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RETRIBUIÇÃO
JUNTA DE FREGUESIA
ABONO POR FALHAS
ERRO MATERIAL
RETIFICAÇÃO
Sumário
I – No caso das autarquias locais a possibilidade de pagamento do abono para falhas aos trabalhadores que não detêm a categoria profissional de assistente técnico está no âmbito dos poderes do membro do Governo responsável pelas áreas da Administração Pública e da tutela respectiva.
II - Nestas situações, o reconhecimento do direito ao abono por falhas deixou de decorrer da lei, sem necessidade de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica, para passar a exigir decisão administrativa expressa que o reconheça de forma fundamentada, quer por referência às carreiras abrangidas, aos riscos efectivos, aos montantes anuais movimentados ou às responsabilidades que impedem sobre os funcionários para os quais o mesmo é solicitado, flexibilizando-se assim os critérios de atribuição do abono para falhas tendo-se presente a indispensável equidade entre o risco e a responsabilidade.
III – Para que a recorrente pudesse continuar a ter direito ao abono para falhas depois de 1/09/2009, impunha-se que houvesse despacho conjunto expresso e fundamentado nesse sentido proferido pelos membros da tutela do governo, o que nunca ocorreu como resulta da alínea B) dos pontos dos factos provados.
IV - O erro ou lapso manifesto que pode ser rectificado, ao abrigo do art.º 614º, nº 1, CPC, é apenas aquele cuja existência pressupõe uma divergência entre a vontade real do juiz e aquilo que escreveu na sentença e que não se pode confundir com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz disse aquilo que pretendia, mas julgou ou decidiu mal.
V – Para que o erro material possa ser rectificado, ao abrigo do disposto no n.º1 do art. 614.º do CPC, é necessário que ele seja apreensível através do contexto da sentença, de tal forma que possa ser percebido por outrem, que o juiz quis escrever uma coisa e escreveu outra.
VI - Se a sentença condena no pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação da ré até efectivo e integral pagamento em conformidade com o pedido deduzido pela autora, não é possível concluir por qualquer erro material no que respeita a juros, que seja susceptível de rectificação, porquanto, ainda que se tenha como certo poderem ser outros os juros devidos, nada se disse na sentença que permita concluir que o erro em causa não seja um erro de julgamento, insusceptível por isso de rectificação.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães
APELANTE: A. M. APELADA:JUNTA DE FREGUESIA X.
Tribunal Judicial da Comarca de Barga, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Famalicão
I – RELATÓRIO
A. M., residente na Rua (...), Nine, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra JUNTA DE FREGUESIA X, com sede no Loteamento (...), Nine, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 9.517,29€ a título de créditos laborais, acrescida de juros de mora vincendos, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alega em resumo que no período compreendido entre 1/02/2002 e 21/07/2006 trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da ré, exercendo funções de assistente administrativa, tendo por determinação da Ré manuseado e teve à sua guarda, na área da tesouraria e cobrança, valores, numerário, títulos e documentos, pelos quais era responsável, devendo por isso ter recebido abono para falhas o que nunca sucedeu. Calculou a autora o valor de tal abono até ao ano de 2009 no valor de 5% sobre o vencimento correspondente à categoria de ingresso de carreira de tesoureiro e, desde 2009 inclusive até à cessação do contrato, no valor de €86,29 mensais.
A Ré contestou, negando que a Autora tivesse direito ao recebimento de tal abono, acrescentando que no caso para que fosse reconhecido o abono para falhas teria de existir uma decisão administrativa expressa, sendo certo que nunca foi formulado qualquer pedido nesse sentido.
Os autos prosseguiram os seus trâmites normais e realizado o julgamento foi proferida sentençapela Mma. Juiz a quo, que terminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente por provada a acção e, consequentemente:
a) Condeno a ré a pagar à autora, a título de abono para falhas pelo trabalho prestado de 2002 a 2008, a quantia de 1.784€, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação da ré até efectivo e integral pagamento; e b) No mais, absolvo a ré do pedido. Custas pela autora e ré, na proporção do decaimento. Registe e notifique.”
