COVID
PERDÃO DE PENA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO
Sumário


1 - Como é claro e resulta expresso no nº 7, do artigo 2º da Lei nº 9/2020, o perdão aí referido é concedido a reclusos cujas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor da lei e sob condição resolutiva, o que não é o caso destes autos aos quais a dita lei não é aplicável directamente.
2 - Mas dela resulta clara uma preocupação com a população prisional que recoloca em moldes novos, não obstante temporários, porquanto dependentes do período de duração da referida pandemia, a necessidade de ponderar em novos moldes a necessidade das penas impostas que são, efectivamente, curtas penas de prisão.
3 - Estando em causa um crime de furto de energia eléctrica para a residência dos arguidos, não se antecipa possível que existam as condições técnicas que permitam o cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, pelo que se justifica a suspensão da execução da pena de prisão.

Texto Integral



Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

A - Relatório:

No Tribunal Judicial de Santarém – Vara de competência Mista - correu termos o processo comum singular supra numerado no qual foram julgados os arguidos: (…) imputando-lhes a prática, como autores materiais, de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 do Código Penal, aos arguidos (...) e (…) em co-autoria, e aos arguidos (...) e (…) em co-autoria material e na forma tentada.

Regularmente notificados, os arguidos não deduziram contestação nem arrolaram testemunhas.


*

A final - por acórdão lavrado a 29 de Maio de 2019 - veio a decidir o Tribunal recorrido:

a) Condenar o arguido (…), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano.

b) Condenar o arguido (…), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 900 (novecentos euros).

c) Condenar o arguido (…), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 900 (novecentos euros).

d) Condenar o arguido (...), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão.

e) Condenar a arguida (…), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 650 (seiscentos e cinquenta euros).

f) Condenar o arguido (...):

i) pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

ii) pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão;

iii) depois de efectuado o cúmulo jurídico das penas parcelares identificadas em f) i) e f) ii) na pena única de 7 (sete) meses de prisão.

g) Condenar a arguida (…), pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 1.100 (mil e cem euros).

h) Condenar o arguido (…), pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 1.100 (mil e cem euros).

i) Condenar a arguida (…), pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 750 (setecentos e cinquenta euros).

j) Condenar o arguido (…), pela prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 550 (quinhentos e cinquenta euros).

k) Declarar perdidos a favor do Estado os cabos eléctricos apreendidos nos autos.

l) Condenar todos os arguidos em 3 U.C. de taxa de justiça, cada um, e a suportar solidariamente os demais encargos decorrentes com o processo.


*

O arguido (...), não se conformando com a decisão, interpôs recurso da decisão final formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

a) Por sentença proferida nos presentes autos, foi o arguido condenado pela prática em co-autoria e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão; e pela prática de um crime de furto na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 do Código Penal, na pena de 3 meses de prisão; sendo que, depois de efetuado o cúmulo jurídico das mencionadas penas parcelares, foi condenado na pena única de 7 (sete) meses de prisão.

b) O tribunal a quo considerou provados os factos numerados de 31 a 36 e constantes da “Fundamentação de facto – Factos provados” na douta sentença recorrida, os quais se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

c) O arguido, ora recorrente, não se conforma com a decisão do tribunal a quo relativamente aos factos mencionado em b), por entender que a prova produzida em audiência de julgamento é manifestamente insuficiente para que o tribunal de que se recorre pudesse decidir pela sua condenação e, consequentemente, para fundamentar a solução de direito adotada.

d) Para formação da sua convicção o Tribunal a quo atendeu a toda a prova produzida, sendo que a mesma era indireta, sempre orientado pelo princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127.º do CPP.

e) Existe contradição entre o facto dado como provado no ponto 31. (Os arguidos (...) e (…) residem numa casa situada no Bairro (…)) dos factos provados na douta sentença de que se recorre e o facto provado e constante do ponto 80. (O arguido (...) vive em casa do pai, com a companheira, que não trabalha, e uma filha com 16 anos de idade), uma vez que o arguido reside efetivamente em casa do seu pai e esta não se situa no Bairro (…).

f) O Tribunal a quo alicerçou a sua decisão em convicções, quer das testemunhas, quer do próprio Tribunal e, com base nessas convicções considera ser razoável presumir a autoria dos factos supra mencionados, por parte do arguido.

g) O douto Tribunal a quo teria que, necessariamente, fazer a descrição factual correspondente à autoria do crime por parte do arguido, conforme resulta do Acordão do Tribunal da Relação de Évora, proferido em 12/09/2017, no âmbito do Processo n.º 151/15.7GAVRS.E1, mas a verdade é que não o fez.

h) Tal como resulta do mencionado Acordão do Tribunal da Relação de Évora, “não só se exige na acusação e sentença a descrição factual correspondente à forma de autoria verificada, como só pode afirmar-se a autoria se resultar provada alguma destas modalidades”.

i) Relativamente ao recorrente, a factualidade julgada provada não é suficiente para que se possa inferir que foi o arguido quem subtraiu a energia elétrica. Da mesma forma, e ainda que se possa admitir ter sido outra pessoa a subtrair energia elétrica em benefício do arguido, a verdade é que não resultou provado a participação deste.

j) Não foi produzida qualquer prova que possa permitir, com a certeza que esta situação exige, concluir que o arguido subtraiu energia elétrica, facto essencial ao preenchimento do tipo legal de furto tal como o descreve o artigo 203º do Código Penal.

k) Não podem bastar indícios e presunções para fundamentar a condenação do arguido numa pena de prisão efetiva e a verdade é que, o douto tribunal a quo recorreu à prova indiciária para formar a sua convicção (cfr. motivação da decisão de facto).

l) Não existem provas sólidas e inabaláveis para fundamentar a condenação do arguido numa pena de prisão efetiva, alicerçada em factos que deveriam ter sido considerados não provados, face à inexistência de tal prova.

m) Verifica-se pois, um erro notório na apreciação da prova, sendo que estamos perante uma incorreta apreciação da prova produzida em sede de julgamento.

n) A sentença recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova, previsto na al. c) do n.º 2 do art. 410.º do C.P.P., sendo certo que existe falta de conformidade entre a prova produzida em audiência de julgamento e as regras da experiência comum.

o) O tribunal a quo deu como provado o que não se sabe se aconteceu., pelo que, ignorou o princípio do “in dúbio pro reo”. Este princípio constitui uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver a certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa.

p) O princípio do “in dúbio pro reo”, uma das vertentes que o princípio constitucional da presunção de inocência (artigo 32º, nº 2, 1ª parte, da CRP) contempla, impõe uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos, sendo que, em tal situação, o tribunal tem de decidir pro reo.

q) Não o fazendo, como aconteceu nos presentes autos relativamente ao recorrente, estamos perante a violação do princípio do “in dúbio pro reo”.

r) Resulta da decisão recorrida (cfr. motivação da decisão de facto) que “para a formação da sua convicção, o tribunal atendeu à conjugação de toda a prova produzida orientada pelo princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do Código de Processo Penal”.

s) Mas, o princípio da livre apreciação da prova não pode, de modo algum, querer apontar para uma apreciação arbitrária, da prova produzida. Se a apreciação da prova é discricionária, esta discricionariedade tem os seus limites, os quais não podem ser licitamente ultrapassados: a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever, o dever de perseguir a chamada “verdade material”, de sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objetivos e, portanto, em geral suscetível de motivação e controlo (cf. Figueiredo Dias, ob. cit.., págs 202-203).

t) Dando como provado aquilo que não se provou, estamos perante um erro notório na apreciação da prova e perante a violação do disposto no artigo 127º do Código Penal, o que, no caso da decisão recorrida, se verifica.

u) Os factos considerados provados em 31., 32., 33., 34., 35. e 36. da douta sentença recorrida, devem, assim, ser considerados não provados.

v) No que respeita à escolha e medida da pena, entende o recorrente que o tribunal a quo também errou, uma vez que considerou que as exigências de prevenção geral e especial apenas serão beneficiadas com a aplicação de uma pena privativa da liberdade para o arguido (...), por só esta se afigurar adequada às finalidades da punição.

w) Para justificar a aplicação ao arguido de uma pena de prisão efetiva, o tribunal a quo considera que o recorrente revela fraca capacidade em analisar criticamente factos semelhantes aos que deram origem ao presente processo. Mas, a verdade é que o arguido nunca foi condenado pela prática do crime de furto (cfr. ponto 84 dos factos provados).

x) Não tendo o recorrente antecedentes criminais registados pela prática do crime de furto, o tribunal a quo devia ter considerado esta circunstância para fundamentar a suspensão da execução da pena de prisão efetiva, sendo certo que, ao decidir como decidiu, está a infligir ao recorrente um desproporcionado sacrifício.

y) Poderia igualmente ter decidido pela execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sendo certo que o regime de permanência na habitação previsto no artigo 43º do Código Penal passou a constituir uma forma de execução ou cumprimento da pena de prisão.

z) O tribunal a quo não só deveria ter optado, no caso de sentença condenatória (da qual o recorrente discorda, como já se demonstrou supra), pela aplicação de multa ou, na eventualidade de pena de prisão como se verificou, pela sua suspensão na execução ou, ainda que se entendesse que não havia lugar à suspensão da execução da pena, deveria o tribunal de que se recorre ter optado execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.

aa) Não o fazendo, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40º e 71º do Código Penal, no que respeita às finalidades das penas e determinação da medida da pena.

bb) Deve assim, a douta sentença recorrida ser revogada e substituida por outra que absolva o recorrente, (...), da prática do crime de furto pelo qual foi condenado.

cc) Ou, caso assim não se entenda, o que apenas por mera hipótese se admite, deve ser aplicada ao arguido uma pena de multa ou, optando-se pela aplicação de uma pena prisão, deve esta ser suspensa na sua execução, pelo período de tempo que se entenda adequado, ou ordenado o seu cumprimento em regime de permanência na habitação, ao abrigo do disposto no artigo 43º do Código Penal.


