HABEAS CORPUS
RECURSO DE REVISÃO
SENTENÇA
DESPACHO
REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
AUDIÇÃO DO ARGUIDO
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
ARGUIDO AUSENTE
NOTIFICAÇÃO PESSOAL
NOTIFICAÇÃO POSTAL
TERMO DE IDENTIDADE E RESIDÊNCIA
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
EXTINÇÃO
MEDIDAS DE COACÇÃO
MEDIDAS DE COAÇÃO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário


I - Pese embora a inexistência de unanimidade, quer na doutrina quer na jurisprudência, para o estrito plano da recorribilidade no âmbito do recurso extraordinário de revisão de sentença a solução que se crê mais adequada é a de fazer equivaler o despacho que revoga a suspensão da pena a uma sentença quando se pretende pôr em causa tal despacho.

II - Já para a questão de precisar se é equiparável à sentença o despacho subsequente à audição do condenado no âmbito do incidente que vise decidir da falta de cumprimento das condições da suspensão, previsto no art. 495.º, nº 2. Do CPP, designadamente para os efeitos do art. 333.º, n.º 5, ou seja, a obrigação de notificação pessoal, a resposta tem de ser diferente pois essa norma que impõe essa notificação pessoal da sentença condenatória ao arguido julgado na ausência é de carácter especial visando somente a situação do julgamento na ausência do arguido notificado.

III - O problema afigura-se que deve ser colocado noutro plano. O requerente prestou TIR em 2011-05-25 e à data, estava em vigor a versão do art. 196.º do CPP fixada pela Lei 320-C/2000, de 15-12. Nessa versão, o n.º 3 determinava que deveria ser dado conhecimento ao arguido de diversas obrigações previstas nas als. a) a d) do sobredito n.º 3. Foi perante essa redacção que veio a ser fixada a jurisprudência constante do AUJ 6/2010. Perante essa jurisprudência fixada pareceria que a situação do requerente seria processualmente correcta uma vez que a decisão que revogou a pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão foi notificada por via postal simples para a morada indicada pelo requerente que constava do TIR, sendo a carta depositada no receptáculo respectivo em 2018-07-09.

IV - Há, porém, que levar em conta as alterações introduzidas pela Lei 20/2013, de 21-02, que ao n.º 3 do art. 196.º aditou a al. e) impondo que sendo prestado o TIR o arguido seja advertido também, de que em caso de condenação esse TIR, essa medida de coacção, só se extinguirá com a extinção da pena. Como complemento desta alteração a al. e) do n.º 1 do art. 214.º que tem como epigrafe “Extinção das medidas” (de coacção) foi também alterada daí resultando que as medidas de coacção se extinguem de imediato, além do mais, com o trânsito em julgado da sentença condenatória – como já se previa na redacção até aí vigente – à excepção do TIR que só se extinguirá com a extinção da pena.

V - É possível, agora, fazer a notificação do despacho que haja revogado a suspensão da execução da pena por via postal simples como preconizou o acórdão mas para tal é preciso que, ao ser prestado o TIR, o arguido seja advertido que a validade deste vai para além do trânsito em julgado da sentença condenatória; que se não extingue com esta mas somente com a extinção da pena.

VI - A validade do TIR prestado pelo requerente e, por conseguinte, a possibilidade de este ser notificado por via postal simples passou a ser condicionada pela advertência que se tornou obrigatória de essa mesma validade e as obrigações dele decorrentes persistirem para lá do trânsito em julgado da sentença condenatória alargando-se até ao momento da extinção da pena.

VII - Em rigor, para a aplicação da jurisprudência fixada era mister que o requerente oportunamente tivesse prestado um novo TIR de acordo com a prescrição actual do n.º 3 do art. 196.º implicando a sobredita advertência a respeito do momento da extinção da medida de coacção.

VIII - Como isso não aconteceu, a conclusão é a de que no momento em que se procedeu à notificação por via postal simples a medida de coacção estava já extinta esvaziando-se desse modo a “presunção” de notificação feita para a morada indicada no TIR. Implicando, pois, a notificação pessoal do requerente do despacho que revogara a prisão preventiva. Essa notificação não teve lugar logo o referido despacho não transitou. Do que decorre – embora por razões diversas das invocadas na petição – ser ilegal a prisão do requerente pois foi motivada por facto que a lei não permite, a saber, ordenada por despacho não transitado.

Texto Integral

1– AA, condenado no processo nº 149/05.3PULSB do Juízo Central Criminal de Lisboa, Juiz 7, da Comarca de Lisboa veio apresentar um pedido de habeas corpus por si subscrito ao abrigo do disposto nos arts. 222º, nº 2 alínea b) do CPP (diploma a que pertencem as normas adiante indicadas sem menção de origem) com os seguintes fundamentos (transcrição):

1º - Por acórdão de -/-/-, a fls... dos autos, já declarado transitado em julgado, foi o Arguido/Requerente condenado, pela prática de um crime de furto qualificado previsto e punido pelo artigo 204° do Código Penal, por facto praticado em 01/10/2003, na pena de prisão pelo período de 2 anos e 6 meses, suspensa na sua execução, (ver Mandado de Detenção de 10/10/2018).