Inconformada com esta sentença, dela veio a Autora interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões:
1. O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida em 1ª instância, na parte em que absolveu a ora Recorrida do pedido de condenação em pagamento à Recorrente da quantia de 7.773,29€ (sete mil setecentos e setenta e três euros e vinte e nove cêntimos) a título de créditos laborais e juros de mora. 2. Na douta sentença proferida, entendeu o Venerando Tribunal de 1ª instância que “Afigura-se-me, assim, inquestionável que as funções que a autora concretamente exerceu se enquadram no artigo 2º do DL 4/89, de 6/01, donde seria de lhe atribuir o reclamado abono para falhas.”, questionando-se logo de seguida, na ótica da Recorrente erradamente, se “Importa, porém, apreciar da invocada necessidade de uma decisão administrativa que determinasse o pagamento à autora daquele abono.”. 3. Conclui, porém, o Venerando Tribunal de 1ª Instância que “De facto, não obstante as funções que exerceu envolverem, inquestionavelmente, o manuseamento de dinheiro, a verdade é que a concessão daquele abono deixou de depender de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica, passando a ser exigida uma decisão administrativa expressa que o reconheça de forma fundamentada, tal como determina o ponto 5º do Despacho n.º 15409/2009, do Ministério das Finanças e da Administração Pública. Como resulta plasmado na matéria provada, tal despacho nunca foi proferido – cfr. ponto B), parte final. Não se diga, ainda, como faz a autora na resposta à contestação que tal se deve à inercia da ré, já que era a Autora que deveria ter levado a cabo aquele pedido a deliberação da junta de freguesia – órgão com competência para a sua apreciação – que, naturalmente, tinha o dever de sobre o mesmo se pronunciar e, perante a recusa da sua atribuição deveria sim ter reagido judicialmente, com vista à reapreciação da legalidade e bondade daquela decisão. (…)” acabando, com base no exposto supra, por decidir o Tribunal ad quo que “Em face do exposto, não pode proceder o pedido da autora quanto ao pagamento do abono para falhas relativo aos anos de 2009 a 2016.” 4. Não pode conformar-se, porém, a Recorrente com a interpretação que faz o Venerando Tribunal de 1ª instância do Despacho n.º 15409/2009, designadamente do seu n.º5, contra tal decisão se insurgindo nas presentes alegações, porquanto, no sentido da Recorrente, tal norma (que serve de fundamente jurídico àquela decisão) deve ser interpretada e aplicada doutra forma (cfr. art.º 639º, n.º2 al. b) do CPC). 5. Dispõe o n.º 5 do Despacho n.º 15409/2009 o seguinte: “5 – O reconhecimento do direito a abono para falhas a trabalhadores integrados noutras carreiras, ou titulares de outras categorias, efetua-se mediante despacho conjunto dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública.”, 6. Donde de lado nenhum se retira, que a legitimidade para requerer tal atribuição do abono para falhas, ao contrário do que pretende fazer crer, e salvo o devido respeito, o Venerando Tribunal de 1ª instância, é do trabalhador, neste caso da Recorrente. Não se compreende, pois, como pode o trabalhador, vale dizer a Recorrente, que se encontra numa posição fragilizada perante a Entidade Patronal (recorrida), com constante receio de represálias, ser ele, de mote próprio, o legítimo requerente da atribuição. 7. O procedimento é, ao contrário do invocado, ser a própria entidade patronal, neste caso a Recorrida, a analisar o estatuto e as funções dos trabalhadores ao seu serviço e a analisar da pertinência da atribuição do abono para falhas, mercê das funções exercidas, sem que para tal tenha de existir a entrega de um requerimento formal à Junta de Freguesia pela trabalhadora, e, em caso de indeferimento, tenha a mesma que tal ato impugnar. 8. Tanto assim é, que é a própria entidade patronal que tem de verificar se existem ou não funções para integrar na lista de atribuição de suplementos remuneratórios. 9. Ora, uma vez mais, em parte alguma desse diploma legal, consta que a obrigação de requerer a atribuição do aludido suplemento remuneratório impende sobre o trabalhador. Aliás, no art.º 5º deste Decreto-lei, que legisla a colocação na tabela única de suplementos, não consta que tenha de ser o trabalhador a requerer a sua inclusão, antes transparecendo que deve ser, pela entidade patronal, colocado na tabela única de suplementos, através dos procedimentos nessa norma constantes.´ 10. Concluindo, apesar de não ter sido proferida uma decisão administrativa expressa que concedesse à Recorrente o direito a abono para falhas neste período, não pode tal omissão ser, como parece fazer crer o Venerando Tribunal de 1ª instância, imputada à Recorrente, com base numa errónea interpretação do n.