RECURSO
INADMISSIBILIDADE
COLIGAÇÃO ACTIVA
Sumário


1. Na coligação activa, o valor a atender, para efeitos de admissibilidade do recurso, não é o valor da causa, que resulta da soma dos valores dos pedidos formulados por cada um dos autores, mas sim o valor do pedido formulado por cada um deles, individualmente considerado.
2. Assim, ainda que o valor da causa exceda a alçada da Relação, a decisão desta não será susceptível de recurso se revista, se o valor do pedido de cada um dos autores não for superior à alçada daquele tribunal.
3. Correspondendo o valor da causa à soma das quantias pecuniárias certas peticionadas por cada um dos autores, o valor do pedido de cada autor, a levar em conta para efeitos de recurso, será o valor da quantia certa por cada um deles peticionada, ainda que tenham pedido a ilicitude do despedimento e o pagamento das retribuições vincendas.

Texto Integral



Acordam, em conferência, na Secção do Supremo Tribunal de Justiça:

1. O Réu/recorrente AA – Centro de Formação Sindical e Aperfeiçoamento Profissional veio reclamar para a conferência do despacho do relator, de fls. 978, que não admitiu o recurso, por entender que a decisão recorrida não era susceptível de recurso, por insuficiência do valor da causa.

Alegou, para o efeito e em síntese, o seguinte:
- o valor da causa, em caso de coligação de Autores, é o correspondente à soma do valor dos pedidos;
- a própria lei manda atender, para efeitos de valor da causa, quer aos juros entretanto vencidos, quer às prestações vincendas no momento da propositura da acção, mas vencidas ao tempo da sentença recorrida;
- o recorrente arguiu a ausência de jurisdição dos tribunais do foro comum para a apreciação da causa, argumento que coloca a revista «por de fora» das regras da alçada, sendo sempre admissível recurso no âmbito e alcance do art.º 678.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil.

A parte contrária pronunciou-se no sentido de que, não existindo razões de ordem substancial ou processual que devam levar a apreciar o recurso, deverá manter-se a decisão de inadmissibilidade deste.

O despacho reclamado, de fls. 978, proferido em 6.11.2008, determina o não conhecimento do recurso, «pelas razões aduzidas no anterior despacho».

Este despacho, de fls. 959, proferido em 17.10.2008, que determinara a notificação das partes para, querendo, se pronunciarem sobre a questão prévia de (in)admissibilidade do recurso, é, na parte relevante, do seguinte teor:
«O recurso é o próprio e foi correctamente admitido no que toca ao efeito e ao regime de subida.
Afigura-se-nos, porém, que dele não se pode conhecer, por entendermos que a decisão recorrida não é susceptível de recurso ordinário.
Com efeito, apesar do valor da acção ser de 52.133,82 €, tal valor corresponde à soma dos pedidos formulados pelos quatro autores.
Conforme este Supremo Tribunal reiteradamente tem vindo a afirmar, na coligação activa as acções não perdem a sua autonomia para efeito de recurso.
Ora, sendo o pedido de cada um dos autores inferiores à alçada da Relação, a decisão não admite recurso».

2. Embora a parte não o alegue, ao menos expressamente, a reclamação para a conferência ancora-se no disposto no n.º 3 do artigo 700.º do Código de Processo Civil, nos termos do qual, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve então submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária.

Assim, independentemente de vistos dos Juízes Adjuntos, atenta a simplicidade da questão decidenda (art.os 700.º, n.º 3, 707.º, n.º 2 e 726.º do Código de Processo civil), cumpre apreciar e decidir.