2º - Por despacho de -/-A, a fis...dos autos, alegadamente transitado em julgado em 02/10/2018, foi lhe revogada a suspensão da execução da pena de prisão e determinado o cumprimento desta.

3o - O referido Despacho não foi notificado pessoalmente ao Arguido/Requerente, tal como prescreve de forma cristalina o artigo 333° nºs 5 e 6 do CPP, o que ainda não ocorreu por razões alheias ao interessado/arguido.

4o - E o arguido nunca pôde pronunciar-se sobre o mesmo, quer recorrendo ou não, tal como lhe garante o disposto no artigo 333° nº 6 do CPP, logo inexiste trânsito em julgado em 02/10/2018.

5o - Conforme constitui jurisprudência dos tribunais superiores, «O Despacho de revogação deverá ser notificado pessoalmente ao arguido para que dele possa, querendo recorrer ou, então, com e/e se conformar".

"Por isso, entende-se que o despacho que revoga a suspensão da execução da pena é também, nesse sentido, um despacho que põe fim ao processo e é equiparado à sentença, para o efeito do disposto no nº 2 do artigo 449° do CPP." (Acórdão nº 73/04.7PTBRG23/11/2018 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/856465712f78253380257c8b003597dc?OpenDocument&fbclid=!wAR3UBKPWA... 3/6D.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 07 de Maio de 2009-STJid576290744-vlex).

6o - O Arguido/Requerente encontra-se preso, em cumprimento daquela pena de prisão, desde 20/11/2018, e à ordem dos autos supra identificados.

7o  - Não se conformando com a sua prisão, o Arguido fez em 22/11/2018 um requerimento ao processo alegando ilegalidades e nulidades processuais, designadamente por omissão da notificação pessoal prescrita no artigo 333° n°s 5 e 6 do CPP, o que de per si obsta ao trânsito em julgado em 02/10/2018 da decisão que revogou a suspensão da pena de prisão e determinou o cumprimento desta.

II - Do Direito

8o -  Nos termos do n° 2 do art° 222° do Código de Processo Penal, o pedido de HABEAS CORPUS, relativamente a pessoa presa, tem de «fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:

a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto peto qual a lei a não permite; ou

c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial».

    9o - Sobre a pena aplicada ao arguido, enquanto pena de substituição, vem entendendo a jurisprudência, que a mesma reveste natureza autónoma da pena principal e, por conseguinte, está igualmente sujeita a um prazo de prescrição.

  10° - «A suspensão da execução da pena de prisão, na modalidade simples ou com imposição de deveres ou regras de conduta, é uma pena de substituição». Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-02-2014, Processo: nº 1069/01.6PCOER-B.S1 5a SECÇÃO. Relator: MANUEL BRAZ.

    11° - Salvo o devido respeito, que é muito, deve-se dizer que a aplicação da pena efectiva de prisão, resultante da revogação da suspensão concedida, mostra-se como inadmissível.

   12° - Não pode o arguido ficar indefinidamente a aguardar que se declare a extinção da pena ou que a sua suspensão seja revogada.

   13° - Entre a data do facto a que se reporta a condenação - 01/10/2003 - (ver mandado de detenção de 10/10/2018) e a data do alegado trânsito da decisão que revogou a suspensão da pena de prisão, ou seja, 02/10/2018, (ver mandado de detenção de 10/10/2018) decorreram já mais de 15 anos, factualidade que foi, certamente desconsiderada, na decisão objecto da presente providência/pedido de Habeas Corpus.

  14° - O habeas corpus é uma providência excepcionai que visa garantir a liberdade individual contra os abusos de poder consubstanciados em situações de detenção ou prisão ilegal, com suporte no artigo 31 º da CRP, que o institui como autêntica garantia constitucional de tutelada da liberdade.

 15° - No caso sub judice, conhece aplicabilidade o fundamento da alínea b) do artigo 222° do CPP -prisão por facto pelo qual a lei a não permite.

  16° - Embora como mero juízo de prognose, sem vinculação das instâncias não pode deixar de se reconhecer que a interpretação que faz depender de uma decisão do incidente processual, sem qualquer notificação válida ao Arguido, ofende os princípios jurídicos em que assentam os mais elementares direitos fundamentais de audiência, de defesa e de recurso jurisdicional. V. artigo 32° da CRP.

  17°- Sendo ainda de realçar que o arguido está perfeitamente inserido, social e familiarmente.

   18° - Pelo que a condenação que agora se pretende, e lhe foi aplicada, sempre lhe trará consequências negativas indesejáveis, nomeadamente, decorrentes da convivência com outros reclusos.