º 5 do Despacho n.º 15409/2009, devendo, antes, ser imputada à Recorrida, que detinha o ónus de, mercê das indubitáveis funções exercidas pela Recorrente que fundamentavam a atribuição do abono para falhas, levar a deliberação expressa da autarquia local essa atribuição. 11. Uma vez não o tendo feito, deve a Recorrida ser responsabilizada pelo pagamento de tais créditos, de cuja responsabilidade não pode ser libertada, uma vez que, se a deliberação expressa de atribuição do abono para falhas à Recorrente não aconteceu, tal omissão se deve, tão somente, à inércia da Recorrida, que, anos após anos, apesar das insistências da Recorrente, foi sempre adiando e postergando tal concessão. 12. Sem prescindir, o que apenas por mera cautela de patrocínio se equaciona: Sempre dirá a Recorrente que, caso a atribuição do abono para falhas pela Recorrida tivesse acontecido em data anterior à alteração legislativa desta matéria, uma vez que esse direito a abono para falhas já lhe teria sido atribuído (conforme resultou provado ter direito a Recorrente na douta sentença proferida pelo Venerando Tribunal de 1ª instância), já não estaria, na ótica da interpretação do Tribunal de 1ª instância do n.º5 do Despacho n.º 15409/2009, depende do requerimento para deliberação expressa da autarquia local para a sua atribuição, porquanto, nesse caso, tratar-se-ia apenas de uma reavaliação à necessidade da sua permanência, o que não se coaduna, de todo, com o Acórdão que é alocado pelo Venerando Tribunal de 1ª instância. 13. Mercê de todo o supra exposto, deve reconhecer-se o erro na interpretação do n.º 5 do despacho n.º 15409/2009, proveniente do ministério das finanças e da administração pública, publicado no DR de 08/06, II, n.º30, nos termos do disposto no art.º 639º, n.º2 b) do CPC, e, consequentemente, ser REVOGADA a sentença recorrida, condenando-se, também, a Recorrida ao pedido formulado pela Recorrente (ora Autora) quanto ao pagamento do abono para falhas relativo aos anos de 2009 a 2016, na quantia de 7.248,36€ (sete mil duzentos e quarenta e oito euros e trinta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor. 14. Cumpre ainda ressalvar que na douta sentença proferida em 1ª instância verifica-se existir uma inexatidão devida a omissão ou lapso manifesto do Venerando Tribunal, nos termos do disposto no art.º 614º, n.º1 do CPC, que se consubstancia no facto de não ter sido considerada na douta decisão o montante relativo a juros de mora vencidos, relativos pelo menos ao período entre 1 de abril de 2002 e 1 de janeiro de 2009, que devidamente foram indicados e peticionados na petição inicial e que, mercê da matéria de facto dada como provada, devem ser reconhecidos à Recorrente. 15. Após calcular individualizadamente estes dois períodos, mercê da aplicação de dois diplomas legais diferentes a cada um dos períodos, a Recorrente termina no art.º 31.º da petição inicial a concluir que “Mercê do supra exposto, tem a Autora a receber a título de créditos laborais de suplemento remuneratório a quantia global de 9.032,36€ (nove mil e trinta e dois euros e trinta e seis cêntimos), correspondente ao período de duração do contrato desde 1 de abril de 2002 a 21 de julho de 2017.”, procedendo, posteriormente no art.º 32º ao cálculo de juros de mora vencidos, aplicados à globalidade do montante em dívida pela Ré. 16. Assim, conclui no seu art.º 33º com a inserção do seu crédito global sobre a Recorrida, consubstanciando-se o mesmo em 9.517,29€ (nove mil quinhentos e dezassete euros e vinte nove cêntimos), montante este que já inclui, conforme supra densificado, os juros de mora vencidos. 17. Motivo pelo qual, a Recorrente, no seu pedido, peticiona a condenação da Recorrida ao pagamento da quantia de 9.517,29€ (nove mil quinhentos e dezassete euros e vinte e nove cêntimos) (que, reitera-se, já INCLUI os juros de mora vencidos), acrescida de juros de mora vincendos, desde a citação até efetivo e integral pagamento, a título de créditos laborais relativos ao suplemento remuneratório de abolho para falhas. 18. Sucede que, mal andou o Venerando Tribunal de 1ª instância, o que se pressente ser tão somente uma inexatidão devida a omissão ou lapso manifesto, ao, na douta sentença, designadamente na fundamentação, concluir que: “Ao valor de 1.784,00€, relativo a abono para falhas devido à autora pelo trabalho prestado de 2002 a 2008, acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data de citação da ré – tal como esta peticiona – até efetivo e integral pagamento.” E na decisão, concluir que:“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente por provada a ação e, consequentemente: a) Condeno a ré a pagar à autora, a título de abono para falhas pelo trabalho prestado de 2002 a 2008, a quantia de 