BB, CC, DD e EE, intentaram, em 5 de Junho de 2006, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra o ora reclamante, pedindo que (fls. 20 e 21 dos autos):
«a) [seja] declarada a nulidade das cláusulas de consagração de termo dos contratos de trabalho dos autos e seja concomitantemente a Ré condenada a reconhecer a existência de contrato de trabalho subordinado sem termo desde 10 de Março de 2003 com todos os Autores até à presente data;
b) [seja] a Ré condenada ao pagamento à Autora BB de todas as retribuições e subsídios referentes ao trabalho prestado, no montante total de € 12.575,09;
c) [seja] a Ré condenada ao pagamento à Autor CC de todas as retribuições e subsídios referentes ao trabalho prestado, no montante total de € 12.702,02;
d) [seja] a Ré condenada ao pagamento à Autora DD de todas as retribuições e subsídios referentes ao trabalho prestado, no montante total de 12.702,02;
e) [seja] a Ré condenada ao pagamento ao autor EE de todas as retribuições e subsídios referentes ao trabalho prestado, no montante total de € 13 156,86;
f) [seja] a Ré condenada a repor todas as contribuições para a segurança social, procedendo às necessárias declarações e pagamentos de taxas, multas e outras quantias que se mostrem devidas para o efeito;
g) [seja] a Ré condenada ao pagamento de juros vencidos desde a data em que as peticionadas quantias deveriam ter sido pagas aos Autores e bem assim no[s] vincendos, todos à taxa legal, até integral pagamento, bem como em custas e procuradoria condignas (…)».

Entretanto, em 4 de Janeiro de 2007 (fls. 201 e seguintes), já após a apresentação da contestação, e do despacho a dispensar a realização da audiência preliminar e a confirmar a data da audiência final que havia sido designada na audiência de partes, vieram os Autores BB e CC ampliar a causa de pedir e o pedido.

Para tanto pediram: (a) que fosse declarada a ilicitude do despedimento destes Autores (BB e CC); (b) a condenação do Réu a reintegrar os Autores no seu posto de trabalho; (c) a condenação do Réu a pagar aos Autores uma indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que vierem a ser liquidados em execução de sentença e, bem assim, o pagamento de todos os salários e demais retribuições que lhes sejam devidas desde a data da apresentação do articulado até à sentença final.

Posteriormente, em 2 de Março de 2007 (fls. 283 e seguintes), vieram também os Autores DD e EE ampliar a causa de pedir e o pedido em termos idênticos aos referidos para os outros Autores.

Por despacho de 16 de Março de 2007 (fls. 328-329 dos autos), foram admitidas as ampliações da causa de pedir e do pedido.

Na petição inicial, os Autores atribuíram à acção o valor de € 52.133,82, que não foi objecto de impugnação pelo Réu, ou de alteração pelo tribunal, pelo que se tem por definitivamente fixado com a prolação da sentença em 1.ª instância (art.os 315.º, n.º 1, do CPC e 1.º, n.º 2, alínea a), do CPT).

Por sentença da 1.ª instância foi declarado ter cada um dos Autores celebrado com o Réu um contrato de trabalho subordinado, sem termo, em 10 de Março de 2003, a nulidade, por ilicitude, dos despedimentos de que foram alvo (os Autores) e a condenação do Réu:
«- a reintegrar os AA BB e CC nos respectivos postos de trabalho sem prejuízo da categoria e antiguidade;
- a pagar à A. DD a quantia de € 6.392,80 a título de indemnização pelo despedimento ilícito;
- a pagar ao A. EE a quantia de € 6.392,80 a título de indemnização pelo despedimento ilícito;
- a pagar à A. BB a quantia global de € 6.073,81 referente às férias, subsídios de férias e de Natal supra descriminados;
- a pagar ao A. CC a quantia global de € 6.073,81 referente às férias, subsídios de férias e de Natal supra descriminados;
- a pagar à A. DD a quantia global de € 6.562,52 referente às férias, subsídios de férias e de Natal supra descriminados;
- a pagar ao A. EE a quantia global de € 6.562,52 referente às férias, subsídios de férias e de Natal supra descriminados;
- a quantia de € 1.566,72 relativa às diferenças remuneratórias apuradas e resultantes da diminuição da retribuição da A operada pela R;
- a pagar aos AA. as diferenças retributivas, a liquidar em execução de sentença, relativas ao período compreendido entre 1 de Fevereiro de 2005 e as datas dos respectivos despedimentos;
- a pagar aos AA. todas as retribuições vencidas e vincendas, desde as datas dos respectivos despedimentos e até à data do trânsito em julgado da sentença, absolvendoo R do demais peticionado».

O Réu interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, mas sem êxito, pois este tribunal, por acórdão de 9 de Julho de 2008, confirmou a sentença recorrida.