  19° - Para além da nulidade extrínseca decorrente do facto do arguido ainda não ter sido notificado pessoalmente da decisão que revogou a suspensão da pena de prisão e determinou o cumprimento desta, é por demais evidente que inexiste, em consequência, o invocado trânsito em julgado em 02/10/2018 em que se estriba erradamente o Mandado de Detenção da Mmª Juiz que ordenou a sua emissão, sem cuidar de verificar previamente do cumprimento do prescrito, designadamente, no artigo 333° nºs 5 e 6 do CPP.

  20° - Com efeito, ainda hoje o arguido desconhece o teor da decisão que revogou a suspensão da pena de prisão e determinou o cumprimento desta, alegadamente transitada em julgado em 02/10/2018, estando assim impedido de exercer na sua plenitude o seu direito fundamental de recurso contra decisão judicial desfavorável - V. artigo 24°, nº 4 da CRP.

  21° - Por outro lado, a audiência em que foi tomada essa decisão condenatória foi realizada sem a presença do arguido, sem o seu consentimento, apenas com a participação de um defensor oficioso, Dr. ..., (V. Mandado de Detenção de 10/10/2018), cuja substituição foi em tempo requerida, com fundamento em quebra de confiança, o que impedia e impede a participação em qualquer acto processual em representação do arguido (V. artigo 61, n° 1 al. a) do CPP),

  22° - O mesmo é dizer que a audiência decorreu sem a presença do arguido e sem a participação de defensor da confiança do arguido, tal como garante o artigo 32° nºs 1 e 3 da CRP e os artigos 64°, nº 1, al. c) e 66°, n° 3 do CPP, o que fere de nulidade insuprível a audiência assim realizada, o que também ora vem arguir, com todas as legais consequências, o que se requer.

   23° - Caso assim não se entenda, o que considera por mera cautela e sem conceder, a interpretação restritiva dada às normas legais aqui em causa, reveía-se materialmente inconstitucional por violar os mais elementares direitos do cidadão, designadamente, o princípio da legalidade (artigos 3o, n°s 2 e 3 e 204° da CRP), o direito à liberdade (artigo 27° n°s 1, 2 e 4 da CRP), o direito à informação (artigo 20° nº 2 da CRP) e o direito fundamental ao recurso jurisdicional contra qualquer decisão que lhe seja desfavorável (artigo 32° n°s 1,2 e 3 da CRP).

24° - Ou seja, o disposto no artigo 333° nºs 5 e 6 do CPP na interpretação que parece ter sido dada nos autos, segundo a qual a notificação ao arguido pode ser realizada por via postal simples para uma morada que já não pertence ao arguido, revela-se materialmente inconstitucional.

     25° - A interpretação devida é a de que o disposto no artigo 333° nºs 5 e 6 do CPP constitui uma norma especial que não pode ser afastada por qualquer Outro procedimento que não garanta a certeza da notificação pessoal ao interessado/arguido, nem lhe faça chegarem tempo as necessárias e imprescindíveis informações quanto ao prazo e procedimentos de recurso, colocando-o numa situação de iniludível indefesa, agravada pela circunstância de estar privado da liberdade, que o impede de exercitar nos termos legais o seus direitos de recurso,

                        26° - O mesmo decorre do facto do Defensor Oficioso, Dr...., nada ter feito, apesar do arguido em tempo ter pedido a sua substituição por quebra de confiança, o que também o colocou numa situação de manifesta indefesa - V. artigos 64°, nº 1 c), 119° al. c) e 120° n°s 1 e 2 al. b) do CPP e 32° nºs 1 e 3 da CRP.

27° - Repete-se que a morada para efeitos de notificações não é há muito tempo a que consta no «Mandado de Detenção de 10/10/2018», mas sim a que consta do seu Cartão de cidadão e/ou domicílio postal em Coimbra que em tempo foi informado ao tribunal e, em consequência, requerida a sua anotação para efeitos de notificações.

  28° - Seja como for, a notificação pessoal prescrita no artigo 333° n°s 5 e 6 do CPP não se satisfaz com a mera notificação postal, por ex vi  lege tem que ser pessoal e conter todas as informações aí prescritas.

29° - Porém, até à presente data tal não ocorreu.

 30° - Em consequência inexiste qualquer trânsito em julgado da Decisão que revogou a suspensão da execução da pena de prisão.

  31° - Não havendo prisão exequível a situação de prisão do Arguido/Requerente é ilegal.

 32º - Está, por isso, preenchido o fundamento de HABEAS CORPUS previsto na alínea b) do n°2 do artigo 222° do CPP, e encontrados fundamentos bastantes para que a presente providência/pedido seja procedente.

                                                                                           *

2. - A informação a que se refere o art. 223, nº 1 é do seguinte teor (transcrição):

O arguido AA, por acórdão de 2/7/2012, transitado em julgado em 16/3/2016, foi condenado, pela prática, em 26/5/2005, de um crime de furto qualificado, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, a qual ficou suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova e com a obrigação de depositar, à ordem do processo, mensalmente, a quantia de €100 (cem euros), por conta da indemnização arbitrada a favor do demandante Francisco Gastão Cruz de Sousa Félix.

