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CONTRAORDENAÇÃO
ADMOESTAÇÃO
REGIME JURÍDICO DE ACESSO À ACTIVIDADE DOS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE PASSAGEIROS
Sumário
Não podermos “presumir” que a contra-ordenação, atenta a moldura contra-ordenacional aplicável, seja grave, ou muito grave, havendo para tal que ter em conta os interesses e valores jurídicos acautelados. O diploma legal n° 3/2001 de 10 de Janeiro - regime jurídico de acesso à actividade dos transportes rodoviários de passageiros, onde se encontra legalmente consagrada a contra-ordenação não faz uma distinção expressa quanto às contra-ordenações nele previstas, no sentido de as distinguir como leves, graves ou muito graves. Mas este diploma abrange matérias de organização e uniformização de procedimentos para fazer face à concorrência externa e interna das empresas de transporte para que seja garantida uma melhor qualidade de serviço de forma a possibilitar o exercício efectivo da actividade. São perante estes interesses que não outros, que se deve aferir da gravidade da contraordenação praticada, sendo certo que o âmbito desta abrange não só os casos em que a conduta se traduz numa situação pontual de não renovação do alvará, em que a empresa, no entanto tem vindo até aí a exercer a sua actividade regularmente, como os casos em que a empresa nunca teve o alvará em questão, situações estas que a nosso ver se situam a nível da sua gravidade nos respetivos extremos. Há que ter em conta a culpa diminuta e a ilicitude também diminuta, e uma vez que não se apurou que a arguida tivesse retirado qualquer benefício económico da prática da contra-ordenação, tratando-se de uma pequena empresa, não havendo registos de qualquer infracção anteriormente cometida, justificada se encontra a aplicação da pena de admoestação .
Texto Integral
Acordam, em conferência, na 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa
I RELATÓRIO
Em auto de contra-ordenação que correu termos junto DRET- Direcção Geral dos Transportes Terrestres, foi aplicada a “F..., Lda.”, a coima de € 5 100,00, por uma contra-ordenação p. e p. pelo artº 23, do DL nº3/2001 de 10 de Janeiro.”
Não se conformando com tal decisão, a recorrente impugnou-a judicialmente, nos termos do artº 59º do DL nº 433/82, de 27/10 (Regime Geral das Contra-Ordenações, adiante designado como RGCO), sustentando que deveria ter sido aplicada uma pena de admoestação
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Remetido o recurso ao Juízo Criminal Local do Funchal, do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, foi o mesmo admitido, e realizado julgamento foi proferida decisão que julgou procedente o recurso.
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Inconformada com essa decisão, o MºPº interpôs recurso, pretendendo a sua revogação, para tal apresentando as seguintes conclusões:
1. O presente recurso vem interposto da sentença de fls. 52 e seguintes destes autos que substituiu a coima de € 5.100,00 aplicada pela autoridade administrativa à sociedade arguida "F..., LDA.", assente na prática, por esta última, de uma contra-ordenação, prevista e punida pelo art. 23° do Decreto-Lei n° 3/2001, de 10 de Janeiro, por uma sanção de admoestação de acordo com o disposto no art. 51°, do Regime Geral das Contra-Ordenações (doravante R.G.C.O.).
2. Não há nenhum elemento de facto ou de direito que permita aceitar que a infracção imputada à arguida possa ser integrada no conceito de infracção de gravidade reduzida. Daí que entendamos não estar preenchido no caso vertente um dos pressupostos necessários à aplicação da admoestação prevista no art. 51° do R.G.C.O..
3. Na realidade, a sanção da admoestação só pode ser aplicada aos casos de contra-ordenações leves, por serem apenas estas as subsumíveis ao conceito de gravidade reduzida previsto no art. 51°, do R.G.C.O.
4. No caso sob apreciação observamos que embora o diploma legal n° 3/2001 de 10 de Janeiro, onde se encontra legalmente consagrada a contra-ordenação ora imputada à sociedade arguida, não faça uma distinção expressa quanto às contra-ordenações nele previstas, no sentido de as distinguir como leves, graves ou muito graves, a contra-ordenação em causa situa-se necessariamente no âmbito de uma contra-ordenação, pelo menos, grave.
5. Na realidade, se aceitarmos a tese do Tribunal A Quo plasmado na sentença sob recurso estaremos, salvo melhor opinião, a sufragar uma posição de banalização do ilícito em claro prejuízo do efeito da punição que visa a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma violada.