1.784,00€, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data de citação da ré até efetivo e integral pagamento; (…)” 19. Uma vez tendo o Venerando Tribunal de 1ª Instância concluído, com base na matéria de facto dada como provada, que a Recorrente, mercê das funções exercidas, tem direito ao pagamento pela Recorrida do abono para falhas, pelo menos entre o período de 1 de abril de 2002 a 1 de janeiro de 2009, nunca o mesmo lhe tendo sido pago, e, considerando que no valor do pedido, isto é, nos 9.517,29€ (nove mil quinhentos e dezassete euros e vinte e nove cêntimos), estavam incluídos os montantes relativos ao abono para falhas relativo ao período entre 1 de abril de 2002 e 1 de janeiro de 2009, bem como os respetivos juros de mora vencidos, conforme supra explanado, 20. Na decisão do Venerando Tribunal de 1ª instância deveria constar, o que apenas por mera inexatidão devida a omissão ou lapso manifesto se justifica não ter sido considerado, que é também a Recorrida condenada ao pagamento à Recorrente dos juros de mora vencidos sobre o montante de 1.784,00€ (mil setecentos e oitenta e quatro euros), correspondentes ao período mediado entre 1 de abril de 2002 a 1 de janeiro de 2009, conforme identificados no art.º 32º da petição inicial, e que se quantificam em 357,19€ (trezentos e cinquenta e sete euros e dezanove cêntimos). 21. Pelo que, deve o Tribunal de 1ª Instância proceder à correção da decisão contida na douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que condene a Recorrida ao pagamento à Recorrente, também, dos montantes relativos a juros de mora vencidos, respeitantes ao período entre 01 de abril de 2002 a 01 de janeiro de 2009, nos termos do art.º 614º do CPC, e conforme peticionado no articulado de petição inicial e factos dados como provados na sentença, no valor de 357,19€ (trezentos e cinquenta e sete euros e dezanove cêntimos), o que, somado ao valor de 1.784,00€ (mil setecentos e oitenta e quatro euros), perfaz a quantia global de 2.141,19€ (dois mil cento e quarenta e um euros e dezanove cêntimos).”
Termina pugnando pela revogação da sentença recorrida.
Respondeu a Recorrida/Apelada defendendo a manutenção da sentença recorrida nos seus exactos termos.
Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida e efeito, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer, no sentido da improcedência do recurso.
Não foi apresentada qualquer resposta ao douto parecer.
Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II – OBJECTO DO RECURSO
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões da recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nela não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, que aqui se não detetam, no recurso interposto pela Autora/Apelante sobre o sentença recorrida, colocam-se à apreciação deste Tribunal da Relação as seguintes questões:
- Interpretação do disposto no n.º 5 do Despacho n.º 15409/2009 do Ministério das Finanças e da Administração Pública referente ao “abono para falhas”;
- Da rectificação de erro material da sentença, por inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto, nos termos do art. 614.º n.º 1 do CPC.
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Em 1ª instância deram-se os seguintes factos como provados:
A) Por contrato de trabalho escrito a termo celebrado em 1 de Abril de 2002, a ré admitiu a autora ao seu serviço para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de assistente administrativa, tendo tal contrato cessado no dia 21 de Julho de 2016. B) Nunca foi pago pela ré à autora abono para falhas, nem nunca houve decisão administrativa relativa à concessão daquele abono à autora. C) Durante o período de duração do contrato, por deliberação da ré, a autora ficou responsável, entre outras tarefas, por receber dinheiro em numerário/cheques pela emissão de licenças de canídeos; receber dinheiro em numerário/cheques das mensalidades da cantina escolar. D) Desde a abertura na ré do posto dos correios (Correios) em 2012 a até 2014, a autora, para além do referido em C), auxiliava a funcionária ali colocada, exercendo esporadicamente todas as tarefas inerentes à existência deste posto como: receber dinheiro dos pagamentos de luz, telefone, scut’s, aceitação de encomendas, remessa de correio; responsabilizar-se por todos os documentos e títulos emitidos e entregues e proceder ao pagamento das reformas. E) Desde a abertura na ré do segundo posto dos Correios em 2014, a autora, para além do referido em C), exerceu todas as tarefas inerentes à existência deste posto como: receber dinheiro dos pagamentos de luz, telefone, scut’s, aceitação de encomendas, remessa de correio; responsabilizar-se por todos os documentos e títulos emitidos e entregues e proceder ao pagamento das reformas.