Por despacho de fls. 1446 do processo em papel, em 24/11/2017 foi designada, para a audição do condenado AA, o dia 10 de Janeiro de 2018, pelas 14 horas, sendo o arguido notificado para comparecer por mail de fls. 1450. A fls. 1457 foi o arguido notificado por mail do despacho judicial e da promoção do Ministério Público, tendo faltado o arguido a tal diligência, como resulta de fls. 1458 e 1459, apresentando justificação médica.

Foi designada nessa sede, nova data para inquirição para dia 14/2/2018, de que o arguido foi notificado por mail, a fls. 1464 e por carta por via postal simples para o apartado postal que indicou e que veio devolvida a fls. 1467.

Em 7 de Fevereiro de 2018, a fls. 1468, o arguido requereu a confiança dos autos, que lhe foi indeferida por despacho de 12/2/2018, antecedido de informação de que o condenado esteve a consultar os presentes autos, na secretaria, no dia 7/2/2018,com fundamento em manifesta impossibilidade de tal confiança, por estar agendada a audição do condenado AA para o dia 14 de Fevereiro.

Pelo despacho de fls. 1471, em 14/2/2018, por não se encontrarem presentes nem o arguido, nem a sua Ilustre Defensora, foi dada sem efeito a diligência de audição e determinada a abertura de vista ao Ministério Público.
A fls. 1472 a 1476, 1478 a 1480- verso e 1482 a 1484, o arguido veio requere justificação de ausência.

Na promoção de fls. 185 e 1486, o Ministério Público, em 24/4/2018 veio considerar que, como já seria de esperar, face à sua anterior conduta processual, o arguido AA continua a adoptar condutas tendentes a inviabilizar a normal tramitação dos autos -em concreto, após trânsito da decisão condenatória proferida nos autos, a respectiva execução, que, na sequência do promovido a fls. 1444 e 1445 e de modo a conceder uma última oportunidade ao arguido para que adira ao cumprimento dos deveres a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada (com eventual prorrogação do período de suspensão), promove-se seja o mesmo notificado, nos moldes anteriormente promovidos e nos seguintes termos:

a) De que, tendo já por duas vezes sido inviabilizada a audição pessoal do arguido por falta de comparência nas datas designadas para tanto, deverá este, caso queira fazê-lo, indicar data próxima na qual possa deslocar-se a este Tribunal para esse efeito;
b) Em alternativa, se lhe for de todo impossível comparecer em data próxima, deverá pronunciar-se por escrito, num prazo de 20 dias, a respeito do modo como pretende vir a cumprir a obrigação de indemnização fixada pelo Acórdão condenatório proferido nos autos, indicando as razões pelas quais não o fez até agora;
c) Deverá igualmente indicar a sua verdadeira morada, de modo a viabilizar a respectiva notificação pessoal e a execução, por parte da DGRS, do regime de prova que lhe foi imposto, se necessário após prorrogação do prazo de suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi imposta;

d) Caso não o faça, considerar-se-á que foi ouvido, nos termos e para os efeitos previstos no art. 495º, nº 2, do Código de Processo Penal, sendo tomada decisão em conformidade, ao abrigo do disposto nos arts. 55º e 56º do C. Penal, a qual poderá passar pela revogação da suspensão da pena de prisão aplicada, com efectiva execução desta última;
e) Devendo o arguido ficar ciente de que, caso não forneça a sua verdadeira morada, de modo a que as respectivas condições socias e económicas possam ser devidamente comprovadas e avaliadas pelo Tribunal e pela DGRS, não poderão ser tidas em consideração quaisquer justificações que venha a fornecer para o incumprimento das obrigações que lhe foram impostas pelo Acórdão condenatório.
A fls. 1487, consta informação do Tribunal da Relação de Lisboa de que o defensor oficioso do arguido AA é actualmente o Dr. ...
Pelo despacho de fls. 1488, concordando-se integralmente com tal promoção foi determinada a notificação do condenado AA e do actual defensor, Sr. Dr. ....
Como consta de fls. 1491 a 1493, foi o arguido, respectivamente, notificado para o apartado que indicou, para a morada constante do termo de identidade e residência e por mail e o mencionado defensor foi notificado a fls. 1494.

Por mail, a fls. 1496 e 1497, o arguido “vem informar que ainda não lhe foi notificada a nomeação de novo defensor, razão porque requer a nomeação I notificado de novo Defensor. Não obstante, sobre a(s) questão(ões) que determinou(aram) a realização da audiência de 14/02/2018, desde já adianta que não recebeu qualquer notificação I convocatória dos Serviços de Reinserção Social no seu endereço postal em tempo indicado no processo, nem por e-mail, razão porque improcede os fundamentos que determinaram essa audiência”.