Veio, então, o réu recorrer de revista, tendo, como questão prévia, o despacho reclamado não admitido o recurso, por insuficiência de valor, considerando o pedido de cada um dos Autores.

3. Resulta do disposto no art.º 678.º, n.º 1, do CPC, ex vi do art.º 1.º, n.º 2, a), do CPT/99, que «só é admissível recurso ordinário nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse tribunal; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atender-se-á somente ao valor da causa».

Deste normativo legal decorre que a admissibilidade de recurso está dependente da verificação cumulativa de um duplo requisito: (i) que a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre; (ii) que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão de que recorre.

No caso interessa-nos apenas o primeiro requisito.

A alçada dos Tribunais da Relação, em matéria civil, é de € 14.963,94 (art.º 24.º, n.º 1, da Lei n.º 3/99, de 13/1, na redacção dada pelo art.º 3.º, anexo ao DL n.º 323/2001, de 17/12).

Tendo o valor processual da causa sido fixado em € 52.133,82 não constituiria, em princípio, obstáculo à admissibilidade do recurso.

Contudo, importa atender que a acção foi intentada por quatro Autores.

Como este tribunal tem afirmado repetidamente (1), e também se afirmou no despacho posto em crise, o valor a atender para efeitos de recurso, nos casos de coligação activa voluntária, é, não o valor da causa, mas o valor dos pedidos individualmente formulados, uma vez que a coligação de Autores não passa de uma cumulação de acções propostas por vários Autores contra o mesmo Réu.

Com efeito, ao contrário do que se verifica no litisconsórcio voluntário – que pressupõe a contitularidade da mesma relação jurídica –, a coligação activa pressupõe a dualidade ou pluralidade dessas relações.

Daí que, nos termos do art.º 30.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o requisito essencial da coligação seja a dedução de «pedidos diferentes».
No dizer de Alberto dos Reis (2)., «(…) os autores juntaram-se, não para fazerem valer a mesma pretensão ou para formularem um pedido único, mas para fazerem valer, cada um deles, uma pretensão distinta e diferenciada».

Ou seja, na coligação não se afasta a autonomia de cada um dos pedidos, verificando-se apenas que os Autores se juntam para fazer valer a sua própria pretensão no mesmo processo. De outro modo, abria-se a possibilidade de recurso em acções em que o mesmo não seria admissível, em função do(s) pedido(s), caso elas tivessem sido propostas em separado.

Ora, no caso, na petição inicial os Autores formularam os seguintes pedidos de condenação do Réu: (i) a Autora BB de € 12.275,09; (ii) o Autor CCs de € 12.575,09; (iii) a Autora DD de € 13.699,85; e o Autor EE de € 13.156,86, quantias acrescidas de juros de mora vencidos desde a data em que as mesmas deviam ser liquidadas, bem como os vincendos até integral pagamento.

Face a tais pedidos, manifestamente inferiores à alçada da Relação (€ 14.963,94), não é admissível recurso de revista.

É certo que os Autores vieram, posteriormente à apresentação da petição, ampliar a causa de pedir e os pedidos, consistindo estes, basicamente, em atribuições pecuniárias, devidas após a apresentação do articulado, que vierem a ser liquidadas, que não quantificam, e na ilicitude do despedimento, com a consequente reintegração no Réu.

Recorde-se que nos termos do art.º 305.º, n.º 1, do CPC, «a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido».

Como a propósito escrevia o Prof. Alberto dos Reis (3), a utilidade económica a que a acção visa é dada não pelo pedido isoladamente considerado, mas pelo pedido combinado com a causa de pedir.

E, de acordo com o art.º 306.º, do mesmo diploma legal, «se pela acção, se pretende obter quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário (…)» (n.º 1); «cumulando-se na mesma acção vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos» (n.º 2) e, no caso de pedidos alternativos, «(...) atender-se-á unicamente ao pedido de maior valor(...)» (n.º 3).

Assim, sendo formulado um pedido de uma quantia certa em dinheiro, o valor da causa não pode deixar de ser o dessa quantia, não sendo atendível impugnação ou acordo em contrário.

