.
8 - Os serviços da segurança social devem comunicar ao empregador:
a) A impossibilidade de submeter o trabalhador à CVIT nos termos da alínea a) do n.º 4, sendo caso disso, nas vinte e quatro horas seguintes à receção do requerimento;
b) A não realização do exame médico, designadamente por falta de comparência do trabalhador com indicação do motivo impeditivo alegado por este, ou por estar a decorrer um período de incapacidade temporária para o trabalho por doença já anteriormente verificada por CVIT, sendo este o caso, nas vinte e quatro horas seguintes à receção do requerimento.
Artigo 18.º
Verificação da situação de doença por médico designado pelo empregador
1 - O empregador pode designar um médico com o qual não tenha tido qualquer vínculo contratual anterior para verificar a situação de doença do trabalhador:
a) Caso seja informado da impossibilidade de realização de CVIT, ou se decorridas 48 horas após o requerimento sem que tenha recebido comunicação dos serviços da segurança social da convocação do trabalhador para apresentação à CVIT;
b) Caso seja informado de que o exame médico pela CVIT não se realizou no prazo a que se refere a alínea a) do n.º 4 ou o n.º 6 do artigo anterior.
2 - Ao processo de verificação da situação de doença por médico designado pelo empregador é aplicável o disposto nas alíneas a) e c) do n.º 4 e nos n.ºs 5 a 7 do artigo anterior, com as necessárias adaptações.
Artigo 19.º
Reavaliação da situação de doença
1 - Quando a deliberação da CVIT ou parecer de médico designado pelo empregador divirja da declaração ou atestado apresentado pelo trabalhador para prova da situação de doença, qualquer das partes pode requerer aos serviços da segurança social da área da residência habitual do trabalhador que o caso seja apreciado por comissão de reavaliação.
2 - A comissão de reavaliação é em regra constituída por três médicos, um designado pelos serviços da segurança social, que preside com voto de qualidade e que deve ser um dos médicos que integrou a CVIT e que procedeu à verificação da incapacidade temporária ao abrigo do artigo 17.º, caso esta tenha existido, um designado pelo trabalhador e outro pelo empregador.
3 - A comissão de reavaliação é constituída por apenas dois médicos em caso de:
a) O trabalhador ou o empregador não ter designado médico;
b) O trabalhador e o empregador não terem procedido às designações que lhes competem, cabendo aos serviços de segurança social a designação de outro médico.
4 - A verificação da situação de doença pela comissão de reavaliação produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social.
Artigo 20.º
Procedimento para reavaliação
1 - A reavaliação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença pode ser requerida nas vinte e quatro horas subsequentes ao conhecimento do resultado da verificação da mesma, devendo, na mesma data, ser comunicado o pedido à contraparte.
2 - O requerimento deve conter a designação do médico referido no n.º 2 do artigo anterior, ou declaração de que o requerente prescinde dessa faculdade.
3 - A contraparte pode designar o médico nas vinte e quatro horas seguintes ao conhecimento do pedido.
4 - Ao procedimento para reavaliação é aplicável o disposto nas alíneas a) e c) do n.º 4 e nos n.ºs 5 a 7 do artigo 17.º
5 - No prazo de oito dias a contar da receção do requerimento, a comissão deve proceder à reavaliação da situação de doença do trabalhador e comunicar o resultado da mesma a este e ao empregador, nos termos do n.º 7 do artigo 17.º
Artigo 21.º
Comunicações
As comunicações previstas no presente capítulo devem ser efetuadas por meio célere, designadamente telegrama, telefone, telefax ou correio eletrónico.
Artigo 22.º
Eficácia do resultado da verificação da situação de doença
O empregador não pode fundamentar qualquer decisão desfavorável para o trabalhador no resultado da verificação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença, efetuada nos termos dos artigos 17.º ou 18.º, enquanto decorrer o prazo para requerer a reavaliação ou, se esta for requerida, até à decisão final.
Artigo 23.º
Encargo da verificação ou reavaliação da situação de doença
O requerimento de submissão à CVIT da segurança social ou da intervenção da comissão de reavaliação está sujeito a taxa, regulada em portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pela área das finanças e pela área laboral.
Artigo 24.º
Direito subsidiário
Em tudo o que não se encontrar especialmente regulado no presente capítulo, e desde que o não contrarie, aplica-se subsidiariamente, e com as necessárias adaptações, o disposto no Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de Dezembro.
A apreciação do litígio dos autos tem como ponto fulcral a análise deste regime legal, que deixámos antes reproduzido e que se encontrava em vigor à data dos factos em causa nos autos.
H – INTERPRETAÇÃO DO REGIME LEGAL TRANSCRITO
Importa desde logo e nesta matéria das ausências dos trabalhadores ao serviço por motivo de doença referir que a leitura e conjugação dos diversos preceitos normativos antes reproduzidos não se revela fácil, clara e inequívoca, dado os mesmos pecarem não somente por omissão como por uma - pelo menos aparente – contradição.
Mas antes de concretizarmos as nossas dúvidas e perplexidades quanto aos aspetos anteriormente aflorados, há que assentar no que nos parece mais ao menos certo e seguro quanto ao regime jurídico das faltas [que são definidas como «a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário»]:
- Tal regime jurídico, no que respeita aos motivos justificativos de faltas e à sua duração, é insuscetível de alteração por regulamentação coletiva ou por contrato de trabalho, nos termos do artigo 250.º do C/2009, salvo no que toca às ausências dadas por «[…] trabalhador eleito para estrutura de representação coletiva dos trabalhadores, nos termos do artigo 409.º; [que pode ser alvo de negociação coletiva, mas apenas em sentido mais favorável ao trabalhador];
- Logo, nada obsta a que, em princípio, os instrumentos de regulamentação coletiva e os contratos de trabalho possam regular as demais matérias referentes às faltas, nos termos do artigo 3.º do CT/2009 e desde que não exista disposição legal que, de uma forma expressa ou tácita, a tal se oponha;
- As entidades empregadoras também não estão impedidas de, dentro dos seus poderes de direção e regulamentação das relações laborais, emanar ordens de serviços e regulamentos que definam internamente regras respeitantes a esses mesmos aspetos que não se acham cobertos pelo disposto no artigo 250.º ou outros dispositivos legais, mas sempre respeitando o âmbito das normas e as fronteiras definidas pelos demais artigos do Código de Trabalho ou de outra legislação avulsa, complementar e aplicável que regulam tal regime das faltas justificadas ou injustificadas;
- Logo, esses regulamentos ou ordens de serviço não podem arredar, contrariar ou alterar unilateralmente e de acordo com as conveniências de funcionamento, organização e atividade do empregador o conteúdo e os limites traçados por tais dispositivos legais [cf. os artigos 97.º, 99.º, 126.º, 127.º e 129.º de tal diploma legal];
- Tais ausências/faltas podem ser justificadas ou injustificadas;
- As faltas justificadas podem ser motivadas «por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, nomeadamente […] doença […];
- As faltas têm de ser comunicadas ao empregador nos termos dos números 1 a 4 do artigo 253.º do CT/2009, considerando-se tais ausências injustificadas, ainda que sejam materialmente fundadas em qualquer uma das causas elencadas no número 2 do artigo 249.º do mesmo diploma legal ou em legislação especial, caso se verifique a violação por parte do empregado faltoso de tais regras;
- No caso de faltas fundadas em motivo de doença as mesmas só podem ser provadas por declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou ainda por atestado médico;
- A entidade patronal pode requerer a verificação por médico da doença invocada pelo trabalhador para fundar as suas faltas ao trabalho, sendo tal verificação efetuada pelos clínicos da Segurança Social ou por médico designado pela empregadora e estando a sua decisão de «APTO» ou «NÃO APTO» sujeita a reavaliação por junta médica a funcionar junto daquela entidade.
