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ADVOGADO
HONORÁRIOS
Sumário
1 - Em matéria de honorários a advogado, o «resultado da causa » é algo que, ainda que a título de "success fee", não pode ser valorado autonomamente como honorário ou retribuição. 2 - O «resultado obtido» é apenas e só, de sua natureza, um factor a ter em conta na fixação dos honorários. 3 - Não pode deixar de ser considerada, na moderação exigida na fixação de honorários, a circunstância de a ré ter entregado ao autor a prestação dos serviços jurídicos a pagar num tempo em que ele, autor, seu sobrinho, era um jovem estagiário de advocacia, a iniciar o seu estágio precisamente com o ilustre causídico que era, e continuou a ser, o advogado da ré. 4 - A quantia que vier a ser fixada a título de honorários vence juros desde a data em que a respectiva conta se tiver por apresentada ao cliente.
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
"A", intentou, no Tribunal Judicial da comarca de Lisboa, onde recebeu o nº106/2001, da 7ª Vara Cível, acção ordinária contra B pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 8.226.027$50, acrescida de juros de mora à taxa legal (sendo os já vencidos no valor de 886.608$00), quantia esta devida pelos serviços que lhe prestou, desde o início de 1996 até 28 de Outubro de 1999, na qualidade de Advogado, quantia que tem em conta os serviços jurídicos prestados, a sua importância, dificuldade do assunto, resultados obtidos, e encargos suportados e não reembolsados.
A Ré contestou, concluindo por que a acção deve ser julgada parcialmente procedente, sendo que a fixação justa dos honorários pelos serviços prestados não deverá ultrapassar os 1.000.000$00.
Alega, em suma, que o autor é seu sobrinho, sendo boas as relações de família até virem a desembocar num desentendimento entre a ré e seu irmão, pai do autor, e na consequente apresentação da nota de honorários;
não foram prestados pelo autor todos os serviços invocados na petição inicial;
a nota de honorários apresentada viola o critério da moderação que deve ser tido em conta pelos Advogados.
Foi apresentada réplica, que não foi admitida.
Elaborado o despacho saneador, com selecção dos factos assentes e fixação da base instrutória (com reclamações de ambas as partes decididas no despacho de fls.271), foi junto o parecer do Conselho Geral da Ordem dos Advogados e, efectuado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia devida pelos serviços prestados, fixando-se os seus honorários em 10.000,00 euros, acrescidos das despesas realizadas no valor de 529,86 euros, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde 8 de Fevereiro de 2000 até integral pagamento.
Inconformados ambos, quer a ré quer o autor, ambos interpuseram recurso e, por acórdão de fls. 452 a 465, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso de apelação interposto pelo autor e concedeu parcial provimento ao recurso de apelação interposto pela ré, alterando a decisão recorrida, e condenando a ré a pagar ao autor a quantia de cinco mil euros (5.000,00), a título de honorários, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde 8 de Fevereiro de 2000, até integral pagamento.
De novo inconformados ambos, pedem revista autor e ré, recursos ambos admitidos por despachos de fls. 476.
Alegando a fls.485, a ré/recorrente dirige o seu recurso contra o acórdão « relativamente à condenação em juros de mora, desde 8 de Fevereiro de 2000 » e CONCLUI:
1 - nas "obrigações de indemnizar", em que o dinheiro surge a posteriori da constituição da obrigação, por constituir um sucedâneo à reposição in natura - n. 1 do art. 566º do CCivil - e cujo critério de fixação assenta na teoria da diferença, aferida pelo tribunal na data que mais recentemente puder apurar - n. 2 do mesmo preceito - a iliquidez será um corolário natural daquelas proposições;
2 - no caso em apreço, não tendo sido prévia e contratualmente fixado o montante de honorários do autor, e tratando-se de uma obrigação de indemnizar, o quantum da dívida só virá a ser apurado quando transitar em julgado a sentença que vier definitivamente a fixar o valor desses honorários;
3 - nos termos do n. 3 do art. 805º do CCivil, os juros demora são devidos desde o momento em que o devedor passa a saber o montante exacto da dívida, o que ocorrerá com o trânsito em julgado da sentença que vier a fixar esse montante.