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Igualmente o arguido (...) interpôs recurso da decisão final formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

1. O Arguido ora Recorrente (...), foi acusado, em consequência dos factos descritos na acusação pública, no âmbito dos presentes autos, da prática em coautoria material e na forma consumada de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 do Código Penal.

2. Tendo sido proferida sentença no passado dia 29 de Maio de 2019 em que o Tribunal a quo decidiu, Condenar o arguido (...), pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão.

3. O Arguido ora Recorrente (...), não se conforma, nem se poderia de modo algum conformar, no que tange á escolha e medida da pena aplicada.

4. O crime de furto é punível, em abstracto, com pena de prisão de 1 mês até 3 anos ou pena de multa de 10 dias até 360 dias (artigo 203º, nº 1 e artigos 41º e 47º, todos do Código Penal).

5. O Tribunal á quo na Escolha e medida concreta da Pena atendeu ao supra referido, e deu como assente, que depõe contra todos os arguidos o grau de ilicitude dos factos, que é mediano, a intensidade do dolo, que é directo, bem como o facto de terem persistido na conduta durante cerca de meio ano.

6. Mais importa ponderar o facto de os arguidos se encontrarem familiarmente inseridos”.

7. E na sequencia deste entendimento o Tribunal a quo, entre vários arguidos, todos condenados pelo mesmo tipo de crime (furto de energia eléctrica em barracas), todos condenados pelo crime de furto simples, em que para a condenação o Tribunal a quo atendeu apenas pela convicção do tribunal, orientada pela livre apreciação da prova, em que apenas foi produzida prova indirecta, tendo para o efeito o Tribunal a quo, dado como provado todos os factos apenas pela forma indiciária.

8. E mesmo assim, faltando uma prova sustentável em factos directos, o Tribunal a quo não teve em consideração tal circunstância, aquando da escolha e determinação da medida da pena, e aplicou ao arguido (...), uma pena de prisão efectiva.

9. Para tal teve o Tribunal a quo apenas e só em consideração relativamente ao Recorrente (...) os seguintes factos: “1 - O arguido (...) trabalha ocasionalmente na agricultura, sobrevivendo com a ajuda da mãe, com quem vive. 2 - O processo de socialização do arguido (...) decorreu no seio de uma família disfuncional, social e economicamente desfavorecida. 3- O percurso de vida do arguido (...) ficou marcado pelo consumo abusivo de drogas, e mais tarde pelo consumo de bebidas alcoólicas, com implicações negativas aos vários níveis, nomeadamente pessoal, social e profissional. 4- Relativamente a factos semelhantes aos constantes nos autos, em abstracto considerados, o arguido (...) reconhece sua ilicitude, mas relativiza a sua gravidade, não demonstrando uma percepção clara do impacto dos mesmos em hipotéticos lesados ou na sociedade em geral. 5- O arguido (...) tem de habilitações literárias o 4º ano de escolaridade. 6- Do Certificado de Registo Criminal do arguido (...) constam averbadas as seguintes condenações: a) no Processo Comum Singular nº (…), do Tribunal de Nisa, por sentença datada de 30/04/1996, de um crime de burla e falsificação de documento, praticados em 05/08/1994, na pena única de 2 anos e 8 meses de prisão e 60 dias de multa, declarada extinta pelo cumprimento. b) no Processo Comum Colectivo nº (…), do Tribunal de Portalegre, por acórdão datado de 11/12/1995, de um crime de furto qualificado, praticado em 09/02/1995, na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão. c) No Processo Comum nº (…), do Tribunal de Abrantes, por sentença datada de 17/02/1997, de um crime de furto, praticado em 04/10/1995, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 2,5. d) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 22/01/2001, transitada em julgado em 06/02/2001, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 21/01/2001, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 2, declarada extinta pelo cumprimento. e) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 02/10/2006, transitada em julgado em 17/10/2006, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 18/10/2004, na pena de 170 dias de multa, à taxa diária de € 2,50 declarada extinta pelo cumprimento. f) No Processo Abreviado nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 29/05/2007, transitada em julgado em 13/06/2007, de um crime de condução sem habilitação legal e um crime de desobediência, praticados em 05/07/2006 e 04/07/2007 respectivamente, na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de € 3, declarada extinta pelo cumprimento. g) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 26/11/2013, transitada em julgado em 08/01/2014, de um crime de ameaça agravada, praticado em 20/11/2013, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento. h) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 06/12/2013, transitada em julgado em 20/01/2014, de um crime de furto simples, praticado em 14/07/2012, na pena de 240 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento.

10. Ou seja, o Tribunal a quo, a quando da escolha da pena a aplicar ao Recorrente, teve apenas em consideração e como factor determinante, o teor do registo criminal do mesma.

11. Ainda que se entenda ser um registo criminal com um significativo numero de crimes, também se entende que deveria relevar, o facto de a maior parte dos crimes serem de outra natureza, muitos deles de condução sem habilitação legal, sendo que o ultimo foi praticado á cinco anos, uns á mais de dez, mais de quinze e mais de vinte anos, sendo que todos estão extintos pelo seu cumprimento.

12. O Recorrente não se conforma com a pena de prisão efectiva que lhe foi aplicada, considerando que a pena de prisão efectiva é manifestamente excessiva tendo em conta o seu grau de culpa, que tal como refere a douta sentença “No presente caso, verifica-se que depõe contra o arguido o grau de ilicitude dos factos, que é mediano, a intensidade do dolo, que é directo, e o facto de o arguido ter extensos antecedentes criminais registados, alguns pela prática do mesmo tipo legal de crime. Há também que considerar que embora o arguido reconheça a ilicitude da conduta, relativiza a sua gravidade, não demonstrando uma percepção clara do impacto dos mesmos em hipotéticos lesados ou na sociedade em geral”.

Mais importa ponderar o facto de os arguidos se encontrarem familiarmente inseridos”.

13. O Tribunal a quo, não ponderou, o facto do arguido ter reconhecido a ilicitude da conduta, bem como não ponderou o facto de se encontrar familiarmente inserido, o facto de ser trabalhador agrícola, e viver com a sua mãe.

14. Pelo que no entendimento do Recorrente, o Tribunal a quo não aplicou ao caso em concreto o direito de forma exemplar, como de resto lhe era exigido, senão vejamos:

DA SUSPENSÃO DA PENA

15. O Arguido ora Recorrente, entende que para que lhe seja aplicada uma pena justa, adequada e proporcional, a qual não exceda o seu grau de culpa e participação nos factos ora em apreço, esta não poderá em caso algum passar por uma pena de prisão efectiva, a qual deverá ser suspensa na sua execução.

16. O Recorrente, rejeita, de facto, que a pena de prisão efectiva seja a única espécie de pena que realize, no caso concreto, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, uma vez que, não se encontram esgotadas todas as virtualidades pedagógicas e ressocializadoras que uma pena não detentiva poderá ainda ter sobre o Arguido/ora Recorrente, não obstante o caso em apreço e de já ter no seu registo criminal condenações anteriores.

17. O recorrente considera que o Tribunal a quo deveria ter partido de uma premissa que não partiu - da premissa de que as penas devem ter sempre um carácter ressocializador.

18. Pois deveria ter analisado o CRC do Arguido e atentado também ao facto, dos mesmos remontarem a crimes praticados, em Agosto de 1994, ou seja, há quase 25 anos, em Fevereiro de 1995, há 24 anos, em Outubro de 1995, há 23 anos, em Janeiro de 2001, há 18 anos, em Outubro de 2004, há 15 anos, em Julho de 2006, há 13 anos, em Julho de 2012, há 7 anos, e em Novembro de 2013, há 6 anos.

Por outro lado, todas as penas aplicadas ao Arguido Recorrente foi Julgada extintas pelo seu cumprimento.

19. Entende-se assim que a Douta Sentença recorrida deve ser revogada, devendo ser substituído por outra que condene o ora Recorrente numa pena de prisão suspensa na sua execução por período a determinar pelos Venerandos juízes, por esta, ainda, realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

20. Como é sabido a suspensão da execução da pena insere-se num conjunto de medidas não institucionais que, não determinando a perda da liberdade física, importam sempre uma intromissão mais ou menos profunda na condução da vida dos delinquentes, pelo que, embora funcionem como medidas de substituição, não podem ser vistas como formas de clemência legislativa, pois constituem autênticas medidas de tratamento bem definido, com uma variedade de regimes aptos a dar adequada resposta a problemas específicos.

21. No presente caso, a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão bastarão para realizar as finalidades da punição, sendo possível fazer um juízo de prognose social favorável ao Arguido, sendo credível que o Arguido sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime.

22. Pelo exposto, entende o Recorrente que os atos por si praticados foram graves, contudo, no seu caso ainda é possível fazer um juízo de prognose social favorável, devendo a pena única aplicada ao Arguido de seis meses de prisão, ser suspensa na sua execução por período a determinar pelos venerando Juízes, sendo-lhe impostas todas as regras de conduta e injunções que se julgarem adequadas às necessidades do caso em apreço.