Ora, chegados aqui, defrontamo-nos com uma primeira dúvida, que se radica na redação do número 3 do artigo 17.º da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro «3 - A deliberação da CVIT realizada a requerimento do empregador produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social de que o trabalhador é titular.», assim como no teor idêntico do número 4 do artigo 19.º do mesmo diploma legal: «4 - A verificação da situação de doença pela comissão de reavaliação produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social.» [cf. ainda o número 2 do artigo 18.º do mesmo diploma legal].
São textos legais pouco felizes, pois consentem interpretações opostas e com consequências jurídicas muito díspares, dado as duas normas acima reproduzidas parecerem querer restringir os efeitos da declaração de «APTO» ou «NÃO APTO» à relação entre a Segurança Social e o beneficiário – neste caso, o trabalhador examinado – e à continuação do recebimento pelo mesmo do correspondente subsídio de doença.
Tal questão não é absurda, bastando olhar, para o efeito, para os factos alegados pelo Autor na sua contestação/reconvenção assim como para a resposta da Segurança Social ao pedido da empregadora no sentido de lhe fornecer cópia do relatório da Junta de Verificação, constante de fls. 38 do procedimento disciplinar [E-mail de 19/10/2018], que parece insinuar uma distinção entre o parecer médico-legal de verificação da incapacidade e a declaração de tal incapacidade quando reconhecida por CITT: «O exame clínico no âmbito do Serviço de Verificação de Incapacidades consiste numa peritagem médico-legal, com normativos específicos, que não deve ser confundido com o exame médico promovido no âmbito do Sistema Nacional de Saúde pelo respetivo médico assistente, com o objetivo de prestação de cuidados de saúde.
Ainda que o médico assistente considere a manutenção da situação de incapacidade temporária, este facto não determina o direito ao subsídio de doença [mesmo que possa, eventualmente, justificar a falta ao trabalho no âmbito da legislação laboral]». [sublinhado da nossa responsabilidade]
Temos para nós que, contudo, tal interpretação não pode merecer o nosso acolhimento – à imagem do que é sustentado pelo tribunal da 1.ª instância -, pois não somente é o próprio número 3 do artigo 254.º do CT/2009 que permite ao empregador o pedido de verificação da doença invocada pelo trabalhador como fundamento para sua ausência ao trabalho, como remete para o regime da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro, onde se regula tal verificação e se determina, designadamente, que «O empregador não pode fundamentar qualquer decisão desfavorável para o trabalhador no resultado da verificação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença, efetuada nos termos dos artigos 17.º ou 18.º, enquanto decorrer o prazo para requerer a reavaliação ou, se esta for requerida, até à decisão final.» [artigo 22.º].
Logo, há que concluir que a decisão de tal comissão de verificação produz efeitos jurídicos simultaneamente em dois planos distintos, a saber, na relação laboral estabelecida entre a entidade empregadora e o trabalhador ausente por motivo de doença e na relação jurídica prestacional do sistema de segurança social.
A ser assim, há que encarar aquela declaração de «APTO» da Comissão de Verificação como produzindo efeitos ao nível do CITT que justifica as faltas dadas pelo Autor até ao dia 1/10/2018.
I – PARECER NEGATIVO DA COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO E CITT POSTERIOR
Mas que dizer do cenário particular que ressalta dos autos e que nos revela que a médica assistente do Autor continuou a emitir CITT’s desde o dia 2/10/2018 em diante, não obstante a referida declaração de «APTO» da Comissão de Verificação datada de 28/9/2018?
A Ré ignorou simplesmente a sua existência, assim como o próprio tribunal da 1.ª instância, o que não deixa de ser estranho e algo temerário, pois em parte alguma dos autos se disse que tais certificados eram falsos, forjados, falsificados, fraudulentos, simples fogos-fátuos sem alcance nem sentido.
Esses CITT’s são um dos documentos próprios segundo o número 2 do artigo 254.º do CT/2009 [e legislação especial e específica reguladora do modo, quando e quanto de tais certificados clínicos] para justificar as faltas dos trabalhadores e o que se passou nos autos é que os mesmos, não obstante o referido parecer negativo da Comissão de Verificação quanto ao CITT que vigorava até ao dia 1/10/2018, continuaram a ser elaborados, emitidos, entregues ao Autor e apresentados por este à sua entidade empregadora.
Não são propriamente papel de embrulho ou meras folhas de couve que possam ser simplesmente ignoradas, em termos materiais como jurídicos, mas documentos válidos e legítimos que não podem ser descartados sem que antes se explique e justifique devidamente a sua desconsideração médico-legal e jurídica.
Ora, nesta precisa matéria, quer as partes como o próprio tribunal da 1.ª instância simplesmente ignoraram a norma constante do artigo 24.º da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro, quando, com a epígrafe «Direito subsidiário», determina que «Em tudo o que não se encontrar especialmente regulado no presente capítulo, e desde que o não contrarie, aplica-se subsidiariamente, e com as necessárias adaptações, o disposto no Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de Dezembro.»
Consultando e compulsando esse diploma legal [Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de Dezembro] [[1]], que institui o «Sistema de Verificação de Incapacidades da Segurança Social», deparamo-nos com algumas disposições legais que julgamos serem pertinentes no quadro do litígio que nos ocupa e, especialmente, na tentativa de resposta à questão posta: o que pode fazer o empregador quando, na posse [digamos assim] de uma declaração de «APTO» relativamente a um trabalhador faltoso, se confronta de imediato com novos CITT que vêm reafirmar a doença que havia já justificado a emissão de documentos idênticos desde 17/9/2018 e que, no que toca à prorrogação de 22/9/2018, tinha sido contestada pela Comissão de Verificação, com o seu veredicto de «APTO».
Os dispositivos legais a que nos referimos são os seguintes:
SUBSECÇÃO II
Comissões de verificação
Artigo 33.º
Efeitos das deliberações de não subsistência de incapacidade
As deliberações das comissões de verificação que se pronunciem pela não subsistência da situação de incapacidade temporária para o trabalho determinam os efeitos previstos no regime jurídico de protecção na doença.