Pela promoção de fls. 1500 e 1501 do processo em papel, considerou o Ministério Público, em 22/6/2018, que como decorre de fls. 1491 a 1495 e das referências efectuadas na própria “resposta” fornecida pelo arguido AA, este último e o seu Defensor oficioso foram devidamente notificados, nos termos e para os efeitos promovidos a fls. 1485 e ordenados a fls. 1488, que, porém, apesar de se nos afigurar que os termos da notificação efectuada tornaram absolutamente claro que a persistência do arguido na sua reiterada falta de colaboração com o Tribunal poderia conduzir à eventual revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o mesmo foi condenado nos presentes autos, com base no manifesto e persistente incumprimento dos deveres que lhe foram impostos como condição de tal suspensão, o arguido absteve-se de dar qualquer resposta relevante àquilo que lhe foi solicitado, que, assim, não tendo o arguido querido fornecer informações essenciais à eventual execução do regime de prova ao qual foi sujeito, nem tendo apresentado qualquer justificação para o incumprimento da obrigação de indemnização fixada como condição da suspensão da execução da pena de prisão em que foi condenado, ou sequer mostrado a mínima intenção de vir a cumprir os deveres que lhe foram impostos, julga-se que o carácter comprovadamente grosseiro e reiterado do incumprimento de tais deveres por parte do arguido imporá a revogação da suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada - desde logo por a sua conduta demonstrar que qualquer providência menos gravosa, incluindo a eventual prorrogação do período de suspensão fixado no Acórdão condenatório (ver art. 55º, d), do C. Penal), seria na prática insusceptível de garantir a realização das finalidades que estiveram na base da suspensão decretada.
Promoveu, pois, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido AA, ao abrigo do disposto no art. 56º, nº 1, a), do C. Penal.

Pelo despacho de fls. 1502, em 28/6/2018, considerou-se que “no caso “sub-judice”, como refere o Ministério Público e resulta, à saciedade dos autos, é manifesto que o condenado - propositadamente impossibilitando a execução do regime de prova e eximindo-se ao pagamento das quantias fixadas - infringiu grosseira e repetidamente os deveres e regras de conduta que lhe foram impostos e, ostensivamente, demonstrou (total) alheamento e desinteresse na execução do regime.

Termos em que, concordando-se integralmente com o promovido, é por demais evidente que se trata de um caso em que as finalidades que estiveram na base da suspensão foram totalmente frustradas.
Face a todo o exposto, e sem necessidade de outras considerações, determina-se a revogação da suspensão da execução da pena” .
Foi tal despacho notificado ao arguido, por via postal simples, a fls. 1505 e 1508, para a morada constante do termo de identidade e residência, tal como resulta de fls. 249 do processo em papel.

Foi tal decisão revogatória considerada transitada em julgado em 2/10/2018 (fls. 1509) e foi passado mandado de detenção para cumprimento da pena que foi cumprido em 20/11/2018, estando o arguido desde tal data em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de ....

Vem o arguido sustentar que não lhe foi notificado pessoalmente o despacho de revogação da suspensão da execução da pena, tal como prescreve de forma cristalina o artigo 333 º,nºs 5 e 6 do CPP, que tal não ocorreu por razões alheias ao arguido, que nunca pôde pronunciar-se sobre o mesmo, quer recorrendo ou não, tal como lhe garante o disposto no artigo 333º, nº 6 do CPP, inexistindo trânsito em julgado em 2/10/2018.

Acrescentou que se encontra encontra-se preso, em cumprimento daquela pena de prisão, desde 20/11/2018, à ordem dos autos principais, que, não se conformando com a sua prisão, o Arguido fez em 22/11/2018 um requerimento ao processo alegando ilegalidades e nulidades processuais, designadamente por omissão da notificação pessoal prescrita no artigo 333 º nºs 5 e 6 do CPP, o que de per si obsta ao trânsito em julgado em 2/10/2018 da decisão que revogou a suspensão da pena de prisão e determinou o cumprimento desta.

Ora, tal requerimento mostra-se apreciado pelo despacho de fls. 1547 e seguintes dos autos principais.

Em tal sede, como agora, o arguido também sustentou que o defensor oficioso, Dr. ..., nada ter feito, apesar do arguido em tempo ter pedido a sua substituição por quebra de confiança, o que também o colocou numa situação de manifesta indefesa.

