CONVENÇÃO DE HAIA DE 18/3/1970
OBTENÇÃO DE PROVAS NO ESTRANGEIRO EM MATÉRIA CIVIL E COMERCIAL
CARTA ROGATÓRIA PARA OBTENÇÃO DE CERTIDÃO DE DOCUMENTO DE PROCESSO A TRIBUNAL SUÍÇO
FORÇA PROBATÓRIA
LEGALIZAÇÃO PELO CONSULADO PORTUGUÊS
APOIO JUDICIÁRIO (ABRANGÊNCIA A CERTIDÕES)
Sumário


I) - Em obediência aos princípios do inquisitório e da cooperação que se encontram plasmados nos artºs 411º e 7º, nº. 4 do NCPC, quando alguma das partes alegue dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade, ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo, solicitando ou requisitando o documento em falta quando o mesmo seja necessário ao esclarecimento da verdade, assim se conferindo à parte uma verdadeira efetividade do acesso à justiça tal qual se mostra consagrado no artº. 20º da CRP.

II) – Demonstrada nos autos a insuficiência económica da parte que beneficia de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e tendo a mesma invocado dificuldades económicas para suportar os custos com a emissão de certidão de documentos que constam num processo que correu termos num tribunal suíço, pode o tribunal português pedir essa certidão, através de carta rogatória a ser enviada diretamente para a autoridade central cantonal designada pelo Estado suíço, que a deverá encaminhar para o tribunal suíço competente para o seu cumprimento, aplicando-se a Convenção de Haia de 18/03/1970, sobre a obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil ou comercial.

III) - A parte que beneficia do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, não tem que suportar os custos de certidões exigidas pela lei processual e emitidas por um tribunal estrangeiro, com vista a integrarem o processo para o qual o mesmo foi concedido.

IV) - Ao ser remetida carta rogatória pelo tribunal português a solicitar a um tribunal suíço o envio de certidão de três documentos que constam de um processo que ali correu termos, a certidão emitida por esse tribunal não necessita de ser legalizada pelo consulado português competente nos termos do artº. 440º do NCPC, para revestir força probatória em Portugal.

V) - A autoridade judiciária suíça que cumprir a carta rogatória terá de aplicar a sua lei interna, nos termos do artº. 9º da Convenção de Haia de 18/03/1970, e desde que a certidão seja elaborada em conformidade com a lex loci, aquele documento reveste a mesma força probatória que têm os documentos da mesma natureza elaborados em Portugal, só sendo de exigir a respetiva legalização se houver fundadas dúvidas acerca da sua autenticidade ou da autenticidade do seu reconhecimento.

Texto Integral


Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Na acção especial de prestação de contas movida por A. D. contra F. D., o Autor juntou, com a petição inicial, os documentos 6 a 13 redigidos na língua francesa, para prova dos factos alegados nos artºs 5º, 7º e 8º daquele articulando, protestando juntar a respectiva tradução certificada.

O Réu, na sua contestação, veio impugnar a genuinidade e força probatória dos documentos 6 a 13 juntos com a petição inicial, alegando, em síntese, que:

- tais documentos estão escritos em língua estrangeira, carecendo de ser apresentada a respectiva tradução nos termos do disposto no artº. 134º do Novo Código de Processo Civil (doravante NCPC);
- o documento 6 não reveste a forma de escritura pública ou equivalente, conforme imposto pelo artº. 2063º do Código Civil, tratando-se de um mero documento particular, dactilografado e no qual está aposta uma assinatura, alegadamente, da suposta repudiante da herança de A. P., sua mãe M. D.;
- a assinatura aposta nesse mesmo documento 6 não é da autoria de M. D., nem foi feita pelo seu punho;
- o documento 7 com o título Certificat d’Heritier não contém a legalização prevista como requisito essencial pelo artº. 440º do NCPC, sendo falso o seu conteúdo, pois há mais seis irmãos além do Autor e do Réu e nenhum destes teria renunciado à herança em causa.

Em 14/09/2017 veio o A. A. D. requerer a intervenção principal provocada de seus irmãos M. A., M. P., O. P., J. A., J. P. e D. P., como seus associados (refª. 26758677), a qual foi admitida por despacho proferido em 23/10/2017 (refª. 41643618).

