ACIDENTE DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
Sumário

No contrato de seguro a prémio variável, não se encontra coberto pelo risco uma parcela da retribuição auferida pelo trabalhador sinistrado, que apenas foi incluída no valor da retribuição segura através de comunicação feita à seguradora para além do dia 15 do mês seguinte ao do acidente, e que vinha sendo omitida nas folhas de salários anteriores.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1. Relatório.

"AA", intentou a presente acção emergente de acidente de trabalho contra a Empresa-A, e a Empresa-B, pedindo a condenação das rés no pagamento de indemnização por incapacidade temporária para o trabalho e de uma pensão anual e vitalícia por incapacidade permanente, além de outros encargos, em resultado de acidente de trabalho ocorrido em 31 de Agosto de 2001, quando se encontrava ao serviço da primeira ré.

Em sentença de primeira instância foi julgada procedente a acção, condenando-se a ré seguradora no pagamento de uma pensão anual e vitalícia de € 4082,18, de uma indemnização por incapacidade temporária de € 13434,70 e ainda da quantia de € 175 de despesas de deslocação, e absolvendo-se do pedido a ré entidade patronal.

A ré seguradora interpôs recurso de apelação, discutindo o valor da retribuição tida em consideração para efeitos do cálculo da pensão e indemnização que foram fixadas a seu cargo, sustentando que no montante remuneratório não deveria ser tida em conta a importância de € 498,80, que só foi incluída na folha de férias (modalidade de seguro contratada) no 19º dia do mês seguinte àquele em que teve lugar o acidente.

O Tribunal da Relação de Évora negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida por entender que a alteração relativa à retribuição do sinistrado já tinha sido comunicada à seguradora em 19 de Setembro de 2001 e mesmo que se considerasse um incumprimento contratual por parte do tomador do seguro ele apenas poderia originar a resolução do contrato nos termos do artigo 7º, n.º 2, alínea a), da apólice uniforme.

É contra esta decisão que a ré seguradora de novo se insurge mediante recurso de revista, em cuja alegação formula as seguintes conclusões:

A) Perante a matéria provada, nomeadamente os factos provados b), c), i), j), 1) e n) ter-se-á de concluir que nas folhas de férias não foi englobada ou referenciada em qualquer altura o pagamento da quantia de € 498,80.
B) Assim, perante o factualismo supra referido não nos parece que existam quaisquer dúvidas sobre qual o montante de remunerações que estava efectivamente transferido para a Recorrente seguradora no que concerne ao seguro de acidentes de trabalho: € 673,38 X 14 meses, acrescido de subsídio de refeição no montante de € 82,85 X 11 vezes por ano.
C) Para efeitos do contrato de seguro na modalidade de folha de férias, vale a retribuição constante das folhas de férias.
D) No sentido de que são as folhas de férias que determinam o âmbito pessoal da cobertura do contrato de seguro e de que se o nome do trabalhador sinistrado delas não constar não se pode considerar abrangido por esse contrato, já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça nos acórdãos 67/99, de 14 de Abril, 368/98, de 14 de Abril de 1998, 165/99, de 9 de Dezembro, 98/2000, de 31 de Outubro e no 2868/2000, de 25 de Janeiro de 2001, tendo mesmo já sido proferido em plenário da secção social do Supremo Tribunal de Justiça, o acórdão de uniformização de jurisprudência.
E) Qualquer decisão em contrário será tomada em contradição com a jurisprudência uniformizada com aquele aresto.
F) A comunicação com o valor das alegadas "ajudas de custo" apenas deu entrada no dia 19 de Setembro de 2001, isto é, após o dia 15, dia em que, nos termos do contrato de seguro, devem ser entregues os mapas e as indicações das retribuições e após ter ocorrido o acidente de trabalho.
G) Sendo manifesto o intuito fraudulento por parte da entidade patronal tentando fazer crer que o Recorrido apenas a partir dessa data tinha passado a auferir as ajudas de custos (conclusão que decorre da própria data inscrita nas comunicações, não coincidente com a data em que efectivamente foram enviadas para a Recorrente).
H) Logo, dúvidas não há, de ter de se considerar que o risco por acidente de trabalho do Recorrido estava transferido pela entidade patronal para a Recorrente, mas com o limite de responsabilidade pelo valor declarado de retribuição nas folhas de férias do mês do acidente e anteriores, isto é: €673,38 X 14 meses, acrescido de subsidio de refeição pelo valor de €82,85 X 11 vezes ao ano.
I) Decorre dos factos provados c) e n) que na data do acidente, em 31 de Agosto de 2001, o Recorrido auferia a quantia de € 498,80 durante 11 meses por ano, ou seja, nos meses anteriores ao acidente o A./Recorrido auferia as ajudas de custo.
J) A mesma conclusão decorre dos articulados das partes e dos recibos de vencimento juntos aos autos pelo Procurador do Ministério Público referentes ao período de Setembro de 2000 até à data do acidente que fazem menção ao pagamento das ajudas de custos em discussão.
K) Conclusão diversa levaria a concluir que estaríamos perante um despacho saneador com uma elaboração altamente deficiente que afastaria a discussão da questão principal do processo: o limite da transferência - o que não é razoável que se possa imaginar.
L) Por outro lado, mesmo que assim fosse, como acima se mencionou, estão no processo elementos suficientes para que seja dado como provado que o A./Recorrido sempre auferiu as ajudas de custo e, consequentemente que o seu pagamento foi omitido nas folhas de férias, decidindo-se em conformidade.
M)A existência de uma "prática" mencionada pelo Meritíssimo Juiz "a quo" não foi invocada pelas partes nos seus articulados nem assenta em factos que não constem da matéria assente ou da base instrutória ou mesmo da exposição dos factos provados feita a sentença recorrida.
N) A razão pela qual a apólice uniforme prevê a correcção do prémio no final do ano não se destina, como é obvio, a permitir que após o acidente se inclua uma nova verba, como é o caso das ajudas de custo que, já sendo paga, não tinha sido indicada anteriormente.