23. Prescreve o artigo 50º do Código Penal, que:

“ O Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo á personalidade do agente, às condições da sua vida, á sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”

24. Constituindo um corolário da preferência manifestada pela lei, pelas penas não privativas da liberdade, conhecidos que são os efeitos criminógenos da prisão.

25. Por conseguinte, a suspensão da execução da pena de prisão, pressupõe que o julgador, reportando-se ao momento da decisão, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido.

“O Tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser positiva.” – Leal Henriques e Simas Santos. - “Código Penal Anotado”, 1º Volume, 1995, Editora Rei dos Livros, p. 444.

26. Julgamos assim que deverá permitir-se ao Arguido Recorrente uma derradeira oportunidade para actuar conforme ao direito.

Acresce que o Arguido encontra-se social e familiarmente inserido, tendo, vivendo com a sua mãe de quem toma conta.

Quando se fala de prevenção como princípio regulativo da actividade judicial de medida da pena, não pode ter-se em vista o conceito de prevenção em sentido amplo, como finalidade global de toda a política criminal, ou seja, como conjunto dos meios e estratégias preventivos de luta contra o crime.

O que está aqui em causa, é na verdade, a aplicação de uma concreta consequência jurídico-penal, num momento em que o crime já foi cometido e não pode por isso, e não pode por isso, falar-se com sentido de prevenção na acepção referida.

Assim, a prevenção geral positiva traduz-se na confiança que a sociedade precisa de manter na vigência da norma, é o mínimo exigível da pena, ora no presente caso do ora Recorrente, ainda, que as necessidades de prevenção geral positiva, sejam elevadas, tendo em conta que o grau de ilicitude dos factos, não se poderá olvidar que o Arguido dispõe de apoio e inserção social e familiar.

27. Pelo que, julgamos que deverá permitir-se ao Arguido uma derradeira oportunidade, a qual o Arguido certamente não desperdiçará.

28. Assim deverá permitir-se ao Arguido (...), uma derradeira oportunidade para mudar de vida e actuar conforme ao direito, aplicando-se a pena de prisão de 6 (seis) meses, suspensa na sua execução, por periodo a determinar pelos venerandos juízes.

29. Caso assim não se entenda, sempre deve a referida pena de prisão ser cumprida em regime de prisão domiciliária.

30. Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer seja o presente recurso julgado procedente nos, exactos termos, supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.

Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer que seja o presente recurso julgado procedente nos, exactos termos, supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.


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A Digna magistrada do Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso interposto, defendendo a improcedência do mesmo, com as seguintes conclusões:

1.ª Vêm os arguidos recorrer da douta sentença de fls…, que os condenou, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, n.º 1 do Código Penal, nas seguintes penas:

- (...), na pena de 6 meses de prisão;

- (...), na pena única de 7 meses de prisão.

2.ª Colocam à apreciação desse Venerando Tribunal as seguintes questões:

- A eventual existência do vício de erro notório na apreciação da prova;

- A violação do princípio do In Dubio Pro Reo

- Medida da Pena

A) Da existência do vício de erro notório na apreciação da prova

3.ª Constitui entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça, há muito estabelecido, que não há erro na apreciação da prova quando o que o recorrente invoca não é mais do que uma discordância sua quanto ao enquadramento da matéria de facto provada.

4.ª Os Recorrentes constroem a sua tese em torno da valoração dada à prova indirecta pelo tribunal, sendo que, na sua óptica, os indícios revelados pelo tribunal na sua fundamentação não permitem concluir pela prática dos factos pelos arguidos.

E para tanto os arguidos focam-se nos seguintes pontos:

- A prova testemunhal não resulta quem vivia nas barracas associadas aos arguidos

- Se existia energia eléctrica no interior das barracas dos arguidos

- A consumação do ilícito, referindo que não existiu furto de energia, sendo certo que os arguidos apenas beneficiaram dela, negando terem realizado as ligações.

5.ª O tribunal valorou o relatório de diligência da GNR, produzido com informação do dia 25/07/2016, quando a EDP em conjunto com a GNR procedeu ao corte das ligações ilegais e fez a recolha dos cabos que íam dos postes até ao interior das habitações e ainda à informação inicial com fotos de fls. 2 e ss. dos autos.

6.ª Do referido relatório resulta a identificação de cada barraca, assinalada em folha da foto aérea e em seguida a informação apurada no local para cada habitação, a saber: possuidor actual (presente no local ou não, sendo neste último caso recorrido o tribunal ao conhecimento das testemunhas (…) para apurar, naquela data, os possuidores das barracas), se tinha ligação directa ao poste, e nesse caso, de que poste provinha o fio até ao interior da barraca. A pormenorização de tal relatório, aliada ao depoimento isento das testemunhas (…), que identificaram inequivocamente quais as barracas onde viviam os arguidos, identificando presencialmente na audiência os arguidos, aliás, já sobejamente conhecidos dos OPC’s locais, pelo que não tiveram qualquer dúvida em associar os arguidos às barracas onde os mesmos residiam, permitem inferir que, quais os arguidos que habitavam, naquela data, as respectivas barracas.

7.ª A inverosimilhança das declarações do arguido (…) (quando refere que não sabia de onde provinha a electricidade) aliada à demais prova, conjugada com as regras da experiência comum e da normalidade, permitem concluir pela forte probabilidade de ter sido o arguido a efectuar ou mandar efectuar a referida ligação ilícita à rede pública de energia eléctrica de que beneficiava.

8.ª Apesar de não existir prova directa da autoria dos factos, tal não obsta à sua imputação aos arguidos, pois que da conjugação dos elementos de prova constantes dos autos e que resultaram do julgamento resulta que os arguidos residiam nas barracas identificadas nos autos, que as mesmas tinham energia eléctrica da qual os arguidos beneficiaram diariamente, pelo que, atentas as regras da normalidade, são estes os únicos interessados e beneficiados com as ligações directas efectuadas.

9.ª “De acordo com as regras da experiência comum, se existe uma ligação do tipo “direta” da rede pública para uma casa, onde não existe contador de energia, quem tem interesse em consumir a eletricidade sem a pagar, é o proprietário da casa” (vide Ac. TRC de 10/07/2018), que no caso são os arguidos Recorrentes os possuidores das habitações, o que permite inferir, atentas as regras da experiência que a ligação foi autoria destes.

10.ª Quanto ao argumento do simples benefício pelos arguidos da energia, entendemos que a electricidade, assim como o gás natural não têm a mesma existência física, não sendo possível agarrar tais “coisas”, pelo que a sua subtracção, na óptica da deslocação de esfera quanto à (quebra da) posse, se concretiza com o seu consumo efectivo e/ou a possibilidade de fruir de tal bem. Não estamos perante coisa com existência fisicamente delimitada, como um livro ou uma caneta, cujos limites físicos são apreensíveis à visão e ao tacto; trata-se de coisa que se desloca por impulso e cuja existência material não tem limites físicos concretos e definidos que permitam a sua subtracção de uma só vez e com um só acto, mas antes em actos sucessivos, sempre que a energia passa pelo fio até alimentar um aparelho doméstico ou uma lâmpada.

11.ª A ligação em si (a colocação do fio do poste até ao interior da habitação) é apenas a materialização do meio que permite a passagem da energia, subtraída de forma continuada sempre que o arguido liga um interruptor. De facto, os arguidos, realizada a ligação directa, passam a fruir livremente da energia, sem que para isso seja necessário a intervenção de terceiros, pelo que a disponibilidade da coisa está na sua esfera de acção exclusiva.

12.ª Ora, se subtrai energia aquele que materializa este acto de colocação do fio, na mesma medida subtrai energia aquele que dela beneficia, pois que a colocação de tal fio, feita por si (ou não), só a si beneficia, pelo que considerar que aquele que beneficia da energia de forma ilegal na sua habitação (não podendo ignorar tal realidade) mas, por variadas razões (insegurança, idade avançada, inabilidade natural, comodismo), não subiu ao poste para colocar o fio não fez parte da execução do furto seria abrir um espaço muito amplo de impunidade.

13.ª Do mesmo modo consideramos que é autor do crime aquele aceita, por sugestão de terceiro, que se faça uma ligação à sua casa, mesmo que não esteja presente no momento da sua concretização material (colocação do fio no poste até à habitação) e também aquele que concorda e aceita a ligação já realizada, por saber ser ilícita e aderir ao plano (de subtracção de energia), consumindo-a diariamente, e desta forma subtraindo-a também continuadamente, o que constitui um acto de execução acompanhado da intenção de apropriação.

14.ª O que está em causa no recurso é o facto de os arguidos não aceitarem a versão dos factos apresentada pelo Tribunal em detrimento da sua, o que não suporta a conclusão de que existe erro notório na apreciação da prova.

B) Violação do Princípio do In Dubio Pro Reo

15.ª A Sentença recorrida não revela, em momento algum, que o Tribunal tenha sentido alguma uma hesitação ou indecisão em relação a qualquer facto. Bem pelo contrário, afirma convictamente a matéria dada como provada.

16.ª Não se verifica qualquer vício, uma vez que na douta sentença se faz um exame crítico e exaustivo da prova que serviu para formar a convicção da Mm.ª Juiz a quo, apreciando-a e ponderando-a correctamente, não tendo qualquer cabimento a aplicação do princípio do in dúbio pro reo.