Por sua vez, alegando a fls. 498, apresenta o autor/recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
1. A decisão da 1ª instância violou as regras da prova, ao não dar como provada matéria que o havia sido à luz das disposições contidas nos artigos 342º, 346º, 347º, 352º ou 361º e 376º do Código Civil e de extrema relevância para a boa decisão da causa;
2. Tal factualidade era de extrema importância no sentido de aferir a justeza dos honorários apresentados pelo ora Recorrente e a análise do respeito dos mesmos pelo princípio da moderação, na medida em que na fundamentação da sentença são tomados em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos e os que o tribunal deu como provados (artigo 659º, nº3 do Código de Processo Civil);
3. A decisão da 1ª instância não observou, assim, o disposto no artigo 659º, nº3 do Código de Processo Civil;
4. O ora Recorrente produziu prova suficiente dos factos constitutivos dos direitos alegados;
5. A ora Recorrida não logrou provar qualquer facto anormal que excluísse ou impedisse a eficácia dos elementos
constitutivos dos direitos invocados pelo ora Recorrente;
6. Ao contrário do que entendeu o tribunal de 1ª instância, o ora Recorrente logrou provar que prestou à ora Recorrida todos os serviços enunciados na petição inicial, que o processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa foi altamente complexo, que os resultados obtidos foram excelentes e por si obtidos e não pelo seu colega Dr. C, que foi pago por via dos poucos serviços que prestou;
7. O tribunal de 1ª instância ao fixar os honorários em 10.000,00 (dez mil euros) não respeitou as disposições legais contidas no artigo 1158º do Código Civil e artigo 65º do E.O.A., atinentes à justeza e equilíbrio dos honorários apresentados;
8. O acórdão sub judice não só negou total procedência ao recurso interposto da decisão da 1ª instância, como também incorreu nas mesmas ilegalidades e as agravou, ao tecer um conjunto de considerações e afirmações incorrectas, que contribuíram decisivamente para um desfecho ainda mais censurável, concretamente através da absolvição da ora Recorrida da obrigação de proceder ao pagamento dos encargos e despesas incorridas pelo ora Recorrente e a redução do valor dos honorários fixados pela 1ª instância de 10.000,00 euros para 5.000,00 euros;
9. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice ao advogado é permitido fixar os honorários com base nos resultados obtidos (artigo 65º do E.O.A.);
10. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice, resultou inequivocamente provado que o ora Recorrente prestou todos os serviços enunciados na petição inicial, quer pelo facto de tal prova ter sido produzida por documentos com força probatória suficiente para o efeito, quer pelo facto de a ora Recorrida ter confessado que o não pagamento da conta de despesas e honorários se ficou a dever ao valor dos mesmos e à atribuição de success fee;
11. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice, nunca o dossier relativo ao andar da Rua dos Soeiros se traduziu em mais do que um mero acerto negocial e contratual visando a compra do mesmo por parte do filho da ora Recorrida, Exmo. Senhor Arquitecto D e jamais constituiu peso algum na nota de honorários apresentada, com excepção do tempo nele despendido;
12. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice, nunca o dossier relativo ao arrendamento de uma loja de Benfica consistiu em mais do que uma mera e vã tentativa de negociação e actualização da renda e jamais constituiu peso algum na nota de honorários apresentada, com excepção do tempo nele despendido;
13. A nota de honorários apresentada a pagamento dizia e diz respeito, em larga medida, aos serviços jurídicos prestados no processo de "Valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa", atendendo ao tempo despendido, aos interesses em questão, à importância que a boa resolução desse assunto tinha para a ora Recorrida e aos resultados aí obtidos;
14. Nos autos resultou provado que a ora Recorrida confiou ao ora Recorrente o patrocínio do processo designado por "valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa";
