CONTRATO DE TRABALHAO A TERMO INCERTO
SUBSTITUIÇÃO TEMPORÁRIA DE TRABALHO
CONVERSÃO DE CONTRATO
Sumário

I - No contrato de trabalho a termo incerto celebrado ao abrigo dos arts. 41.º, n.º 1, alínea a) e 48.º da LCCT, para o trabalhador exercer as funções de carteiro pelo tempo necessário à substituição de outro trabalhador, também carteiro, que se encontrava doente, o “regresso” do trabalhador substituído é o evento referencial para a cessação do vínculo; se o trabalhador substituto continua ao serviço após o decurso do prazo de 15 dias sobre este “regresso” a que alude o art. 51.º, n.º 1, da LCCT, o contrato converte-se em contrato sem termo.
II - A ratio do art. 51.º, n.º 1, da LCCT e as soluções que o legislador pretendeu alcançar com a norma, impõem a necessária equiparação entre o “regresso” do trabalhador e o “não regresso definitivo” enquanto facto com virtualidade idêntica para efeitos de conversão do vínculo precário em vínculo sem termo; em ambos os casos a ausência tornou-se definitiva e deixou de subsistir o requisito da transitoriedade que fundamentou a aposição do termo ao contrato do trabalhador substituto.
III - Por via de regra, a certeza de que o trabalhador substituído não regressará à empresa só se alcançará com a cessação do vínculo laboral deste, designadamente por caducidade do contrato decorrente da situação de reforma.
IV - Mas não é forçoso que haja de verificar-se essa coincidência, desde que o condicionalismo do caso denote a certeza de que a ausência se tornou definitiva, o que destrói a motivação conducente ao aprazamento do vínculo precário celebrado com o trabalhador substituto.
V - É de considerar definitiva a ausência se o empregador remete à sua delegação em que exerceram funções, sucessivamente, os trabalhadores substituído e o substituto, um documento em que fez constar que o substituído estava definitivamente incapaz de prestar serviço para a empresa conforme Junta Médica, que o referido trabalhador “liberta o posto de trabalho” e que deveria apresentar o seu “requerimento para a aposentação.*

* Sumário elaborado pelo Relator.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