A ré entidade patronal, ora recorrida, contra-alegou, defendendo a manutenção do julgado.

Colhidos os vistos dos Juízes Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

2. Matéria de facto.

As instâncias deram como assente a seguinte factualidade:

a) A ré Empresa-A, exerce a sua actividade no sector da construção civil.
b) Na prossecução desse objectivo, admitiu ao seu serviço, com a categoria de encarregado da construção civil, o autor, cerca de um ano antes do dia 31 de Agosto de 2001.
c) O autor auferia inicialmente o salário mensal de 130.000$00, acrescido de subsídio de refeição e de uma importância de 100.000$00 que não variava em função da localização das obras ou de qualquer outro factor relacionada com o exercício da sua profissão.
d) Em 31 de Agosto de 2001, o autor auferia a quantia de € 673,38 durante 14 meses, acrescida do subsídio de alimentação de € 82,85 durante 11 meses.
e) No dia 31 de Agosto de 2001, cerca das 11 horas, em Fronteira, no exercício da sua profissão e no seu local de trabalho, o autor foi atingido por um "taipal metálico de cofragem" no membro inferior direito.
f) Em consequência, o autor sofreu "fractura multicominutiva peri e intra trocantérica do fémur direito, fractura da primeira vértebra lombar... e fractura bi-maleolar direita", de que lhe resultaram sequelas.
g) A ré seguradora pagou ao autor as indemnizações até 30/5/03, com base no salário de € 673,38 x 14 + € 82,85 x 11.
h) A ré Empresa-A celebrou com a ré Empresa-B, um contrato de seguro de acidentes de trabalho de trabalhadores por conta de outrem, na modalidade de prémio variável ou de folha de férias, titulado pela apólice n° 2-1-19 -104633/01 - cfr. doc. junto de fls. 254 a 256.
i) Nas folhas de férias enviadas pela ré Empresa-A à ré Empresa-B, nos meses de Maio, Junho, Julho e Agosto de 2001, consta a quantia de 135.000$00 a título de remuneração permanente e a quantia de 16.610$00, a título de comissões, bónus/outras, excepto no mês de Junho em que a título de comissões, bónus/outras, consta a quantia de 15.100$00, como salários do autor - cfr. Docs. juntos aos autos de fls. 257 a 260.
j) Com data de 29 de Agosto de 2001, e entrada nos serviços da ré Empresa-B em 10 de Setembro de 2001, a ré Empresa-A comunicou à ré Empresa-B que
"... os nossos trabalhadores abaixo designados passam a auferir ajudas de custo a partir do corrente mês. Esta medida deve-­se ao facto da falta de pessoal e os referidos terem que se deslocar a várias obras a fim de darem apoio:
(...)
BB ..." - cfr. doc. de fls. 261 e 262.
l) Com data de 19 de Setembro de 2001, a ré Empresa-A comunicou à ré Empresa-B que
"No prosseguimento da n/carta... datada de 29 de Agosto de 2001, vimos deste modo dar a conhecer a V. Exas. o valor das ajudas de custo liquidadas no mês de Agosto de 2001 ... a fim de serem incluídas nas remunerações para efeitos da apólice em epígrafe e, relativas aos seguintes trabalhadores:
(...)
BB .......... 100.000$00" - cfr. doc. de fls. 263.
m) No dia 30/1/04 a ré Empresa-B comunicou à ré Empresa-A o seguinte: "Serve a presente para informar, segundo o vosso pedido telefónico, que a previsão de salários para o ano de 2001, da apólice AT29104633, foi de 451965,66€, tendo sido pagos prémios no total de 26134,56€. No entanto como os salários reais foram de 549054,86€, foi emitido um recibo de acerto de 5.614,09€" - cfr. doc. junto aos autos a fls. 196.
n) Em 31 de Agosto de 2001, para além das quantias referidas d), o autor auferia a quantia de € 498,80 durante 11 meses do ano - resp. ques. 1 °.
o) O autor gastou a quantia de € 175,00, em despesas de alimentação e deslocação ao Tribunal e ao GML - resp. ques. 2°
p) Em consequência do acidente, o sinistrado sofreu uma ITA de 842 dias, entre 1 de Setembro de 2001 e 22 de Dezembro de 2003 e encontra-se afectado de uma IPP de 36,85%, desde 23 de Dezembro de 2003 - cfr. fls. 22 e 23 do apenso para fixação de incapacidade.