De resto, os Autores pedem o pagamento de retribuições vincendas, pelo que não há que atender aos mesmos na fixação do valor da causa (art.º 306.º, n.º 2, 2.ª parte, a contrario, do CPC).

Mas os Autores peticionaram também, e além do mais, a ilicitude do seu despedimento e a reintegração no posto de trabalho respectivo.

Certamente tendo em conta tais pedidos, a reclamante, na resposta à notificação para se pronunciar sobre a admissibilidade do recurso, veio sustentar – mas sem razão, como se verá –, que estando em causa interesses imateriais, o valor da acção seria, no mínimo, o fixado no art.º 312.º, do CPC, ou seja, a alçada da Relação mais € 0,01.

Dispõe o art.º 79.º, alínea a), do CPT/99 (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro), que sem prejuízo do disposto no art.º 678.º do Código de Processo Civil e independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação, entre outras, nas acções em que esteja em causa o despedimento do trabalhador, a sua reintegração na empresa e a validade ou subsistência do contrato de trabalho.

Isto é, de acordo com o referido normativo legal, independentemente do valor da causa, é sempre admissível recurso para a Relação quando, além de outras que aqui não relevam, estejam em causa as situações referidas. Dito de outro modo, não é pelo facto de estar em causa uma das situações referidas que tem, necessariamente, que se alterar o valor da causa. O que a lei assegura, nessas situações, é o recurso para a Relação, independentemente do valor da causa.

Naturalmente que o recurso para o Supremo já terá que observar o disposto no art.º 678.º do CPC.

No âmbito do CPT/81 (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81, de 30 de Setembro), tendo em conta o disposto no art.º 47.º, n.º 3 – de acordo com o qual «as acções em que esteja em causa o despedimento do trabalhador, a sua reintegração na empresa ou a validade do contrato de trabalho nunca terão valor inferior ao da alçada do tribunal de primeira instância e mais 1$00» –, ainda se suscitaram divergências na jurisprudência sobre a admissibilidade de recurso para o Supremo, nas situações referidas, independentemente do valor da causa (4).

Isto, porquanto, para uma corrente e numa primeira interpretação, se considerava que o texto da lei se limitava a estabelecer um valor mínimo para efeitos de recurso e não o valor do direito submetido à apreciação do tribunal. E, porque estavam em causa direitos imateriais, seria sempre admissível recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça.

Na verdade, de acordo com esta corrente, em acções desta natureza, em que o trabalhador pede a reintegração, o que verdadeiramente estava em causa não seria uma compensação material, dificilmente quantificável em montante determinado, mas sim o reconhecimento ao trabalhador do seu direito ao trabalho.

E esta reintegração representava em muitos dos casos uma “sanção” mais gravosa do que a condenação no pagamento de retribuições devidas aos trabalhadores.

Contudo, tal interpretação veio a ser abandonada, perfilhando-se, então, o entendimento que nas acções em causa haveria sempre recurso para a segunda instância, ficando, todavia, o recurso para o STJ sujeito ao regime geral das alçadas.

Para chegar a esta conclusão partiu-se do entendimento de que, com a entrada em vigor do CPT de 1981 (aprovado pelo DL n.º 272-A/81, de 30 de Setembro), deixou de ser lícito recorrer-se ao art.º 312.º do CPC, como direito subsidiário que é.

Com efeito, o elemento histórico da interpretação do art.º 47.º, n.º 3, do CPT/81 não deixava de assumir particular relevância, porquanto no domínio do Código de Processo de Trabalho de 1963 não existia qualquer preceito específico sobre o valor da acção em casos de despedimento, reintegração na empresa ou validade do contrato de trabalho, e, na consideração de que estavam em causa interesses imateriais, insusceptíveis de serem quantificados em dinheiro, recorrendo-se ao art.º 312.º do CPC, como direito subsidiário, seria admissível recurso até ao STJ.

O Código de Processo de Trabalho de 1979 (aprovado pelo DL n.º 537/79, de 31 de Dezembro), seguindo a mesma orientação dispunha que tais acções nunca teriam “valor inferior ao da alçada da relação e mais 1$00.