Por requerimento apresentado também em 14/09/2017, com a refª. 26759017, veio o A. responder à impugnação da genuinidade e força probatória dos documentos juntos com a petição inicial, requerendo, entre outras diligências, que seja o Tribunal de 1ª instância a solicitar:

- à Justice de Paix du District de Morges, do cantão de Vaud, na Suíça, a emissão de certidão do documento 6 junto com a petição inicial, bem como do documento junto a fls. 38vº e 39 destes autos, que constitui o elenco de renúncias e aceitações da herança do falecido A. P. e no qual se comprova que apenas o A. aceitou a herança, documentos esses que constam do processo de sucessão nº. 102169 de 2008, que ali correu termos, e ao consulado português competente, a legalização dessas mesmas certidões;
- ao consulado português competente, a legalização do documento 7 junto com a petição inicial, que é um certificado emitido pela Justice de Paix du District de Morges no processo já referido, cujo original está em poder do A. e que juntou digitalmente aos autos, prontificando-se a entregá-lo em suporte físico naquele Tribunal para tal efeito.
Justifica esta sua pretensão com o facto de não ter capacidade económica para suportar os custos com o pedido e emissão das certidões dos documentos e sua legalização no consulado português, alegando ter-lhe sido concedido o benefício do apoio judiciário devido às suas dificuldades económicas.

As traduções dos aludidos documentos 6 a 13, constantes de fls. 19vº a 23, e do documento junto a fls. 38vº e 39, todos redigidos em francês, foram juntas aos autos em 10/05/2018 (refª. 1937272) e em 11/10/2018 (refª. 2101335).

Em 4/10/2018, o Tribunal “a quo” pronunciou-se sobre o aludido requerimento apresentado pelo A., proferindo o seguinte despacho que passamos a transcrever, na parte que ora interessa (cfr. fls. 40):

«Requerimentos datados de 14.09.2017 e 03.10.2018:
(…)
Já no que concerne ao pedido de certidão gratuita e respectiva legalização junto de tribunal estrangeiro, este tribunal não tem jurisdição para o efeito, ou seja, para determinar a tal tribunal o envio de tais elementos gratuitamente.
Adianta-se que o pedido de "legalização" de documentos não se trata de um acto que esteja abrangido pelo benefício do apoio judiciário, motivo pelo qual indefiro o requerido (pontos 4 a 10).
Notifique.
(…)»

Inconformado com tal decisão, o Autor dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]:

- O A. não se conforma com a parte do despacho de 04/10/2018 (refª 43015857) onde se recusa o requerimento probatório, que pede ao tribunal que solicite certidões, ao tribunal Suíço, de dois documentos e que determine a sua legalização consular, conforme é exigido pelo artigo 440º do C.P.C (pontos 6 e 10 do requerimento do A. de 14/09/2017 (Ref.ª 26759017 e 1641832) e de igual modo, não se conforma com o indeferimento do pedido de que seja o tribunal a solicitar, ao consulado português competente, a legalização do documento nº 7 junto à P.I.
- O despacho recorrido fundamenta o indeferimento em duas razões: a) - quanto ao pedido de documentos/certidões ao tribunal Suíço, refere não ter jurisdição para ordenar tal "envio" gratuitamente; e b) - quanto ao pedido de legalização, justifica que não é acto que esteja abrangido pelo apoio judiciário.
- Quanto ao primeiro fundamento, não está verdadeiramente em causa obtê-los gratuitamente, mas antes que o A. não poderá suportar os custos, se os pedir a título pessoal.
- Ora, efetivamente, o tribunal recorrido pode pedir tais documentos ao abrigo da Convenção de Haia de 1970, de 18 de março (sobre obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil e comercial; ratificada pelo Decreto nº 764/74 de 30 de Dezembro); ao que acresce que, nos termos de tal convenção, a regra até é de que tal pedido não está sujeito a custas ou outras taxas.
- Pelo que o despacho recorrido viola o disposto nesta convenção, nos artigos 411º e 436º, entre outros, do C.P.C, e na parte final do nº 1 do artigo 20º da Constituição.
- Mesmo que não existisse a referida Convenção de Haia, o tribunal recorrido sempre teria possibilidade de pedir tais certidões, nos termos gerais da lei processual, através de carta rogatória.
- Quanto ao fundamento para indeferir a legalização dos documentos, nos termos do artigo 440º do C.P.C, o mesmo implica uma violação direta do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 16º da Lei nº 34/2004, bem como da parte final do nº 1 do artigo 20º da Constituição.
- No caso concreto da alínea a) do nº 1 do artigo 16º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho; entendemos que os encargos, a que se refere este preceito, englobam também os encargos relativos à obtenção de certidões (que no caso em concreto poderão nem ter custos para o tribunal, em virtude do disposto na Convenção de Haia) e relativos à legalização de documentos estrangeiros, sendo que tal interpretação é imposta pelo preceito constitucional já referido (artigo 20º nº 1 in fine da Constituição).
- Aliás, uma interpretação da alínea a) do nº 1 do artigo 16º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, que exclua dos encargos aí previstos as despesas com a obtenção de certidões em tribunal estrangeiro e com a legalização consular de documentos estrangeiros, nos termos do artigo 440º do C.P.C., resulta em inconstitucionalidade de tal preceito, por violação do artigo 20º nº 1 da Constituição.
10ª - Assim, o peticionado nos pontos 6 e 10 do requerimento do A. de 14/09/2017 (Ref.ª 26759017 e 1641832) deverá ser deferido; devendo o tribunal recorrido fazer tal solicitação nos termos da Convenção de Haia de 1970 sobre obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil e comercial.
11ª - Do mesmo modo, deverá ser deferida a legalização consular dos documentos, pedida nos pontos 6, 8 e 10 do referido requerimento do A.