1 – RELATÓRIO

1-1
"AA" intentou, no Tribunal do Trabalho das Caldas da Rainha, acção declarativa de condenação, com processo comum, contra “Empresa-A”, pedindo se reconheça que entre as partes existia um contrato de trabalho sem termo e, por via disso, se considere ilícito o seu despedimento e se condene a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, bem como a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas até à data da prolação da sentença.
Invoca, para o efeito, um duplo fundamento:
- a nulidade da estipulação do termo aposto no contrato a termo incerto aprazado entre as partes em 5 de Setembro de 2001;
- a permanência da Autora ao serviço da Ré após a cessação do pretenso motivo justificativo da contratação (substituição temporária do trabalhador em situação de doença).
Em contrário da versão veiculada na P.I., a Ré afirma a validade do questionado termo e a plena validade da cessação do vínculo laboral, aduzindo ainda que a Autora litiga com manifesto abuso de direito.
1-2
Instruída e discutida a causa, veio a 1ª instância a sufragar a tese da Autora, no que respeita a aos dois fundamentos invocados, condenando a Ré a:
- reconhecer que entre as partes existia um contrato sem termo, com efeitos reportados a 5/9/01;
- reconhecer que a comunicação operada em 1/8/03 consubstancia um despedimento ilícito;
- reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, no grupo profissional CRT, com a categoria/nível salarial e a antiguidade reportada a 5/9/01;
- pagar à Autora a quantia de €9.030,80.
O Tribunal da Relação de Lisboa, sob desatendida apelação da Ré, manteve a sentença da 1ª instância, arrimando-se, para tal, no segundo fundamento aduzido pela Autora.
1-3
Continuando irresignada, a Ré pede a presente revista, cujas alegações remata com o seguinte núcleo conclusivo:
1 – a estipulação do termo invocado no contrato celebrado em 5/9/01, é válida, bem como o motivo nele aposto;
2 – ficou provado que o motivo da contratação da ora recorrida foi verdadeiro, pois o carteiro BB estava efectivamente doente;
3 – a vacatura do posto de trabalho ocorre com a publicação do despacho de apresentação e do seu conhecimento pelas partes, e não a partir do momento em que houve o conhecimento de que o trabalhador substituído não voltaria mais ao serviço;
4 – sendo verdadeiro o motivo da contratação da recorrida, não tem qualquer relevância a prova de que havia, ou não, falta de efectivos naquela Estação, nem sequer a posterior contratação do CC, o qual foi contratado por outro motivo, sendo certo que o mesmo não foi ocupar o lugar da recorrida;
5 – a recorrente cumpriu inteiramente o preceituado nos art.ºs 49º, 50º, 51º, nº 1 (in fine) do D.L. nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro;
6 – não houve conversão do contrato a termo incerto em contrato sem termo, porque o mesmo foi denunciado de forma válida e eficaz, de modo a produzir os seus efeitos legais;
7 – a recorrente também cumpriu inteiramente os art.ºs 41º als. A) e H) e 42º do D.L. nº 64ª/89, 2º nº1 do D.L. nº 34/16, de 18 de Abril e o disposto no Decreto-Lei nº 132/99, de 21 de Abril.
1-4
A Autora contra-alegou, sustentando a improcedência do recurso mas, hipotizando a eventualidade de decisão contrária, requereu a ampliação do seu objecto para apreciação de um dos fundamentos da acção em que decaiu.
Neste último contexto, conclui como segue:
1 – ao abrigo do art.º 684ºA nº1 do C.P.C., vem a recorrida requerer a ampliação do objecto do recurso para que este tribunal aprecie, se tal vier a mostrar-se necessário, o segmento do Acórdão recorrido que julgou não se verificar a nulidade do termo oposto no contrato, ao contrário do que decidira a 1ª instância;
2 – face à factualidade fixada nos pontos 6 a 10 parece ser inequívoco que o recurso, pela Ré, à contratação a termo não visou senão iludir as disposições legais aplicáveis a tal tipo de contratação;
3 – pelo que o termo aposto em tal contrato não pode deixar de se considerar nulo, por força do art.º 41º nº 2 do D.L. nº 64-A/89;
4 – devendo, por isso, ser mantido aquele fundamento, que a 1ª instância julgara procedente;
5 – nesta parte, o Acórdão violou o citado preceito e ainda o art.º 659º do C.P.C..
1-5
O Exm.º Procurador-Geral Adjunto, a cujo douto parecer não foi apreciada resposta, sustenta que a revista da Ré deve ser negada.
1-6
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - FACTOS

As instâncias deram pacificamente comprovada a seguinte factualidade:
1 – para trabalhar por sua conta e sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, desempenhando as funções de carteira na Ec/cDP de Benedita, a R. admitiu a A, por contrato de trabalho a termo incerto, celebrado em 5/9/01, com início na mesma data;
2 – por carta registada de 1/8/03, recebida pela A. na mesma data a R. comunicou à A. que “Nos termos do art.º 50º do D.L. nº 64-A/89, de 27/2, comunica-se que o contrato de trabalho a termo incerto celebrado com esta empresa, com início em 3/9/61 e em que é 2ª contratante, termina em 1/8/03 (último dia de trabalho)”;
3 – naquele momento, a A. pertencia ao grupo profissional de carteiro, com a categoria /nível salarial E, e auferia a remuneração base mensal de €559,80, a que acrescia um subsídio de refeição de € 7,97 por cada dia de trabalho efectivo;
4 – a A. é sócia do Sindicato Nacional dos trabalhadores dos Correios e Telecomunicações;
5 – o motivo justificativo da celebração do contrato era “a substituição do carteiro BB, que se encontra na situação de doença”;
6 – na estação de correios de Benedita, na altura em que a A. lá trabalhou, os trabalhadores efectivos não conseguiam dar vazão ao volume de serviço existente;
7 – a R., desde há anos, recorre à contratação a termo para suprir as suas necessidades com pessoal;
8 – em 5/8/03, a A. continuou na Estação da Benedita a exercer normalmente, as suas funções até 14/8/03, ao abrigo de dois contratos de trabalho temporário celebrados entre si e “Vedior Psicoemprego”, tendo ensinado CC, que a veio substituir;
9 – em 12/8/03, a R. admitiu ao seu serviço CC para o exercício das funções de carteiro na Estação de Correios da Benedita;
10 – BB foi submetido a junta médica, do Instituto de Obras Sociais e considerado definitivamente incapaz de prestar serviço contínuo e útil em 6/11/01, libertando o seu posto de trabalho;
11 – pelo menos desde 15/11/01, era do conhecimento da R., que o estado de saúde do BB não mais lhe permitiria regressar ao serviço activo como carteiro;
12 – nos contratos de trabalho temporário consignou-se que o que os motivava era a substituição de DD, ausente por doença;
13 – cada um dos contratos foi celebrado pelo período de 4 dias;
14 – à data da admissão da A., o carteiro BB sofria de epilepsia;
15 – consignou-se no contrato do CC que o que o motivava era a procura de primeiro emprego.
São estes os factos.

