CRÉDITO DA SEGURANÇA SOCIAL
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO GERAL
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL
HIPOTECA
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
Sumário


Os créditos da Segurança Social garantidos por privilégio imobiliário geral, nos termos do art.º 205.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009 de 16 de setembro, não prefere ao crédito hipotecário, aplicando-se o art.º 749.º e não o 751.º do C. Civil (sumário do relator).

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I. Relatório.
1. Nos presentes autos de reclamação de créditos, que correm por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa com o n.º 141/12.1TBACN, instaurada pela exequente R…, S.A., contra J… e outro, vieram reclamar créditos o Instituto da Segurança Social, I.P., o Estado Português, e o Banco …, S.A., tendo este último, para o efeito, alegado, no essencial:
- que, por contrato celebrado em 30/03/2000, o reclamado solicitou e obteve do Banco, ora reclamante, um empréstimo destinado a aquisição de habitação, no montante de 7.650.000$00, equivalente a 38.158,03 €, e que em 29/09/2010, o reclamado solicitou e obteve ainda do ora reclamante um outro empréstimo, no montante de 17.500,00 €, dos quais se confessou devedor; que, para garantia do pagamento de todas as responsabilidades assumidas nos dois contratos, o reclamado constituiu a favor do reclamante duas hipotecas, ambas a incidir sobre a Fração I, destinada a habitação, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcanena sob o nº … e inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, da freguesia de Alcanena;
- Que, relativamente ao primeiro contrato, o capital em dívida ascende ao montante de € 17.547,86, os juros vencidos desde 30/11/2012 até hoje, contados à taxa atual de 2,87%, acrescida da sobretaxa de 4% em virtude da mora, ascendem ao montante de € 125,50 e que as despesas emergentes do contrato são do montante de € 1.526,32;
- Relativamente ao segundo contrato, o capital em dívida ascende ao montante de € 17.031,26, os juros vencidos desde 02/12/2012 até hoje, contados à taxa atual de 4,264%, ascendem ao montante de € 71,62, o imposto de selo sobre os juros ascende ao valor de € 2,86 e que as despesas emergentes do contrato são do montante de € 700,00.
Não foram deduzidas impugnações.
A execução foi suspensa nos termos do art.º 882.º do anterior CPC, atento o acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda.
O Ministério Público requereu o prosseguimento da execução nos termos do art.º 885.º do anterior CPC para satisfação do crédito da Fazenda Nacional.
A Exequente foi notificada nos termos do art.º 809.º, n.º 2, do novo CPC, nada tendo dito.
O crédito da Exequente encontra-se satisfeito, de acordo com a informação prestada pela AE nos autos de execução, e foi determinado o prosseguimento da execução.
Após foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos, graduando os créditos, cujo dispositivo é o seguinte:
Face ao exposto, julgo as reclamações procedentes, por provadas e, consequentemente:
- Reconheço o crédito reclamado pela Fazenda Nacional referente a IMI e respetivos juros, o qual ascende atualmente ao montante de € 315,50, garantido por privilégio imobiliário especial sobre o imóvel penhorado;
- Reconheço o crédito reclamado pelo ISS referente a contribuições dos meses de janeiro de 2010 a abril de 2012 no montante de € 2.379,69 e respetivos juros no montante de € 241,60, garantido por privilégio imobiliário geral;
- Reconheço os créditos reclamados pelo Banco …, S.A. dos montantes de € 17.547,86 e de € 17.031,26, acrescidos dos respetivos juros, despesas emergentes dos contratos e imposto de selo sobre os juros, garantidos por hipotecas;
Graduo os créditos da seguinte forma:
1.º- O crédito da Fazenda Nacional referente a IMI e respetivos juros, o qual ascende atualmente ao montante de € 315,50;
2.º- O crédito de € 17.547,86, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
3.º- O crédito do ISS relativo às contribuições dos meses de janeiro a agosto de 2010 e respetivos juros;
4.º- O crédito de € 17.031,26, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
5.º- O crédito do ISS relativo às contribuições dos meses de setembro de 2010 a abril de 2012”.