Artigo 34.º
Comunicação das deliberações sobre a incapacidade
1 - Da deliberação da comissão de verificação será dado imediato conhecimento ao beneficiário, mediante entrega de documento que a declare.
2 - Cópia do documento a que se refere a parte final do número anterior é enviada, se for caso disso, dentro das quarenta e oito horas subsequentes, à instituição de segurança social que abrange o beneficiário, para os efeitos previstos na lei, nomeadamente a cessação das prestações, quando à mesma houver lugar.
3 - A instituição de segurança social que abrange o beneficiário comunica, de imediato, ao centro de saúde competente a deliberação da comissão de verificação relativa à não subsistência da incapacidade, para conhecimento do médico assistente do beneficiário.
[…]
SUBSECÇÃO II
Comissões de reavaliação
Artigo 13.º
Composição e designação
1 - As comissões de reavaliação de incapacidade temporária são constituídas por três peritos médicos, sendo dois designados pelo centro regional e o terceiro indicado pelo beneficiário.
2 - Dos dois peritos designados pelo centro regional, um preside à comissão de reavaliação e o outro deve ter feito parte da comissão de verificação que observou o beneficiário.
3 - No caso de o beneficiário não indicar o médico no prazo que lhe for fixado pelo centro regional, ou, indicando-o, o mesmo falte, a comissão de reavaliação delibera com a presença dos dois médicos referidos no número anterior, tendo o presidente voto de qualidade, em caso de empate.
Artigo 14.º
Competências
Compete às comissões de reavaliação de incapacidade temporária pronunciar-se sobre a subsistência de incapacidade temporária dos beneficiários, quando se verifique uma das seguintes situações:
a) Certificação, devidamente fundamentada pelos serviços de saúde, de uma nova situação de incapacidade do beneficiário no período de 90 dias subsequente à data da deliberação da comissão de verificação que considerou a não subsistência de incapacidade temporária para o trabalho;
b) Manutenção pelos serviços de saúde da situação de incapacidade temporária, após deliberação da comissão de verificação que considerou a não subsistência de incapacidade para o trabalho.
Resulta, desde logo, do número 3 do artigo 34.º do transcrito diploma que os serviços da Segurança Social onde se reuniu a Comissão de Verificação que proferiu um parecer negativo quanto à incapacidade temporária do beneficiário que ali se apresentou a pedido da sua entidade empregadora, devem comunicar de imediato ao Centro de Saúde e ao médico-assistente de tal beneficiário [trabalhador], o «APTO» por aquela declarado, de maneira a que o mesmo possua uma informação atualizada acerca da situação médico-legal do seu doente/utente, conforme foi avaliada pelos peritos da Segurança Social.
Esse médico-assistente, face a tal informação da Segurança Social, tem duas atuações possíveis a adotar, do ponto de vista técnico e clínico: ou concorda e se conforma com o referido parecer, entendendo que o referido beneficiário afinal está laboralmente capaz para se apresentar ao serviço ou, ao invés e porque não aceita nem subscreve o mencionado parecer, mantém ou até altura a sua posição clínica mas continua a entender que o referido utente/trabalhador não está em condições de saúde para voltar a assumir as suas funções profissionais e emite novo CITT em que lhe reconhece a manutenção da mesma doença e prorroga os anteriores CITT ou, caso esse seja verdadeiramente o caso que tem perante si, elabora um outro em que declare uma outra e nova doença.
Estando-se perante um caso como o que os nossos autos nos apresentam, em que o aludido médico-assistente considerou que a doença natural ou não-profissional que já havia fundado os dois anteriores CITT se conserva [ou até se agravou], mantendo o seu parecer médico-legal e assim contrariando o da Comissão de Verificação [como muito claramente, a alínea b) do artigo 14.º acima reproduzida expressamente admite], então a opção que a entidade empregadora possui como forma de reação a esses novos CITT não é simplesmente olhar para eles como se não existissem ou se se limitassem a ser uma folha de papel em branco sem valor algum mas antes, de acordo com as competências definidas nesse artigo 14.º, vir reclamar ou recorrer para a comissão de reavaliação de incapacidade temporária territorialmente competente, com vista a rebater aquela nova emissão de CITT e a obter um parecer médico-legal que resolvendo o diferendo existente, seja a palavra definitiva na matéria e coloque assim uma pedra final no assunto.
Afigura-se-nos que, se tal Comissão de Reavaliação, confirmar o parecer de «APTO» da primeira Comissão, à entidade empregadora não será exigível mais nenhum procedimento ou diligência, podendo então e sem margem para dúvidas tomar a decisão desfavorável para o trabalhador a que se refere o artigo 22.º da Lei n.º 105/2009 de 14 de setembro.
No quadro exposto e face ao teor da alínea b) do artigo 14.º, a questão de ter sido prorrogada a anterior doença natural ou de ter sido declarada uma nova doença pelo médico-assistente, para efeitos de se considerarem legítimas ou não as posteriores faltas ao trabalho dada pelo trabalhador, para além de ser de ordem essencialmente formal, perde a relevância e importância que quer a Ré, como o tribunal da 1.ª instância, lhe vieram a conferir.
Ora, a ser assim, houve uma manifesta precipitação legal da parte da Ré que, ao invés de desenvolver aquela última diligência junto da Comissão de Reavaliação da Segurança Social, com vista a abalar a credibilidade e valor médico-legal dos novos CITT, deixou os mesmos intocados e a produzir os seus normais, válidos e legítimos efeitos e avançou logo para o regime jurídico-laboral das faltas injustificadas e para o procedimento disciplinar com base nas mesmas com vista ao seu despedimento com justa causa, como efetivamente veio a acontecer, o que, em nosso entender, tem efeitos jurídicos importantes na economia dos autos, no quadro da ponderação da adequação, proporcionalidade e justiça da justa causa do despedimento aplicada pela Ré ao Autor.
J – JUSTA CAUSA PARA O DESPEDIMENTO
Se lermos as alegações de recurso e as conclusões delas extraídas, verificamos que também é questionado pelo empregador a circunstância do tribunal da 1.ª instância ter considerado ilícito, com base na factualidade dada como provada, por o seu comportamento não integrar suficientemente o conceito legal de justa causa, conforme previsto no artigo 351.º do Código do Trabalho.
Tal disposição legal reza o seguinte, na parte que nos interessa para aqui:
Artigo 351.º
Noção de justa causa de despedimento
1 - Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
2 - Constituem, nomeadamente, justa causa de despedimento os seguintes comportamentos do trabalhador:
a) (…)
g) Faltas não justificadas ao trabalho que determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa, ou cujo número atinja, em cada ano civil, cinco seguidas ou 10 interpoladas, independentemente de prejuízo ou risco;
h) (…)
3 - Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes.