3 - DIREITO

3-1
Recordemos que a Autora estriba a sua pretensão – caracterização do vínculo como contrato sem termo, com as consequências daí decorrentes: ilicitude do seu despedimento, reintegração nos quadros da empresa e reposição remuneratória – em dois fundamentos distintos:
1º - a nulidade da estipulação do termo aposto no vínculo contratual, por inveracidade do motivo invocado;
2º - a permanência da Autora, ao serviço da Ré, durante cerca de 21 meses após cessação do pretenso motivo justificativo.
Mais em concreto, a Autora factualiza como segue esse duplo fundamento:
- sendo embora certo que o motivo justificativo da celebração do contrato foi “a substituição do carteiro BB, que se encontra na situação de doença”, a verdade é que a Autora foi contratada para suprir necessidades normais e permanentes do serviço de distribuição de correspondência;
- por decisão da respectiva Junta Médica, lavrada em 6/11/01 e de que a Ré tomou conhecimento em 15/11/01, o trabalhador pretensamente substituído foi dado como definitivamente incapaz de prestar serviço contínuo e útil, libertando o seu posto de trabalho, devendo entender-se que a motivação contratual da Autora cessou naquela data.
Ainda que tenham coincidido quanto ao desfecho final da demanda, as decisões das instâncias divergem parcialmente na sua fundamentação:
- enquanto a 1ª instância sufragou por inteiro as razões aduzidas pela Autora, a Relação só validou o seu segundo fundamento, vindo a entender que a contratação precária se transformou em contratação sem termo, de acordo com o disposto no art.º 51º nº1 do D.L. nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, uma vez que a Ré, com referência à data de 15/11/01, não fizera cessar o vínculo aprazado durante o período (15 dias) enunciado naquele preceito.
A Ré questiona o entendimento da Relação, dizendo que a motivação vertida no texto contratual se manteve inteiramente válida até à publicação do despacho de apresentação do BB e do seu conhecimento pelas partes, cuja data – a alegar e a provar pela Autora – se ignora.
Deste modo, o objecto da revista circunscreve-se a duas questões:
1ª – a de saber se , no caso, é conferível a disciplina emergente do citado art.º 51º nº1;
2ª – em caso afirmativo, a de saber a que evento – conhecimento da Decisão da Junta Médica ou conhecimento da data da aposentação – se deve atender para a contagem do prazo a que alude aquele normativo.
Ademais, e se vier a proceder a tese da recorrente, caberá apreciar ainda o fundamento – nulidade da estipulação – em que a Autora acabou por decair: essa cognoscibilidade decorre da ampliação do objecto do recurso, acima mencionada.
3.2-1
Ao caso dos autos é aplicável o regime jurídico do contrato de trabalho a termo resolutivo, constante da L.C.C.T., aprovada pelo D.L. nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro: é que o contrato ajuizado cessou em 1 de Agosto de 2003, sendo que o art.º 8º nº1 (parte final) da lei nº 99/03, de 27 de Agosto – que aprovou o Código do Trabalho e revogou a legislação de pretérito – estatui que a legislação revogada continua a aplicar-se aos efeitos de factos totalmente passados antes da sua entrada em vigor (1 de Dezembro de 2003 – art.º 3º nº1 da referida Lei).
O art.º 53º da Constituição consagra o princípio da segurança no emprego, em função do qual é proibido o despedimento sem justa causa, ou por motivos políticos ou ideológicos, e fortemente controlada a precaridade da relação de trabalho.
Por isso, o legislador ordinário tem a cautela de só admitir a contratação a termo com carácter excepcional, mais precisamente nas circunstâncias elencadas taxativamente no art.º 41º nº1 L.C.C.T..
Nos termos da alínea A) deste preceito, na sua redacção originária, ainda aplicável, o contrato a termo é admitido no caso de “...substituição temporária do trabalhador que, por qualquer razão, se encontre impedido de prestar serviço ou em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude do despedimento”.
O seu nº2, por seu turno, estipula que a celebração de contratos a termos fora do condicionalismo elencado no nº1 importa a nulidade da estipulação do termo.