15. Nos autos resultou provado que o processo de "Valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho" consistia em o ora Recorrente acordar a cessação de um contrato de arrendamento então em vigor (entre a ora Recorrida e a sociedade "E", S.A.) e obter junto da Câmara Municipal de Lisboa a emissão do respectivo título de viabilidade do projecto de transformação de uma loja e de um terreno em Parque de Estacionamento;
16. Nos autos resulta inequivocamente provado que em 28 de Novembro de 1997 a ora Recorrida celebrou a almejada revogação do contrato de arrendamento com a "E", S.A.;
17. Nos autos resulta inequivocamente provado que em 06 de Janeiro de 1999, a ora Recorrida foi notificada do parecer favorável emitido pela Câmara Municipal de Lisboa no âmbito do pedido de informação prévia apresentado;
18. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice, o ora Recorrente não se limitou a indicar advogado no que concerne à revogação do contrato de arrendamento e a negociar com um gabinete de arquitectos a elaboração de um projecto a apresentar na Câmara Municipal de Lisboa com vista a viabilizar aqueles terrenos para efeitos de parque de estacionamento;
19. Ao contrário do que resulta patenteado no douto acórdão sub judice, o ora Recorrente é objectivamente responsável nos desideratos acima enunciados, porquanto foi quem negociou a dita revogação do contrato de arrendamento e quem iniciou, desenvolveu e acompanhou todo o processo camarário com vista à emissão de parecer favorável no que concerne à viabilidade de construção e exploração de um parque de estacionamento nos prédios da Rua Saraiva de Carvalho;
20. Foi o ora Recorrente quem designou o Dr. C para concretizar o negócio já por si acordado com a arrendatária e procedeu à escolha criteriosa dos arquitectos e acompanhou o respectivo processo camarário até à emissão do respectivo parecer favorável;
21. E, ainda que assim não fosse, o ora Recorrente, pela sua qualidade de advogado, a quem foi confiado o processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, jamais poderá ver-lhe subtraído qualquer mérito pelo resultado das opções e estratégias delineadas e executadas, nomeadamente o mérito de recorrer a terceiros, com vista à prossecução dos interesses da mandante, na situação ora vertente, da ora Recorrida;
22. Tal circunstancialismo não retira mérito algum ao trabalho desenvolvido, antes sim, pelo contrário, reforça toda uma confiança que deve presidir ao mandato;
23. Objectivamente, o processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, foi confiado ao ora Recorrente pela ora Recorrida com vista à obtenção de resultados concretos;
24. Objectivamente, o ora Recorrente cumpriu esses mesmo objectivos ao entregar à ora Recorrida os prédios da Rua Saraiva de Carvalho totalmente devolutos de pessoas e bens e livres de um arrendamento, bem como susceptíveis de poderem vir, no futuro, a acolher um parque de estacionamento;
25. A intervenção do ora Recorrente no processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, encontra-se descrita do anexo que faz parte integrante da nota de honorários que constitui o documento n. 6 junto aos autos pelo ora Recorrente;
26. Nota de honorários e respectivo descritivo anexo à mesma que jamais mereceram qualquer tipo de reparo por parte da ora Recorrida (e do seu ilustre mandatário forense), com excepção dos valores dos honorários e da atribuição de success fee, ao longo de toda a fase de pré-contencioso (vide documentos nºs 9, 10 e 12 que, sabe-se lá porquê, o ilustre mandatário da ora Recorrida pretendeu ver desentranhados)
27. É dentro desta factualidade que a questão central dos autos - saber se a nota de honorários, em razão dos serviços prestados, do tempo despendido, da importância dos assuntos, das posses da ora Recorrida e dos resultados obtidos - deve ser analisada, mormente para efeitos de verificação se a nota de honorários em apreço viola o princípio da moderação e, em caso afirmativo, qual o valor justo dos mesmos;
28. Em função do trabalho desenvolvido pelo ora Recorrente resultaram para a ora Recorrida os benefícios inerentes à extinção de um arrendamento e à aprovação camarária de um estudo prévio, concretamente o aumento do valor locatício da referida loja e terreno de 18.000$00 mensais para um valor aproximadamente na ordem de 250.000$00 mensais e o aumento substancial do valor da loja e terreno, de cerca de 4.000.000$00 (à luz dos critérios de avaliação em prática) para um valor na ordem de 110.000.000$00 (cento e dez milhões de escudos), ou, no mínimo, fazendo fé no documento nº9 junto aos autos pela ora Recorrida, para um valor na ordem de 85.000.000$00;