6. Não podemos esquecer que estamos perante a violação de uma obrigação legal cuja existência visa assegurar, nomeadamente, a garantia da segurança dos passageiros transportados em veículos de turismo, passando pela garantia da qualidade do serviço prestado em geral e da viabilidade financeira de quem o presta até à garantia da leal concorrência entre os agentes comerciais da área do transporte de passageiros.
7. Sem embargo, importa acrescentar, ainda neste contexto, dois outros aspectos importantes que necessariamente se extraem da matéria de facto dada como provada e que contribuem para a demonstração de que o caso sob análise encerra em si uma gravidade incompatível com uma mera censura simbólica e solene como é o caso da admoestação.
8. Posto isto, e embora a sociedade arguida deva ser punida efectivamente com uma coima e não com uma mera admoestação, entendemos igualmente que, ao abrigo do disposto nos arts. 17°, nrs. 1 e 2, e 18°, n° 3, do R.G.C.O., juntamente com o disposto no art. 72°, do Código Penal, ex vi art. 32° do R.G.C.O., e em face da factualidade emergente nos autos, deverá ter lugar uma atenuação especial da coima fixando-se esta no seu patamar mínimo, ou seja no valor € 2.500,00.
9. O Tribunal A Quo, ao ter considerado a infracção contra-ordenacional apreciada nos presentes autos como sendo de gravidade reduzida e ao aplicar, em consequência, à sociedade arguida uma sanção de admoestação violou, por errada aplicação e interpretação, o disposto conjugada e articuladamente nos arts. 21°, nrs. 1 e 2, e 23° do Decreto-Lei n° 3/2001, e 51°, do R.G.C.O., assim como violou paralelamente, por omissão na sua aplicação, o disposto nos arts. 17°, nºs. 2 a 4. e 18", n° 3, do R.G.C.O., tal como o disposto no art. 72° do Código Penal, ex vi art. 32° do R.G.C.O , em articulação com os normativos atrás referidos.
10. A correcta interpretação e aplicação conjunta e articulada de tais normativos impunha a conclusão no sentido da obrigatoriedade da aplicação de uma coima efectiva que, no caso em apreço, deverá traduzir-se no valor acima referido.
Face a todo o exposto, peticionamos a revogação da sentença proferida e a sua substituição por outra que negue a aplicação de uma sanção de admoestação no caso vertente e determine a efectiva condenação da sociedade arguida numa coima no montante de € 2.500,00, em virtude de se entender que, perante as circunstâncias particulares do caso concreto, haverá apenas lugar a uma atenuação especial da coima.
Termos em que, e nos mais de direito aplicáveis, deve o presente recurso ser integralmente provido conforme o ora requerido.
MAS VOSSAS EXCELÊNCIAS FARÃO, COMO SEMPRE, O QUE MELHOR FOR DE JUSTIÇA!
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O recurso foi admitido.
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A sociedade arguida "F..., LDA.", em resposta defendeu a improcedência do recurso e a confirmação da decisão recorrida, concluindo como segue:
I- As presentes contra-alegações destinam-se a evidenciar que os argumentos utilizados pelo Recorrido são contrários aos factos provados e são desprovidos de fundamentação idónea, o que só confirma que, com a interposição deste recurso se pretende protelar o desfecho de uma decisão perfeitamente justa.
II - A total falta da razão do Recorrido é captada directamente da sua incongruência na argumentação:
III- Primeiramente quando alega, que conforme decorre da factualidade dada como provada na sentença, que a sociedade arguida actuou com culpa reduzida (negligência inconsciente) não há nenhum elemento de facto ou de direito que permita aceitar que a infracção imputada à arguida possa ser integrada no conceito de infracção de gravidade reduzida, entendendo não estar assim preenchido no caso vertente um dos pressupostos necessários à aplicação da admoestação prevista no art. 51º do R.G.C.O., contudo, depois afirma que no caso sob apreciação o diploma legal nº 3/2001 de 10 de Janeiro, onde se encontra legalmente consagrada a contra-ordenação ora imputada à sociedade arguida, não faz uma distinção expressa quanto às contra-ordenações nele previstas, no sentido de distinguir como leves, graves ou muito graves (sublinhado nosso), concluindo de seguida, que a contra-ordenação em causa situa-se necessariamente no âmbito de uma contra-ordenação, pelo menos grave.
IV. Ora, salvo o devido respeito, a classificação da infracção deve ser aferida em função, não só do modo de execução e da natureza dos deveres violados, mas também, e muito, das suas consequências, não podendo resultar de uma interpretação individual.
V. Acresce que, o legislador no caso em apreço não procedeu a uma qualificação da contra-ordenação, sendo escassa, conforme referiu a Meritíssima Juiz A Quo, a conduta anti-social da recorrente.
