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EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA
HABILITAÇÃO
OPOSIÇÃO
EXECUÇÃO
EXTEMPORANEIDADE
Sumário
I. Querendo o exequente actuar a garantia real (hipoteca), fazer intervir, a par do devedor originário, executado, terceiro que, após a instauração da execução, mas antes da efectivação da penhora, atento o vertido no art. 819º do CC, adquiriu o bem hipotecado, objecto da execução, o incidente adequado é a habilitação (art.s 271º nº1 e 376º do CPC). II. A intervenção do adquirente na causa importa o ter de aceitar aquela no estado em que ela se encontrar, não consentindo "ressurreição" do prazo peremptório para deduzir oposição à execução, não oferecida pelo transmitente.
Texto Integral
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I. a) "Empresa-A" instaurou execução para pagamento de quantia certa, sujeita à forma ordinária, contra "Empresa-B" e outros, a qual corre seus termos pela 2ª Secção da 3ª Vara Cível de Lisboa, registada sob o nº 5507/1987.
b) Citada, a executada "Empresa-B" opôs-se à predita execução, mediante a dedução de embargos de executado, nos termos e com os fundamentos que fls. 195 a 208 evidenciam, a 23-09-93.
c) Transitado em julgado o acórdão deste Tribunal que constitui fls. 235 e segs. dos autos, proferido a 09-10-1997, aconteceu o naufrágio dos embargos referidos em b) por dedução fora do prazo (art. 817º nº 1 a) do CPC).
d) Após o trânsito em julgado da decisão a que se alude em c), por apenso à supracitada execução, a exequente deduziu o incidente de habilitação de "Empresa-C", por adquirente de imóvel penhorado, incidente esse julgado procedente por decisão transitada em julgado a 10-02-2005 - cfr. certidão junta a fls. 249 a 252.
e) A 01-03-2005, "Empresa-C" veio deduzir oposição à execução, em abono daquela aduzindo o que fls. 2 a 29 revelam.
f) Foi proferido despacho indeferindo, liminarmente, com o fundamento plasmado no art. 817º nº 1 a) do CPC, a oposição à execução oferecida pela ora agravante, a bondade da decisão tendo o Sr. Juiz feito radicar no vertido a fls. 165 e 166.
g) Do despacho de indeferimento, sem êxito, agravou "Empresa-C" , já que o TRL, por acórdão de 06-12-2005, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão impugnada (cfr. fls. 256 a 259).
h) De tal acórdão do TRL agravou "Empresa-C", na alegação apresentada tendo tirado as conclusões seguintes:
1º
O presente recurso delimita-se pela questão de apurar se um executado, habilitado como tal por requerimento do exequente, pode deduzir embargos de executado logo após ser trazido à execução, tendo a decisão recorrida entendido que não, com o que discorda.
2º
Não foi a ora executada que requereu a sua habilitação, mas sim a exequente.
Portanto, a agravante encontra-se na posição de executada apenas por vontade e iniciativa da exequente.
3º
Não se pode afirmar que os embargos em apreço se encontram definitivamente julgados, uma vez que foram rejeitados por extemporaneidade.
4º
Face a uma petição liminarmente rejeitada por extemporaneidade (ou por outro motivo) não pode dizer-se que foi "definitivamente julgada".
5º
Juridicamente, uma tal petição não tem existência jurídica, equivale à sua não apresentação.
6º
A rejeição desses embargos por alegada extemporaneidade, equivale à sua não apresentação pela primitiva executada, Empresa-B.
7º
A decisão recorrida considera que a habilitada, como executada "recebendo o Direito nos seus precisos termos (substantivos e processuais) em que ele se verificava na esfera do transmitente, o transmissário/habilitado não pode deduzir embargos se tal direito já estava precludido na esfera do transmitente", (cfr. Acórdão recorrido de fls.).
8º
O douto Acórdão recorrido não indica o fundamento legal desta asserção.
9º
"I - Um executado, habilitado de executado falecido, pode deduzir a oposição que poderia ser deduzida pelo executado falecido, se vivo fosse.
II - Se um executado, citado para a execução, não deduzir oposição no momento processual oportuno, poderá depois deduzi-la na qualidade de habilitado de executado falecido, não citado para a mesma", neste sentido, Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 11-03-1999, www.dgsi.pt
10º
A situação tratada pelo acórdão supra do STJ é a mesma que a situação dos autos.