O conceito de faltas injustificadas pode ser melhor compreendido através da conjugação do preceito acima transcrito com o estatuído nos artigos 249.º a 251.º do mesmo diploma legal, que nos dá a noção de falta, das diversas categorias juridicamente previstas, bem como a relevância do regime em causa para o legislador laboral (imperatividade praticamente absoluta):
Artigo 248.º
Noção de falta
1 - Considera-se falta a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a actividade durante o período normal de trabalho diário.
2 - Em caso de ausência do trabalhador por períodos inferiores ao período normal de trabalho diário, os respectivos tempos são adicionados para determinação da falta.
3 - Caso a duração do período normal de trabalho diário não seja uniforme, considera-se a duração média para efeito do disposto no número anterior.
Artigo 249.º
Tipos de falta
1 - A falta pode ser justificada ou injustificada.
2 - São consideradas faltas justificadas:
a) As dadas, durante 15 dias seguidos, por altura do casamento;
b) A motivada por falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos termos do artigo 251º;
c) A motivada pela prestação de prova em estabelecimento de ensino, nos termos do artigo 91º;
d) A motivada por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, nomeadamente observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida, doença, acidente ou cumprimento de obrigação legal;
e) A motivada pela prestação de assistência inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro do agregado familiar de trabalhador, nos termos dos artigos 49.º, 50.º ou 252.º, respetivamente;
f) A motivada por deslocação a estabelecimento de ensino de responsável pela educação de menor por motivo da situação educativa deste, pelo tempo estritamente necessário, até quatro horas por trimestre, por cada um;
g) A de trabalhador eleito para estrutura de representação colectiva dos trabalhadores, nos termos do artigo 409.º;
h) A de candidato a cargo público, nos termos da correspondente lei eleitoral;
i) A autorizada ou aprovada pelo empregador;
j) A que por lei seja como tal considerada.
3 - É considerada injustificada qualquer falta não prevista no número anterior.
Artigo 250.º
Imperatividade do regime de faltas
As disposições relativas aos motivos justificativos de faltas e à sua duração não podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo em relação a situação prevista na alínea g) do n.º 2 do artigo anterior e desde que em sentido mais favorável ao trabalhador, ou por contrato de trabalho.
Estas são as normas legais que nos servirão de pano de fundo para efeitos de análise das questões em presença: faltas injustificadas e justa causa do despedimento de que a Autora foi alvo.
K – FACTOS RELEVANTES
Os factos dados como provados, a este respeito, são os seguintes:
«A. O Autor foi admitido nos quadros da Ré em 21-06-1995 tendo em 6 de fevereiro de 2019, sido notificado da deliberação da Comissão Executiva, que lhe aplicou a sanção disciplinar de Despedimento, aplicada por (…) de 01-02-2019, com efeitos imediatos. B. À data do despedimento, o Autor auferia as seguintes remunerações: a) Vencimento base, € 909,80; b) Diuturnidades, € 152,85 c) Diuturnidade especial, € 13,11. C. No âmbito da categoria de carteiro (CRT), desenvolvia a sua atividade no Centro (…) Amora. O. No âmbito do contrato de trabalho, estava obrigado a prestar diariamente serviço no Centro (…), no período normal de trabalho- horário de trabalho designado pela empresa. P. O trabalhador entregou à entidade patronal Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho (doravante CITT), emitido pela Dra. - por Doença Natural (DN) - Prorrogação, com início no dia 22 de Setembro de 2018 (2018-09-22), e termo a 01 de Outubro de 2018 (2018-10-01), e data de emissão 26 de setembro de 2018. Q. O CITT supra referido foi emitido pela prorrogação da situação de doença anterior (Constante de CITT emitido pela Dra. , por Doença Natural (DN), Inicial, com início no dia 17 de Setembro de 2018 (2018-09-17), e termo a 21 de setembro (2018-09-21), emitido no dia 20 de setembro de 2018). R. Os BBB, requereram junto dos serviços competentes do Instituto da Segurança Social- Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal, a submissão do trabalhador (ausente com justificação de doença), a exame de verificação da Comissão de Verificação da Incapacidade para o Trabalho. S. Na sequência do solicitado pelo Empregador, o Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal- S.S.S - Serviço de Verificação de Incapacidade Temporária, convocou o trabalhador para exame médico de verificação da incapacidade para o exercício da sua atividade profissional, a realizar no dia 28 de setembro de 2018. T. Realizado o exame médico de verificação, por aquela entidade foi deliberado que o trabalhador estava APTO para desempenhar a sua atividade profissional. U. Nessa data, o trabalhador foi informado pelos serviços da Segurança Social de Setúbal, que caso pretendesse, poderia requerer a reavaliação da deliberação da competente peritagem médica, no prazo de 24 horas, faculdade que não usou. V. O trabalhador não fez pedido de reavaliação, ou seja, não usou da supra referida faculdade. W. Nem se apresentou ao trabalho no dia útil imediato 01 de Outubro de 2018 (2.ª feira). X. O trabalhador entregou ao Empregador, Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho - CITT, emitido pela Dra. - por Doença Natural (DN), Prorrogação, com início no dia 02 de outubro de 2018, e termo a 4 de Outubro de 2018. Y. No dia 2 de outubro de 2018, foi remetido telegrama e correspondência registada ao trabalhador, com informação de que se encontrava em situação de faltas injustificadas, por não se ter apresentado ao serviço, depois de ter sido considerado apto pela Comissão de Verificação. Z. O trabalhador foi devidamente informado pelo empregador, por meio de correspondência remetida para a morada que consta dos registos biográficos da empresa, Rua (…) Seixal, da situação de faltas injustificadas em que se encontrava, desde a data em que se deveria ter apresentado ao trabalho, ou seja, desde o dia 1 de Outubro de 2018, durante 17 dias consecutivos, até ao dia 24 de outubro, mais concretamente nos dias 1, 2, 3, 4, 8, 9,10,11,12,15,16,17,18,19, 22, 23 e 24 de outubro de 2018. AA. O Autor está diagnosticado com ansiedade marcada e depressão, como também sabia a Ré, pelo menos a partir de 03.12.2018. BB. Desde o início da situação de baixa médica o Autor está medicado para essas doenças do foro psiquiátrico e que o tem incapacitado para o exercício da sua atividade profissional, razão pela qual lhe foi prescrita baixa pela sua médica assistente do Centro de Saúde para fazer o devido tratamento, repouso e a recuperação que a situação clínica impõe. CC. No dia em que o Autor recebeu o primeiro telegrama (19.09.2018), estava