ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO
ARMA PROIBIDA
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DIREITO AO RECURSO
DUPLA CONFORME
MEDIDA CONCRETA DA PENA
HOMICÍDIO
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
RECURSO PENAL
ROUBO AGRAVADO
Sumário

I  -   A lei reguladora da admissibilidade dos recursos é a que vigora no momento em que é proferida a decisão objecto de recurso.
II -  Com a entrada em vigor da Lei 48/2007, que alterou o paradigma de “pena aplicável” para “pena aplicada”, o regime resultante da actual al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP tornou inadmissível o recurso para o STJ de acórdãos condenatórios proferidos pelas Relações quando, confirmando decisão anterior, apliquem pena não superior a 8 anos de prisão.
III - O princípio da dupla conforme, que não pode ser encarado como excepção ao princípio do direito ao recurso, consagrado no n.º 1 do art. 32.º da CRP, impede (ou tende a impedir) que um segundo juízo, absolutório ou condenatório, sobre o feito, seja sujeito a uma terceira apreciação pelos tribunais.
IV - É de rejeitar o recurso interposto pelo arguido para o STJ, no que respeita às penas parcelares e às questões que lhe estão conexas, quando todas essas penas tenham sido aplicadas em medida igual ou inferior a 8 anos de prisão e tenham sido confirmadas, em recurso, pela Relação.
V - O arguido foi condenado pela prática de 2 crimes de roubo agravado do art. 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), do CP, na pena de 6 anos de prisão, cada um, pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, dos arts. 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. g), do CP, na pena de 8 anos de prisão e pela prática de 1 crime de detenção de arma proibida do art. 86.º, n.º 1, al. c), da Lei 5/2006, de 23-02, na pena de 2 anos de prisão.
VI - Estão em causa roubos qualificados levados a cabo pelo arguido com a participação de um outro indivíduo, deslocaram-se de moto de alta cilindrada aos locais, escolheram as alturas em que os funcionários das empresas de segurança procediam ao carregamento das caixas ATM numa farmácia e num banco, ameaçaram os funcionários com arma de fogo e apropriaram-se de cacifos com € 50 000 e € 51 000 € em dinheiro.
VII - No homicídio qualificado tentado relevam as graves lesões causadas com o disparo (4 feridas num pulmão que só não conduziram à morte da vítima devido a pronta intervenção cirúrgica) e a angariação de dinheiro de modo fácil estabelece a estreita ligação entre os crimes cometidos pelo recorrente.
VIII - Considerando a sequência da prática dos crimes, os bens jurídicos violados com diferente natureza e o grau de lesividade ao nível pessoal, mas também ao nível patrimonial, afigura-se equilibrada e proporcional a pena conjunta encontrada de 13 anos de prisão.

Texto Integral

          No âmbito do processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo do 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, integrante do Círculo Judicial de Oeiras, foi submetido a julgamento o arguido AA, solteiro, empregado de balcão, nascido a 12-04-1988, na Freguesia de São Sebastião da Pedreira, Concelho de Lisboa, residente na T… da M…, n.º xx, Q… da V…, P… de S…, Loures, e, actualmente, preso preventivamente à ordem do presente processo no Estabelecimento Prisional de Lisboa.

        Por acórdão do Colectivo de Oeiras, de 19-04-2012, constante de fls. 1759 a 1834, do 9.º volume, foi deliberado:

I - Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provada, a pronúncia, que remete para a acusação pública e, em consequência:

A - Absolver o arguido AA da prática de onze crimes de roubo agravado, p. e p. pelo artº 210.º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. a) e f), todos do C. Penal, bem como de três crimes de roubo agravado, na forma tentada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.ºs. 1 e 2, al. b), 22.º e 23.º, com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. a) e f), todos do C. Penal, pelos quais vinha pronunciado;

B - Condenar o arguido AA, em concurso real e efectivo, nas seguintes penas parcelares:         

a) - pela prática, em co-autoria material, de dois crimes de roubo agravado (apensos 6 e 11), p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1 e 2, al. b), 204.º, n.º 2, al. a) e f) do C. Penal, na pena de seis anos de prisão, cada um;

b) - pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada (apenso 6), p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.º 1 e 2, al. g) do C. Penal, na pena de oito anos de prisão;

c) - pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, al. c), da Lei 5/2006, de 23/02, na pena de dois anos de prisão;

d) nos termos do disposto no artigo 77.º do Código Penal, em cúmulo das penas parcelares aplicadas, na pena única de treze anos de prisão.

                                               *

II. A) - Julgar improcedente o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante “BB.”, absolvendo o demandado do respectivo pedido.

      B) – Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante CC. e, consequentemente, condenar o demandado no pagamento da quantia global de € 101.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4% desde a notificação para contestar até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.