11º
O executado que se encontra em processo por ter sido julgado habilitado de executado falecido, não tem culpa que o sujeito que o antecedeu não fizesse uso dos seus direitos atempadamente.
12º
Não pode o "novo" executado ver os seus direitos tolhidos, uma vez que sendo uma outra pessoa, nenhum conhecimento ou legitimidade teve no processamento que antecedeu a sua habilitação.
13º
É da mais elementar justiça salvaguardarem-se os direitos de quem, como habilitado, toma agora conhecimento dos autos e merece o respeito pelos seus direitos, maxime, pelo seu direito ao contraditório.
14º
"I - A pessoa que é habilitada como herdeira em determinada acção sucede na sua posição processual e tem os mesmos direitos e obrigações que a parte primitiva.", neste sentido, Acórdão da Relação do Porto de 22.01.2002, www.dgsi.pt.
15º
Termos em que é claro que os direitos da executada habilitado no processo não podem ficar precludidos em face da actuação do anterior executado falecido.
16º
Os embargos em apreço são tempestivos.
17º
O artigo 813º do C.P.C. estabelece que o prazo para a oposição a deduzir pelos executados é de 20 dias; uma vez que a agravante só passou a ser executada após o trânsito em julgado da sentença que a habilitou como tal, só a partir dessa data é que podia opor-se à execução;
18º
O artigo 816º do C.P.C. estabelece que, além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814º do C.P.C., podem alegar-se ainda quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração.
19º
Os artigos 525º, 598º e 698º, todos do Código Civil, asseguram ao "condevedor", "novo devedor" ou "dono da coisa", respectivamente, o direito de opor ao credor todos os meios de defesa que o devedor originário tiver contra o crédito, tal como, paralelamente, o "novo executado".
20º
Carece de sentido que se entenda que um credor posa colocar um terceiro na posição de executado - por via da habilitação - sem que este pudesse impugnar o valor pedido na execução, seria manifestamente violado o princípio constitucional do contraditório, plasmado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa e vertido na lei ordinária, no nº3 do artigo 3º do artigo 3º do C.P.C.
21º
A pessoa que é habilitada como herdeira em determinada acção sucede na sua posição processual e tem os mesmos direitos e obrigações que a parte primitiva.
22º
Transpondo esta premissa para a situação do presente agravo, a parte legalmente habilitada, uma vez citada, dispõe do prazo de 20 dias para se opor à execução por meio de embargos, tal como a parte primitiva dispôs de tal prazo.
23º
"I - Um executado, habilitado de executado falecido, pode deduzir a oposição que poderia ser deduzida pelo executado falecido, se vivo fosse.
II - Se um executado, citado para a execução, não deduzir oposição no momento processual oportuno, poderá depois deduzi-la na qualidade de habilitado de executado falecido, não citado para a mesma.", Ac. STJ de 11-03-99, processo nº 99B120, nº convencional JSTJ00036227, www.dgs.pt.
24º
"I - Tendo falecido o executado e habilitado o seu sucessor no respectivo incidente de habilitação por decisão transitada em julgado, não pode este discutir nos embargos de executado a sua ilegitimidade.
II - Na causa principal poderá discutir a questão da legitimidade do primitivo devedor mas não poderá reapreciar-se a sua legitimidade como representante do falecido.", - entenda-se, por meio de embargos de executado - neste sentido, Ac. RL, de 02-12-92, processo nº63651; nº convencional JTRL00002474, www.dgsi.pt.
25º
"I - Nada obsta, em processo executivo, que seja aplicado analogicamente o incidente de habilitação para fazer intervir o adquirente de bem hipotecado que não registou a aquisição antes da acção.
II - Mas para assegurar o seu direito de defesa, deve ele ser notificado para os termos da execução afim de, querendo, deduzir oposição por embargos", Neste sentido, Ac. RP de 21-03-2002, Col. de Jur., 2002, 2, 203.
26º
"Habilitado como parte (executado) no processo principal, este fica com a faculdade de deduzir embargos de executado, contando-se o prazo para a sua dedução a partir da data da citação em tal processo (art. 816º, nº 1), assim podendo aí fazer salvaguardar a sua posição jurídica". Neste sentido, Ac. RC, de 18-01-2000, processo nº 3091/99, Nº Convencional JTRC 189/4, www.dgsi.pt.
27º
A decisão proferida a fls. que julgou extemporâneos os embargos de executado deduzidos pela ora agravante colide frontalmente com a lei, na medida em que não permitiu à ora agravante assegurar o seu direito de defesa, termos em que o mesmo é ilegal e inconstitucional.