Inconformado com esta sentença veio o credor reclamante “Banco …” interpor o presente recurso, terminando as alegações com as seguintes conclusões:
1 – A sentença recorrida fez, com o devido respeito, uma incorreta interpretação dos art.s 686º, 748º e 751º, todos do CC, ao graduar em 3º lugar um crédito do ISS em detrimento do crédito do recorrente, garantido por hipoteca e que foi graduado em 4º lugar.
2 – O crédito do ISS, goza de um privilégio imobiliário estabelecido em legislação avulsa que, incide não sobre bens concretos e determinados, mas sim sobre todos os bens de que o devedor é titular à data da penhora ou outro ato equivalente, esse crédito (o do Instituto) tem uma natureza geral e não especial, e, como tal, deverá ser graduado depois do crédito garantido por hipoteca registada
3 – O facto do crédito do ISS, graduado em 3º lugar, ser respeitante a divida de contribuições dos meses de janeiro a agosto de 2010, data anterior à data do registo da hipoteca, é irrelevante, porquanto, nos termos do art. 686º CC, a hipoteca prefere sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
4 – O crédito do ISS, como se disse, não goza de privilégio imobiliário especial, nem o ISS fez qualquer registo na Conservatória sobre o imóvel, logo não pode ser graduado em 3º lugar, antes do crédito do recorrente.
5 – E, não gozando de privilégio imobiliário especial, não pode incluir-se nos créditos previstos no art.748º CC.
6 – Por sua vez, o recorrente que tem o seu crédito garantido por hipoteca, devidamente registada na Conservatória, tem, nos termos do disposto no art. 686º CC, prefere a todos os credores que não gozem de privilégio imobiliário especial, pelo que o crédito do recorrente no valor de 17.031,26 €, deveria ter sido graduado em 3º lugar e não em 4º lugar.
Assim, nestes termos e nos melhores de Direito e com o Douto suprimento de V. Exas., deve a decisão recorrida ser revogada e, em consequência, os créditos do recorrente graduados em 2º e 3º lugar, logo a seguir ao crédito de IMI, por gozarem da preferência que as hipotecas registadas lhes confere.
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Não se mostram juntas contra-alegações.
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II – Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil, constata-se que a questão única a decidir consiste em saber se a sentença que reconheceu os créditos do recorrente sobre o imóvel penhorado os graduou corretamente.
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III – Fundamentação fáctico-jurídica.
1. Sendo a matéria de facto a considerar a que consta do antecedente relatório, importa ainda acrescentar (com base nos documentos juntos nos autos de execução apensa, após consulta) a seguinte factualidade:
a) Em 17 de outubro de 2012 foi penhorada a fração I do prédio sito em Alcanena, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alcanena com o n.º … e descrito na C. R. Predial sob o n.º …, penhora que foi registada na C. R. Predial em 16 de outubro de 2012 (cf. auto de penhora e Consulta ao Registo Predial em 17/10/2012).
b) Está registada na CRP de Alcanena, a favor do Banco …, S.A., em 2000/03/23, hipoteca voluntária sobre a fração predial I, do prédio sito em Alcanena, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alcanena com o n.º … e descrito na C. R. Predial sob o n.º …, para garantia do pagamento máximo de 9.785.115,00 escudos, relativo a um empréstimo de capital de 7.650.000,00 escudos;
c) Está registada na CRP de Alcanena, a favor do Banco …, S.A., em 2010/09/29, hipoteca voluntária sobre a fração predial I, do prédio sito em Alcanena, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alcanena com o n.º … e descrito na C. R. Predial sob o n.º …, para garantia do pagamento máximo de € 23.975,00, relativo a um empréstimo de capital de € 17.500,00.
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2. O direito.
Está em causa, segundo o recorrente, a graduação dos créditos reclamados, de acordo com o registo das hipotecas que os garantem, e que, em seu entender, prevalece sobre os créditos reclamados pelo Instituto da Segurança Social, pois que a sentença recorrida ao graduar em 3º lugar um crédito do ISS em detrimento do crédito do recorrente, garantido por hipoteca e graduado em 4º lugar, fê-lo incorretamente.