Quanto à primeira questão suscitada pelo arguido, quanto ao seu defensor, a alegada omissão de nomeação de “novo defensor”, como já se referiu no âmbito dos autos principais, tal questão foi já apreciada e definitivamente decidida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do qual foi nomeado o Defensor oficioso que actualmente o representa, como resulta de fls. 438 do Apenso de Recurso B), na sequência de escusa do anterior e esse Tribunal superior indeferiu expressamente, por despacho de fls. 452 a 455 do mesmo Apenso B, o pedido de nomeação de novo Defensor formulado pelo arguido, inexistindo qualquer omissão a suprir e não se verifica qualquer invalidade processual em matéria de garantia do direito do arguido a ser assistido por Defensor, assegurado neste momento por aquele que por último lhe foi nomeado pela Ordem dos Advogados.
Invoca ainda o arguido, tal como já o havia feito nos autos principais, omissão de notificação para a audiência em que teria sido decidido revogar a suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada.
Como aí se escreveu e ora se repete, se tomarmos em consideração o processado posterior a fls. 1444, em particular no teor das notificações ordenadas a fls. 1446, 1456, 1463 e 1488, para se verificar que o Tribunal tudo tentou para conseguir que o arguido fosse ouvido presencialmente a respeito do incumprimento dos deveres que lhe foram impostos e, em qualquer caso, para lhe proporcionar a oportunidade de se pronunciar a respeito de tal matéria, com a advertência de que não o fazendo, ou não prestando justificação aceitável para a sua conduta, poderia vir a ser revogada a suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada.

Mostram, pois, as respostas do arguido às referidas notificações que o mesmo não quis, por razões que apenas ele conhecerá, comparecer em Tribunal para ser ouvido, nem sequer pronunciar-se por escrito sobre as questões que lhe foram colocadas, nenhuma invalidade se verifica nesta matéria, no que se refere ao cumprimento do disposto no nº 2 do art 495º do Código de Processo Penal.
Sustentou ainda nos autos principais, tal como agora, o arguido a omissão de notificação da decisão proferida a fls. 1502.

Quanto a tal matéria, cumpre recordar que o Acórdão n.º 6/2010 do Supremo Tribunal de Justiça (in D.R., Iª Série nº 99, de 21 de Maio de 2010) fixou jurisprudência no sentido de que: “I - Nos termos do n.º 9 do artigo 113.º do Código de Processo Penal, a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão deve ser notificada tanto ao defensor como ao condenado. II - O condenado em pena de prisão suspensa continua afecto, até ao trânsito da revogação da pena substitutiva ou à sua extinção e, com ela, à cessação da eventualidade da sua reversão na pena de prisão substituída, às obrigações decorrentes da medida de coacção de prestação de termo de identidade e residência (nomeadamente, a de «as posteriores notificações serão feitas por via postal simples para a morada indicada»). III - A notificação ao condenado do despacho de revogação da suspensão da pena de prisão pode assumir tanto a via de «contacto pessoal» como a «via postal registada, por meio de carta ou aviso registados» ou, mesmo, a «via postal simples, por meio de carta ou aviso» [artigo 113.º, n.º 1, alíneas a), b), c) e d), do Código de Processo Penal]”.
Como já escrevemos nos autos principais, tal notificação foi efectuada para o domicílio indicado no termo de identidade e residência prestado a fls. 249 pelo arguido, em estrito cumprimento da doutrina que foi fixada pelo Acórdão do STJ nº 6/2010, antes ainda da entrada em vigor da actual redacção do art. 196º do Código de Processo Penal.

Acresce que, mesmo que tal domicílio já não corresponda àquele no qual o arguido reside ou que não lhe será actualmente fácil aceder à correspondência depositada no respectivo invólucro postal, a responsabilidade pela eventual desconhecimento da decisão que lhe foi notificada nos termos legalmente previstos é exclusivamente do próprio arguido.
Com efeito, como resulta abundantemente dos autos, em particular de fls. 814, 847, 1030, 1085, 1155 e, por último, do assinalado e promovido a fls. 1444, 1462 e 1485, em termos que chegaram indubitavelmente ao conhecimento do arguido, este último há muito que vem sendo alertado para o facto de não ser de modo algum legalmente admissível a sua pretensão de ser notificado através dum apartado postal, desde logo para os efeitos previstos na alínea c) do nº 3 do art. 196º do Código de Processo Penal.

Por outro lado, nunca tendo o arguido querido indicar nos autos a sua verdadeira morada, ou qualquer outro local no qual pudesse vir a ser notificado, nos termos legalmente previstos, por via postal ou pessoalmente (em termos claramente indiciadores da intenção de dificultar a respectiva localização, no âmbito do presente processo), se a notificação efectuada nos termos legalmente previstos não tenha, eventualmente, chegado ao seu efectivo conhecimento só ao arguido é imputável.

Cumpre apenas acrescentar que foram várias as notificações enviadas para tal apartado postal e que vieram devolvidas (cfr. fls. 1452 e 1467).
Como também escrevemos nos autos principais, o arguido não poderia ser encontrado ou notificado na morada que indicou nos respectivos documentos de identificação, pois, como resultava já das averiguações efectuadas antes de o arguido ser declarado contumaz e foi mais recentemente confirmado a fls. 1427, a morada indicada pelo arguido a fls. 181, 185, 1164, 1382 e 1387 não é por si habitada há muitos anos.

Resulta, assim, validamente proferida e transitada em julgado a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada nestes autos ao arguido e que já está em execução.