Termina entendendo que deve ser revogado o despacho recorrido e deferida a pretensão do A., determinando-se que o tribunal recorrido proceda às diligências consequentes.

Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido por despacho certificado a fls. 7.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do NCPC, aprovado pela Lei nº. 41/2013 de 26/6.

Nos presentes autos, o objecto do recurso interposto pelo Autor, delimitado pelo teor das suas conclusões, circunscreve-se às seguintes questões:

- Do indeferimento do pedido de obtenção de certidão de documentos que constam num processo existente em tribunal estrangeiro;
- Do indeferimento do pedido de legalização consular de documentos estrangeiros.

Com interesse para apreciação e decisão das questões em causa, há que ter em conta a dinâmica processual supra referida, em sede de relatório.

*
Apreciando e decidindo.

O recorrente insurge-se contra o despacho proferido em 4/10/2018, na parte em que indefere o requerimento por ele apresentado em 14/09/2017, para obtenção, pelo Tribunal “a quo”, da seguinte prova no estrangeiro:

- certidão do documento 6 junto com a petição inicial (fls. 19 vº destes autos) e do documento junto com o requerimento de 14/09/2017 (fls. 38vº e 39 destes autos), documentos esses que constam do processo de sucessão nº. 102169 de 2008, que correu termos num tribunal suíço (Justice de Paix du District de Morges, do cantão de Vaud), bem como a legalização dessas mesmas certidões pelo consulado português competente;
- legalização consular do documento 7 junto com a petição inicial (fls. 20 destes autos), que também consta do aludido “processo de sucessão” suíço, cujo original está em poder do A./recorrente e que este juntou digitalmente aos autos, prontificando-se a entregá-lo em suporte físico naquele Tribunal para tal efeito.

Pretende o recorrente o deferimento das diligências por ele requeridas, alegando, para tanto que:

a) - relativamente ao primeiro fundamento do indeferimento, o Tribunal “a quo” errou quanto à sua competência/jurisdição para pedir certidões ao tribunal estrangeiro, bem como quanto a poder obter tais documentos gratuitamente, não estando em causa obtê-los gratuitamente, mas antes que o A. não poderá suportar os custos, se os pedir a título pessoal, podendo o Tribunal recorrido pedir tais documentos ao abrigo da Convenção de Haia de 18 de Março de 1970, sobre obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil e comercial;
b) - quanto ao fundamento para indeferir a legalização dos documentos, nos termos do artº. 440º do NCPC (ou seja, o pedido de "legalização" de documentos não estar abrangido pelo benefício do apoio judiciário), o mesmo implica uma violação directa do disposto na al. a) do n.º 1 do artº. 16º da Lei n.º 34/2004 de 29/7, bem como da parte final do n.º 1 do artº. 20º da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), pois devido à situação económica do A. - que aqui não se discute, nem o Tribunal pôs em causa - ele está impossibilitado de obter tais documentos e de os legalizar de modo a poderem ser atendidos nos autos.

Vejamos se lhe assiste razão.

Conforme se alcança dos autos, o documento 6 junto com a petição inicial constitui uma declaração de repúdio da herança de A. P., que o A./recorrente alega ter sido feita por sua mãe M. D., no processo de sucessão nº. 102169, que correu termos no tribunal suíço - Justice de Paix du District de Morges, do cantão de Vaud – por óbito daquele seu irmão que era emigrante na Suíça, mas que se encontra assinada pelo R. que dispunha de uma procuração outorgada pela sua mãe a conferir-lhe poderes para o efeito, declaração esta elaborada numa folha com o timbre do tribunal suíço.

Por sua vez, o documento 7 junto com a petição inicial, intitulado “Certificat d’Heritier” (“Habilitação de Herdeiros”, conforme tradução junta aos autos em 11/10/2018), é um certificado emitido pela Justice de Paix du District de Morges no aludido processo de sucessão, no qual constam duas assinaturas (uma como sendo do juiz de paz e outra do oficial de justiça) e um carimbo da Justice de Paix du District de Morges, onde se faz referência ao falecimento de A. P. em 28/12/2007, à sua residência na Suíça e ao facto de ter deixado como único herdeiro legal o seu irmão A. D., aqui Autor.