no seu terceiro dia de ausência ao trabalho, vindo esses dias a serem retroativamente abrangidos pela baixa por doença, concedida através de CITT emitido no dia 20 de setembro de 2018. DD. Ainda no mesmo dia 19.09.2018, um funcionário da Ré dirigiu-se pessoalmente à morada que o Autor indicou na empresa como sendo a sua residência, aí se tendo deparado apenas com a mãe do Autor, pessoa idosa e doente, que ali também habitava. EE. Nestas circunstâncias perguntou pelo Autor. FF. Após a visita à casa do Autor e da sua mãe por parte desse funcionário, no dia 19/9/2018, e do recebimento na empresa Ré do CITT de 20/9/2018, o trabalhador recebeu nesse mesmo dia 20.09.2018 uma carta da Ré a informá-lo que tinha sido requerida na segurança social a verificação da sua incapacidade GG. O Autor recebeu ainda uma carta no dia 19.10.2018, subscrita pelo Sr. Marco Cardoso, Diretor de Operações, na qual alegava que o mesmo se encontrava em faltas injustificadas ao trabalho. HH. Toda esta situação deixou o Autor ainda mais ansioso, nervoso e desestabilizado. II. Também a sua mãe, que foi vítima recentemente de acidente vascular cerebral, ficou bastante perturbada, nervosa e inquieta, por aperceber-se que o filho, para além de não estar bem de saúde, ainda se encontrava com problemas no trabalho. JJ. Como sabe a Ré o Autor entrou para a faculdade no ano letivo de 2017/2018. LL. Toda esta situação foi denunciada por escrito mediante carta dirigida no dia 23.10.2018 para a sede da Ré, na qual foi relatado o sucedido, bem como foram juntas cópias dos CITT que já se encontravam na posse da Ré. MM. O Autor não tem qualquer sanção disciplinar averbada. NN. A Comissão de avaliação teve lugar no dia 28.09.2018. OO. Na Comissão, o Senhor Perito pediu-lhe um relatório médico. PP. O Autor estava doente no dia 28.09.2018, quando ocorreu essa Comissão, e assim permaneceu nos dias seguintes, o que não lhe permitiu que recuperasse e se apresentasse ao serviço, nem no dia 01.10.2018, nem nos dias seguintes. QQ. Por decisão da sua médica do Centro de Saúde, o mesmo manteve-se em situação de incapacidade para o exercício das suas funções, tendo-lhe sido atribuída novamente baixa médica, devidamente comprovada junto dos serviços da Ré, após a decisão da referida Comissão. RR. A médica do Centro de Saúde emitiu um CITT ao Autor referente ao período 22.09.2018 e 01.10.2018. SS. No dia 02.10.2018 o Autor enviou uma mensagem escrita para o telemóvel com o número 926390126 por volta das 6:00 horas da manhã, na qual informava que não se sentia bem e que não estava em condições de ir trabalhar. TT. Ainda nesse dia o Autor foi à sua médica no Centro de Saúde, tendo a mesma decidido que devia ficar em situação de baixa, pelo que emitiu o competente CITT, datado de 2.10.2018 e que veio a ser prorrogado. UU. O respetivo subsídio de doença está a ser atribuído ao Autor pela Segurança Social, porque se encontra em situação de baixa médica por doença. VV. Os CITT são válidos para a Segurança Social desde o dia 20.09.2018 em diante, que sempre atribuiu o subsídio de doença ao Autor, pelo menos até 02.02.2019. WW. A Segurança Social convocou o Autor para exame médico de verificação a 11.01.2019. XX. O Autor compareceu nessa data no serviço de verificação de incapacidades de Almada e foi considerado pela Comissão NÃO APTO, porque subsistia nessa data a incapacidade temporária para o trabalho. YY. A Comissão de Trabalhadores dos CTT fez constar do parecer “...ainda que seja entendimento que aquele se sobrepõe ao CITT, considerando que aquele suspende a decisão da médica de família quanto à situação de ausência em concreto, não nos parece legítimo o entendimento da empresa de recusar novas situações de doença, no caso concreto e ainda o que no CITT emitido em 02/10/2018 a médica entenda que é uma prorrogação da situação de doença nada inviabiliza que o estado de saúde do doente se tenha agravado nos dias que medeiam a decisão de equipa de verificação de incapacidade e o momento da avaliação do doente pela médica assistente (4 dias).” ZZ. O Autor é reconhecido pela chefia hierárquica como trabalhador educado, de fácil trato, sem registo de reclamações sobre a sua prestação. AAA. A situação de saúde do Autor degradou-se face ao processo disciplinar e ao despedimento de que foi alvo. BBB. Como consequência direta e adequada dos factos supra descritos, o Autor sentiu-se e vexado na sua dignidade e brio profissional. CCC. A sua sujeição doente a um processo disciplinar que culminou no seu despedimento provocou no Autor sofrimento e um estado de angústia constante. DDD. Passou a ter dificuldades em dormir, vivendo ensombrado pelas preocupações com a sua vida profissional e a sua situação económica. EEE. O Autor passou a isolar-se, a furtar-se ao convívio com a família e com os amigos. FFF. Em virtude do despedimento de que foi alvo o Autor viu-se acometido de dificuldades económicas. GGG. O Autor paga mensalmente uma prestação relativa ao crédito habitação no valor de € 196,58; prestação mensal referente ao seu carro no valor de € 295,90; a título de despesas fixas mensais, aproximadamente, os seguintes valores: água (€ 7,14), luz (€ 84,29), gás (€ 28,43), televisão (35,87), telecomunicações (€ 15,90), condomínio (€ 26,67) e alimentação.»
L - NOÇÃO JURÍDICA DE JUSTA CAUSA
O Professor JOÃO LEAL AMADO, “Contrato de Trabalho”, 2.ª Edição, Janeiro de 2010, publicação conjunta da Wolters Kluwer e Coimbra Editora, página 383, a partir da noção geral de justa causa contida no número 1 do artigo 351.º acima transcrito, refere que “a justa causa de despedimento assume, portanto, um carácter de infração disciplinar, de incumprimento contratual particularmente grave, de tal modo grave que determine uma perturbação relacional insuperável, isto é, insuscetível de ser sanada com recurso a medidas disciplinares não extintivas (…) As diversas condutas descritas nas várias alíneas do número 2 do artigo 351.º possibilitam uma certa concretização ou densificação da justa causa de despedimento, muito embora deva sublinhar-se que a verificação de alguma dessas condutas não é condição necessária (dado que a enumeração é meramente exemplificativa), nem é condição suficiente (visto que tais alíneas constituem «proposições jurídicas incompletas», contendo uma referência implícita à cláusula geral do n.º 1 para a existência de justa causa. Esta traduz-se, afinal, num comportamento censurável do trabalhador, numa qualquer ação ou omissão que lhe seja imputável a título de culpa (não se exige o dolo, ainda que, parece, a negligência deva ser grosseira) e que viole deveres de natureza laboral, quando esse comportamento seja de tal modo grave, em si mesmo e nos seus efeitos, que torne a situação insustentável, sendo inexigível ao empregador (a um empregador normal, razoável) que lhe responda de modo menos drástico”.