C) Medida da Pena

17.ª Entendeu o tribunal, relativamente aos Recorrentes, que as exigências de prevenção especial são muito elevadas, na medida em que os arguidos já sofreram diversas condenações pela prática de crimes diversos, inclusive pela prática de crimes contra o património, sendo que as várias penas que lhes foram sendo aplicadas, inclusive pena de prisão efectiva, não se mostraram suficientes para os demover da prática de novos ilícitos. Assim sendo, resulta claro que os arguidos têm sérias dificuldades em orientar o seu comportamento de acordo com o Direito, não obstante as várias oportunidades que lhes foram conferidas.

18.ª Cotejando a factualidade dada como provada, nomeadamente o teor do respectivo certificado do registo criminal, considerou-se que, in casu, não é possível substituir as penas de prisão aplicadas por qualquer outra medida, uma vez que ambos os arguidos foram já aplicadas outras penas de substituição – prisão suspensa, prisão por dias livres e até penas de prisão efectivas, donde se extrai que os arguidos revelaram insensibilidade pelas advertências que lhes haviam sido feitas nas condenações anteriores.

19.ª É, pois, evidente, no caso concreto, que o comportamento dos arguidos avesso às regras da convivência social, é uma constante, não tendo os factos aqui julgados sido um episódio isolado, traduzindo-se, antes, numa postura reiterada de oposição e desrespeito pelo Direito, ignorando a ameaça de prisão que lhes foi dirigida noutras penas, imbuídos de sentimento de impunidade.

20.ª Se fosse expectável a reintegração dos arguidos sem contacto com o meio prisional, ta já teria ocorrido no âmbito das condenações anteriores, em que viram suspensas a execução das penas de prisão que lhes foram aplicadas, sendo certo que, perante a concessão de tal benefício, os arguidos optaram por ignorar a advertência que para si decorreria das penas aplicadas e voltaram a delinquir.

21.ª Posto isto, diga-se que a decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada no que toca à não aplicação da suspensão da execução da pena de prisão e das restantes penas de substituição, incluindo a obrigação de permanência na habitação, mostrando-se proporcionada e adequada às exigências de prevenção sentidas em concreto, encontrando-se sustentada ainda nas demais circunstâncias mencionadas na sentença.

Pelo exposto, entendemos não haver, pois, qualquer fundamento para revogar a douta sentença proferida, devendo ser julgados totalmente improcedentes os recursos ora interpostos pelos recorrentes.

Termos em que, decidindo pela manutenção da douta sentença recorrida, nos seus exactos termos e fundamentos


*

A ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A. deduziu, a fls. 569, pedido de indemnização cível contra os arguidos, reclamando, a título de indemnização, a condenação dos arguidos no pagamento da quantia de € 978,31, por cada ponto de consumo, com excepção de um ponto de consumo, em que imputa o valor de € 1.894,07, o que perfaz o valor global de € 8.252,24 quantias acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo pagamento, por danos patrimoniais.

A ofendida reduziu posteriormente o pedido de indemnização cível para o ponto de consumo em que imputava o valor de € 1.894,07 para o valor de € 978,31.

Foi efectuada alteração não substancial dos factos constantes da acusação, o que foi devidamente comunicado aos arguidos (...), (…) e (…), nos termos do disposto no artigo 358º do Código de Processo Penal, nada tendo sido requerido.

O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu douto parecer defendendo a improcedênciua dos recursos.

Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 417º n.º 2 do Código de Processo Penal.


***

B - Fundamentação:

B.1.1 - O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:

1. O arguido (...) reside numa casa situada no Bairro (…).
2. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido (...) decidiu apoderar-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
3. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligou um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziu o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
4. Desta forma, o arguido (...) logrou efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A.
5. Com a conduta supra descrita, o arguido (...) apoderou-se e fez sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiu no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
6. O arguido (...) agiu com o propósito concretizado de se apropriar e fazer sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhe pertencia e que o fazia sem autorização do respectivo dono.
7. O arguido (...) reside numa casa situada no Bairro (…).
8. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido (...) decidiu apoderar-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
9. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligou um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziu o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
10. Desta forma, o arguido (...) logrou efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A.
11. Com a conduta supra descrita, o arguido (...) apoderou-se e fez sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiu no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
12. O arguido (...) agiu com o propósito concretizado de se apropriar e fazer sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhe pertencia e que o fazia sem autorização do respectivo dono.
13. O arguido (...) reside numa casa situada no Bairro (…).
14. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido (...) decidiu apoderar-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
15. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligou um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziu o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
16. Desta forma, o arguido (...) logrou efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A.
17. Com a conduta supra descrita, o arguido (...) apoderou-se e fez sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiu no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
18. O arguido (...) agiu com o propósito concretizado de se apropriar e fazer sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhe pertencia e que o fazia sem autorização do respectivo dono.
19. O arguido (...) reside numa casa situada no Bairro (…), embora não o faça em permanência.
20. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido (...) decidiu apoderar-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
21. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, o arguido, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligou um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziu o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
22. Desta forma, o arguido (...) logrou efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A.
23. Com a conduta supra descrita, o arguido (...) apoderou-se e fez sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiu no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
24. O arguido (...) agiu com o propósito concretizado de se apropriar e fazer sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhe pertencia e que o fazia sem autorização do respectivo dono.
25. No período compreendido entre o mês de Agosto de 2015 e Julho de 2016 a arguida (...) residiu numa casa situada no Bairro (…).
26. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, a arguida (...) decidiu apoderar-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
27. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, a arguida, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligou um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziu o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
28. Desta forma, a arguida (...) logrou efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A.
29. Com a conduta supra descrita, a arguida (...) apoderou-se e fez sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiu no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
30. A arguida (...) agiu com o propósito concretizado de se apropriar e fazer sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhe pertencia e que o fazia sem autorização do respectivo dono.
31. Os arguidos (...) e (…) residem numa casa situada no Bairro (…).
32. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, os arguidos (...) e (...) decidiram apoderarem-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
33. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, os arguidos (...) e (...), actuando em conjugação de esforços e mediante um plano previamente gizado entre si, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligaram um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziram o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
34. Desta forma, os arguidos (...) e (...) lograram efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A..
35. Com a conduta supra descrita, os arguidos (...) e (...) apoderaram-se e fizeram sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiram no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
36. Os arguidos (...) e (...) agiram em comunhão de esforços e na execução de um plano previamente acordado por ambos, com o propósito concretizado de se apropriarem e fazerem sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhes pertencia e que o faziam sem autorização do respectivo dono.
37. Os arguidos (...) e (…) residiram numa casa situada no Bairro (…), até data não concretamente apurada, mas seguramente até ao dia 12/12/2015.
38. Os arguidos (...) e (…) em 25/07/2016 continuavam a ter na sua posse a casa situada no Bairro (…).
39. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, os arguidos (...) e (...) decidiram apoderarem-se de energia eléctrica da rede pública que pertencia à EDP Distribuição-Energia, S.A.
40. Assim, em data não concretamente apurada, mas seguramente antes do dia 12/12/2015, os arguidos (...) e (...), actuando em conjugação de esforços e mediante um plano previamente gizado entre si, por si, ou através de terceiros, a seu pedido e sob sua orientação, ligaram um cabo eléctrico ao cabo eléctrico de um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. e depois conduziram o referido cabo eléctrico para a sua habitação.
41. Desta forma, os arguidos (...), (...) lograram efectuar uma ligação directa da rede pública de electricidade à sua residência, permitindo que esta fosse abastecida, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A..
42. Com a conduta supra descrita, os arguidos (...), (...) apoderaram-se e fizeram sua uma quantidade indeterminada de energia eléctrica que consumiram no período compreendido entre os dias 12/12/2015 e 25/07/2016.
43. Os arguidos (...), (...) agiram em comunhão de esforços e na execução de um plano previamente acordado por todos, com o propósito concretizado de se apropriarem e fazerem sua a energia eléctrica da rede pública, contra a vontade e sem o consentimento da ofendida EDP Distribuição-Energia, S.A., usufruindo dela, com perfeito conhecimento que não lhes pertencia e que o faziam sem autorização do respectivo dono.
44. No dia 25/07/2016, na sequência de uma acção levada a cabo por militares da GNR e técnicos da EDP Distribuição-Energia, S.A., foram retirados cerca de 300 metros de cabos que faziam a ligação dos postes da EDP às residências dos arguidos, abastecendo-as de electricidade de forma ilícita.
45. No dia 04/07/2016, pelas 15h40m, na Rua (…), os arguidos (...) e (…), dirigiram-se até um poste de baixa tensão do traçado aéreo da rede pública de distribuição de electricidade pertencente à EDP Distribuição-Energia, S.A. que ali existia, com o propósito de se apoderarem de energia eléctrica, fazendo uma ligação directa do cabo eléctrico daquele poste a um cabo eléctrico de uma barraca existente no Bairro (…).
46. Para o feito, um dos arguidos subiu ao poste da EDP e começou a fazer a ligação dos cabos enquanto o outro arguido ficou no solo a segurar um dos cabos e a tapar com terra o fio do cabo eléctrico que iria abastecer a aludida barraca, procurando dessa forma esconder a ligação ilícita à rede pública de abastecimento de energia eléctrica que estavam a fazer.
47. Sucede que, naquele momento surgiu no local uma patrulha da GNR de Coruche, composta pelos militares (…),, que abordaram os arguidos (...) e (…) e os impediram de continuar a fazer a ligação.
48. Os arguidos (...) e (…) agiram em comunhão de esforços e na execução de um plano previamente acordado por ambos, com o propósito de se apropriarem e fazerem sua a energia eléctrica da rede pública, bem sabendo que a mesma não lhes pertencia e que agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono, o que só não lograram conseguir por motivos alheios às suas vontades.
49. Todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
50. A EDP Distribuição Energia é titular da concessão para a exploração da Rede Nacional de Distribuição da Energia Eléctrica em Média Tensão e Alta Tensão e das concessões municipais de distribuição de energia eléctrica em Baixa Tensão.
51. A EDP Distribuição de Energia coordena a ligação à Rede Eléctrica e as instalações eléctricas que servem essa rede são sua propriedade.
52. A cada habitação é imputado o consumo de 4.490 kWh, que corresponde a € 746,84.
53. O arguido (...) é trabalhador agrícola, auferindo € 150 por semana, quando trabalha.
54. O arguido (...) vive numa barraca, com a companheira, que não trabalha, e com os filhos de 19, 17, 15 e 6 anos de idade, todos estudantes.
55. O arguido (...) não sabe ler nem escrever.
56. Do Certificado de Registo Criminal do arguido (...) constam averbadas as seguintes condenações:
a) No Processo Sumário nº (…), do Tribunal de Évora, por sentença datada de 24/07/2002, transitada em julgado em 30/09/2002, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 23/07/2002, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 3, declarada extinta pelo cumprimento.
b) No Processo Sumário nº (…), do Tribunal de Évora, por sentença datada de 22/04/2002, transitada em julgado em 08/05/2002, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 21/04/2002, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de € 2, declarada extinta pelo cumprimento.
c) No Processo Sumário nº (…), do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 03/10/2011, transitada em julgado em 02/11/2011, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 30/09/2011, na pena de 120 dias, de multa, à taxa diária de € 6, declarada extinta pelo cumprimento.
d) No Processo Sumário nº (…), do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 09/02/2017, transitada em julgado em 13/03/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 08/02/2017, na pena de 80 dias, de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento.
57. O arguido (...) está desempregado e aufere a título de Rendimento Social de Inserção a quantia de € 200 por mês.
58. O arguido (...) vive numa barraca, com a companheira, que não trabalha, e os filhos com 6 e 8 anos e 5 meses de idade.
59. O arguido (...) tem de habilitações literárias o 6º ano de escolaridade.
60. O arguido (...) admitiu os factos.
61. Do Certificado de Registo Criminal do arguido (...) constam averbadas as seguintes condenações:
a) No Processo Sumário nº (…), do Juízo de Competência Genérica de Coruche, por sentença datada de 16/11/2016, transitada em julgado em 04/01/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 01/11/2016, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de € 5.
b) No Processo Comum (tribunal singular) nº (…), do Juízo de Competência Genérica de Coruche, por sentença datada de 18/05/2017, transitada em julgado em 22/06/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 07/10/2016, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 5.
c) No Processo Abreviado nº (…), do Juízo de Competência Genérica de Coruche, por sentença datada de 02/10/2017, transitada em julgado em 02/11/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 28/01/2017, na pena de 180 dias, de multa, à taxa diária de € 5.
d) No Processo Abreviado nº (…), Do Juízo de Competência Genérica de Coruche, por sentença datada de 07/11/2017, transitada em julgado em 07/12/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 25/04/2017, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 5.
62. O arguido (...) é trabalhador rural, auferindo € 30 por dia quando trabalha, e beneficia do Rendimento Social de Inserção, no valor de € 540 por mês.
63. O arguido (...) vive em casa emprestada, com a companheira, que não trabalha, e 3 filhos com 7, 5 e 1 ano de idade.
64. O arguido (...) tem de habilitações literárias o 5º ano de escolaridade.
65. O arguido (...) admitiu os factos.
66. O arguido (...) tem um antecedente criminal registado, no Processo Comum Colectivo nº (…), do Tribunal de Évora, por acórdão datado de 03/10/2016, transitado em julgado em 02/11/2016, pela prática de um crime de roubo, praticado em 14/05/2015, na pena de 2 ano e 6 meses de prisão, suspensa por igual período.
67. O arguido (...) trabalha ocasionalmente na agricultura, sobrevivendo com a ajuda da mãe, com quem vive.
68. O processo de socialização do arguido (...) decorreu no seio de uma família disfuncional, social e economicamente desfavorecida.
69. O percurso de vida do arguido (...) ficou marcado pelo consumo abusivo de drogas, e mais tarde pelo consumo de bebidas alcoólicas, com implicações negativas aos vários níveis, nomeadamente pessoal, social e profissional.
70. Relativamente a factos semelhantes aos constantes nos autos, em abstracto considerados, o arguido (...) reconhece sua ilicitude, mas relativiza a sua gravidade, não demonstrando uma percepção clara do impacto dos mesmos em hipotéticos lesados ou na sociedade em geral.
71. O arguido (...) tem de habilitações literárias o 4º ano de escolaridade.
72. Do Certificado de Registo Criminal do arguido (...) constam averbadas as seguintes condenações:
a) No Processo Comum Singular nº (…), do Tribunal de Nisa, por sentença datada de 30/04/1996, de um crime de burla e falsificação de documento, praticados em 05/08/1994, na pena única de 2 anos e 8 meses de prisão e 60 dias de multa, declarada extinta pelo cumprimento.
b) No Processo Comum Colectivo nº (…), do Tribunal de Portalegre, por acórdão datado de 11/12/1995, de um crime de furto qualificado, praticado em 09/02/1995, na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão.
c) No Processo Comum nº (…), do Tribunal de Abrantes, por sentença datada de 17/02/1997, de um crime de furto, praticado em 04/10/1995, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 2,5.
d) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 22/01/2001, transitada em julgado em 06/02/2001, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 21/01/2001, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 2, declarada extinta pelo cumprimento.
e) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 02/10/2006, transitada em julgado em 17/10/2006, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 18/10/2004, na pena de 170 dias de multa, à taxa diária de € 2,50 declarada extinta pelo cumprimento.
f) No Processo Abreviado nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 29/05/2007, transitada em julgado em 13/06/2007, de um crime de condução sem habilitação legal e um crime de desobediência, praticados em 05/07/2006 e 04/07/2007 respectivamente, na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de € 3, declarada extinta pelo cumprimento.
g) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 26/11/2013, transitada em julgado em 08/01/2014, de um crime de ameaça agravada, praticado em 20/11/2013, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento.
h) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 06/12/2013, transitada em julgado em 20/01/2014, de um crime de furto simples, praticado em 14/07/2012, na pena de 240 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento.
73. A arguida (...) é doméstica e beneficia do Rendimento Social de Inserção, no valor de € 522 por mês.
74. A arguida (...) vive em casa social, despendendo a título de renda de casa a quantia de € 13,70.
75. A arguida (...) vive com o companheiro, desempregado, e quatro filhos com 16, 11, 9 e 3 anos de idade.
76. A arguida (...) tem de habilitações literárias o 6º ano de escolaridade.
77. A arguida (...) admitiu os factos.
78. A arguida (...) não tem antecedentes criminais registados.
79. O arguido (...) está desempregado, auferindo a título de Rendimento Social de Inserção a quantia de € 400 por mês.
80. O arguido (...) vive em casa do pai, com a companheira, que não trabalha, e uma filha com 16 anos de idade.
81. A socialização do arguido (...) processou-se num contexto familiar numeroso, num total de 8 irmãos, socioeconómico desfavorecido e culturalmente marcado pelos valores subjacentes à comunidade cigana.
82. O arguido (...) nunca frequentou a escola, não possuindo qualquer conhecimento de alfabetização.
83. O arguido (...) revela fraca capacidade em analisar criticamente factos semelhantes aos que deram origem ao presente processo.
84. Do Certificado de Registo Criminal do arguido (...) constam averbadas as seguintes condenações:
a) No Processo Comum Colectivo nº (…), do Tribunal de Lisboa, por acórdão datado de 05/01/2000, transitado em 20/01/2000, de um crime de tráfico de estupefaciente, praticado em 04/01/1993, na pena de 7 anos e 6 meses de prisão, declarada extinta pelo cumprimento.
b) No Processo Comum Colectivo nº (…), do Tribunal de Lisboa, por acórdão datado de 15/04/2005, transitado em 02/05/2005, de um crime de tráfico de estupefacientes e um crime de condução sem habilitação legal, praticados em 30/08/2002, na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão, declarada extinta pelo cumprimento.
c) No Processo Sumário nº (…), do Tribunal de Vila Franca de Xira, por sentença datada de 14/01/2008, transitada em 04/02/2008, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 15/12/2007, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta pelo cumprimento.
d) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Lisboa Norte, por sentença datada de 23/04/2008, transitada em julgado em 24/03/2014, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 25/03/2008, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de € 5, declarada extinta por prescrição.
e) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 18/04/2013, transitada em julgado em 09/05/2013, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 19/07/2011, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 horas de trabalho a favor da comunidade, declarada extinta pelo cumprimento.
f) No Processo Abreviado nº (…) do Tribunal de Cascais, por sentença datada de 09/05/2008, transitada em julgado em 29/05/2008, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 03/04/2007, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 4, declarada extinta pelo cumprimento.
g) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 08/05/2012, transitada em julgado em 08/06/2012, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 07/05/2012, na pena de 4 meses de prisão, substituída por 120 dias de trabalho a favor da comunidade.
h) No Processo Comum nº (…) do Tribunal de Almeirim, por sentença datada de 10/04/2014, transitada em julgado em 19/05/2014, de um crime de tráfico de estupefacientes, praticado em 04/09/2010, na pena de 3 anos de prisão, suspensa com regime de prova, declarada extinta pelo cumprimento.
i) No Processo Sumário nº (…) do Tribunal de Coruche, por sentença datada de 30/03/2016, transitada em julgado em 29/04/2016, de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 06/03/2016, na pena de 8 meses de prisão, suspensa por 1 ano com regime de prova, declarada extinta pelo cumprimento.
85. A arguida (...) é companheira do arguido (...).
86. A arguida (...) não sabe ler nem escrever.
87. A arguida (...) tem um antecedente criminal registado, tendo sido condenada no Processo Comum Singular nº (…), do Tribunal de Almeirim, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, por sentença datada de 10/04/2014, transitada em julgado em 19/05/2014, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, substituída por 480 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos praticados em 05/09/2010, pena declarada extinta pelo cumprimento.
88. (…).