Por último, o documento junto a fls. 38vº e 39 destes autos, com o título “Déclaration du décés – 2008.1896 DE P., Laissant pour seuls héritiers légaux” (“Declaração de Óbito -2008.1896 DE P., Deixando por únicos herdeiros legais”, conforme tradução junta aos autos em 10/05/2018), constitui o elenco de renúncias e aceitação da herança do falecido A. P., no qual consta que o A. A. D. (irmão do falecido) aceitou a herança e que a mãe M. D. e os restantes irmãos do falecido (os aqui R. F. D. e os chamados aos autos) renunciaram à mesma, documento esse que, segundo o recorrente, consta do supra mencionado processo de sucessão, estando elaborado em duas folhas com o timbre do tribunal suíço.

Por outro lado, conforme resulta de fls. 23vº a 24vº dos autos, foi concedido ao A./recorrente o benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, bem como de nomeação e pagamento da compensação de patrono.

O A. fundamenta o pedido formulado nos pontos 4 a 10 do seu requerimento, com o facto de beneficiar do apoio judiciário e não ter condições económicas para suportar os custos com a emissão de certidão pelo tribunal suíço e a legalização consular de tais documentos.

Como vimos, a Mª Juíza “a quo”, no despacho sob recurso, fundamenta o indeferimento do requerido pelo A., nos aludidos pontos 4 a 10, em duas razões:

a) - Quanto ao pedido de certidão de documentos junto do tribunal suíço e respectiva legalização consular, refere não ter jurisdição para determinar àquele tribunal o "envio" de tais elementos gratuitamente;
b) - Quanto ao pedido de “legalização” de documentos, entende que não se trata de um acto que esteja abrangido pelo benefício do apoio judiciário.

No que concerne ao pedido de certidão de documentos que constam de um “processo de sucessão” de um cidadão português, residente na Suíça, que correu termos num tribunal daquele país, salvo o devido respeito, não merece a nossa concordância o argumento aduzido pelo Tribunal “a quo” para indeferir tal pretensão do A., ora recorrente.

Importa, desde já, referir que assiste razão ao recorrente quando refere que não está em causa obter tais documentos gratuitamente, mas sim o facto dele não ter condições económicas para suportar os eventuais custos com a obtenção de tais elementos, se os pedisse a título pessoal, tendo sido a sua situação económica que terá motivado que lhe fosse concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade acima referida, e a possibilidade do tribunal português solicitar tais documentos a um tribunal estrangeiro ao abrigo de um instrumento jurídico internacional, que se aplica em sede de obtenção de provas em matéria civil ou comercial.

Por outro lado, de acordo com o disposto no artº. 411º do NCPC, que consagra o princípio do inquisitório, “incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.

Estatui, ainda, o artº. 7º, n.º 4 do NCPC, no âmbito do princípio da cooperação, que “sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo”.

Deste modo, para que o Tribunal se substitua à parte, carreando para o processo elementos probatórios, tem a mesma que alegar séria dificuldade em obtê-los por si.

Da conjugação destas disposições legais, não subsistem dúvidas de que a nossa lei processual civil consagra um verdadeiro poder-dever do juiz (cfr. acórdão da RC de 14/10/2014, proc. nº. 507/10.1T2AVR-C, acessível em www.dgsi.pt), uma “incumbência” do tribunal (cfr. Lopes do Rego, in Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed., 2004, Almedina, pág. 474), de tal modo que o seu não exercício faculta à parte requerente a possibilidade de recorrer do despacho.

Portanto, actualmente, em obediência aos mencionados princípios que se encontram plasmados nos referidos normativos, quando alguma das partes alegue dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade, ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo, solicitando ou requisitando o documento em falta quando o mesmo seja necessário ao esclarecimento da verdade, assim se conferindo à parte uma verdadeira efectividade do acesso à justiça tal qual se mostra constitucionalmente consagrada (artº. 20º da CRP).

Os documentos que o recorrente pretende sejam juntos aos autos devidamente certificados constam de um “processo de sucessão”, que correu termos num tribunal suíço, por óbito de um irmão do A., do R. e restantes intervenientes nestes autos, visando o A./recorrente, com a junção da referida certidão, fazer prova contra a impugnação da genuinidade e a ilisão da força probatória desses documentos já juntos a estes autos em formato digital, apresentada pelo Réu.

Está, pois, em causa a realização de uma diligência processual pelo Tribunal de 1ª instância junto de um tribunal suíço, a pedido do recorrente, para obtenção de prova documental existente num processo sucessório que ali correu termos.