O Professor MONTEIRO FERNANDES, em “Direito do Trabalho”, 14.ª Edição, Almedina, página 612, segundo esse mesmo autor, defende que “a cessação do contrato, imputada a falta disciplinar, só é legítima quando tal falta gere uma situação de imediata impossibilidade de subsistência da relação laboral, ou seja, quando a crise disciplinar determine uma crise contratual irremediável, não havendo espaço para o uso de providência de índole conservatória”, ao passo que o Professor JORGE LEITE em “Colectânea de Leis do Trabalho”, página 250 (nota 537 a página 384 da obra de JOÃO LEAL AMADO) sustenta que “a gravidade do comportamento (do trabalhador) deve entender-se como um conceito objectivo-normativo e não subjetivo-normativo, isto é, a resposta à questão de saber se um determinado comportamento é ou não grave em si e nas suas consequências não pode obter-se através do recurso a critérios de valoração subjetiva mas a critérios de razoabilidade (ingrediente objetivo), tendo em conta a natureza da relação de trabalho, as circunstâncias do caso e os interesses da empresa” e ainda que “uma vez mais, não é pelo critério do empregador, com a sua particular sensibilidade ou a sua ordem de valores próprios, que se deve pautar o aplicador do direito na apreciação deste elemento, mas pelo critério do empregador razoável”, istoquanto ao requisito legal da impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho.
Finalmente, a Professora MARIA ROSÁRIO DA PALMA RAMALHO [[2]], acerca do «conceito geral de justa causa disciplinar», afirma o seguinte:
«A lei é particularmente exigente na configuração da justa causa para despedimento. Assim, para que surja uma situação de justa causa para este efeito, é necessário que estejam preenchidos os requisitos do art.º 351.º, n.º 1 do CT. Estes requisitos, de verificarão cumulativa, são os seguintes: - Um comportamento ilícito, grave, em si mesmo ou pelas suas consequências, e culposo do trabalhador (é o elemento subjetivo da justa causa); - A impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral (é o elemento objetivo da justa causa); - A verificação de um nexo de causalidade entre os dois elementos anteriores, no sentido em que a impossibilidade de subsistência do contrato tem que decorrer, efetivamente, do comportamento do trabalhador. (…) Assim, relativamente ao elemento subjetivo da justa causa é exigido que o comportamento do trabalhador seja ilícito, grave e culposo. Estes requisitos justificam as seguintes observações: i) A exigência da ilicitude do comportamento do trabalhador não resulta expressamente do art.º 351.º, n.º 1, mas constitui um pressuposto geral do conceito de justa causa para despedimento, uma vez que, se a atuação do trabalhador for lícita, ele não incorre em infração que possa justificar o despedimento. Contudo, a ilicitude deve ser apreciada do ponto de vista dos deveres laborais afetados pelo comportamento do trabalhador (…)
ii) O comportamento do trabalhador deve ser culposo, podendo corresponder a uma situação de dolo ou de mera negligência. Nos termos gerais, será de qualificar como culposa a atuação do trabalhador que contrarie a diligência normalmente devida, segundo o critério do bom pai de família, mas o grau de diligência exigido ao trabalhador depende também, naturalmente, do seu perfil laboral específico (assim, consoante seja um trabalhador indiferenciado ou especializado, um trabalhador de base ou um técnico superior, o grau de diligência varia). Relevam e devem ainda ser valoradas, no contexto da apreciação da infração do trabalhador, as circunstâncias atenuantes e as causas de exculpação que, eventualmente, caibam ao caso.
iii) O comportamento do trabalhador deve ser grave, podendo a gravidade ser reportada ao comportamento em si mesmo ou as consequências que dele decorram para o vínculo laboral (…) A exigência da gravidade do comportamento decorre ainda do princípio geral da proporcionalidade das sanções disciplinares, enunciado no art.º 330.º, n.º 1 do CT e oportunamente apresentado: sendo o despedimento a sanção disciplinar mais forte, ela terá que corresponder a uma infração grave; se o comportamento do trabalhador, apesar de ilícito e culposo, não revestir particular gravidade, a sanção a aplicar deverá ser uma sanção conservatória do vínculo laboral.
(...) Para além destes elementos subjetivos, só se configura uma situação de justa causa de despedimento se do comportamento do trabalhador decorrer a impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral - é o denominado requisito objetivo da justa causa. Fica assim claro que o comportamento do trabalhador, ainda que constitutivo de infração disciplinar, não e, por si só, justa causa para despedimento; para que esta surja, é necessário que concorram os dois outros elementos integrativos. Em interpretação da componente objetiva da justa causa, a jurisprudência tem chamado a atenção para três aspetos essenciais: i) O requisito da impossibilidade de subsistência do vínculo laboral deve ser reconduzido à ideia de inexigibilidade, para a outra parte, da manutenção do contrato, e não apreciado como uma impossibilidade objetiva. (…) ii) A impossibilidade de subsistência do contrato de trabalho tem que ser uma impossibilidade prática, no sentido em que deve relacionar-se com o vínculo laboral em concreto. (…) iii) A impossibilidade de subsistência do vínculo tem que ser imediata: este requisito exige que o comportamento do trabalhador seja de molde a comprometer, de imediato, o futuro do vínculo laboral. Assim, se, apesar de grave, ilícita e culposa, a infração do trabalhador não tiver, na prática, obstado à execução normal do contrato, após o conhecimento da situação pelo empregador, tal execução demonstra que a infração não comprometeu definitivamente o futuro do vínculo contratual. (…) IV. Por fim, a lei exige que se verifique um nexo de causalidade entre o comportamento ilícito, grave e culposo do trabalhador e a impossibilidade prática e imediata de subsistência do contrato de trabalho. (cf., também, ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual do Direito do Trabalho, Almedina, 1997, página 820).
M - FALTAS INJUSTIFICADAS E JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Não será despiciendo, ainda dentro desta noção da justa causa do despedimento, fazer uma incursão jurídica na matéria específica das faltas injustificadas, dado as mesmas constituírem um dos fundamentos do despedimento com justa causa expressamente previstos no elenco do número 2 do artigo 351.º do CVT/2009 (v.g., na sua alínea g)] e serem o natural contraponto às faltas justificadas, encontrando-se umas e outras definidas e enquadradas juridicamente nas normas constantes dos artigos 248.º a 257.º do CT/2009, na sua redação anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 90/2019, de 4/9, que entrou em vigor em 4/10 deste mesmo ano e cujas disposições fundamentais se mostram reproduzidas noutra parte deste Aresto.