Também o art.º 42º nº1 al. E) do mesmo diploma impõe que o contrato de trabalho a termo seja reduzido a escrito e contenha, entre o mais, o “prazo estipulado, com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração ou o nome do trabalho substituído”.
E o nº3 deste, último preceito determina que se considera sem termo o contrato a que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea E) do nº1.
Referindo-se especificamente ao contrato a termo incerto, o art.º 49º seguinte estabelece que tal contrato dura por todo o tempo necessário à substituição do trabalhador ausente ou à conclusão da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifica a sua celebração.
Por fim, o art.º 51º, sob a epígrafe “Conversão do Contrato”, estatui, no seu nº1, que “o contrato converte-se em contrato sem termo se o trabalhador continuar ao serviço decorrido o prazo do aviso prévio ou, na falta deste, passados quinze dias, sobre a conclusão da actividade, tarefa ou obra para que haja sido contratado ou sobre o regresso do trabalhador substituído” (sublinhado nosso).
3.2-2
Conforme decorre desse último preceito, sendo o contrato celebrado a termo incerto, a continuação da prestação do trabalho, para além da data da verificação do termo aprazado, com a dilatação acrescida de 15 dias, produz a conversão do vínculo em contrato sem termo.
No caso específico da substituição de um trabalhador, a data legalmente atendível, para o cômputo desse prazo, é a do “...regresso do trabalhador substituído”.
Pelo próprio fundamento daquela específica contratação, a lei, presume a transitoriedade da ausência: compreende-se, por isso, que só enuncie o regresso”, como evento referencial para a cessação do vínculo.
Contudo, facilmente se compreende também que essa ausência se possa tornar definitiva, nomeadamente quando ela é motivada por doença do trabalhador.
Aqui, como ali, deixa de subsistir o requisito da transitoriedade, que fundamentou a aposição do termo contratual do trabalhador substituto.
A “ratio” do preceito, isto é, o fim visado pelo legislador e as soluções que ele pretendeu alcançar com a norma produzida, impõem a necessária equiparação entre o “regresso” e o “não regresso definitivo”, enquanto factos com virtualidade idêntica para efeitos de conversão do vínculo precário em contrato sem termo.
Deste modo, acompanhamos a tese das instâncias no que respeita ao âmbito de previsão do inciso em análise.
3.3.1
Há que enfrentar, por isso, a segunda questão.
Por via de regra, a certeza de que o trabalhador substituído já não regressará à empresa só se alcançará com a cessação do vínculo laboral que – é sabido – só pode ocorrer no condicionalismo enunciado nos art.ºs 3º e 4º do D.L. nº 64-A/89, designadamente por caducidade do contrato decorrente da situação de reforma (al.c) daquele art.º 4º).
Neste último contexto, porque a obtenção da reforma se constitui no quadro de uma Relação bilateral entre o seu beneficiário e a instituição de segurança social, é de todo evidente que o efeito extintivo daí resultante não pode verificar-se sem que o empregador disso se aperceba.
Aliás, no caso específico da reforma por velhice, nada impede até que o trabalhador permaneça ao serviço, com as consequências plasmadas no art.º 5º daquele mesmo diploma.
É dizer que, nesse caso, o efeito extinto da reforma já não depende sequer - e apenas – do conhecimento do empregador mas, em última análise, da vontade das partes.
No caso dos autos, toda a defesa da Ré, desde a fase dos articulados até à presente sede recursória, se acoberta, justamente, no entendimento de que a extinção do contrato laboral com o trabalhador substituído constitui o pressuposto essencial para a cessação do vínculo precário com o trabalhador substituto.
Apesar do que se deixou dito, não é forçoso que haja de verificar-se essa coincidência: se o que está em causa, na motivação do vínculo precário, é apenas uma ausência por doença, o que releva, para a extinção desse vínculo, e, tão-somente a certeza de que essa ausência se tornou definitiva.
E nada impõe que essa certeza só se obtenha com a extinção do contrato da pessoa substituída.