E com inteira razão, adianta-se, sendo certo que a resposta a esta questão tem merecido resposta uniforme da jurisprudência.
Com efeito, a hipoteca constitui um direito real de garantia que se caracteriza por conferir ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis (ou equiparadas), pertencentes ao devedor ou terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou prioridade de registo, podendo ter a sua origem num contrato ou declaração unilateral – art.ºs 686.º/1 e 712.º do C. Civil.
Citando Carvalho Fernandes, Direitos Reais, 4.ª Edição, 2005, pág. 152, a propósito da proibição do “pacto comissório”, que “este regime não prejudica o credor hipotecário por os atos subsequentes de alienação ou oneração lhe serem inoponíveis. Nomeadamente, no caso de transmissão, isso significa que ele pode fazer executar a coisa hipotecada no património do adquirente, sendo esta uma manifestação da sequela do direito de hipoteca”. E, adianta o Professor, que no caso do adquirente dos bens hipotecados, este tem, em alternativa, a faculdade de optar entre: a) pagar aos credores hipotecários as dívidas garantidas pelo bem hipotecado; b) declarar-se disposto a entregar aos credores hipotecários o bem, para pagamento dos respetivos créditos, até à quantia pelo qual o adquiriu (art.º 721.º do C. Civil).
Assim também ensina Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 12.ª Edição, pág. 955, onde refere que “os bens hipotecados podem ser transmitidos, embora o respetivo ónus os acompanhe”, concedendo-se à pessoa que os adquire a faculdade de fazer extinguir esse ónus real, é o que na terminologia técnico-jurídica se chama expurgação da hipoteca.
Oliveira Ascensão, “Direitos Reais”, 4.ª Edição, pág. 551 e segs., considera apropriado falar-se em “preferência”, como princípio característico dos direitos reais de garantia, no confronto com outros direitos legítimos, mas incompatíveis, considerando a “sequela” uma consequência necessária do direito real, nos termos da qual “uma coisa é funcionalmente afeta a um sujeito, que todos os outros, quando entram em contato com a essa coisa, têm de se submeter à atribuição que já foi realizada”.
E Pires de Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª Edição, afirmam que “o meio de o credor hipotecário tornar efetivo o seu direito em relação aos bens hipotecados é a execução, regulada no C. P. Civil”. Sendo que a “ação executiva por dívida provida de garantia real e, portanto, de hipoteca, pode seguir diretamente contra o possuidor dos bens onerados (sequela)”.
Portanto, por força do direito de sequela que assiste ao credor hipotecário, a hipoteca mantém-se inerente, grudada ao imóvel, apesar de ele poder passar para a esfera jurídica de terceiro que não é o devedor. A hipoteca garante a obrigação enquanto esta se não extinguir, quem quer que seja o devedor ou o titular do imóvel onerado.
Ora, o direito do credor hipotecário, no confronto com os denominados créditos que beneficiam de privilégios imobiliários gerais, prevalece sobre estes.
Na verdade, estabelece o art.º 751.º do C. Civil, que “Os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores”.
Segundo a noção legal do art.º 733.º do C. Civil, “privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros”.
E existem duas espécies de privilégios creditórios: mobiliários e imobiliários, sendo que os primeiros são gerais, se abrangerem o valor de todos os bens móveis existentes no património do devedor à data da penhora; são especiais, quando compreendem só o valor de determinados bens móveis. Os privilégios imobiliários são sempre especiais, por incidirem sobre determinados bens imóveis (cf. art.º 735.º do C. Civil).
Por sua vez, o art.º 205.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009 de 16 de Setembro [1], estatui que “Os créditos da segurança social por contribuições, quotizações e respetivos juros de mora gozam de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património do contribuinte à data da instauração do processo executivo, graduando -se logo após os créditos referidos no artigo 748.º do Código Civil”.
A propósito da criação destes privilégios creditórios gerais, Lebre de Freiras, in “A ação Executiva”, À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6.ª edição, págs. 368/369, realça o facto de tais créditos privilegiados, de montante desconhecido do exequente quando instaura a execução, tendo preferência no pagamento sobre o crédito exequendo, que o C. Civil quis, na sua época atenuar, “constitui em alguns casos, violação do direito fundamental de acesso à justiça e do princípio da confiança, pois possibilita a retirada ao exequente da tutela judiciária assegurada pela ação executiva e altera, de forna não transparente, a base em que assenta a constituição das garantias especiais, razão pela qual alguns privilégios gerais foram declarados inconstitucionais, com força obrigatória geral”.