ABÍLIO NETO, em “Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados”, 2.ª Edição, Setembro de 2010, EDIFORUM, páginas 775 e 776, Nota G.1., com referência à alínea g) do número 2 do artigo 351.º, afirma o seguinte: “A alínea g) do n.º 2 deste artigo ao estatuir que, independentemente de qualquer prejuízo ou risco, quando o número de faltas injustificadas atingir, em cada ano civil, cinco seguidas ou dez interpoladas, tal facto constitui justa causa de despedimento, tem subjacente a constatação de que o apontado número de faltas causa uma inevitável perturbação na organização do trabalho do empregador e dos respectivos colegas de trabalho, acarretando sempre incómodos ou/e prejuízos, embora não directamente quantificáveis, para todos, até pela imprevisibilidade e pelo desconhecimento da data da verificação da ausência e do correspondente tempo de duração. Porque nestas circunstâncias o prejuízo existe sempre, o legislador dispensou - e bem - a respectiva alegação e prova, tratando-se, como se trata, de uma facto notório” (só não acompanhamos este autor nesta última afirmação, pois entendemos estar antes face a uma presunção - ilídivel - de que tais ausências provocaram os tais danos ou riscos graves, podendo o trabalhador faltoso demonstrar que os mesmos não ocorreram, em absoluto ou foram diminutos ou moderados, bastando pensar em situações de avaria da máquina com que trabalhava - ou de outras a montante da sua, na cadeia de produção - durante, pelo menos, parte do período de cinco dias em que não compareceu ou da inexistência de trabalho, por não haver encomendas a satisfazer, durante todos ou alguns desses dias).
Chegados aqui, importa dizer que tal fundamento de justa causa deve passar pelo crivo geral do número 1 do artigo 351.º do Código do Trabalho, bem como ponderar os diversos elementos elencados no seu número 3, quando não se mostrarem excluídos pela norma que prevê a justa causa e na sua exata relevância para a apreciação da justa causa em presença (cf. a este respeito, entre outros, JÚLIO MANUEL VIEIRA GOMES, “Direito do Trabalho”, Volume I, “Relações Individuais de Trabalho”, Coimbra Editora, 2007, páginas 944 e seguintes, com especial relevo para o que é sustentado nas páginas 954 a 959, até porque aí são abordadas as faltas injustificadas como fundamento integrador - ou não - da referida justa causa de despedimento).
A nossa jurisprudência tem vindo a defender que no caso de tais faltas - no mínimo de cinco seguidas ou de dez interpoladas - e porque o legislador menciona com padrão temporal de referência o respetivo ano civil, que o prazo de caducidade (ou de prescrição) só deve contar-se a parte do primeiro dia do ano seguinte ao do ano em que tais ausências se verificaram. [[3]]
A ilicitude do despedimento por fatas injustificadas é abordada no seguinte excerto do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.12.2010 (www.dgsi.pt) que reproduz o pensamento do Prof. Menezes Cordeiro, no qual este acentua: “Se o trabalhador duma empresa se sente autorizado a faltar sem justificação, ele está a sobrecarregar os seus colegas e a economia em geral. Tal como ele, todos teriam igual direito a faltar; nenhum processo produtivo seria possível. Por isso, o absentismo é um problema público, que não pode deixar de ser disciplinarmente reprimido. Além disso, a falta injustificada faz esboroar a confiança merecida pelo trabalhador. Provadas as faltas injustificadas – logo, ilícitas e culposas – no máximo legal, está praticamente preenchido o tipo de justa causa. Os seus reflexos na relação laboral advêm agora de juízos de experiência e razoabilidade (…). Mas não parece adequado (…) deixar penetrar um tipo de benevolência que a lei não consente (…)”.
N – LITÍGIO DOS AUTOS
Ora, face ao descrito quadro legal e à interpretação que a transcrita doutrina faz do mesmo, importa averiguar se as condutas dadas como assentes e imputadas ao Apelado integram ou não o conceito legal de justa causa.
Se quisermos sintetizar tais condutas que foram disciplinarmente assacadas ao trabalhador e consideradas pela sua entidade empregadora como suficientemente graves para motivar a cessação do contrato de trabalho que aquela mantinha com o Autor, traduzem-se em 17 faltas injustificadas dadas ao trabalho entre os dias 1/10/2018 e 24/10/2018.
Também não é despiciendo recordar o que se disse acerca do regime legal aplicável, designadamente por referência à admissibilidade legal de cumulação e concorrência entre uma decisão de «APTO» por parte da Comissão de Verificação da Segurança Social e os CITT posteriormente emitidos pelo Centro de Saúde onde o Autor está inscrito e que não são forjados, falsos ou fraudulentos [nada foi alegado a esse respeito nem ficou minimamente provado], tanto mais que o mesmo, em janeiro de 2019, veio a se deslocar, com base nos mesmos, a uma segunda Comissão de Verificação de Segurança Social que o deu como «NÃO APTO», tendo tal entidade sempre liquidado ao trabalhador, de forma ininterrupta e desde 17/9/2018, o correspondente subsídio de doença [a sentença recorrida afirma que se trata de um lapso dos serviços da Segurança Social, mas nada ficou dado como assente nesse sentido nos autos, como, tendo em atenção o que deixámos antes mencionado quanto à possibilidade de existência daqueles Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho em concorrência, discórdia e confronto com o parecer médico-legal da Comissão de Verificação, não é certo e seguro que tal atuação da Segurança Social não tenha sido consciente, intencional e legal].
Ora, tal cenário factual, médico-legal e jurídico coloca, desde logo, em dúvida a posição assumida pela Ré e que foi no sentido de ignorar tais CITT assim como o regime jurídico aplicável, e considerar, desde logo, tais ausências como laboralmente injustificadas e disciplinarmente relevantes.
Importa dizer, aliás, que também aqui e ainda que, com base no parecer médico-legal de «APTO» da Comissão de Verificação, se pudesse qualificar tais faltas como injustificadas, tal cenário não obrigava nem implicava necessariamente a perseguição disciplinar do trabalhador.
Convoque-se para aqui o texto da Dr.ª MILENA ROUXINOL, intitulado «XVI. Faltas ao Trabalho» e publicado na obra coletiva «Direito do Trabalho – Relação Individual», 2020 [reimpressão] Almedina, páginas 737 e seguintes, com especial relevância para páginas 765]: «Se retornarmos a algumas das hipóteses acima figuradas, não poderá dizer-se, relativamente ao trabalhador que se ausenta devido ao funeral da ama, a urgência de socorrer o animal de estimação, ou de afastar os seus haveres do perigo premente de incêndio, ou do trabalhador zeloso e cumpridor que incorre em faltas por ter marcado unilateralmente férias, sendo certo que nunca a entidade empregadora lhe permitira gozá-las nos termos devidos, e ainda relativamente aqueloutro que não comunica ao empregador que estará ausente por ter sido condenado a pena de prisão, sabendo que aquele conhecia a situação, ou que não entrega os atestados comprovativos da sua doença, sem, porém, se poder dizer que tal se deve a qualquer atitude de desprezo perante as responsabilidades laborais correspetivas dos interesses da entidade empregadora - não poderá afirmar-se, dizíamos, em relação a todos esses, que, não obstante lhes ser imputável o ato ilícito (pelo qual são responsáveis, portanto), a sua conduta, mais amplamente apreciada e em correlação com as circunstancias exógenas que a rodeiam é, afinal, essencialmente consonante com a esperada do trabalhador-homem normal, suposto pela ordem jurídico-laboral, contrastando, por isso, com qualquer juízo de censurabilidade e consequente punição? Afirmá-lo equivale a sustentar que, para se apurar se certo comportamento do trabalhador, designadamente uma falta injustificada, deve qualificar-se como infração disciplinar merecedora de sanção por parte do empregador, há que valorar a sua atitude subjetiva não apenas como se revelou naquele comportamento, mas também no quadro circunstancial que a contextualiza, sempre em vista de saber se, afinal, se desviou do padrão do trabalhador normalmente responsável, zeloso e fiel aos seus deveres laborais. Parece-nos, de facto, dever ser assim. Em síntese, a falta, mesmo injustificada, não acarreta, automaticamente, um juízo de culpa, elemento que importará identificar, ainda antes de o medir, de acordo com as circunstâncias concretas. Resta saber se, apresentando-se o ordenamento, no ponto referente à delimitação das faltas justificadas e injustificadas, como tributário de um sistema que, sem ser puramente taxativo, assenta, ainda assim, na tipificação dos motivos justificativos das ausências, assim se afastando da justiça individualizante, a do caso concreto, não haverá espaço para uma leitura do mesmo permeável a juízos de valoração por via dos quais possa concluir-se deverem ter-se como justificadas outras ausências que não as literal e inequivocamente elencadas na lei - aquelas relativamente às quais pudesse, objetivamente, considerar-se prevalente o bem jurídico tutelado por via dessa exclusão da ilicitude da falta, em confronto com o interesse do empregador no cumprimento do contrato e, portanto, inexigível, hoc sensu, esse mesmo cumprimento. Será este, no essencial, o sentido da proposta interpretativa da alínea d) do n.º 2 do art.º 249.º sugerida por JÚLIO GOMES, que, anteriormente, aludimos.»