Tudo dependerá do condicionalismo específico de cada caso.
3-3.2
Há que conferir, por isso, a factualidade relevante, condensada nos pontos 10 e 11 da respectiva decisão:
-“BB foi submetido a junta médica do Instituto de Obras Sociais e considerado definitivamente incapaz de prestar serviço contínuo e útil, em 6/11/01, libertando o seu posto de trabalho” (facto 10);
— “pelo menos desde 15/11/01, era do conhecimento da R. que o estado de saúde do BB não mais lhe permitiria regressar ao serviço activo como carteiro” (facto 11).
É de todo evidente que esta factualidade não belisca minimamente a subsistência do contrato de trabalho que ligava o BB à Ré.
Mas a questão que aqui se coloca não é a vacatura do lugar, é antes a de saber se essa factualidade destrói a motivação que conduzira ao aprazamento do vínculo precário celebrado com a Autora.
Se nos cingíssemos à factualidade vertida no Ponto 11, parece que o BB só estaria definitivamente impossibilitado de continuar a exercer a sua actividade de “carteiro”.
Nesse caso e, muito embora fosse essa a sua “categoria profissional” – para cuja tutela a lei consigna o princípio geral da correspondência entre a “categoria-estatuto” e a actividade exercida (art.º 22º nº1 da L.C.C.T.) – nada impedia que a Ré pudesse eventualmente modificar, nos limites legais, o conteúdo da prestação laboral daquele seu trabalhador, ao abrigo do poder de direcção que lhe está cometido.
É dizer que não estaria de todo afastado o regresso do BB ao serviço.
Mas, em contraponto disso, também é certo que o Ponto 10 é suficientemente esclarecedor no sentido de que a Junta Médica dos serviços da Ré considerara aquele trabalhador como “... definitivamente incapaz de prestar serviço contínuo e útil,... libertando o seu posto de trabalho” (sublinhado nosso).
Acresce que o documento de fls. 12 foi determinante para a condensação factual acima reproduzida, conforme se vê da fundamentação lavrada pela 1ª instância.
Trata-se de uma comunicação, dirigida pela própria Ré à sua delegação na Benedita, com data de 15/11/01 e com o seguinte teor:
“ 1 – O CRT BB foi submetido à Junta Médica de IOS, tendo sido considerado definitivamente incapaz de prestar serviço contínuo e útil, por parecer daquela Junta de 6/11/01;
2 – O CRT BB liberta o Posto de Trabalho e fica abrangido pela OS 41-89 CA, dispensado de apresentar atestados médicos;
3 – Deverá apresentar requerimento para a Apresentação, dentro de 30 dias a contar da data do conhecimento, a fim de poder beneficiar dos descontos na doença;
4 – Deverá pôr o ciente (e data), a qual será devolvida, de imediato, a esta Direcção” (FIM DE TRANSCRIÇÃO).
No corpo direito do documento encontram-se apostos os seguintes dizeres:
“Ciente 29/11/2001
BB”.
Este documento, cuja autoria e teor a Ré reconhece, tem a virtualidade de provar em definitivo tudo o que dele consta, na justa medida em que esse teor é desfavorável aos interesses da sua signatária, a ora Ré – art.º 376º nº2 do Cod. Civil.
Em face dele, torna-se irrecusável que a própria Ré assumira, já em 15/11/01, que o trabalhador substituído estava definitivamente incapacitado de produzir qualquer serviço para a empresa, sendo inevitável a sua aposentação.
Torna-se também irrecusável, por via disso, que o BB não mais voltaria a trabalhar para a Ré, cessando a motivação para a contratação precária da Autora.
E, como esta continuou, após essa data, a desenvolver a sua prestação laboral durante cerca de 21 meses mais, só podemos concluir que a Ré desrespeitou o comando imperativo do mencionado art.º 51º nº1, com a inevitável consequência da conversão do vínculo precário da Autora em contrato sem prazo.
Por isso, não merece qualquer reparo a decisão alcançada pelo Acórdão em crise.
3.4
Improcedendo a revista da Ré, prejudicada fica a apreciação das questões que integravam a censura da Autora quanto ao fundamento em que decaíra, oportunamente contextualizadas no peticionado alargamento do objecto do recurso.

4- DECISÃO

Em face do exposto, acordam em negar a revista, confirmando o Acórdão impugnado.
Custas pela recorrente

Lisboa, 22 de Maio de 2007
Sousa Grandão (Relator)
Pinto Hespanhol
Bravo Serra