*

B.1.2 - E como não provados os seguintes factos:

a) A ofendida suportou encargos administrativos no valor de € 69,60 com a deslocação e tratamento da anomalia em cada uma das habitações.

b) A ofendida suportou encargos de potência no montante de € 161,87 em cada uma das habitações.


*

B.1.3 - E apresentou como motivação da decisão de facto os seguintes considerandos:

«Para a formação da sua convicção, o tribunal atendeu à conjugação de toda a prova produzida orientada pelo princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do Código de Processo Penal, que estabelece que “Salvo quando a lei dispuser de modo diferente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”, fazendo ainda apelo às regras da lógica e da experiência comum.

Para a formação da sua convicção quanto à matéria de facto dada como provada, o Tribunal atendeu, desde logo, às declarações dos arguidos (...), (...) e (...) que, embora sem efectuarem uma confissão integral e sem reservas, admitiram parcialmente os factos de que se encontram acusados. O arguido (...), embora tenha referido não residir no local há data, admitiu que há cerca de 7 anos efectuou uma ligação para a sua barraca, desde um aparelho que lá se encontrava, e que a testemunha (…), electricista, identificou como sendo um disjuntor não diferencial, e do qual seguiam fios para as barracas ali existentes no bairro. Este arguido também admitiu que nunca teve qualquer contrato com a EDP ou outra operadora. O arguido (...) também admitiu que sabe que tem electricidade na sua barraca de forma ilícita, pois sabia como a luz vinha do poste, e que, embora beneficiasse de luz, não tinha qualquer contrato com a EDP ou outra operadora. Embora este arguido se tenha encontrado privado da liberdade entre 18/03/2016 a 26/09/2016 (cfr. fls. 686), tal período ocorreu após 12/12/2015. Também a arguida (...) referiu que tinha luz na sua barraca, e que a mesma vinha por um fio puxado de outra barraca ao lado, bem sabendo que a outra barraca tinha luz vindo directamente do poste, e que não tinha qualquer contrato de electricidade.

No que diz respeito aos factos relativos aos arguidos (...), (...), (...) e mulher (...), (…) e mulher (…), o Tribunal atendeu ao depoimento das testemunhas (…), militares da GNR, que efectuaram um depoimento espontâneo e coerente, conjugados com as declarações prestadas por alguns dos arguidos, que demonstram que os mesmos eram os possuidores das barracas que beneficiavam de ligações ilícitas.

No entanto, apesar do depoimento das testemunhas (…) terem sido essenciais, no apuramento da autoria dos factos por estes arguidos, sempre tal conclusão seria alcançável através de presunções atenta a conjugação da demais prova produzida. De facto, inexiste prova directa do facto axial em causa, qual seja: a subtracção de electricidade da EDP por estes arguidos nas apontadas circunstâncias, pelo que teremos de recorrer à designada prova indiciária, tendo em vista podermos extrair a conclusão de que nas circunstâncias temporais em causa os arguidos foram, de facto, os autores da subtracção de electricidade da EDP nos termos supra apurados. Assim, não sendo possível recorrer à prova directa, resta, pois, que atender à prova indiciária, a qual assenta em dois elementos: o indício, facto instrumental provado, e a presunção, uma inferência efectuada a partir do indício, permitindo suportar um facto distinto, com apoio na experiência ou em regras da ciência. Nada veda a que a convicção positiva do tribunal sobre a verificação de factos com relevância criminal se estribe, para além da (conjugação da) prova testemunhal, pericial e documental produzida a respeito nos termos supra indicados, em processos lógico-indutivos, baseados, por sua vez, em métodos intelectuais assentes nas presunções decorrentes das regras da experiência comum e da normalidade da vida, justificando, assim, um prévio enquadramento desta temática, que assume ainda uma maior preponderância neste tipo de casos.

De facto, apesar de nenhuma testemunha ter visto os arguidos, ou terceiros a seu pedido, a efectuarem as ligações ilícitas, ou aproveitando-se da puxada existente, a utilizarem electrodomésticos no interior das barracas, existem fortíssimos e reveladores actos instrumentais e acessórios, que resultaram do julgamento, que permitem concluir que as ligações ilícitas que entravam em cada umas das barracas, e que eram do conhecimento dos respectivos possuidores das mesmas, não obstante as considerações já supra efectuadas relativamente ao depoimento das testemunhas (…). Importa aqui considerar que do teor das fotografias de fls. 5 a 14, 69, 71 e 72, 74, 77, 78 e 80 são bem visíveis os fios das puxadas vindas dos postes e a entrarem no interior das habitações. Por outro lado, as testemunhas (…) referiram que eram bem visíveis ligações rudimentares vindas de vários postes até todas as barracas existentes no bairro. Também a testemunha (…), electricista, e que efectuou um depoimento espontâneo e que mereceu credibilidade, referiu que no bairro todas as barracas tinham cabos a entrar para o seu interior, cabos esses que tinham energia eléctrica, conhecimento que decorre do facto de ter utilizado uma pinça amplimérica que lhe permite verificar se existe corrente nos fios, o que fez no local onde os fios entravam no interior das barracas e nas ligações dos postes, tendo concluído que havia corrente a passar em todos eles.

Da conjugação da prova supra enunciada o Tribunal formou, assim, convicção de que foram os arguidos, ou terceiros a seu pedido ou com o seu conhecimento, que procederam às ligações em causa, e que eram tão rudimentares e visíveis que não podiam ignorar as mesmas, não sendo necessário ser técnico especialista na matéria para perceber, de acordo com o que qualquer homem médio, perceberia, que estamos perante ligações ilegais, por serem tiradas directamente dos postes de electricidade, sem que o consumo de energia seja contabilizado por um vulgarmente denominado de contador.

Portanto, da conjugação destes depoimentos, sempre se teria de considerar que se devia razoável e seguramente presumir a autoria dos factos por parte dos arguidos, sendo que alguns admitiram em julgamento serem os proprietários ou possuidores das barracas em causa. De facto, o arguido (...) referiu ser o possuidor da barraca que ocupava, ainda que não lhe desse um uso diário (situação corroborada pelo depoimento da testemunha (…)), e que antes era pertença de (…), o que foi corroborado pelo depoimento deste. Embora o arguido tenha referido que o fio que entrava na sua barraca não estava ligado a nada, a verdade é que do depoimento da testemunha (…) resulta que todos os fios que entravam nas barracas tinham tensão, pelo que também a sua barraca podia usufruir das utilidades da electricidade, que entrava na sua barraca através de um fio ligado directamente ao poste, ainda que o mesmo ali resida esporadicamente.

Também o arguido (…) não negou residir no local, juntamente com a sua companheira, a arguida (...), e embora tenha negado beneficiar de uma puxada, por ter gerador, acabou por referir nas suas declarações que o gerador era eléctrico e que estava ligado a esse fio que estava dentro da sua barraca, embora não soubesse de onde vinha o fio. Ora, tal explicação é perfeitamente contraditória entre si e não podia o arguido ignorar que não tinha qualquer contrato de electricidade com a EDP ou outra operadora que lhe permitisse beneficiar de electricidade de forma lícita, ainda que para o dito gerador, que o arguido referiu ser eléctrico. Quer das suas declarações, às quais não se pode atribuir credibilidade por não serem suportadas por qualquer base de lógica, quer dos demais elementos de prova já supra referidos, se conclui que também estes arguidos sabiam beneficiar de energia eléctrica de forma ilícita.

Todos estes arguidos também foram identificados pelos militares da GNR (…) como moradores do bairro, devido ao exercício das suas funções, tendo os mesmo identificado as barracas de cada um dos arguidos, não podendo estes ignorar que nas suas barracas entravam ligações ilícitas, que lhes permitiam beneficiar de electricidade para o uso doméstico, quando o entendessem, sem procederem ao pagamento desse benefício à proprietária da rede eléctrica EDP Distribuição Energia, sendo decorrente das regras da lógica e da experiência comum que tendo acesso a tal benefício tenham procedido a consumo de energia eléctrica, o que também foi corroborado pelo depoimento da testemunha (…), quando referiu que do patrulhamento de rotina que faziam ao Bairro durante a noite era notória a existência de luzes acesas e televisões ligadas no interior das barracas do bairro.