Ora, nas relações entre Portugal e a Suíça, vigora a Convenção Sobre a Obtenção de Provas no Estrangeiro em Matéria Civil ou Comercial, concluída em Haia em 18/03/1970 (que passaremos a designar apenas por Convenção), cujo texto se encontra acessível em https://www.hcch.net/pt/instruments/conventions.

Esta Convenção vigora em Portugal desde 11/05/1975 (foi aprovada para ratificação pelo Decreto n.º 764/74 e publicada no D.R. – I série, n.º 302, 2º suplemento, de 30/12/1974) e, nos termos do artº. 8º, n.º 2 da CRP, vigora na ordem interna e vincula internacionalmente o Estado Português.

Por sua vez, a mesma Convenção também vigora na Suíça desde 1/01/1995 (cfr. https://www.hcch.net/en/instruments/conventions/specialised-sections/evidence).

Esta Convenção estabelece métodos de cooperação para a obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil ou comercial. Aplica-se apenas entre os Estados Partes (está disponível uma lista completa e actualizada de Estados Partes ou Contratantes da Convenção na "Secção
Prova" da página da Conferência da Haia em www.hcch.net) e prevê a obtenção de provas através de cartas rogatórias e de agentes diplomáticos ou consulares e de comissários.

De acordo com o disposto no artº. 1º da Convenção de Haia, a autoridade judiciária de um Estado contratante (Estado requerente) pode requerer, por meio de carta rogatória, à autoridade competente de outro Estado contratante (Estado requerido), a obtenção de prova ou de qualquer outro acto judicial, em matéria civil ou comercial, de acordo com o ordenamento jurídico do Estado requerido.

Esta regra está em harmonia com o direito interno português, já que o artº. 172º, n.º 1 do NCPC também prescreve que, quando a prática de actos processuais exigirem a intervenção dos serviços judiciários de autoridade estrangeira, pode a mesma ser solicitada a essa autoridade ou tribunal estrangeiro, através de carta rogatória.

Conforme se alcança da letra do preceito, trata-se de uma faculdade, cabendo ao tribunal, no uso desse poder discricionário conferido pela norma, e em face do seu prudente arbítrio e perante as circunstâncias concretas do caso, decidir se deve ou não ser expedida a carta rogatória (cfr. acórdão da RP de 25/10/2010, proc. nº. 1100/08.4TBSJM-A, acessível em www.dgsi.pt).

Estabelece, ainda, o artº. 2º da referida Convenção que “cada Estado contratante designará uma autoridade central que assuma o encargo de receber as cartas rogatórias emanadas de uma autoridade judiciária de outro Estado contratante e de as transmitir à autoridade competente para execução. A autoridade central será organizada em conformidade com a lei do Estado requerido”, sendo as cartas rogatórias remetidas à autoridade central do Estado requerido que tenha sido designada.

Nos termos deste artº 2º, a carta rogatória deve ser enviada directamente pelo tribunal português para a autoridade central designada pelo Estado requerido que, por sua vez, a encaminhará para a autoridade judicial competente do país para o seu cumprimento.

O artº. 9º, § 1 da Convenção prevê que a lei aplicável à obtenção de prova fruto de uma carta rogatória será a do Estado requerido, no que respeita às formalidades a seguir. No entanto, o § 2 do mesmo artigo abre a possibilidade do Estado requerente pedir que seja utilizado um procedimento especial na obtenção de prova no Estado requerido, a menos que tal procedimento seja incompatível com o direito interno deste, ou a sua execução não seja possível devido à praxe judiciária seguida ou em virtude de dificuldades de ordem prática.

Importa salientar que a Convenção de Haia de 1970 é um dos instrumentos fundamentais para a cooperação judiciária internacional.

Assim, no caso em apreço, o Tribunal “a quo” pode pedir a certidão dos documentos acima referidos, ao abrigo da mencionada Convenção de Haia de 1970, por meio de carta rogatória a ser enviada directamente para a autoridade central designada pelo Estado suíço.

No caso da Suíça, a autoridade central de destino da carta rogatória varia consoante o cantão.

A lista das autoridades centrais cantonais suíças e das línguas para as quais deve ser traduzida a carta rogatória, consoante o cantão, pode ser consultada na página da Conferência de Haia em https://www.rhf.admin.ch/rhf/fr/home/zivilrecht/behoerden/zentralbehoerden.html.