29. O momento da valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, teve lugar com a revogação do contrato de arrendamento e com a emissão do parecer da Câmara Municipal de Lisboa;
30. O mérito e os resultados obtidos não podem ficar dependentes, assim, de uma eventual alienação dos ditos prédios. Nesse momento, o que se obterá é já o resultado da valorização verificada no passado, por força dos serviços prestados pelo ora Recorrente;
31. Para avaliação da moderação ou não dos honorários apresentados pelo ora Recorrente à ora Recorrida para fixação da retribuição pelos serviços jurídicos prestados, são aplicáveis as disposições legais contidas nos artigos 1158º do Código Civil e 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados;
32. Em função dos serviços prestados pelo ora Recorrente e dos benefícios colhidos pela ora Recorrida, da complexidade do processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, da importância que a resolução de tal assunto tinha para aquela, das suas posses e atendendo à praxe do foro e estilo da comarca, os honorários correctos são os que o ora Recorrente apresentou à ora Recorrida;
33. Todavia, ainda que assim não se entenda, à luz das referidas disposições legais, jamais poderão ser considerados como adequados e justos, a título de honorários, os valores, respectivamente, de 10.000,00 euros e de 5.000,00 euros; antes sim, deverão considerar-se, no mínimo, como adequados e justos os valores sustentados no laudo emitido pela Ordem dos Advogados, caso contrário, estar-se-á a promover judicialmente uma situação de empobrecimento sem causa do ora Recorrente;
34. Ao fixar-se em 10.000,00 euros e em 5.000,00 euros os honorários devidos pela ora Recorrida ao ora Recorrente, quer a 1ª instância, quer o Tribunal da Relação de Lisboa, violaram as disposições legais contidas nos artigos 1158º, nº2 do Código Civil e 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto o valor fixado é demonstrativo e elucidativo de uma má interpretação e aplicação da lei ao caso concreto.
órdão sub judice, a douta sentença da 1ª instância é acertiva quando condena a ora Recorrida a pagar ao ora Recorrente a quantia relativa às despesas e encargos suportados, à luz do disposto no artigo 490º do Código de Processo Civil e em razão da matéria vertida no artigo 14º da contestação.
Contra - alegou a ré/recorrida, a fls.553, pugnando pela manutenção do decidido no que respeita à fixação dos honorários em 5.000,00 euros e à absolvição da ré no pedido de pagamento dos encargos.
Estão corridos os vistos legais.
Cumpre decidir:
Tenhamos em atenção, antes de mais, a matéria de facto tal como foi fixada pelas instâncias. E que aqui, por comodidade, damos por reproduzida.
O autor/recorrente começa, aliás, por pôr em causa a matéria de facto assim fixada.
É preciso, todavia, atentar em que, como resulta do estipulado nos arts. 26º da Lei nº3/99, de 13 de Janeiro (LOTJ99) e 722º e 729º, nº1 do CPCivil, o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista que é, em regra só conhece da matéria de direito.
Em consequência está-lhe vedado, à partida, sindicar o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa por parte da Relação.
Só assim não acontecerá, podendo ser alterada pelo STJ a decisão quanto à matéria de facto, se houver "ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova" - art. 722º, nº2, 2ª parte.
Mas este não é manifestamente o caso, nem mesmo na parte em que o autor/recorrente faz apelo a uma eventual confissão da ré de factos constantes da petição inicial.
A haver confissão, ou seja, a haver o reconhecimento |por parte da ré| da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária ( art. 352º do CCivil ) seguramente haveria que ter em conta, na verdade, esse ou esses factos.
Não se vê, todavia, qual ou quais os factos que assim mesmo devessem ser considerados e tenham sido escamoteados na fundamentação fáctica da decisão.