28º
Verifica-se assim que saíram violados pelo Acórdão recorrido o princípio constitucional do contraditório, plasmado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa e vertido na lei ordinária, no nº 3 do artigo 3º do C.P.C., os artigos 813º, 814º e 816º, todos do CPC e os artigos 525º, 598º e 698º, estes do Código Civil.
i) Contra-alegação não houve.
j) Colhidos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II. Eis como se configura a factualidade relevante para o julgamento do agravo, para além da relatada em I. a) a g), a qual, por despiciendo isso ser, se não reescreve:
a) "Empresa-B" foi citada, para os termos da execução citada em I. a), por dívida provida de garantia real -hipoteca-, em Outubro de 88.
b) A ora recorrente adquiriu imóvel - fracção autónoma designada pela letra "H" do prédio urbano a que se alude a fls. 250 - à executada "Empresa-B", em data posterior à da instauração da execução referida em I. a).
III. O DIREITO:
1. Visto o disposto no art. 56º nº 2 do CPC (com a redacção anterior à vigente, a que se deve ter em conta, atenta a data da instauração da execução), como já se deixou assinalado em acórdão deste Tribunal, por nós relatado, outra não sendo a tese sufragada por Lebre de Freitas (in "A Acção Executiva", Coimbra Editora, 1993, pág.102), não sofre dúvida que é o incidente de habilitação (art.s 271º nº1 e 376º do CPC) o adequado para, como acontece no caso sub judice, querendo o exequente actuar a garantia real, fazer intervir, mesmo a par do executado, devedor originário, o terceiro que, após a instalação da execução, mas antes da efectivação da penhora (para se estar ante transmissão oponível à execução - art. 819º do CC), adquiriu bem hipotecado, objecto da execução.
A decisão de tal incidente é que desencadeia a intervenção na causa do transmissário, a qual, como salienta Salvador da Costa, in "Os Incidentes da Instância", 3ª Edição-Actualizada e Ampliada-, Almedina, pág. 259, "implica que ele tem que a aceitar no estado em que ela se encontrar, certo que o transmitente continuou a ter legitimidade para continuar na causa principal até o transmissário, por habilitação, ser admitido a substituí-lo (art. 271º, nº1)".
2. Pois bem:
Quando, na hipótese vertente, o incidente de habilitação da ora recorrente foi decidido, já há muito transitara em julgado o acórdão deste Tribunal a que se alude em I. c), o qual rejeitou os embargos de executado deduzidos por "Empresa-B, com o fundamento a que se reporta o art. 817º nº1 a) do CPC.
Uma vez que a matéria da oposição à execução deduzida por "Empresa-C" não é, mais flagrantemente, superveniente (art. 816º nº 2 do CPC), ponderado o plasmado em 1. que antecede, censura alguma merece a decisão recorrida que confirmou o despacho a que se alude em I. f).
Há que ter presente, outrossim, o vazado no art. 145º nºs 1 e 3 do CPC!
A habilitação do adquirente não "ressuscita" prazo peremptório para deduzir oposição à execução, não respeitado pelo transmitente (art.816º nº 1 do CPC), com a consequência já noticiada (cfr. I. c) !...
Tal como a notificação da decisão que considere habilitado(s) o (s) sucessor(es) de réu que, em acção declarativa, não contestou, no prazo legal, não faz renascer o prazo para o oferecimento de tal articulado !...
Se a executada transmitente não fez uso, atempadamente, dos seus direitos (conclusão 11ª da alegação), sibi imputet !...
Ao que conduziria a peregrina tese da recorrente quanto à renovação de prazos como fruto do incidente de habilitação!!!
Enfim:
O princípio do contraditório que vai ínsito no direito de acesso aos tribunais, consagrado no art. 20º nº1 da Lei Fundamental, em nada foi ferido pelo acórdão sob recurso, ao arrepio do sufragado pela agravante, nem constitui, é líquido, paradigma de violação dos demais normativos à colação chamados na conclusão última da sua alegação.
A defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, no âmbito de "um due process of law", tem, isso sim, de ser feita pelas partes, com observância dos prazos peremptórios.
IV. CONCLUSÃO:
Termos em que se nega provimento ao agravo, confirmando-se, consequentemente, o acórdão impugnado.
Custas pela recorrente (art. 446º nºs 1 e 2 do CPC).
Lisboa, 18 de Maio de 2006
Pereira da Silva
Rodrigues dos Santos
Noronha do Nascimento