Ora, pretendendo o recorrente que seja emitida certidão de documentos constantes do processo de sucessão por ele referenciado, que correu termos no tribunal suíço - Justice de Paix du District de Morges, do cantão de Vaud – a autoridade central cantonal para onde deverá ser remetida a carta rogatória para obtenção da aludida prova documental será a seguinte:

Tribunal Cantonal de Vaud
Division Entraide Judiciaire
Palais de Justice de l’Hermitage
Route du Signal 8
1014 Lausanne ADM cant VD

Esta autoridade central cantonal, após receber a carta rogatória remetida pelo tribunal português, deverá encaminhá-la para o tribunal suíço competente para o seu cumprimento que, em princípio, será o tribunal onde se encontra o processo em questão.

No entanto, importa agora apreciar se, beneficiando o A. de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, deve o Tribunal proceder à realização de tal diligência para obtenção de prova no estrangeiro, quando o mesmo invocou que não pode obter os aludidos documentos em face da sua situação económica.

O mesmo é dizer: configura a alegação da insuficiência económica, a dificuldade séria de obtenção a que alude o artº. 7º, n.º 4 do NCPC?

Para responder a esta questão importa, desde logo, ter presente que “a efectividade da garantia do acesso à via judiciária implica, desde logo, a eliminação dos obstáculos de natureza económica, prosseguida pela legislação que regula o apoio judiciário” (cfr. Lopes do Rego, ob. cit., pág. 15).

A Lei n.º 47/2007 de 28/8, em concretização do artº. 20º da CRP, começa logo por afirmar no seu artº. 1º, n.º 1 que “o sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício, ou a defesa dos seus direitos”.

Por sua vez, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 6º, nº. 1 e 7º, nº. 1 da mesma Lei, têm direito à protecção jurídica – que reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário – aqueles que demonstrem estar em situação de insuficiência económica.

Considerada a existência de insuficiência económica do requerente do benefício do apoio judiciário, as modalidades de concessão do mesmo, encontram-se previstas no artº. 16º, encabeçadas no seu n.º 1, alínea a), pela “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, tendo sido esta uma das modalidades do apoio judiciário concedida ao ora recorrente.

Tal significa que, enquanto não lhe for cancelada a protecção jurídica concedida, nos termos do artº. 10º, o recorrente goza do referido benefício para todas as fases do processo e até ao seu trânsito em julgado, estando, por isso, processualmente demonstrada a sua insuficiência económica.

Estabelece o artº. 529º, nº. 3 do NCPC que “são encargos do processo todas as despesas resultantes da condução do mesmo, requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz da causa”.

Por seu turno, o artº. 532º, nº. 2 do NCPC rege sobre a responsabilidade pelo pagamento dos encargos, sendo a regra a de que os encargos são da responsabilidade da parte que requereu a diligência ou, quando tenha sido realizada oficiosamente, da parte que aproveita da mesma.

Este preceito é complementado pelo artº. 16º do Regulamento das Custas Processuais (doravante RCP), de cujo n.º 1, e para o que ora interessa, decorre que “as custas compreendem os seguintes encargos:

d) os pagamentos devidos ou pagos a quaisquer entidades pela produção ou entrega de documentos, prestação de serviços ou actos análogos, requisitados pelo juiz a requerimento ou oficiosamente, salvo quando se trate de certidões extraídas oficiosamente pelo tribunal;
f) os pagamentos devidos a quaisquer entidades pela passagem de certidões exigidas pela lei processual, quando a parte responsável beneficie de apoio judiciário”.

Os encargos são, grosso modo, as despesas que os processos em geral comportam diversas da taxa de justiça, sobretudo no âmbito da produção da prova dos factos em que o litígio se consubstancia (cfr. Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado, 5ª ed., 2013, Almedina, pág. 279).

Escreve Salvador da Costa (in ob. cit., pág. 285), que a alínea f) do nº. 1 do artº. 16º do RCP constitui “um normativo inovador, por virtude da condição constante da sua última parte relativa ao apoio judiciário, e reporta-se ao custo de certidões, exigidas pela lei processual, emitidas por quaisquer entidades.

A lei distingue, assim, entre as situações em que a parte responsável pelo pagamento do custo das certidões beneficie ou não do apoio judiciário, naturalmente na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e de encargos.

Na medida em que o apoio judiciário abrange os encargos com o processo, dir-se-á que ele é susceptível de cobrir o custo de certidões exigidas pela lei processual emitidas por terceiros com vista a integrarem o processo para o qual o mesmo foi concedido”.

No caso dos autos, está em causa o pedido de certidão de documentos a um tribunal estrangeiro e embora, nos termos do artº. 14º, § 1 da Convenção de Haia, a regra seja que tal pedido não está sujeito ao reembolso de taxas ou custas de qualquer natureza, o § 2 do mesmo preceito confere ao Estado requerido o direito de exigir que o Estado requerente o reembolse das custas ocasionadas pela aplicação de um processo especial solicitado pelo Estado requerente, em conformidade com o artº. 9º, alínea 2ª.