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IV - APRECIAÇÃO DO RECURSO
1 -- Interpretação do disposto no n.º 5 do Despacho n.º 15409/2009 do Ministério das Finanças e da Administração Pública referente ao “abono para falhas”
Insurge-se a Recorrente quanto à interpretação dada ao n.º 5 do Despacho n.º 15409/2009 pelo tribunal a quo, da qual veio a resultar que por não ter sido requerido pela autora que fosse proferida decisão administrativa expressa que lhe concedesse o abono para falhas com efeitos reportados a 1/01/2009, não tem direito a este abono desde a referida data e até ao término do contrato de trabalho que manteve com a Ré. Defende a recorrente que tal omissão deve ser imputada à recorrida, que detinha o ónus de, mercê das indubitáveis funções exercidas pela Recorrente que fundamentavam a atribuição do abono para falhas, levar a deliberação expressa da autarquia local essa atribuição, e não o tendo feito deve ser responsabilizada pelo pagamento do abono para falhas.
Vejamos se lhe assiste razão
Uma vez que apenas está em causa a atribuição do abono para falhas a partir de 1/01/2009, visto que que o tribunal a quo deu provimento ao pedido formulado pela recorrente respeitante ao abono para falhas pelo trabalho prestado de 2002 a 2008, importa analisar os normativos aplicáveis à situação sub judice:
A partir de 01.01.2009, a abono para falhas na Administração Autárquica, passou a reger-se pelo Decreto-lei nº 4/89,de 06.01, alterado pelo Decreto-lei n.º 276/98, de 11.09, e revisto pela Lei nº 64-A/2008, de 31.12, pela Portaria nº1553-C/2008, de 31.12, e pelo Despacho nº15409/2009.
Resulta do art.º 2º da Lei n.º 64-A/2008, de 31/12 (Orçamento do Estado) que procedeu à alteração do DL n.º 4/89 o seguinte:
“1 – Têm direito a um suplemento remuneratório designado “abono para falhas” os trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis.” 2 – As carreiras e ou categorias, bem como os trabalhadores que, em cada departamento ministerial, têm direito a “abono para falhas”, são determinadas por despacho conjunto do respectivo membro do Governo e dos responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.”
A Portaria n.º 1553-C/2008, que regulamentou a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, fixou o montante pecuniário do “abono para falhas” no valor de €86,29, sendo este o valor de tal suplemento desde 1/01/2009.
Por fim, o Despacho n.º 15409/2009 do Ministério das Finanças e da Administração Pública, publicado no DR de 08/07, II, n.º 130, veio regular o direito ao abono para falhas nas autarquias locais, nos seguintes termos que passamos a transcrever:
“O suplemento remuneratório designado «abono para falhas», regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de Setembro, foi já objecto da revisão a que se reporta o artigo 112.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, através da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, tendo já sido fixado o seu valor pela Portaria n.º 1553-C/2008, de 31 de Dezembro.
No entanto, o reconhecimento do direito ao seu abono depende da identificação das carreiras e ou categorias, bem como dos trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis.
Atendendo a que, no actual elenco das carreiras, não existe qualquer carreira ou categoria inequivocamente associada a esta área, como anteriormente acontecia com a carreira de tesoureiro, e ao facto de os trabalhadores nela integrados terem transitado para a carreira e categoria de assistente técnico, reconhece-se o direito a esse abono aos trabalhadores integrados nessa carreira e categoria que ocupem postos de trabalho nas áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos.
Atende-se, ainda, ao caso específico da administração local, reconhecendo o mesmo direito aos trabalhadores das autarquias que sejam titulares da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico e que se encontrem nas mesmas condições, bem como aos trabalhadores integrados na categoria subsistente de tesoureiro-chefe.
No que respeita ao reconhecimento do direito ao abono para falhas a trabalhadores que ocupem postos de trabalho cuja carreira e categoria não seja a de assistente técnico, deverá o mesmo concretizar-se, em cada departamento ministerial, mediante despacho conjunto do membro do Governo responsável pelas áreas da Administração Pública e da tutela respectiva. (sublinhado nosso)
Assim:
Nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de Setembro, e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, determina-se o seguinte:
1 - Têm direito ao suplemento designado «abono para falhas», regulado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de Setembro, e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportem às áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos. 2 - Nas autarquias locais, têm ainda direito ao suplemento a que se refere o número anterior os trabalhadores titulares da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico que se encontrem nas mesmas condições, bem como os titulares da categoria subsistente de tesoureiro-chefe. 3 - O montante pecuniário do abono para falhas é o que se encontra fixado na portaria a que se refere o n.º 2 do artigo 68.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro. 4 - Nos termos dos n.os 4 e 5 do artigo 73.º da Lei n.º 12-A/2008, o abono para falhas é apenas devido quando haja efectivo exercício de funções e enquanto perdurarem as condições que determinaram a sua atribuição. 5 - O reconhecimento do direito a abono para falhas a trabalhadores integrados noutras carreiras, ou titulares de outras categorias, efectua-se mediante despacho conjunto dos membros do Governo da tutela e das Finanças e da Administração Pública. 6 - O presente despacho produz efeitos a 1 de Janeiro de 2009, relativamente aos trabalhadores que nessa data se encontrassem nas condições para o reconhecimento do direito ao abono para falhas.”