O mesmo se diga em relação aos arguidos (…), pois embora não se encontrassem a residir no local em Julho de 2016, conforme foi referido pelos militares da GNR (…), uma vez que a barraca se encontrava em obras, eram estes os possuidores da barraca, como o próprio arguido (…) admitiu, quando referiu que a barraca nº 10 era sua, e que viu lá o GNR a segurar no cabo que estava atrás da sua barraca quando foi lá dar de comer aos animais. O militar da GNR (…) referiu ainda que este arguido se encontrava a residir naquela residência quando tirou a fotografia nº 8, de fls. 10, em 12/12/2015. Daqui se retira que os arguidos residiam naquela barraca em 12/12/2015 e em 25/07/2016 continuavam a ter a posse da mesma, sendo estes os únicos beneficiários da puxada lá existente, podendo fazer uso das utilidades da coisa (electricidade), quer directamente por si, quer através da pessoa que lá pernoitava, e que se encontrava a fazer as obras (o arguido …).

Quanto ao crime de furto na forma tentada, imputado aos arguidos (…), o tribunal considerou o depoimento das testemunhas (…), militares da GNR, que efectuaram um depoimento espontâneo e coerente entre si, que referiram ter visto dois indivíduos quando passavam na rua, junto a um poste, estando um deles em cima do poste e outro a segurar fio que vinha do poste. Da conjugação destes depoimentos o Tribunal formou convicção de que estes arguidos pretendiam efectuar uma ligação ilegal para uma das barracas, o que apenas não lograram porque foram interrompidos pelos militares da GNR. Embora a testemunha (…) tenha referido que o arguido que se encontrava em cima do poste tenha sido o arguido (…), que era o que tinha mais idade, o Tribunal não logrou formar convicção de qual dos arguidos se encontrava em cima do poste, uma vez que a diferença de idade entre os dois, no documento de identificação é de apenas 4 anos, e no auto de fls. 171 a 174 os militares não identificam quem se encontrava em cima do poste, para além de a testemunha ter efectuado um depoimento por videoconferência, não tendo procedido à identificação pessoal do arguido (…), que se encontrava presente em audiência. Por esse motivo o Tribunal não logrou identificar qual a acção que cada um dos arguidos tinha na execução dos factos, mas os mesmos foram identificados no local pelos militares da GNR, pelo que não teve o tribunal dúvidas sobre a sua execução dos factos.

O tribunal, na formação da sua convicção, atendeu, ainda, ao depoimento da testemunha (…), trabalhadora da EDP Soluções Comerciais, que efectuou um depoimento espontâneo e coerente, que esclareceu que efectuou o cálculo da energia consumida pelos arguidos através definido no artigo 6º do D.L. nº 328/90, de 22/10 e nas Directivas anualmente publicadas pela ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos), que permitem à ofendida calcular consumo até três anos quando não existe um período definido em concreto para o consumo ilícito verificado, como acontece nos presentes autos.

Mais se atendeu o Tribunal à análise crítica dos demais documentos juntos aos autos.

Foram tidos em consideração os certificados de registo criminal dos arguidos juntos aos autos, as suas declarações para o apuramento da sua situação pessoal e económica e ao teor dos relatórios elaborados pela DGRS que se encontram juntos aos autos.

Quanto aos factos não provados nenhuma prova foi produzida em sede de audiência de discussão e julgamento que lograsse ao Tribunal formar convicção dos mesmos.

A ofendida não apresentou qualquer prova documental e testemunhal sobre a existência desses gastos, nem que gastos são esses, nem de os ter efectivamente suportado, e os documentos de fls. 579 a 586, desacompanhados de qualquer outra prova, não são suficientes para comprovar a existência desses gastos, e que os mesmos são aplicáveis a cada uma das habitações ou apenas pela deslocação efectuada ao bairro pelo técnico, pelo que o Tribunal deu tais gastos como não provados. Também se entende que, salvo melhor opinião, os custos com a potência não estão previstos na previsão legal do artigo 6º, nº 1 do D.L. 328/90, de 22/10, pelo que não poderão ser imputados aos arguidos.

O Tribunal não considerou o depoimento das testemunhas (…) por não terem demonstrado qualquer conhecimento sobre o objecto do processo nem sobre qualquer dado relevante para a descoberta da verdade material.»


***

Cumpre conhecer.

B.2.1 - O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no art. 410°, n.° 2, do Código de Processo Penal de acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95, in D.R., I-A de 28/12/95.

São questões suscitadas pelo recurso do arguido (…) as seguintes:

- a contradição insanável entre factos provados;

- a insuficiência de prova para sustentar a condenação, o erro notório na apreciação da prova e o princípio in dubio pro reo;

- a escolha, medida e forma de execução da pena;

Relativamente ao recurso do arguido (...) o mesmo centra-se na natureza e medida da pena e seu regime de execução.


*

B.2.2 – O primeiro ponto de inconformidade do arguido (...) centra-se na afirmação de que existe contradição entre os factos 31º e 80º, na medida em que – invoca o recorrente - se afirma no primeiro desses factos que os arguidos (…) e a arguida (...) vivem numa casa situada no Bairro (…), e o facto 80 por afirmar este que o arguido reside em casa do pai.

Em concreto afirma-se nos indicados factos:

31. Os arguidos (...) e (...) residem numa casa situada no Bairro (…).

80. O arguido (...) vive em casa do pai, com a companheira, que não trabalha, e uma filha com 16 anos de idade.

Como é evidente não existe o vício de conhecimento oficioso previsto na al. b) do nº 2 do artigo 410º do C.P.P. na medida em que para que se considere existe tal vício, a contradição insanável da fundamentação, aqui na vertente de contradição insanável entre factos provados, é exigível que essa contradição seja “evidente para qualquer indivíduo de médio discernimento” e deve resultar do texto da sentença conjugado com as regras da experiência comum, e apenas.

Ora, aqueles factos lidos na sua singeleza não encerram qualquer contradição. Tanto assim é que o arguido se vê na necessidade de invocar que o seu pai não vive no Bairro (…), sim noutro local que não indica.

Ou seja, já não estamos em sede de vício de conhecimento oficioso, estamos sim em sede de impugnação impugnatória a sedear no artigo 412º do C.P.P. sem que o recorrente tenha cumprido o seu ónus de impugnação especificada, designadamente a demonstraçao cabal de que o pai do arguido moraria noutro local.

Por tudo deve improceder este motivo de inconformidade do recurso do arguido.


*

B.2.3 – O segundo motivo de inconformidade do recurso do arguido (...) espraia-se por três diversos fundamentos de recurso, tratados na mesma sede, a saber, a insuficiência de prova para sustentar a condenação, o erro notório na apreciação da prova e o princípio in dubio pro reo.

Desde logo convém tornar claro que o recorrente não impugna factualmente a decisão recorrida nos termos do disposto no artigo 412º, nsº 3 e 4 do C.P.P., tendo-se limitado a invocar a existência do vício de “revista largada” de erro notório na apreciação da prova.

Depois, é sabido que a motivação de uma decisão judicial deve cumprir o comando contido no artigo 127º do Código de Processo Penal que determina que o juiz deve apreciar a prova “segundo as regras da experiência e a livre convicção”. A final, caso ocorram dúvidas sobre o juízo de facto a formular, o tribunal está vinculado a seguir uma regra jurídica imposta pelo sistema processual penal: ocorrendo essa dúvida deve favorecer o arguido.

Mas - verdade insofismável - o princípio in dubio pro reo não é um método racional de busca da verdade dos factos, como comunmente se invoca na prática judicial quotidana. É sabido que neste ponto é costume da praxis judicial portuguesa usar o princípio in dubio pro reo para nele integrar três realidades quando se invoca este princípio: confundir o princípio com uma regra de apreciação de concretos meios de prova no âmbito do artigo 127º do C.P.P.; confundir o princípio com o standard probatório necessário à condenação. Essas duas, a que acresce a plena - mas restritiva, face a esta visão - operatividade do princípio in dubio pro reo, são três coisas distintas. - Seguimos aqui o por nós já fundamentado no acórdão deste Tribunal da Relação de Évora de 03/08/2018 (proc. 1360/14.IT9STB.E1).

A invocação dos recorrentes segue essa prática e assenta na ideia de que ocorre violação do princípio na medida em que entendem que o tribunal deveria ter permanecido em dúvida quanto à imputação dos factos ao arguido.

Quando se aprecia a prova no âmbito do artigo 127º do C.P.P. usa-se a razão, os conhecimentos empíricos, os conhecimentos técnicos e científicos, as regras sociais e de experiência comum. Aqui não há metodo dubitativo, há métodos racionais de dedução e indução.

A final do labor anteriormente referido, o princípio in dubio pro reo impõe ao tribunal que, na dúvida, favoreça o arguido quando formula uma apreciação racional sobre o acontecer naturalístico, no caso de se não ter a certeza sobre esse acontecer. Mas pode não haver dúvida.