Todavia, caso o tribunal suíço venha a cobrar custos pela emissão da pretendida certidão, os mesmos constituirão encargos do processo, claramente abrangidos pelo benefício do apoio judiciário de que goza o recorrente, sendo o respectivo pagamento adiantado pelo IGFEJ.

O Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado que o direito de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional, consagrado no artº. 20º, n.º 1 da Constituição, implica a garantia de uma protecção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efectiva.

Ora, definido nestes termos o conteúdo essencial do direito fundamental de acesso aos tribunais, é manifesto que nele vai implicado o direito da parte economicamente carenciada a não ver negada ou substancialmente restringida a possibilidade de acesso a elementos essenciais de prova com exclusivo fundamento em dificuldades económicas já devidamente atestadas no processo, tendo para garantia desses direitos o legislador instituído o benefício do apoio judiciário (cfr. acórdão da RP de 21/03/2013, proc. nº. 3498/08.5TBVFR-B, acessível em www.dgsi.pt).

Deste modo, devemos concluir que, demonstrada nos autos a insuficiência económica do recorrente em face do benefício de apoio judiciário que lhe foi concedido na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e tendo o mesmo invocado o facto de ter dificuldades económicas para justificar o pedido feito ao Tribunal, tal configura a dificuldade séria para a obtenção dos documentos que, como tal, deve ser atendida pelo Tribunal, a quem incumbe remover tal obstáculo à boa instrução da causa, por força do princípio da cooperação que deve observar (cfr. acórdão da RC de 5/12/2012, proc. nº. 771/10.6T2OBR-B, acessível em www.dgsi.pt).

Nesta conformidade, incumbe ao Tribunal “a quo” suprir as dificuldades sérias do recorrente economicamente carenciado para obter os mencionados elementos probatórios, impondo-se, consequentemente, a revogação do despacho recorrido e a substituição por outro que determine o envio de carta rogatória à autoridade central cantonal da suíça acima identificada, ao abrigo da mencionada Convenção de Haia de 1970, a solicitar o envio de certidão dos documentos 6 e 7 juntos com a petição inicial e do documento junto a fls. 38vº e 39 destes autos, que constam do processo de sucessão nº. 102169 de 2008, que correu termos na Justice de Paix du District de Morges, do cantão de Vaud, na Suíça, por óbito de A. P..

Quanto ao pedido de legalização consular dos documentos acima referidos, nos termos do artº. 440º do NCPC, entendemos, salvo o devido respeito, que não andou bem o Tribunal “a quo” ao indeferi-lo com o fundamento de que não se trata de um acto que esteja abrangido pelo benefício do apoio judiciário.

Caso o Tribunal viesse a considerar necessária tal legalização dos documentos emitidos pelo tribunal suíço, para que pudessem ter força probatória nos autos, e tal acto implicasse custos, entendemos, na sequência do que atrás se deixou exposto, que esses custos estão englobados nos encargos a que alude a al. a) do nº. 1 do artº. 16º da Lei nº. 34/2004 de 29/7, por força do artº. 20º da CRP, não tendo o recorrente de suportar tais encargos por beneficiar do apoio judiciário.

Uma interpretação da al. a) do nº. 1 do artº. 16º da citada Lei nº. 34/2004 que exclua dos encargos aí previstos as despesas com a obtenção de certidões em tribunal estrangeiro e com a legalização consular de documentos estrangeiros, mediante pedido do tribunal português, constituiria uma violação do disposto no artº. 20º, nº. 1 da CRP.

Contudo, ao ser remetida carta rogatória pelo Tribunal “a quo” a solicitar a um tribunal suíço o envio de certidão de três documentos que constam de um processo que ali correu termos, consideramos que a certidão emitida por esse tribunal não necessita de ser legalizada pelo consulado português competente nos termos do artº. 440º do NCPC, para revestir força probatória nos autos.

Entendemos que o dispositivo do citado artº. 440º aplica-se apenas no caso de ser um particular ou uma entidade privada a pedir um documento a uma entidade estrangeira e pretender que esse documento passado em país estrangeiro faça prova em Portugal, e não ao caso dos autos em que é o tribunal português que solicita, por carta rogatória, a um tribunal suíço o envio de certidão de documentos que constam de um processo judicial.

A autoridade judiciária suíça que cumprir a carta rogatória terá de aplicar a sua lei interna, nos termos do artº. 9º da Convenção de Haia. E desde que a certidão seja elaborada em conformidade com a lex loci, aquele documento reveste a mesma força probatória que têm os documentos da mesma natureza elaborados em Portugal, só sendo de exigir a respectiva legalização se houver fundadas dúvidas acerca da sua autenticidade ou da autenticidade do seu reconhecimento (cfr. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2018, Almedina, pág. 510; acórdão da RL de 1/02/2011, proc. nº. 987/10.5YRLSB, acessível em www.dgsi.pt).