Resulta do transcrito despacho ministerial que o direito à percepção de abono para falhas está dependente de dois requisitos cumulativosa categoria e a ocupação de posto de trabalho que, no respectivo mapa de pessoal, seja caracterizado como reportando-se às áreas de tesouraria ou cobrança. A que acresce dizer que no caso das autarquias locais a possibilidade de pagamento do abono para falhas aos trabalhadores que não detêm a categoria profissional de assistente técnico está no âmbito dos poderes do membro do Governo responsável pelas áreas da Administração Pública e da tutela respectiva.
Assim, nestas situações, o reconhecimento do direito ao abono por falhas deixou de decorrer da lei, sem necessidade de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica, para passar a exigir decisão administrativa expressa que o reconheça de forma fundamentada, quer por referência às carreiras abrangidas, aos riscos efectivos, aos montantes anuais movimentados ou às responsabilidades que impedem sobre os funcionários para os quais o mesmo é solicitado, flexibilizando-se assim os critérios de atribuição do abono para falhas tendo-se presente a indispensável equidade entre o risco e a responsabilidade.
Daqui resulta que para que a recorrente pudesse continuar a ter direito ao abono para falhas depois de 1/09/2009, impunha-se que houvesse despacho conjunto expresso e fundamentado nesse sentido proferido pelos membros da tutela do governo, o que nunca ocorreu como resulta da alínea B) dos pontos dos factos provados.
Com efeito, a recorrente não era titular da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico nem era titular da categoria subsistente de tesoureiro-chefe, daí a necessidade/obrigatoriedade do reconhecimento do direito a abono para falhas a efectuar mediante despacho conjunto dos membros da tutela do governo e das Finanças e da Administração Pública, tal como o previsto no despacho n.º 15409/2009.
Em concordância com o defendido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 19/10/2012, disponível em www.dgsi.pt, no qual se escreveu a este propósito em situação idêntica “Resulta, pois, segundo cremos, que para que as associadas do recorrido pudessem continuar a ter direito a receber abono para falhas depois de ter entrado em vigor, em 01.01.2009, o regime renovado relativo a tal suplemento remuneratório, era imperioso que houvesse despacho expresso e fundamentado nesse sentido, no caso proferido pelo Presidente da CMC, o que, tanto quanto sabemos, nunca ocorreu.
Não obstante terem direito, ao abrigo do anterior regime, como reconhecemos acima, a receber abono para falhas, certo é que, uma vez alteradas as premissas da sua respectiva concessão, impunha-se reavaliar a situação jurídico-funcional das funcionárias em causa, a fim de se poder concluir pela manutenção, ou não, do referido abono.
E esta reavaliação envolverá momentos discricionários, próprios da Administração Autárquica, que o poder jurisdicional não pode nem deve ultrapassar sob pena de atentar contra a separação de poderes.
Daí que, em nosso entender, porque não estão em causa meros juízos vinculados, decorrentes apenas da lei, que poderiam ser feitos pelo TAF sem necessidade da prévia ponderação administrativa, terá razão o recorrente quando alega, neste segmento, desrespeito pelo princípio da separação de poderes.”
Em suma, ainda que a recorrente tivesse direito ao abrigo do anterior regime a receber abono para falhas, o certo é que uma vez alteradas as premissas para o seu recebimento, impunha-se apreciar a situação jurídico-funcional da funcionária a fim de se concluir pela manutenção ou não de tal abono, não restando qualquer dúvida que tal apreciação implica a actuação própria da administração autárquica, a ser requerida por quem nela tenha interesse, uma vez que tal envolve a prática de um acto administrativo que lhe reconheça esse direito.
Assim de acordo com os novos pressupostos de atribuição do abono para falhas a recorrente deveria ter requerido o reconhecimento do direito àquele abono, ao abrigo do disposto no artigo 2.º do DL n.º 4/89, de 6/01, com a redacção introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12, o que não fez, não podendo agora o tribunal se substituir à entidade administrativa para determinar a prática de um acto supostamente devido, mas que não foi requerido, pois dependendo a atribuição do abono para falhas, nestas situações da discricionariedade da administração local, não pode a mesma ser levada a cabo pelo tribunal, sob pena de violação do princípio da separação de poderes.