                                             *

 3. – Seguidos os trâmites mencionados nos nºs 2 e 3, 1ª parte, do art. 223º do Código de Processo Penal, cumpre decidir.

                                               *

4. – Determina o art. 31º, nº 1 da Constituição da República que o habeas corpus se destina a reagir contra o abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal.

         Dispondo, por seu turno, o art. 222º nos seus nºs 1 e 2, que a qualquer pessoa ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede a providência se a ilegalidade da prisão advier de:

a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto pelo qual a lei o não permite;

c) Se mantiver para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.

Neste quadro legal, o Supremo Tribunal de Justiça entende desde há muito, de forma pacífica, que a providência de habeas corpus tem uma natureza excepcional destinando-se a assegurar o direito à liberdade mas não é um recurso. É, por assim dizer, um remédio único, a ser usado quando falham as demais garantias do direito de liberdade mas não pode ser utilizado para impugnar quaisquer deficiências ou irregularidades processuais que têm no recurso a sua sede própria de apreciação[1].

Como tem sido foi acentuado por inabarcável jurisprudência deste Supremo Tribunal a providência «não almeja a reanálise do caso; almeja a constatação da ilegalidade, que, por isso mesmo, tem de ser patente» apresentando-se como erro grosseiro ou manifesto abuso de poder. Por isso não pode ser tida como «um sucedâneo dos recursos admissíveis, esses sim os meios ordinários e adequados de impugnação das decisões judiciais».

Terá, pois, natureza excepcional por se propor como reacção expedita perante uma situação de prisão ilegal oriunda de uma inusitada ou patente desconformidade processual, adjectiva ou material que redunde numa situação de prisão ilegal.

Posto isto.

                                               *

5. - A questão que o requerente coloca sobre a equiparação do despacho que revoga a suspensão da execução da pena a uma sentença tem dividido a jurisprudência e nem mesmo é pacífica na doutrina não sendo raro surgir na interposição do recurso extraordinário de revisão de sentença quando se pretende pôr em causa tal despacho. Mas apenas e só para o efeito de precisar se esse despacho é ou não recorrível nesse estrito âmbito da sua revisão.

A solução que se crê mais adequada é a de fazer equivaler o despacho que revoga a suspensão da pena a uma sentença. Mas, sublinha-se, não só não colhe unanimidade como essa interpretação visa esse estrito plano da recorribilidade.[2]

Já para a questão de precisar se é equiparável à sentença o despacho subsequente à audição do condenado no âmbito do incidente que vise apurar a falta de cumprimento das condições da suspensão, previsto no art. 495º, nº 2, designadamente para os efeitos do art. 333º, nº 5 a resposta tem de ser diferente pois essa norma que impõe a notificação pessoal da sentença condenatória ao arguido julgado na ausência é de carácter especial visando somente a situação do julgamento na ausência do arguido notificado.

O problema afigura-se que deve ser colocado noutro plano.

O requerente prestou termo de identidade e residência em 2011.05.25, como resulta dos autos.

À data, estava em vigor a versão do art. 196º fixada pela Lei nº 320-C/2000, de 15 de Dezembro. Nessa versão o nº 3 determinava que deveria ser dado conhecimento ao arguido de diversas obrigações previstas nas alíneas a) a d) do sobredito nº 3.

E foi perante essa redacção que veio a ser fixada a jurisprudência constante do Acórdão nº 6/2010[3], referido, aliás, na informação, que foi a seguinte:

i – Nos termos do n.º 9 do artigo 113.º do Código de Processo Penal, a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão deve ser notificada tanto ao defensor como ao condenado.

ii – O condenado em pena de prisão suspensa continua afecto, até ao trânsito da revogação da pena substitutiva ou à sua extinção e, com ela, à cessação da eventualidade da sua reversão na pena de prisão substituída, às obrigações decorrentes da medida de coacção de prestação de termo de identidade e residência (nomeadamente, a de «as posteriores notificações serão feitas por via postal simples para a morada indicada»).

iii – A notificação ao condenado do despacho de revogação da suspensão da pena de prisão pode assumir tanto a via de «contacto pessoal» como a «via postal registada, por meio de carta ou aviso registados» ou, mesmo, a «via postal simples, por meio de carta ou aviso» [artigo 113.º, n.º 1, alíneas a), b), c) e d), do Código de Processo Penal].

Dir-se-ia, perante esta jurisprudência que a situação do requerente seria processualmente correcta uma vez que a decisão que revogou a pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão foi notificada por via postal simples para a morada indicada pelo requerente que constava do TIR, sendo a carta depositada no receptáculo respectivo em 2018.07.09, como consta dos autos.

Há, porém, outro dado que não pode deixar de ser levado em conta. O das alterações introduzidas pela Lei nº 20/2013, de 21 de Fevereiro.

Com este diploma, ao nº 3 do art. 196º foi aditada a alínea e) impondo que sendo prestado o TIR o arguido seja advertido também, de que em caso de condenação esse TIR, essa medida de coacção, só se extinguirá com a extinção da pena.