Assim, caso se suscitem tais dúvidas, poderá o Tribunal requerente, na carta rogatória, pedir ao tribunal suíço que, para além de certificar que os aludidos documentos estão conforme os que constam no processo que ali correu termos, faça constar da certidão a comprovação da autenticidade desses mesmos documentos segundo o direito suíço.

Por outro lado, acresce referir que, se o próprio tribunal suíço não levantou questões quanto aos documentos que foram juntos ao “processo de sucessão” identificado pelo recorrente, e na hipótese do aqui Réu ter intervindo naquele processo sem suscitar quaisquer questões em relação aos aludidos documentos (ou caso as tenha suscitado, as mesmas foram decididas pelo tribunal suíça e os documentos foram aceites), não faz sentido vir agora o R. impugnar documentos que ele sabia que tinham sido aceites pelo tribunal suíço.

Ao impugnar, nestes autos, documentos que alegadamente constam do aludido “processo de sucessão” e que foram aceites pelo tribunal suíço, o R. está a por em causa o próprio processo que correu termos na Suíça, o que contraria os princípios da cooperação internacional, da confiança e da reciprocidade, bem como a tentativa de uniformização de procedimentos entre os Estados.

Em face do acima exposto, entendemos que para a certidão emitida pelo tribunal suíço fazer prova em Portugal, não necessita de ser legalizada pelo consulado português naquele país, nos termos do artº. 440º do NCPC, razão porque se mantém o indeferimento do requerido pelo A. quanto a esta parte, embora por motivo diferente do consignado no despacho recorrido.

Nestes termos, procede parcialmente o recurso interposto pelo Autor.

SUMÁRIO:

I) - Em obediência aos princípios do inquisitório e da cooperação que se encontram plasmados nos artºs 411º e 7º, nº. 4 do NCPC, quando alguma das partes alegue dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade, ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo, solicitando ou requisitando o documento em falta quando o mesmo seja necessário ao esclarecimento da verdade, assim se conferindo à parte uma verdadeira efectividade do acesso à justiça tal qual se mostra consagrado no artº. 20º da CRP.
II) – Demonstrada nos autos a insuficiência económica da parte que beneficia de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e tendo a mesma invocado dificuldades económicas para suportar os custos com a emissão de certidão de documentos que constam num processo que correu termos num tribunal suíço, pode o tribunal português pedir essa certidão, através de carta rogatória a ser enviada directamente para a autoridade central cantonal designada pelo Estado suíço, que a deverá encaminhar para o tribunal suíço competente para o seu cumprimento, aplicando-se a Convenção de Haia de 18/03/1970, sobre a obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil ou comercial.
III) - A parte que beneficia do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, não tem que suportar os custos de certidões exigidas pela lei processual e emitidas por um tribunal estrangeiro, com vista a integrarem o processo para o qual o mesmo foi concedido.
IV) - Ao ser remetida carta rogatória pelo tribunal português a solicitar a um tribunal suíço o envio de certidão de três documentos que constam de um processo que ali correu termos, a certidão emitida por esse tribunal não necessita de ser legalizada pelo consulado português competente nos termos do artº. 440º do NCPC, para revestir força probatória em Portugal.
V) - A autoridade judiciária suíça que cumprir a carta rogatória terá de aplicar a sua lei interna, nos termos do artº. 9º da Convenção de Haia de 18/03/1970, e desde que a certidão seja elaborada em conformidade com a lex loci, aquele documento reveste a mesma força probatória que têm os documentos da mesma natureza elaborados em Portugal, só sendo de exigir a respectiva legalização se houver fundadas dúvidas acerca da sua autenticidade ou da autenticidade do seu reconhecimento.

III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Autor A. D. e, em consequência:

a) - revogam o despacho recorrido que deverá ser substituído por outro que determine o envio de carta rogatória à autoridade central cantonal da suíça acima identificada, ao abrigo da Convenção de Haia de 18/03/1970, sobre a obtenção de provas no estrangeiro em matéria civil ou comercial, a solicitar o envio de certidão dos documentos supra enunciados;
b) - mantêm o despacho recorrido quanto ao indeferimento do pedido de legalização consular das certidões emitidas pelo tribunal suíço, embora por motivo diferente do consignado naquele despacho.
Custas pelo recorrente na proporção do seu decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.
Notifique.
Guimarães, 17 de Janeiro de 2019
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

(Maria Cristina Cerdeira)
(Raquel Baptista Tavares)
(Margarida Almeida Fernandes)