Como se não vê também que alguns factos, por não impugnados, devessem ter sido considerados como admitidos por acordo, nos termos do que dispõe o nº2 do art. 490º do CPCivil, e o não tivessem sido.
Muito claramente está dito - e bem - na decisão das instâncias, que a impugnação total do montante de honorários pedidos resulta da defesa apresentada, considerada no seu conjunto.
Far-se-á uma pequena ressalva quanto ao montante de 106.227$50 (529,86 euros) incluído como verba de encargos na nota de honorários, cujo valor parece não resultar impugnado no art. 14º da contestação (onde se assume a oposição à petição, e que se transcreve - é exacto o que se afirma no art. 35 da P.I:, pois efectivamente a ré não pagou a conta de despesas e honorários emitida pelo autor, por discordar do montante fixado de honorários stricto sensu e de não poder aceitar a atribuição de success fee) e que, de qualquer modo, como se acentua na sentença de 1ª instância, « se não afiguram desajustados para o trabalho que veio a apurar-se ter sido desenvolvido ».
Dito isto:
o autor pede o pagamento (que contabiliza em 2.675.000$00, de 178 horas e vinte minutos de horas trabalhadas, e
6000.000$00, de success fee) de serviços jurídicos prestados em seis processos;
desses seis processos apenas se provou a intervenção em três: valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, compra de andar na Rua dos Soeiros, arrendamento da Loja de Benfica;
de acordo até com as próprias conclusões da alegação de recurso, concretamente das enumeradas em 11 e 12 e 13, os processos da Rua dos Soeiros e da Loja de Benfica, com excepção do tempo neles despendido, « jamais constitu|iram| peso algum na nota de honorários apresentada | que | dizia e diz respeito, em larga medida, aos serviços jurídicos prestados no processo de valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa ».
É preciso dar, então, uma especial atenção a este último processo. O que se reforça no que vem dito textualmente nas próprias alegações do recorrente - « aqui se situou em absoluto todo o mérito, quase todo o tempo dispendido e os óptimos resultados que o ora Recorrente obteve em benefício da ora Recorrida ».
E, quanto a ele, vale a pena recuperar o que se provou.
A saber:
a loja e terreno da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa, em finais de 1996, estavam arrendados à sociedade "E", S.A., obtendo a ré um rendimento líquido mensal de 18.000$00 ( 7 );
a ré confiou ao autor | ... | o patrocínio para valorização dos prédios da Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa | ... | (10);
em finais de 1996 o autor iniciou um processo relativo à tentativa de valorização de um projecto urbanístico, consubstanciado na elaboração e apresentação de um projecto visando a transformação de uma loja e terreno em parque de estacionamento (11);
em 28 de Novembro de 1997 a ré acordou com a referida sociedade a revogação do contrato de arrendamento, mediante uma indemnização de 4.000.000$00 (13);
até essa data e paralelamente o autor foi desenvolvendo contactos no que concerne aos serviços de arquitectura necessários para o projecto a apresentar na CM de Lisboa (14 );
foi apresentada uma proposta para elaboração e execução do projecto, no valor de 7.601.000$00, pelos Srs. Arquitectos contactados pelo autor (15);
viriam a ser aceites apenas parte dos serviços inicialmente propostos, no valor de 1.520.000$00, tendo da negociação do autor com os arquitectos do projecto resultado a redução de 15%, daquele valor para 1.282.000$00 (16);
aprovado o pedido de informação prévia o autor continuou a acompanhar o processo, para alienação da loja e terreno, conforme a ré e os filhos haviam decidido (7);
o valor locativo da loja e terreno referidos é de cerca de
250.000$00 mensais (19);
foi do autor que partiu a iniciativa de apresentação do projecto (29);
o autor esclareceu a ré que entendia estar-lhe deontologicamente vedado negociar com a locatária E, em virtude desta sociedade ser cliente do escritório (30);
referindo à ré que chegada a altura encarregaria um colega de outro escritório para tratar das negociações (31);
findos os serviços exclusivamente relacionados com a revogação do contrato de arrendamento da loja e terreno da Rua Silva Carvalho, o Dr. C emitiu a sua nota de despesas e honorários, cujo saldo a seu favor foi de 60.000$00 ( 32 );
ainda hoje o imóvel da Rua Saraiva de Carvalho se encontra à venda ( 33 );
o autor nunca apresentou à ré qualquer interessado na compra ( 34 ).