No supra citado nosso relato de 03-08-2018 sumariámos (pedindo perdão pela auto-citação que apenas se justifica pela facilidade de exposição e condensação da leitura):

1 - O princípio in dubio pro reo é habitualmente usado para nele integrar três realidades distintas, gerando alguma indeterminação de conceitos. As regras de apreciação de concretos meios de prova no âmbito do artigo 127º do C.P.P. e o standard probatório necessário à condenação são conceitos que se não confundem com aquele princípio. São três conceitos distintos.
2 - Quando se aprecia a prova no âmbito do artigo 127º do C.P.P. usa-se a razão, os conhecimentos empíricos, os conhecimentos técnicos e científicos, as regras sociais e de experiência comum. Aqui não há metodo dubitativo, há métodos racionais de dedução e indução.
3 - Operar o princípio in dubio pro reo pressupõe um juízo positivo de dúvida resultante de um inultrapassável impasse probatório, mas apenas no final do processo racional de decisão sobre a matéria de facto.
4 - Quando se formula um juízo de convicção tem-se presente a existência de uma presunção de inocência e, por isso, não vale um mero juízo de maior probabilidade de que os factos terão ocorrido de determinada forma, exigindo-se um forte juízo de certeza de que os factos terão ocorrido de deteminada forma, não de outra.
5 - Isto é, o juiz pode ver-se confrontado, a final quando constrói a sua convicção, com três situações:
- ou tem dúvidas sobre como ocorreram os factos e usa o princípio in dubio pro reo e dá-os como não provados;
- ou constrói um juízo de mera probabilidade de que os factos ocorreram de determinada forma e deve dar os factos incriminatórios como não provados;
- finalmente, tem uma certeza judicial de que os factos ocorreram de determinada forma e dá os factos como provados.

A diferenciação destas situações provoca na praxis judicial, ao que parece, alguma perplexidade. O que não é de espantar já que a matéria do standard probatório e da convicção judicial não é matéria que preocupe sobremaneira a doutrina e a jurisprudência portuguesas e alastrou a ideia de que o princípio in dubio pro reo é o “abre-te Sésamo” do processo penal.

Desta forma e como o princípio in dubio pro reo pressupõe a existência de um impasse probatório no final do percurso de apreciação probatória para que possa compaginar-se a sua aplicação, constatamos que não é isso, distintamente, o que ocorre nos autos. Não há, ou houve, impasse probatório. Lida a decisão recorrida nem se vê que lhe tenha sobrevindo um “impasse probatório” nem se lhe pode apontar insuficiência ou falta de clareza da fundamentação.

Assim, naufragam igualmente estes fundamentos de inconformidade pois que bem apreciada a prova, não obstante também com prova indirecta (prova indiciária fora do contexto dos “indícios suficientes” em fases de inquério, acusação e pronúnia é terminologia espanhola).

Por fim, não se revela nos autos que a aplicação do princípio in dubio pro reo se imponha, pois que, avaliada a prova segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, não conduziu à dúvida no espírito do tribunal sobre a existência do facto.

O princípio in dubio pro reo, com efeito, «parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador» - In Cristina Líbano Monteiro, «In Dubio Pro Reo», Coimbra, 1997.. Essa «dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal». Ac. STJ de 25-10-2007, in proc. 07P3170, relator Cons. Carmona da Mota, citando a autora anteriormente citada.

Operar o princípio in dubio pro reo pressupõe, portanto, um juízo positivo de dúvida resultante de um inultrapassável impasse probatório, mas apenas no final do processo racional de decisão sobre a matéria de facto. A final, quando se formula um juízo de convicção tem-se presente a existência de uma presunção de inocência e, por isso, não vale um mero juízo de maior probabilidade de que os factos terão ocorrido de determinada forma, exigindo-se um forte juízo de certeza de que os factos terão ocorrido de deteminada forma, não de outra.


*

B.2.4 – A escolha, medida e forma de execução das penas impostas aos arguidos.

Como se sabe, dispõe o artigo 40.º do Código Penal que a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente. É igualmente sabido que na determinação do quantum concreto dessa pena haverá que fazer apelo às necessidades de prevenção e à culpa do arguido, na sequência do comando contido no artigo 71º, nº 2 do Código Penal.

E no caso dos autos é manifesto que as circunstâncias agravantes gerais se sobrepõem às atenuantes no caso de ambos os arguidos.

E as necessidades de prevenção são igualmente relevantes, pois que ambos os arguidos têm um “histórico” comportamental avesso ao cumprimento de normas desde longa data, desde os anos 90 do século passado.

A circunstância de os arguidos não terem sido condenados anteriormente por este tipo de crime não lhes permite aspirar a medalha de bom comportamento nem sonhar com um tratamento penal equivalente ao de um cidadão cumpridor. Essa é uma nova pretensão apresentada nos recursos que não pode negar a realidade exposta nos factos quanto aos respectivos comportamentos passados que, como é natural e por imposição legal (artigo 71º, nº 2, al. e – a “conduta anterior ao facto” – do Código Penal), deve ser atendido.

E a circunstância de as penas anteriores terem sido declaradas extintas pelo cumprimento também não é critério que faça esquecer o crime praticado na análise a efectuar quanto às necessidades de prevenção.

De facto, o invocado pelos arguidos como circunstâncias atenuantes e que, em seu entender, permitiriam a opção pela pena de multa, não têm o peso pretendido e apenas a inserção social relativa os pode beneficiar. Ou seja, apenas a sua inserção social funciona como atenuante.

Mas analisemos o argumentário dos arguidos, tendo sempre presente que o recurso é um remédio jurídico e não um novo juízo sobre a pena, o que nos reconduz sempre ao invocado pelos recorrentes como fundamento para alterar a pena.


*

a) - (...).

É de recordar que o arguido vem a delinquir desde 1993. E assim em 2002, 2007 (2), 2008, 2010, 2011, 2012 e 2016.

Condenado pela prática de crimes de tráfico de droga (em 1993, 2002 e 2010) e condução sem habilitação legal em 2002, 2007 (2) 2008, 2011, 2012 e 2016.

Foi condenado em penas de multa e prisão efetiva.

Invoca no essencial o não ter sido anteriormente condenado pela prática de crime de furto.

Pretende a suspensão da pena ou a aplicação do regime de permanência na habitação.


*

b) - Arguido (...).

O arguido vem a delinquir desde 1994. E repetiu em 1995 (2 ocasiões), 2001, 2004, 2006, 2007, 2012 e 2013.

E foi condenado pela prática de crimes de burla e falsificação de documento, furto qualificado, furto, condução sem habilitação legal (3 ocasiões, em 2001, 2004 e 2007), ameaça agravada e furto simples.

Foi condenado em penas de multa e prisão efetiva.

Invoca no essencial o estar familiar e socialmente inserido, o facto de o tribunal só ter atendido ao seu certificado de registo criminal, de não ter atendido à circunstância de o arguido ter reconhecido a ilicitude da sua conduta e ser trabalhador agrícola.

Pretende a suspensão da pena ou a aplicação do regime de permanência na habitação.


*

Ora, nada na argumentação dos arguidos inquina a decisão recorrida quanto aos critérios de escolha e medida das penas impostas.

É certo que foram aplicadas “curtas penas de prisão” mas essas têm existência legal, pois que o regime base de substituição da pena de prisão por qualquer pena substitutiva tem que acautelar as finalidades de prevenção. A substituição da pena de prisão efectiva por qualquer das penas substitutivas está condicionada por razões de prevenção, como, aliás, resulta do próprio texto legal. Aí se afirma que a aplicação de tais penas tem que realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.

E aqui batemos à porta dos factos. Nem o passado dos arguidos nem a argumentação dos recursos permitiria alterar o decidido.

E o único facto que permite atingir o objetivo pretendido pelos arguidos é superveniente quer à decisão quer aos recuros. Trata-se da pandémica existência do vírus SARS-CoV-2 e da publicação da Lei nº 9/2020, de 10-04, que pretendeu fixar um concreto regime legal excepcional de perdão parcial de penas de prisão, de indulto das penas, extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e de antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.

Como é claro e resulta expresso no nº 7, do artigo 2º da referida Lei nº 9/2020, o referido perdão é concedido a reclusos cujas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor da lei e sob condição resolutiva.

Ora, não é o caso destes autos aos quais a dita lei não é aplicável directamente.

Mas dela resulta clara uma preocupação com a população prisional que recoloca em moldes novos, não obstante temporários porquanto dependentes do período de duração da referida pandemia, a necessidade de ponderar em novos moldes a necessidade das penas impostas que são, efectivamente, curtas penas de prisão.

A condenação efetiva e a perspectiva que os arguidos tiveram de virem a cumprir pena em período pandémico – com o consequente risco de contaminação – foi necessariamente uma perspectiva antecipada pelos arguidos como angustiante e passível de funcionar como recolocando o juízo de prognose pessoal como positivo.

É claramente um juízo antecipatório de risco, mas risco assumido que apenas pode ser temperado por um período de suspensão da pena alongado no tempo.

Resta acrescentar que, sendo o crime de furto de energia eléctrica para a residência dos arguidos não se antecipa possível que existam as condições técnicas que permitam o cumprimento da pena em regime de permanência na habitação.

Em função do que se acaba de expor se decide, embora por razões muito distintas, declarar parcialmente procedentes os recursos, suspendendo a execução das penas de prisão impostas a ambos os arguidos por um período de 2 (dois) anos.


***

C - Dispositivo

Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora em – embora por muito distintas razões – conceder provimento a ambos os recursos e, consequentemente, suspender a execução das penas de prisão impostas a ambos os arguidos por um período de 2 (dois) anos.

Notifique.

Sem custas.

(elaborado e revisto pelo relator antes de assinado).

Évora, 22 de Setembro de 2020

João Gomes de Sousa

Nuno Garcia