VI. Pois bem, nenhum dos passageiros transportados foi vítima de acidente por força da infracção detectada
VII. Nem nunca em circunstância alguma esteve em perigo a segurança dos passageiros transportados no veículo em que foi detectada a inexistência de alvará, uma vez que este estava com a inspecção periódica em dia, e possuía seguro de responsabilidade civil válido.
VIII. A tudo isto acresce, como bem formulou a Meritíssima Juiz A Quo na sua douta decisão, que:
“- A infracção é de reduzida gravidade, não só porque e o legislador, no caso, não procedeu a uma classificação das contra-ordenações, sendo escassa a conduta anti-social da recorrente;
- A culpa da arguida encontra-se sensivelmente diminuída na medida em que actuou de forma negligente, (negligência inconsciente) em violação dos deveres de cuidado que ao caso cabiam;
- A ilicitude é diminuta, tendo a recorrente, logo que tomou conhecimento, diligenciado pela emissão de novo Alvará, o que lhe foi concedido;
- Não se apurou que tivesse retirado qualquer benefício económico da prática da contra-ordenação;
- Nem se apurou a situação económica da arguida, tratando-se, apenas, de uma pequena empresa;
- Havendo de considerar a conduta anterior e posterior do agente, não havendo registo de qualquer infracção.”
Por conseguinte, não restam dúvidas que a infracção agora em análise se reveste de reduzida gravidade.
IX- Nesta matéria, podemos invocar o Acórdão da Relação de Coimbra datado de 30 de Abril de 2014, processo nº 469/13.3TBCDN.C1, no qual se analisa uma questão idêntica a agora em apreço:
“Dispõe o artigo 51.º, n.º 1, do RGCO, que, “Quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”.
Tem sido entendido que, pese embora a inserção sistemática do preceito em causa no Capítulo III, do RGCO - “Da aplicação da coima pelas autoridades administrativas”, é de entender que a referência a “entidade competente”, usada na redacção do referido normativo, leva a que a admoestação possa ser aplicada, quer na fase administrativa, quer na fase judicial, ou seja, na fase de recurso judicial da decisão administrativa.
A gravidade da contra-ordenação depende do bem ou interesse jurídico que a mesma visa tutelar e, ainda, do eventual benefício retirado pelo agente da prática daquela e do resultado ou prejuízo causado.
Além disso, a gravidade da contra-ordenação pode, também, depender ou aferir-se a partir directamente da lei. É o caso, por exemplo, das contra-ordenações estradais em que o legislador as qualifica, em função da sua gravidade, como simples, graves e muito graves.
Pois bem, quanto às contra-ordenações ora em causa, o Decreto-Lei n.º 119/2009 não as qualifica, nos termos referidos, pelo que há que analisar, no caso concreto, a gravidade das contra-ordenações.”
X. Assim, não se encontra qualquer justificação dogmática apta a impedir o funcionamento da admoestação, como medida de substituição da coima, na fase jurisdicional do processo de contra-ordenação, verificados os pressupostos substantivos da sua aplicação.
XI. Ora, in casu ficou assente que a) a contra-ordenação praticada pela sociedade arguida é de reduzida gravidade, e tal facto é defendido pelo Recorrido, antes das suas conclusões de Recurso, no primeiro parágrafo, do título denominado “Da punição a aplicar à sociedade arguida no caso vertente”; b) a sociedade arguida agiu com negligência inconsciente; c) da prática da contra-ordenação não resultou qualquer dano ou benefício económico, mostrando-se adequada a sanção de admoestação.
XII. Nesta medida, o Tribunal A Quo ao aplicar à Recorrente uma sanção de admoestação não violou qualquer norma, ao contrário do que alega o Recorrido.
XIII. Nem muito menos adoptou uma banalização do benefício em claro prejuízo do efeito da punição (sublinhado nosso).
TERMOS EM QUE,
E nos que Vossas Excelências superiormente suprirão, e sem necessidade de mais amplas considerações, deverá o presente Recurso ser julgada improcedente, por não provada, e, consequentemente, confirmar a decisão proferida pelo Tribunal A Quo com todos efeitos legais, justamente porque não violou quaisquer preceitos legais, "maxime" os mencionados pelo Recorrido.
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Nesta Relação, a Exmª Procuradora Geral Adjunta subscreveu os termos e os fundamentos do recurso interposto emitindo parecer favorável ao mesmo.
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Colhidos os vistos, foram os autos remetidos à Conferência
Cumpre decidir.