3. Fundamentação de direito.

A única questão a dirimir é a de saber se a entidade seguradora pode ser responsabilizada pelo valor de ajudas de custo que vinha sendo pago ao sinistrado, mas cuja inclusão na retribuição segura só foi comunicada à seguradora por carta recebida em 10 de Setembro de 2001 e cujo montante preciso só foi indicado em carta datada de 19 desse mês, posteriormente à ocorrência do acidente, que teve lugar em 31 de Agosto desse ano.

As instâncias entenderam que não havia motivo para excluir a referida importância das coberturas do seguro, tanto mais que a seguradora aceitou a proposta de alteração do contrato, e consideraram ainda que a circunstância de as folhas das retribuições pagas terem sido remetidas posteriormente ao dia 15 do mês seguinte ao do acidente apenas determina a possibilidade de resolução do contrato, por parte da instituição seguradora.

É contra este entendimento que reage a recorrente, aduzindo, em resumo, que, tratando-se de uma modalidade de seguro de prémio variável, são as folhas de férias que determinam o âmbito da cobertura do seguro e que, no caso, a alteração relativa à retribuição segura só foi comunicada em 19 de Setembro de 2001, já após a ocorrência do sinistro.

E afigura-se que tem razão.

O sinistrado - recorde-se - foi admitido ao serviço da Empresa-A cerca de um ano antes do acidente, que teve lugar em 31 de Agosto de 2001 (alíneas b) e e) da matéria de facto), auferindo inicialmente o salário mensal de 130.000$00, acrescido de subsídio de refeição e de uma importância de 100.000$00 (alínea c)). Nas folhas de férias referentes aos meses de Maio, Junho, Julho e Agosto de 2001, foram indicadas como prestações retributivas, relativamente ao sinistrado, a quantia de 135.000$00 a título de remuneração permanente e a quantia de 16.610$00, a título de comissões, bónus ou outras (excepto quanto ao mês de Junho em que esta importância se cifrou em 15.100$00) (alínea i)). No entanto, como decorre da resposta ao quesito 1º, inscrita na decisão de facto sob a alínea n), em 31 de Agosto de 2001, para além das quantias indicadas na alínea d) dos factos assentes, que correspondem às que vinham sendo mencionadas nas folhas de férias relativas aos meses antecedentes, o autor auferia também a quantia de € 498,80 durante 11 meses do ano (alínea n)). Por outro lado, por carta datada de 29 de Agosto de 2001, que deu entrada nos serviços da ré Empresa-B em 10 de Setembro seguinte, a entidade patronal comunicou à seguradora que o sinistrado e outros trabalhadores passavam a auferir, a partir daquele mês de Agosto, ajudas de custo (alínea j)). Porém, só em 19 de Setembro de 2001 é que a ré Empresa-A comunicou o montante das ajudas de custo em causa, indicando, relativamente ao sinistrado, o valor de 100.000$00 (alínea l).