Estes são os factos essenciais.
Estes, e mais os seguintes:
o autor exerce a sua actividade de advogado no seu domicílio profissional situado na Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa (1);
em Fevereiro de 1998 deu entrada na CML um requerimento, pedido de informação prévia, que tinha em vista o pretendido (4);
em 6 de Janeiro de 1999 a ré foi notificada pelo Departamento de Planeamento Urbanístico da CML do parecer favorável à sua pretensão, condicionado: ao arranjo da superfície do parque com revestimento vegetal adequado; ao estudo das condições de escoamento das águas pluviais e à redução do impacto visual das escadas e da cobertura da rampa (5);
no início do estagio de advocacia do autor, este e a ré acordaram que a partir do início do ano de 1996 o autor prestaria serviços jurídicos à ré, no que concerne a um conjunto de processos de natureza judicial e extra-judicial (8);
tal prestação de serviços perdurou pelo menos até ao verão de 1999 (9);
o autor iniciou o seu estágio de advocacia em Dezembro de 1995, no escritório de advogados F, G & Associados, sendo seu patrono o ilustre Dr. I (20);
no ano de 1996 era advogado da ré o Dr. I, que a patrocinava em alguns assuntos para os quais ela o havia mandatado, e tratava das questões jurídicas (22);
a ré não cerceou as iniciativas ou diligências que, de quando em vez, o autor entendia por bem sugerir para rentabilizar o seu património.
Factualizada a questão, importa agora olhar o direito e ver o que dispõem os arts.65º e 66º do Estatuto da ordem dos Advogados então em vigor (Dec.lei 84/84, de 16 de Março).
Assim:
Art. 65º ( Honorários: limites e forma de pagamento)
1 - Na fixação de honorários deve o advogado proceder com moderação, atendendo ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, à importância do serviço prestado, às posses dos interessados, aos resultados obtidos e à praxe do foro e estilo da comarca.
Art. 66º - ( "Quota Litis" e divisão de honorários - sua proibição)
É proibido ao advogado :
a ) exigir, a título de honorários, uma parte do objecto da dívida ou de outra pretensão;
b ) ...
c) estabelecer que o direito a honorários fique dependente dos resultados da demanda ou do negócio.
E também o que dispõe o art. 83º - (Deveres do advogado para com o cliente) e concretamente a alínea i) do nº1 - não celebrar, em proveito próprio, contratos sobre o objecto das questões confiadas ou, por qualquer forma, solicitar ou aceitar participação nos resultados da causa.
Solicitar ... participação nos resultados da causa!
Ora, é exactamente isto o que o autor está a fazer ao inscrever na sua conta de honorários, uma verba de
6.000.000$00 a título de "success fee", ou seja, traduzido à letra, qualquer coisa como uma propina de sucesso ou honorários de sucesso, alguma coisa que está para além dos « honorários por horas trabalhadas » e que é uma participação nos resultados da causa.
Mas o "success", o « êxito; facto de se ser bem sucedido; obtenção ou consecução do fim em vista » (Dicionário de Inglês-Português da Porto Editora, 3ª edição), o « resultado da causa » é algo que não pode ser valorado autonomamente como honorário ou retribuição e que exactamente constitui dever do advogado não solicitar ao seu cliente - art. 83º, nº1, al. i ) - e que lhe é expressamente proibido exigir como parte da pretensão conseguida.
O « resultado obtido » é apenas e só, de sua natureza, um factor a ter em conta na fixação dos honorários. Eventualmente, na lógica formal da conta de honorários apresentada pelo autor à ré, na valorização da hora de trabalho, com um acréscimo de mais valia aportada pelo success.