Porém, já no Código de Processo de Trabalho de 1981, mencionava-se que tais acções “nunca terão valor inferior ao da alçada do tribunal da primeira instância e mais 1$00, o que significava, pois, que em tais acções o legislador de 1981 teria querido assegurar sempre o recurso até ao Tribunal da Relação: a partir daí teria que funcionar o regime geral das alçadas, maxime o disposto nos art.os 305.º e 306.º, do CPC, aplicável ex vi do art.º 1.º, n.º 2, a), do CPT e art.º 74.º, n.º 4, daquele Código.

Ora, o CPT/99, agora de forma ainda mais explícita que o CPT/81, estatui que estando em causa o despedimento do trabalhador, independentemente do valor da acção, é sempre admissível recurso até ao Tribunal da Relação, ficando a admissibilidade do recurso para o STJ dependente do regime geral das alçadas.

Não pode, por isso, também quanto a este fundamento, acolher-se a interpretação do reclamante para sustentar a admissibilidade de recurso.

Refira-se, a finalizar, que o Réu, na reclamação para a conferência, sustenta que «(…) arguiu ausência de jurisdição dos tribunais do foro comum para a apreciação da causa, argumento que coloca a revista por de fora das regras da alçada, sempre admissível no âmbito e alcance do art. 678.º/2 a) CPC».

Entre as excepções à regra da alçada, o art.º 678.º do CPC consigna, no seu n.º 2 (na redacção em vigor à data em que a acção foi instaurada – 5.06.2006 – ou seja, na anterior à que lhe foi dada pelo D.L. nº 303/07 de 24/08), que «(…) se tiver por fundamento a violação das regras de competência internacional, em razão da matéria ou da hierarquia ou a ofensa de caso julgado, o recurso é sempre admissível, seja qual for o valor da causa».
E, dispõe o art.º 687.º, n.º 1, que «[o]s recursos interpõem-se por meio de requerimento, dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida e no qual se indique a espécie de recurso interposto e, nos casos previstos nos n.º 2, 4 e 6, do artigo 678º e na parte final do nº 2 do artigo 754º, o respectivo fundamento» (sublinhado nosso).

Decorre desta norma que nos casos excepcionais em que o recurso é admissível, independentemente do valor da causa, é obrigatório, sob pena de indeferimento, a indicação no respectivo requerimento de interposição, do fundamento excepcional em que aquele se baseia.

Só com a referida indicação, o juiz poderá, em cumprimento do disposto no n.º 3 do art.º 687.º, proferir despacho a admitir ou rejeitar o recurso com tal fundamento, o que pressupõe, naturalmente, que disponha dos elementos necessários para aferir da recorribilidade da decisão.

No caso em apreço, o recorrente, ora reclamante, não indicou no requerimento de interposição do recurso (cfr. fls. 883) o fundamento referido no n.º 2, do art.º 678.º. Tal invocação só veio a ser feita na resposta à notificação para se pronunciar sobre a (in)admissibilidade do recurso e na reclamação para a conferência, o que vale por dizer que o recurso também não é admissível por essa via.

E aqui chegados, teremos de concluir que a decisão recorrida não é passível de recurso, o que implica a manutenção do despacho objecto de reclamação.

4. Decisão
Nos termos expostos, decide-se indeferir a reclamação e manter o despacho de inadmissibilidade do recurso proferido pelo relator.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC.

Lisboa, 10 de Dezembro 2008

Sousa Peixoto (Relator)

Sousa Grandão

Pinto Hespanhol

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(1) - Podem consultar-se, entre outros, os acórdãos de 11-05-2005 (Recurso n.º 362/05, disponível em www.dgsi.pt sob documento SJ200505110003624), de 10-05-2006 (Recurso n.º 2130/05, disponível em www.dgsi.pt sob documento SJ200605100021304 ), de 22-03-2007 (Recurso n. 274/07, disponível em www.dgsi.pt sob documento SJ20070322002744), de 12-07-2007 (Recurso n.º 1694/07) e de 09-01-2008 (Recurso n.º 3784/07).

(2) - Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. III, Coimbra Editora, pág. 146.

(3) - Obra citada, pág. 593.
(4) - Para uma análise mais detalhada sobre a questão, pode ver-se Leite Ferreira, Código do Processo do Trabalho, Coimbra Editora, págs. 238-239.