Segundo o acórdão uniformizador de jurisprudência nº 10/2001 (publicado no Diário da República, I Série, de 27 de Dezembro de 2001), no contrato de seguro de acidentes de trabalho, na modalidade de prémio variável, a omissão do trabalhador sinistrado nas folhas de férias, remetidas mensalmente pela entidade patronal à seguradora, determina a não cobertura do trabalhador sinistrado pelo contrato de seguro. De acordo com o acórdão do STJ de 12 de Dezembro de 2001, a mesma doutrina é extensiva aos casos de inclusão do trabalhador sinistrado apenas na folha relativa ao mês em que ocorreu o acidente, quando tenha sido omitido em anteriores folhas de salários relativamente a períodos de tempo em que já se encontrava ao serviço do tomador do seguro.

E não se vê razão para deixar de aplicar o mesmo princípio relativamente à retribuição segura quando se sabe que é esse o valor na base do qual são calculadas as responsabilidades cobertas pela apólice (artigo 10º da apólice uniforme de seguro de acidentes de trabalho, publicada no Diário da República, II Série, de 30 de Novembro de 1999).

Segundo essa disposição, a determinação da retribuição segura é sempre da responsabilidade do tomador do seguro e deve corresponder, tanto na data da celebração do contrato como em qualquer momento da sua vigência, a tudo o que a lei considera como elemento integrante da retribuição, incluindo quaisquer prestações que revistam carácter de regularidade e que não se destinem a compensar a pessoa segura por custos aleatórios.

É certo que cabe ao tomador do seguro enviar mensalmente à seguradora, quando se trate de seguro de prémio variável, e até ao dia 15 de cada mês, as folhas de retribuições pagas no mês anterior, e que o incumprimento dessa obrigação apenas determina a resolução do contrato, pela seguradora, e a possibilidade do exercício do direito de regresso relativamente a importâncias suportadas para reparação do acidente, na medida em que sejam imputáveis a esse incumprimento (artigo 16º, n.º 1, alínea c), da apólice uniforme). Porém, a questão que se coloca, no presente caso, não é apenas a de incumprimento de uma obrigação contratual - que, aliás, pode ocorrer independentemente da exactidão do número de pessoas seguras e dos montantes das retribuições cobertas -, mas antes do próprio âmbito do contrato de seguro.

No seguro a prémio variável, a apólice cobre um número variável de pessoas, com retribuições também variáveis, sendo consideradas pela seguradora as pessoas e as retribuições identificadas nas folhas de vencimento que lhe são enviadas periodicamente pelo tomador o seguro (artigo 4º, alínea b), da apólice uniforme). O tomador do seguro pode não cumprir a obrigação de envio mensal das folhas de retribuições, sujeitando-se, nesse caso, à resolução do contrato; o que não impede, todavia, que possa ter todos os encargos obrigatórios provenientes de acidentes de trabalho transferidos para a seguradora, por ter definido o âmbito do seguro, desde o seu início, por referência ao número de trabalhadores que se encontram ao seu serviço e ao montante global das retribuições efectivamente pagas.

Não é essa, no entanto, a situação dos autos, visto que a entidade patronal pessoas apenas inscreveu a remuneração relativa a ajudas de custo através de comunicação efectuada após o acidente, e mesmo assim para além do dia 15 do mês seguinte ao da sua ocorrência, ignorando-a nas folhas de retribuições referentes aos meses de Maio, Junho, Julho e Agosto desse ano.