A proposta interpretativa da Dr.ª MILENA SILVA ROUXINOL «casar-se-ia» [perdoe-se-me a expressão] perfeitamente com a situação vivida nos autos pois tal salto jurídico de qualificar como injustificadas as 17 faltas dadas pelo Autor, com base na declaração de «APTO» da Comissão de Verificação da Segurança Social, ignorou e descartou os diversos CITT que o trabalhador foi apresentando desde o dia 2 de outubro de 2018 e que abrangem o referido período de faltas injustificadas e não considerou que aquele, quer subjetiva como objetivamente, achava que podia faltar, por se encontrar e sentir doente e tal doença natural ser reconhecida e declarada nesses Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho que ele entregava religiosamente na sua entidade empregadora, sendo certo que tem perto de 24 anos de antiguidade, sem máculas disciplinares e foi sempre considerado um bom trabalhador dos CTT. Estaríamos, efetivamente, perante uma atuação ilícita e culposa [censurável] que justificava, verdadeiramente a reação radical e definitiva, de cariz disciplinar, que foi acionada pela entidade empregadora?
Mas, como sabemos tal acionamento do processo disciplinar não se acha contestado nos autos pelas partes nem pela sentença recorrida, tendo este tribunal de recurso de partir do pressuposto de que a Ré podia interpelar o trabalhador enquanto infrator das normas legais e internas vigentes [desde que permitidas e válidas, naturalmente] e lhe aplicar uma das sanções elencadas no artigo 328.º do CT/2009.
Ora, partindo desse pressuposto [dado adquirido] seria, efetivamente e no quadro fáctico e jurídico muito particular antes analisado, a sanção de despedimento com justa causa a única adequada, possível e exigível?
O artigo 330.º do Código do Trabalho de 2009, com a epígrafe “Critério de decisão e aplicação de sanção disciplinar” estipula, a esse respeito, no seu número 1, que «A sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator, não podendo aplicar-se mais de uma pela mesma infração».
Entendemos que a resposta a tal questão – que já foi dada de diversas maneiras, em momentos diversos e anteriores deste Aresto – não pode deixar de ser negativa, pois não apenas o trabalhador tinha perto de 24 anos de antiguidade à data do despedimento, sem nenhum passado disciplinar e com uma boa reputação junto da empresa – «ZZ - O Autor é reconhecido pela chefia hierárquica como trabalhador educado, de fácil trato, sem registo de reclamações sobre a sua prestação» -, como, finalmente, desenvolveu uma conduta disciplinar com uma ilicitude e culpa de reduzido alcance e relevo, sem uma gravidade ou consequências minimamente alegadas e demonstradas e cujo sancionamento com o despedimento mereceu parecer negativo da Comissão de Trabalhadores.
Tal comportamento – que foi, aliás, perturbado pela visita inopinada à sua residência, logo no dia 19/9/2018 e já durante a sua ausência por doença, de um seu superior hierárquico, numa clara violação dos seus direitos de personalidade [artigo 16.º do CT/2009] - não acarreta assim uma qualquer quebra inevitável e irrecuperável de confiança, que torne nessa medida inexigível para a Ré a manutenção do vínculo laboral em questão, sendo ainda perfeitamente adequada e proporcional a aplicação de uma sanção disciplinar que fosse claramente conservatória do vínculo laboral.
Em conclusão, julga-se improcedente o presente recurso de Apelação, nesta sua vertente jurídica, confirmando-se a sentença impugnada.
IV – DECISÃO
Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 662.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se neste Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação interposto por BBB., nessa medida se decidindo o seguinte:
1) Alterar a Decisão sobre a Matéria de Facto, com a eliminação dos Pontos KK. e HHH. e a modificação do teor dos Pontos CC., DD. e EE.;
2) Não obstante tal alteração da Matéria de Facto dada como Provada, confirmar a sentença na sua vertente jurídica.
Custas do presente recurso a cargo do Apelante – artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Lisboa, 23 de setembro de 2020
José Eduardo Sapateiro
Alves Duarte
Maria José Costa Pinto
_______________________________________________________ [1] Alterado pelos Decreto-Lei n.º 165/99, de 13 de Maio, com entrada em vigor em 18 de Maio de 1999, Decreto-Lei n.º 377/2007, de 9 de Novembro, Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de Outubro, com entrada em vigor em 7 de Outubro de 2017 e com produção de efeitos desde 1 de Outubro de 2017 e Lei n.º 2/2020, de 31 de Março (Orçamento do Estado para 2020), com entrada em vigor em 1 de Abril de 2020 [Fonte: DATAJURIS] [2] Em “Tratado de Direito do Trabalho - Parte II - Situações Laborais Individuais”, Volume II, Almedina, 4.ª Edição - Revista e Atualizada ao Código do Trabalho de 2009, com as alterações introduzidas em 2011 e 2012 -, Dezembro de 2012, páginas 817 a 821. [3] Cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 21/03/1995, publicado na CJ, 1995, Tomo 2.º, páginas 285 e seguintes, citado pela recorrida no Ponto 19. das suas conclusões de recurso, bem como o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/02/2002, publicado em CJ, 2002, Tomo 5.º, páginas 160 e seguintes, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25/03/2010, processo n.º 1241/06.2TTCBR.C1, publicado em www.dgsi.pt, referido na sentença recorrida bem, como finalmente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/06/2008, processo n.º 08S835, relator: Bravo Serra, igualmente publicado em www.dgsi.pt.