Como complemento desta alteração a alínea e) do nº 1 do art. 214º que tem como epigrafe “Extinção das medidas” (de coacção) foi também alterada daí resultando que as medidas de coacção se extinguem de imediato, além do mais, com o trânsito em julgado da sentença condenatória – como já se previa na redacção até aí vigente – à excepção do TIR que só se extinguirá com a extinção da pena.

As alterações mencionadas fazem toda a diferença face à situação processual do requerente acabando até por, de certo modo, pôr em cheque a doutrina do Acórdão nº 6/2010.

Porquê?

É possível, agora, fazer a notificação do despacho que haja revogado a suspensão da execução da pena por via postal simples como preconizou o acórdão mas para tal é preciso que, ao ser prestado o TIR, o arguido seja advertido que a validade deste vai para além do trânsito em julgado da sentença condenatória; que se não extingue com esta mas somente com a extinção da pena.

Ora, é este requisito que falta no caso presente.

A validade do TIR prestado pelo requerente e, por conseguinte, a possibilidade de este ser notificado por via postal simples passou a ser condicionada pela advertência que se tornou obrigatória de essa mesma validade e as obrigações dele decorrentes persistirem para lá do trânsito em julgado da sentença condenatória alargando-se até ao momento da extinção da pena.

É esta alteração da lei que justifica uma divergente interpretação da doutrina do acórdão tal como o permite o art. 445º, nº 3, parte final.

Em rigor e dito de outro modo, para a aplicação da jurisprudência fixada era mister que o requerente oportunamente tivesse prestado um novo TIR de acordo com a prescrição actual do nº 3 do art. 196º implicando a sobredita advertência a respeito do momento da extinção da medida de coacção.

Como isso não aconteceu, a conclusão é a de que no momento em que se procedeu à notificação por via postal simples a medida de coacção estava já extinta esvaziando-se desse modo a “presunção” de notificação feita para a morada indicada no TIR.

Implicando, pois, a notificação pessoal do requerente do despacho que revogara a prisão preventiva.

Essa notificação não teve lugar logo o referido despacho não transitou.

Este é, de resto, um entendimento já seguido anteriormente designadamente no Acórdão de 2017.06.08[4].

Do que decorre – embora por razões diversas das invocadas na petição – ser ilegal a prisão do requerente pois foi motivada por facto que a lei não permite, a saber, ordenada por despacho não transitado.

Uma última e breve nota para frisar que a questão sobrante colocada pelo requerente acerca da nomeação de defensor oficioso e da quebra de confiança do requerente naquele que em tempo lhe foi nomeado (Dr. ...) não é nem pode ser fundamento de um pedido de habeas corpus por não comportar qualquer situação de patente ilegalidade enquadrável mormente na alínea b) do nº 2 do art. 222º. A excepcionalidade da medida não permite que seja passível de ser usada como alternativa aos meios processuais ordinários, a menos que estes se revelem manifestamente insuficientes para dar resposta imediata e eficaz à situação de prisão ilegal o que não é o caso a respeito da nomeação de defensor oficioso.

De resto, como foi claramente explicado ao requerente, no despacho proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, de 2018.01.30, para a substituição de um defensor oficioso por «quebra de confiança» não basta a alegação de divergência quanto aos termos e rumo da defesa.

No dito despacho salientando-se a circunstância de ter havido já nomeação de cinco defensores oficiosos fez-se notar que o direito de defesa é estabelecido a favor do arguido mas também do valor da justiça e por isso o defensor é um órgão da administração da justiça que não tem de estar ao serviço do arguido e das suas opiniões. E, finalmente, deu-se nota da circunstância de os autos denotarem um uso anormal dos meios processuais por parte do ora  requerente.

Dir-se-ia, em síntese, ser porventura de convocar o antigo e famoso adágio atribuído ao pintor grego Apeles: «ne sutor ultra crepidam judicaret».

                                           *

6. – Em face do que, embora por motivo diverso do invocado, se decide deferir o presente pedido de habeas corpus apresentado por AA determinando a sua imediata libertação.

Sem tributação.

Feito e revisto pelo 1º signatário

Nuno Gomes da Silva (Relator)

Francisco Caetano

-----------------------
[1] Cfr, neste sentido, v.g. o Código de Processo Penal Anotado, vol I, pag. 1371, dos Cons. Simas Santos e Leal-Henriques.
[2] Cfr designadamente os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 2017.03.02, 2017.09.14 e 2018.05.24, nos processos nºs 329/10.0JAFAR-A.S1, 404/11.3PULSB-C.S3 e 700/98.3PAOVR-B.S1, todos do relator do presente mas com voto de vencido.
[3] DR 99 SÉRIE I de 2010-05-21
[4] No processo 47/11.1PFAMD-A.S1 disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4d964edafb3cc8ed8025813d003c420b?OpenDocument