Ora, não decorrendo o direito ao abono para falhas reivindicado pela recorrente directamente da lei, antes dependendo de uma opção da junta de freguesia, junto da qual deveria ter sido solicitado por ela o reconhecimento de tal direito, o que não sucedeu não se mostra respeitado o momento discricionário de reconhecimento desse direito pela entidade administrativa, não se tendo sequer constituído o dever de decidir sobre o reconhecimento do direito ao abono para falhas à recorrente, com base no regime instituído desde 1/01/2009.
Assim e em concordância com o decidido pelo tribunal a quo diremos que há ré não incumbia qualquer iniciativa para que a autora/recorrente pudesse usufruir de tal abono, pois como se consignou em tal decisão “…era a autora que deveria ter levado a cabo aquele pedido a deliberação da junta de freguesia – órgão com competência para sua apreciação – que, naturalmente, tinha o dever de sobre o mesmo se pronunciar e, perante a recusa da sua atribuição deveria sim ter reagido judicialmente, com vista à reapreciação da legalidade e bondade daquela decisão.
O que não pode a autora é pretender que agora, sem nunca ter sido apreciado um pedido daquela natureza, o tribunal aprecie se lhe deve ou não ser pago o abono para falhas, já que, como como se referiu no citado Acórdão não estão em causa meros juízos vinculados, decorrentes apenas da lei, que poderiam ser feitos pelo tribunal, sem necessidade da prévia ponderação administrativa, sob pena de violação do princípio da separação de poderes.”
Em face do exposto improcedem as conclusões de recurso enumeradas de 1 a 13, sendo de manter nesta parte a decisão recorrida.
2 -Da rectificação de erro material da sentença, por inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto, nos termos do art. 614.º do CPC.
Insurge-se a recorrente quanto ao facto de a condenação em juros de mora ter sido determinada a contar da citação em vez, de conforme o por si peticionado, se condenar nos juros de mora vencidos contados desde o vencimento de cada obrigação, além dos vincendos desde a citação, alegando a existência de uma inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto do Tribunal nos termos do artº. 614.º n.º 1 do CPC.
Estabelece o n.º 1 do artigo 614.º do CPC. que “Se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas ou a algum dos elementos previstos no n.º 6 do artigo 607.º, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz”.
E estipula o art.º 249.º do CC. que “O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.”
Como é consabido proferida a sentença fica esgotado o poder jurisdicional do juiz, relativamente à decisão e aos seus fundamentos, podendo esta ser susceptível de rectificação nos estritos termos previstos no n.º 1 do citado artigo 614.º do CPC. ou seja no que respeita a erro de cálculo ou de escrita, revelado no contexto da declaração corporizada na sentença, omissão do nome das partes ou quanto a custas e inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto.
Não estando em causa nos presentes autos a omissão do nome das partes ou a omissão quanto a custas, o que importa saber é se a sentença proferida contém ou não um qualquer erro material que possa ser rectificado ao abrigo da norma citada.
Importa salientar, desde já, o facto do erro material não poder ser confundido com o erro de julgamento, sendo que apenas o primeiro pode ser corrigido por simples despacho, já que o erro de julgamento não é susceptível de rectificação ao abrigo da norma supra citada, apenas podendo ser reparado por via de recurso.
Como escreve o Prof. Alberto dos Reis (Código do Processo Civil Antado, vol. V, reimpressão, pág. 130) a propósito da distinção entre erro material e erro de julgamento.
“O erro material dá-se quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real…O erro de julgamento é espécie completamente diferente. O juiz disse o que queria dizer; mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos apurados. Está errado o julgamento. Ainda que o juiz, logo a seguir, se convença de que errou, não pode socorrer-se do art. 667º para emendar o erro”.
A existência de um erro material susceptível de rectificação tem que ser apreensível externamente, sob pena de se vir a permitir que o juiz possa emendar um erro de julgamento que tenham cometido. Por isso determina a lei que os erros susceptíveis de rectificação sejam devidos a omissão ou lapso manifesto, o que não pode deixar de significar que o erro tem que se manifestar com alguma clareza a quem leia o despacho ou sentença, de tal forma que possa ser percebido por outrem - que não apenas o juiz que os proferiu- que o juiz quis escrever uma coisa e escreveu outra.