Bem andaram, pois, as instâncias, ao considerar que « os pretendidos honorários a título de "success fee" não são permitidos por lei, à luz do disposto na al. c) do art. 66 do EOA e não têm por isso fundamento legal.
Resta, pois - e porque não houve ajuste prévio entre advogado e cliente - fixar os honorários de acordo com o tempo gasto, com a dificuldade do assunto, a importância do serviço prestado, as posses da ré, os resultados obtidos e a praxe e o estilo da comarca de Lisboa.
Tudo, necessariamente, com recurso à equidade (até mesmo na questão da horas trabalhadas, de cujo número o autor não fez prova). Uma equidade considerada não como um qualquer critério arbitrário, mas como a mais justa das justiças.
E tendo sempre em vista a exigida moderação, que o art. 65 do EOA inscreve logo à cabeça do seu nº1.
A moderação que aqui não pode deixar de ter especialmente em conta que no ano de 1996 era advogado da ré o Dr. I (que a patrocinava em alguns assuntos para os quais ela o havia mandatado, e tratava das questões jurídicas) e que foi no início desse ano de 1996 que a ré entregou ao autor a prestação dos serviços jurídicos que este agora quer cobrar, num tempo em que ele, autor, sobrinho da ré, era um jovem estagiário da advocacia, a iniciar o seu estágio precisamente no escritório do ilustre Advogado Dr. I, advogado da ré.
O tempo e a família a exigirem uma especial moderação. Não que a família tenha direito a qualquer moderação especial, a não ser quando são exactamente as razões de família que fazem aproximar do jovem estagiário a cliente que tem o seu "velho" advogado (com quem, precisamente, o novo advogado vai estagiar).
Consequentemente, nessa procura da justiça das justiças que é a equidade, julgamos acertado o juízo quantitativo que fez o acórdão recorrido, fixando em 1.000.000$00 os honorários a pagar.
Tanto mais que, pensamos, esta quantia vence juros desde a data fixada pelas instâncias, ou seja, 8 de Fevereiro de 2000.
Com a interpelação que lhe foi feita pelo autor para pagar, a ré ficou a saber quanto entendia o autor que lhe era devido - o autor liquidou a dívida, tornou-a líquida. Mal ou bem, tornou-a líquida.
Se quisermos, de outro modo, poderemos dizer que, se ao cabo da acção ordinária que nos ocupa a outro valor diferente daquele que o autor pediu se chegar, a falta de liquidez - de que fala o n. 3 do art. 805 do CCivil - será imputável à ré na parte em que vai condenada a cumprir, ao autor na parte em que a ré foi absolvida do pagamento.
E por esta diferente via se chega à mesma conclusão: no que respeita à quantia a cujo pagamento a ré vai ser condenada há mora desta desde a data em que o autor lhe apresentou - quantificado - o seu pedido.
De qualquer modo sempre se poderia dizer que a dívida da ré é uma dívida de valor.
E assim sendo, ou aceitamos a sua quantificação monetária à data de 8 de Fevereiro de 2000 - como fazemos, considerando liquidada nesse momento - e haverá mora da ré (e juros de mora) desde então; ou consideraríamos a liquidação apenas à data da sentença, e então haveria que proceder a um actualização do montante a essa mesma data, por forma a que um mesmo quantitativo monetário não significasse hoje um valor inferior à dívida.
Em conclusão: improcede o recurso do autor, com excepção da parte em que pede a condenação da ré a pagar a quantia de 106.227$50 a título de encargos;
improcede na totalidade o recurso da ré.
DECISÃO
Na improcedência do recurso da ré e na parcial procedência do recurso do autor,
revoga-se em parte a decisão recorrida fixando-se em 5.529,86 euros a quantia a pagar pela ré B ao autor Dr. A, à qual acrescem os juros de mora à taxa legal desde 8 de Fevereiro de 2000 até integral pagamento.
Custas da revista da ré, a cargo dela; da revista do autor, por autor e ré na proporção do vencido; custas nas instâncias, por autor e ré, nesta mesma proporção.
Lisboa, 17 de Fevereiro de 2005
Pires da Rosa,
Custódio Montes,
Neves Ribeiro.