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II FUNDAMENTAÇÃO
Na decisão recorrida foram considerados como provados os seguintes factos:
1. – No dia 15-02-2016, pelas 17:30 horas, o veículo-pesado de passageiros, matrícula ..-AQ-.., pertencente à arguida, circulava na ER 103, transportando 6 passageiros, sem a mesma possuísse alvará para a prestação de tal actividade (licença para efectuar transportes públicos nacionais de passageiros).
- O referido veículo anteriormente possuía o Alvará com o n.º ..-M-2010, que posteriormente foi substituído pelo Registo Nacional de Turismo n.º … (RNAVT), com validade até 13.12.15.
- Após a alteração de Alvará e recebido todos os documentos relativos ao mencionado veículo, foram arquivados em dossier próprio, não tendo o legal representante, nem os funcionários da sociedade arguida, detectado o prazo de validade do Alvará.
- Só após o levantamento do auto de notícia elaborado pela PSP a recorrente deu conta que o Alvará havia caducado, tendo, de imediato, efectuado novo pedido de Alvará, o qual veio a ser emitido a 18-03-2016, sob o n.º …/2010/M.
– A arguida, ao realizar o transporte público de passageiros, sem ser detentora de Alvará/licença para o efeito, não agiu com o cuidado a que estava obrigada e de que era capaz, confiando precipitadamente na não produção do facto.
– A arguida não tem averbada qualquer infracção.
A motivação da decisão de facto foi explicada como segue
A convicção sobre os factos provados formou-se com base na documentação constante destes autos e do processo administrativo de contra-ordenação, designadamente do teor da decisão administrativa de fls.19, o auto de notícia de fls. 5, doc. de fls. 13 a 17, respeitante à anterior e actual Alvará/licença, conjugado com o depoimento isento, coerente e objectivo da testemunha M..., Director de Serviços da recorrente, que confirmou os factos tal como eles vêm descritos na decisão administrativa, negando apenas que a recorrente tivesse conhecimento da falta de licença e quisesse cometer a infracção. Esclareceu, de modo convincente, as circunstâncias que rodearam a prática da infração, nos termos dados como provados.
Cremos pois que se fez prova que a arguida, à data, da infração desconhecia a caducidade do Alvará/licença emitido a 13.12.10, e válido até 13.12.15, e por tal facto, não agiu com a diligência necessária para cumprir com as obrigações legais inerentes ao exercício da atividade por si prosseguida e de que era capaz.
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O Direito
Atento o disposto no nº 1 do art. 75º do RGCO, os poderes de cognição deste tribunal abrangem apenas a matéria de direito.
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[1], sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P.[2].
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, a questão submetida à nossa apreciação é do tipo de pena, sendo que o recorrente/MºPº defende a atenuação especial da coima aplicada pela autoridade administrativa, co contrário da decisão recorrida que aplicou uma pena de admoestação à sociedade arguida.
O recorrente alegando, que a contra-ordenação imputada à arguida se deverá situar no âmbito de um contra-ordenação grave, afastando assim a possibilidade da aplicação da pena de admoestação, sendo que face ao grau de culpa deverá uma atenuação especial da pena.
Dispõe o art.º 51º do Dec-Lei nº 433/82, no seu nº 1, que “Quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”.
Ou seja são pressupostos que decorrem da constatação da reduzida gravidade da infracção (ilicitude) e da diminuição da culpa do agente.
No caso em apreço na decisão recorrida fundamentou-se a aplicação de uma coima em detrimento de uma admoestação nos seguintes termos: “A contra-ordenação imputada é punível com coima de € 5 000 a € 25 000, dado que a arguida é uma pessoa colectiva (artº 23º, do DL 3/2001 de 10/1). Em sede de impugnação judicial a arguida veio requer a aplicação da sanção de admoestação, por considerar preenchidos os pressupostos previstos no art. 51º do R.G.C.O. Efectivamente dispõe o art. 51º do RGCO: “1 - Quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação. 2 - A admoestação é proferida por escrito, não podendo o facto voltar a ser apreciado como contraordenação” A admoestação a que se refere o artigo 51º do R. G. C. O., não trata apenas de uma sanção/acto susceptível de ser aplicado na fase administrativa do processo mas, independentemente de o ser, é também uma verdadeira sanção de substituição da coima, traduzida na sua dispensa, aplicada na fase judicial, desde que verificados determinados pressupostos, pressupostos que decorrem da constatação da reduzida gravidade da infracção (ilicitude) e da diminuição da culpa do agente. - (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10/03/2010, Proc. N° 918/09.5TBCR.Cl, disponível na base de dados do ITU em www.dgsi.pt). Dispõe o artº 18º do DL nº 433/82, de 27/10, que “ determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática dacontra-ordenação. Quando houver lugar à atenuação especial da punição por contra-ordenação, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos a metade (nº3). Assim, considerando que: - a infracção é de reduzida gravidade, não só porque o legislador, no caso, não procedeu a uma classificação das contra-ordenações, sendo escassa a conduta anti-social da recorrente; - a culpa da arguida encontra-se sensivelmente diminuída na medida em que actuou de forma negligente, (negligência inconsciente) em violação dos deveres de cuidado que ao caso cabiam; - a ilicitude é diminuta, tendo a recorrente, logo que tomou conhecimento, diligenciado pela emissão de novo Alvará, o que lhe foi concedido; - não se apurou que tivesse retirado qualquer benefício económico da prática da contra-ordenação; - não se apurou a situação económica da arguida, tratando-se, apenas, de uma pequena empresa; - por último, há que considerar também a conduta anterior e posterior do agente, não havendo registo de qualquer infracção. Pelo exposto, entende-se que na situação sub judice a eficácia de uma mera repreensão mostra-se merecedora de confiança, representa uma censura suficiente do facto e, simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada, mostrando-se suficiente para que a arguida não volte a violar disposições legais nesta área.”