Com efeito, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 363/2002, de 17 de setembro de 2002, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, “por violação do princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2º da Constituição da República, das normas constantes do artigo 11º do Decreto-Lei nº 103/80, de 9 de Maio, e do artigo 2º do Decreto-Lei nº 512/76, de 3 de Julho, na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral nelas conferido à Segurança Social prefere à hipoteca, nos termos do artigo 751º do Código Civil”.
Já no seu Acórdão n.º160/2000, este Tribunal pronunciou-se nos seguintes termos:
‘‘5 — É indiscutível que o legislador com as normas dos artigos 2.º do Decreto-Lei n.º 512/76 e 11.º do Decreto-Lei n.º 103/80 pretendeu dar alguma preferência aos créditos da segurança social ao determinar que os créditos ali consignados sejam graduados logo a seguir aos do Estado e das autarquias locais, referidos no artigo 748.º do Código Civil.
No entanto, a interpretação que o acórdão recorrido fez destas normas, mediante a aplicação do regime do artigo 751.º do Código Civil, confere a este privilégio a natureza de verdadeiro direito real de garantia, munido de sequela sobre todos os imóveis existentes no património da entidade devedora das contribuições para a previdência, à data da instauração da execução, e atribui-lhe preferência sobre direitos reais de garantia —a consignação de rendimentos, a hipoteca e o direito de retenção —, ainda que anteriormente constituídos.
Este privilégio, com esta amplitude, funciona à margem do registo (já que a ele não está sujeito) e sacrifica os demais direitos de garantia consignados no artigo 751.º, designadamente a hipoteca — que é o caso dos autos”.
Esta orientação continua a ser válida no âmbito do art.º 205.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, sucessor do art.º 11.º do Dec. Lei n.º 103/80, de 9/05.
No caso dos autos, os créditos reclamados pelo recorrente, e reconhecidos na sentença recorrida, estão garantidos por hipoteca com registo em data anterior à penhora. Por isso, este credor deve ser pago pelo valor do bem imóvel hipotecado com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, como prescrito no art.º 686.º, n.º 1, do C. Civil.
E como também se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18/5/2017, proc. n.º 3617/15.5T8SNT-A.L1, disponível em www.dgsi.pt, “um privilégio imobiliário geral não tem preferência sobre as hipotecas. É que a norma do art.º 751.º do CC, que dá essa preferência, não se aplica a eles, mas apenas aos privilégios imobiliários especiais (esta norma foi alterada pelo art.º 5 do DL 38/2003, de 08/03, em vigor desde 15/09/2003, na sequência dos acórdãos do TC que tinham tratado a questão; anteriormente dizia, sem fazer qualificações: “Os privilégios imobiliários são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores”; no mesmo sentido, L. Miguel Pestana de Vasconcelos, obra citada, págs. 334 e 339 a 342, e Marco Carvalho Gonçalves, LPCE, Almedina, 2016, págs. 358 e 359)”.
Na verdade, do art.º 751.º do C. Civil não resulta expressamente que os privilégios imobiliários gerais prevalecem sobre a hipoteca, mas apenas os privilégios imobiliários especiais.
Como é sublinhado no Aresto do STJ de 11/9/2012, proc. n.º 168-A/1994.L1, o Código Civil não consagra a figura dos privilégios imobiliários gerais que o 11.º do DL 103/80, de 5/9, instituíram para os créditos previdenciais, pelo que existe uma lacuna quanto ao regime de oponibilidade a terceiros dos créditos que beneficiam do privilégio imobiliário geral, sendo certo que, no n.º1 do art.º 686.º do C. Civil, se estabelece que a hipoteca cede perante credor que disponha de privilégio especial.