Afirma-se no acórdão recorrido que a entidade patronal fez uma primeira comunicação por carta datada de 29 de Agosto de 2001 e que se não demonstra que não tenha sido essa a data efectiva do envio, e que, entretanto, a seguradora também aceitou o seguro pelas novas retribuições. No entanto, o que releva, para efeito da definição do âmbito do contrato de seguro, são os montantes incluídos nas folhas de retribuições, sendo certo que o tomador do seguro apenas indicou esse montante na comunicação efectuada em 19 de Setembro de 2001. Por outro lado, como se considera no acórdão de 14 de Abril de 1999 (Processo n.º 368/98), não é por mero efeito da aceitação da proposta de seguro que a seguradora fica imediatamente responsabilizada pelo pagamento da reparação por acidente de trabalho, tanto mais que o seguro de prémio variável é sempre limitado ao número de pessoas seguras e ao valor das retribuições envolvidas. Como bem se compreende, é irrelevante a aceitação da alteração das retribuições seguras, quando se constata que, à data do acidente, ainda não tinha sido comunicado o montante das ajudas de custo que passavam a ser incluídas na retribuição (e que constituíam o agravamento do risco), e que só se tornou do conhecimento da seguradora após o termo do prazo definido no artigo 16º, n.º 1, alínea c), da apólice uniforme (neste sentido, também, o acórdão do STJ de 5 de Dezembro de 2001, no Processo n.º 2995/00).

Na mesma linha de entendimento, afigura-se inteiramente irrelevante a eventual existência de uma prática de remessa das folhas de retribuições, pela empregadora, fora dos prazos contratualmente fixados e que o tribunal de primeira instância considerou estar documentada a fls. 330 a 393 dos autos. Em primeiro lugar, esses documentos referem-se a folhas de retribuições enviadas, em qualquer dos casos, posteriormente à data do acidente, nada indiciando que esse fosse o procedimento normalmente adoptado em momento anterior, que, de algum modo, pudesse justificar o atraso verificado relativamente ao cumprimento da obrigação contratual referente ao mês da ocorrência. Depois, essa matéria, embora tenha sido invocada na sentença em termos de fundamentação jurídica, não consta sequer da decisão de facto e não poderia sobrepor-se ao sentido normal da declaração negocial, que, como se viu, se rege pela apólice uniforme do seguro de acidentes de trabalho. Sendo que, quando muito, nos termos da mencionada disposição do artigo 16º, n.º 1, alínea c), o incumprimento da obrigação do envio atempado das folhas de retribuições, por parte do tomador do seguro, apenas poderia justificar a resolução do contrato e o exercício do direito de regresso por banda da seguradora.

Por tudo, entende-se, contrariamente ao decidido pelas instâncias, que o valor da referida retribuição não podia ser incluído na responsabilidade da seguradora, conforme decorre do disposto no artigo 37º, n.º 3, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, que precisamente estipula que, "quando a retribuição declarada para efeito do prémio do seguro for inferior à real, a entidade seguradora só é responsável em relação àquela retribuição".

Assim, sendo devidas ao sinistrado as importâncias de € 4.082,18 a título de pensão anual e vitalícia, de € 13.124,28 a título de indemnização por ITA e de € 175,00 por despesas de transporte, a responsabilidade da seguradora restringe-se à pensão anual e vitalícia de € 2.666,86 [€ 10.338,67 (€ 673,38 x 14 + € 82,85 x 11) x 70% x 36,85%], à indemnização por ITA de € 4.141,23 (€ 861,56 : 30 x 70% x 206 dias) e a despesas de transporte de € 114,33 (65,33%). A entidade empregadora é responsável pela diferença de valores, tendo em conta a retribuição média mensal de € 457,23 (€ 498,80 x 11 : 12) auferida pelo sinistrado e não transferida para a seguradora.

5. Decisão

Termos em que acordam em conceder a revista e revogar a decisão recorrida e, em consequência, condenam-se a pagar ao sinistrado:
a) a seguradora Empresa-B a pensão anual e vitalícia (a pagar nos termos constantes da sentença da 1.ª instância) de € 2.666,86, a indemnização por incapacidade temporária absoluta (ITA) de € 4.141,23 e a importância de € 114,33 a título de despesas de transportes;
b) a entidade empregadora Empresa-A, a pensão anual e vitalícia (a pagar nos termos constantes da sentença da 1.ª instância) de € 1.415,32, a indemnização por incapacidade temporária absoluta (ITA) de € 8.983,05 e a importância de € 60,67 a título de despesas de transporte.

Custas pela recorrida.


Lisboa, 6 de Julho de 2006
Fernandes Cadilha - relator
Mário Pereira
Maria Laura Leonardo