Subscrevemos por inteiro o acabado de transcrever, sendo de realçar que para além de a conduta da arguida ser de enquadrar-se num patamar da culpa que não é grave, e sim negligente, a nosso ver não se pode pretender que o limite máximo da moldura da coima aplicável, seja por si só, definidor da gravidade da contra-ordenação, justificando assim de imediato o afastamento da aplicação da admoestação, quando o próprio legislador, não previu tal hipótese, uma vez que não procedeu a uma classificação das contra-ordenações no diploma em causa.
Como tal não podermos “presumir” que a contra-ordenação, atenta a moldura contra-ordenacional aplicável, seja grave, ou porque não muito grave, havendo para tal que termos em conta os interesses e valores jurídicos acautelados.
No caso em apreço e conforme se afere do preâmbulo do respectivo preâmbulo, o diploma em causa, surgiu em virtude da “necessidade de uniformizar as regras aplicáveis ao transporte de passageiros, por forma a contribuir para uma dinamização do sector e das empresas face à concorrência interna e externa”, e de estabelecer “regras comuns de acesso à actividade, tanto para os transportes nacionais de passageiros como para os internacionais, tendo em vista garantir níveis qualitativos mais elevados na prestação de serviços e no campo do acesso ao mercado, são introduzidas algumas medidas inovadoras, por forma a possibilitar o exercício efectivo da actividade”.
E como tal o “diploma absorve as condições de verificação de aptidão profissional dos responsáveis das empresas que exercem ou pretendem exercer a actividade e as condições de avaliação da capacidade financeira, cujos detalhes estavam definidos por portarias. As matérias cujo conhecimento é obrigatório avaliar em exame de capacidade profissional e a organização dos exames constituem anexos ao presente diploma”
Ou seja, o diploma abrange matérias de organização e uniformização de procedimentos para fazer face à concorrência externa e interna das empresas de transporte e garantindo uma melhor qualidade de serviço de forma a possibilitar o exercício efectivo da actividade.
São perante estes interesses que não outros que se deve aferir da gravidade da contra-ordenação praticada, sendo certo que o âmbito desta abrange não só os casos em que a conduta se traduz numa situação pontual de não renovação do alvará, em que a empresa no entanto tem vindo até aí a exercer a sua actividade regularmente, como os casos em que a empresa nunca teve o alvará em questão, situações estas que a nosso ver se situam a nível da sua gravidade nos respetivos extremos.
No caso em apreço e conforme se referiu, na decisão recorrida há que ter ainda em conta, a culpa diminuta quer da culpa quer da ilicitude, e uma vez que não se apurou que a arguida tivesse retirado qualquer benefício económico da prática da contra-ordenação, que se trata de uma pequena empresa, não havendo registos de qualquer infracção anteriormente cometida, justificada se encontra a aplicação da pena de admoestação
Improcede assim na totalidade o recurso interposto
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III DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar não provido o recurso, mantendo a decisão recorrida nos termos supra expostos
Sem custas por o recorrente delas estar isento
(processado por computador e revisto pelo1º signatário- artº 64º nº 2 do Cod. Proc. Penal)
Lisboa, 23 de Janeiro de 2019
Vasco Freitas
Rui Gonçalves
[1] ( cfr. Prof. Germano Marques da Silva, "Curso de Processo Penal" III, 2ª ed., pág. 335 e jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada). [2] Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95.