No sentido de que o privilégio imobiliário geral da Segurança Social não prefere ao crédito hipotecário, aplicando-se o art.º 749.º e não o 751.º do C. Civil, se pronunciaram, entre outros, o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 4/2/2010, proc. n.º 1411/05.0TBTVD-A.L1-6; Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 09/11/2010, proc. 423/09.0TBOHP-A.C1; Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 06/05/2014, proc. 1514/13.8YYPRT-A.P1; Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 04/07/2014, proc. 88-A/1998.L1-2; e o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 12/01/2017, proc. 2742/12.9TBBRG-K.G.
Pelo mesmo caminho seguiu esta Relação de Évora [2], decidindo que o direito do exequente garantido por hipoteca prevalece sobre o crédito do reclamante Instituto da Segurança Social garantido por privilégio imobiliário geral; e mais recentemente [3] assim se expressou:
Os privilégios imobiliários gerais, que têm natureza excecionalíssima, não constituem direitos reais de garantia, pois não incidem sobre bens determinados; os direitos de crédito de que são titulares as instituições da segurança social, que gozam de privilégio imobiliário geral, não prevalecem sobre os direitos de crédito garantidos por hipoteca”.
Assim, se nenhum crédito tiver sido impugnado ou, tendo havido impugnação, não houver prova a produzir, será logo proferida sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, terminando o processo – n. º2 do art.º 791.º do C. P. Civil. Se pelo contrário, o crédito impugnado estiver dependente de produção de prova, seguir-se-ão os termos do processo comum de declaração, sem prejuízo de no despacho saneador se declarar reconhecidos os créditos o puderem ser, sem prejuízo da sua graduação ser remetida para a sentença final (seu n. º1).
E adianta o seu n. º4 que “São havidos como reconhecidos os créditos e as respetivas garantias reais que não forem impugnados, sem prejuízo das exceções ao efeito cominatório da revelia vigentes em processo declarativo, ou do conhecimento das questões que deviam ter implicado rejeição liminar da reclamação”.
Ora, os créditos reclamados pelo Banco recorrente estão garantidos por hipoteca sobre o imóvel identificado e penhorado nestes autos.
Donde, devem ser graduados de acordo com a precedência do respetivo registo, nos termos do art.º 6.º, n.º 1 do Código de Registo Predial, preferindo ao crédito reclamado da Segurança Social.
Decorrentemente, a graduação de créditos será feita da seguinte forma:
1.º- O crédito da Fazenda Nacional referente a IMI e respetivos juros;
2.º O crédito de € 17.547,86, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
3.º O crédito de € 17.031,26, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
4.º O crédito do ISS referente a contribuições dos meses de janeiro de 2010 a abril de 2012 no montante de € 2.379,69 e respetivos juros no montante de € 241,60.
Procede, pois, a apelação, devendo a sentença recorrida ser alterada nos termos peticionados.

V. Decisão.

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e revogar a sentença recorrida quanto à graduação de créditos, que vão graduados nos termos seguintes:
1.º O crédito da Fazenda Nacional referente a IMI e respetivos juros, o qual ascende atualmente ao montante de € 315,50;
2.º O crédito de € 17.547,86, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
3.º O crédito de € 17.031,26, acrescido dos respetivos juros e despesas emergentes do contrato, do Banco …, S.A.;
4.º O crédito do ISS referente a contribuições dos meses de janeiro de 2010 a abril de 2012 no montante de € 2.379,69 e respetivos juros no montante de € 241,60.
Sem custas por não serem devidas.

Évora, 2020/06/25
Este Acórdão vai assinado digitalmente no Citius, pelos Juízes Desembargadores:
Tomé Ramião (Relator)
Francisco Xavier (1.º Adjunto)
Maria João Sousa e Faro (2.º Adjunto)
__________________________________________________
[1] ) Este diploma legal revogou o Dec. Lei n.º 103/80, de 9/05, que também previa no seu art.º 11.º o privilégio imobiliário geral por créditos da Segurança Social.
[2] ) Ac. de 27/2/2010, proc. 28/12.8TBMMN-C.E1 (Mata Ribeiro).
[3] ) Ac. de 16/5/2019, Proc. n.º 1700/17.1T8ENT-B.E1 (Isabel Imaginário).