Como se escreve a este propósito no Acórdão do STJ de 12.02.2009, proferido no processo nº 08A2680, consultável em www.dgsi.pt. “Quando o decisor se “engana”, tal pode ter como causa o erro material, o lapso manifesto ou o erro de julgamento. O primeiro (como se escreveu no Acórdão desta secção, com o mesmo relator, P.º 87/09): “na sua modalidade escrita (‘lapsus calami’) consiste na inexactidão, na expressão da vontade do julgador, por lapso notório, mais frequentemente traduzido em erros de escrita ou de cálculo. Mas é necessário que resulte evidente do texto essa decisão. Haverá, pois, uma divergência, clara e ostensiva, entre a vontade real do decisor e o que veio a ser exarado no texto. É um tipo de erro, tal como o descrito na lei substantiva (artigo 249.° do Código Civil) ‘...revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita...’. É tratado como uma sub-espécie de erro-obstáculo, que terá de ser constituído por um lapso ostensivo, não podendo existir fundada dúvida sobre o que se quis declarar. (cf. Prof. Manuel de Andrade — “Teoria Geral da Relação Jurídica”, n.° 134, VI; Conselheiro Rodrigues Bastos, “Das Relações Jurídicas”, III, 94).
Na visão processual do Prof. Castro Mendes, o ‘erro material ou lapso é a inexactidão ou omissão verificada em circunstâncias tais que é patente, através dos outros elementos da sentença ou até do processo, a discrepância com os dados verdadeiros e se pode presumir por isso uma divergência entre a vontade real do juiz e o que ficou escrito.’ (“Direito Processual Civil”, 1969, II, 313).”
Já no erro de julgamento (ou erro judicial) ocorre uma divergência entre a verdade fáctica ou jurídica e a afirmada na decisão.
O erro material – artigo 667.º do Código Civil – é corrigível por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz. Mas nunca interfere, decisivamente, com o mérito da decisão, tanto mais que terá de ser evidenciado pelo seu contexto cuja leitura atenta o torna perceptível face às premissas do silogismo judiciário. Já o erro de julgamento, por contender com o mérito, só pode ser motivador de recurso (impugnação perante instância superior). (sublinhados nossos).
Ora, em face do exposto e salvo o devido respeito por opinião em contrário, parece evidente que o eventual erro cometido na sentença proferida nos autos não poderá ser qualificado como erro material, no sentido de ter sido cometido um qualquer erro de cálculo, inexactidão ou lapso manifesto que seja susceptível de rectificação.
Com efeito, nada nos permite afirmar que exista alguma divergência entre o que se escreveu e o que se pretendia escrever. Se existe erro será um erro de julgamento que apenas poderia ser reparado em sede de recurso.
Na verdade no pedido formulado pela autora, esta peticiona a condenação da Ré no pagamento da quantia global de €9.517,29 a título de créditos laborais, acrescida de juros de mora vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Do pedido não resulta assim a reclamação da condenação em qualquer quantia devida a título de juros vencidos e por si liquidados, de forma a podermos concluir pela existência de qualquer lapso manifesto no que respeita a juros.
Ao invés a juiz a quo limitou-se a pronunciar quanto aos juros em conformidade com o pedido formulado pela Autora, não emergindo assim da sentença que tenha existido qualquer divergência entre aquilo que a juiz escreveu e aquilo que pretendia escrever de forma a podermos concluir que tal decisão padece de erro material que importa correcção.
Tal como se sumariou no acórdão da RE de 22/10/2015, proferido no proc. n.º 1692/12.3TBABT-L.E1 (relatora Elisabete Valente), disponível in www.dgsi.pt. “O lapso material manifesto da sentença consiste em escrever algo diferente do que se pretendia escrever e tem que emergir da sentença como uma divergência, clara e ostensiva, entre a vontade real do decisor e o que veio a ser exarado no texto.”
Assim, se a sentença condena no pagamento de juros de mora,à taxa legal, desde a data da citação da Ré até efectivo e integral pagamento em conformidade com o pedido deduzido pela Autora, não é possível concluir por qualquer erro material no que respeita a juros, que seja susceptível de rectificação, porquanto ainda que se tenha como certo poderem ser outros os juros devidos, nada se disse na sentença que permita concluir que o erro em causa não seja um erro de julgamento, insusceptível por isso de rectificação.
Mais não resta do que concluir pela improcedência do recurso.
V – DECISÃO
Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 87º do C.P.T. e 663º do C.P.C., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso de apelação interposto por A. M., confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Notifique
Guimarães, 18 de Outubro de 2018
Vera Maria Sottomayor (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Alda Martins