                                           

                                          ******

         Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, conforme fls. 1854 a 1885, e em original de fls. 1889 a 1904 verso, respondendo o M.º P.º, de fls. 1914 a 1925, e a demandante CC, de fls. 1940 a 1952.

        O recurso foi admitido a fls. 1954.

        No Tribunal da Relação de Lisboa foi o recorrente convidado, conforme despacho de fls. 1975, a apresentar novas conclusões, elaboradas nos termos do artigo 412.º, n.º 1, do CPP, o que foi cumprido, com a apresentação do articulado de fls. 1986 a 1992.

       Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 8 de Novembro de 2012, constante de fls. 1997 a 2061, foi deliberado negar provimento ao recurso do arguido, confirmando-se a decisão recorrida.

       Após renúncia do anterior mandatário, o arguido veio juntar nova procuração a fls. 2096 (cfr. fls. 2069 a 2098).

       O arguido veio a apresentar recurso, a fls. 2100, apresentando a motivação de fls. 2101 a 2129, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição integral, incluídos realces):  

A - Nulidade do Acórdão / Erro na determinação da norma aplicável, por ter existido uma prévia errada apreciação dos factos e prova, por referência ao crime de homicídio qualificado na forma tentada

a. O Tribunal recorrido não se pronunciou de forma expressa sobre a divergente qualificação jurídica dos factos que conduziram à pronúncia e condenação do arguido por crime de homicídio qualificado na forma tentada;

b. Impunha-se saber se in casu se tratou de homicídio qualificado tentado, p.p. pelos arts° 131°, 132°, n° 1 e 2, al. g) do C. Penal, como entendeu o tribunal recorrido de 1ª instância, ou, ao invés, como defendeu e defende o arguido recorrente, de mera ofensa à integridade física qualificada p.p. no art.° 145° n° 1 al. b);

c. No desenvolvimento que deu ao tratamento do recurso, o tribunal recorrido, concluindo pela bondade da pena aplicada, não se pronunciou sobre o problema da qualificação jurídica, que o recorrente continua a questionar perante o Supremo Tribunal de Justiça.

d. Tão apenas aflora a questão, de forma muito abrangente, e na análise ao invocado erro notório na apreciação da prova;

e. Violando o disposto no n° 1 do art.° 428° do C.P.P;

f. Este facto reconduz à nulidade do acórdão nos termos do disposto no artigo 379°, n.° 1, c), do CPP, por não se ter pronunciado sobre questão suscitada pelo recorrente e que devia ter apreciado;

g. Analisando agora os elementos objectivos e subjectivos do crime de homicídio qualificado, parece, por demais evidente, que se o arguido quisesse matar o ofendido, tê-lo-ia feito ab initio, ao invés de disparar para o chão ou em direcção às pernas do ofendido;

h. Sentindo-se perseguido, poderia também, simplesmente, ter parado efectivamente, apontado a arma, e por mais chocante que se apresenta aos olhos do cidadão comum e de V. Exas., por exemplo à cabeça do ofendido, e terminado logo ali a perseguição;

i. Verdade é que disparou várias vezes em corrida!!

j. E nem assim conseguiu intimidar o ofendido que o alcançando, ainda lhe retirou o capacete integral, vendo-lhe a face;

k. Este facto veio a proporcionar o reconhecimento do arguido por parte do ofendido e, por este motivo veio condenado por dois crimes, o de roubo e de homicídio qualificado na forma tentada;

l. Ora, a ter sido intenção do arguido matar o ofendido, foram por demais as oportunidades para o fazer, m. E nem colherá o argumento de que o ofendido apenas não morreu devido à pronta intervenção do INEM;

n. Antes valendo, como claro e evidente, que terá sido atingido no tórax e na perna por balas disparadas em corrida;

o. Há portanto, clara insuficiência da matéria de facto, e que se traduziu manifestamente numa condenação do arguido injusta;

p. No caso em apreço entende-se que, ou não foi atendida toda a prova (explicando-se aqui a insuficiência da matéria de facto) ou se foi atendida, não foram afastadas as dúvidas que surgem ao tentar compatibilizar uma inequívoca intenção de matar, com uma fuga encetada pelo arguido, carregado de duas caixas metálicas, o qual era perseguido pelo ofendido;

q. De uma forma ou de outra, resulta desta conclusão que não ficou demonstrada, para além de qualquer dúvida, a certeza de que o arguido, quando disparou os vários tiros, tenha tido a intenção primeira de provocar a morte;

r. Não poderá presumir, como o fez o tribunal que, com esses disparos, representou o arguido, conformando-se, em atentar contra a vida de outrem, enquadrando esta conduta na previsão do artigo 132°;

s. Defende-se, a contrario, a intenção de assustar e impedir que o ofendido continuasse a perseguição;

t. O Douto Acórdão ora recorrido revela pois uma errada apreciação dos factos e da prova, por não ter indagada com a necessária profundidade e rigor qual a intenção do arguido no momento da ocorrência dos factos e não foram reunidos elementos de facto suficientemente indiciadores da intenção do arguido em tirar a vida ao ofendido;

u. Inexistindo o elemento subjectivo, sempre teria o arguido de ser absolvido do crime de homicídio, valendo o princípio In Dubio pro reo;

B - Erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada no apenso 11.

v. A participação do arguido recorrente no crime de roubo qualificado pelo qual veio condenado o arguido e atinente ao apenso 11, não se apresenta comprovada;

w. A única prova que sustenta a participação, e condenação do arguido, é um reconhecimento efectuado pela testemunha DD, cerca de 9 meses após os factos e pela mão da investigação de um outro inquérito;

x. O reconhecimento efectuado levanta dúvidas que deveriam ter sido melhor sindicadas;

y. Dadas as contradições apresentadas, a defesa solicitou diligências de prova que foram totalmente rejeitadas pelo colectivo e sem sustentação segura;

z. Na dúvida, deveria ter sido permitida a reconstituição dos factos sob pena de colocar em causa o princípio da descoberta da verdade material;

aa. Verdade, é que mal andou o Tribunal ao não determinar uma reconstituição,

bb. diligência esta que se apresentaria, certamente, como um auxiliar à descoberta da verdade;

cc. Por não ter fundamentado claramente esta decisão, de forma a retirar qualquer dúvida, há nulidade da sentença;

dd. Acresce que, pese embora os meios de prova produzidos em audiência estejam sujeitos à livre apreciação do tribunal (art°127º) a verdade é que esta não significa pura convicção subjectiva, mas antes uma convicção objectivável e motivável;

ee. Tal convicção existirá quando, e apenas quando, o tribunal tiver logrado convencer-se da verdade dos factos para além de qualquer dúvida razoável;

ff. Não pode pois basear-se na mera alta probabilidade do facto ou verosimilhança, deve sim ser um processo em que se afasta qualquer dúvida;

gg. Ora as dúvidas permanecem...

hh. O Douto Acórdão ora recorrido revela insuficiente matéria de facto dada por provada. Faltam elementos que, podendo e devendo ser indagados, são absolutamente necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação do arguido;

ii. Verifica-se, assim, um vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada por o tribunal recorrido, podendo (e devendo) fazê-lo, ter deixado de investigar toda a matéria de facto relevante,

jj. Motivo pelo qual os factos apurados e constantes da decisão recorrida se apresentam como insuficientes para a decisão de direito;

kk. Em conformidade entende-se que foi violado, em primeira instância, o Principio In dúbio Pro Reo;

11. Também violou o Tribunal o disposto no art° 410° n° 2, alíneas a) e c);

mm. O art° 163° e enquanto violadora do n° 2 do art° 374°

nn. O art° 340° e o princípio da descoberta da verdade material.

C - Medida da pena

oo. Com base nos factos já descritos e que foram dados como provados, o Tribunal a quo formulou a sua convicção e decidiu condenar o arguido nas penas parcelares já sobejamente elencadas;

pp. Neste âmbito, valendo as reservas atrás expostas, designadamente no tocante à qualificação do crime cometido a apenso 6;

qq. Tendo presente que, para a fixação da medida da pena, é necessário ter em conta as exigências de prevenção, quer gerais, quer especiais, a culpa e as circunstancias em que ocorreram os factos, sob pena de se frustrarem as finalidades da punição;

rr. E que, por seu turno, estatui o n° 2 do mesmo artigo 71° do CP que na determinação concreta da pena o tribunal atende também a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele;

ss. Sem esquecer o princípio do In dúbio pro reo;

tt. Reportados ao caso dos autos, e relativamente à fixação das respectivas penas, considerando as duvidas existentes, que são muitas, e as concretas circunstâncias de prática dos crimes e as condições pessoais e familiares do arguido;

uu. Concluímos que as penas aplicadas merecem reparo, desvelando uma violação ao disposto no art.° 71° do C P por incorrecta e imprecisa aplicação, apresentando-se como demasiado severas e excessivas,

vv. Mais denotando a prática efectiva de aproximar a medida das penas parcelares aplicadas aos seus limites máximos, procurando-se abarcar, salvo melhor opinião e o devido respeito, eventuais crimes não comprovados em sede de julgamento;

ww. Assim, entende-se que, discordando das penas parcelares aplicadas, haverá necessariamente de reformar também a pena única em que foi condenado o arguido, reduzindo-a substancialmente;

xx. Em conformidade, atendendo à qualificação defendida para um crime de ofensas à integridade física qualificada, às dúvidas sobre o reconhecimento efectuado a propósito do apenso 11, à violação, consequente, do princípio in dúbio pro reo,

yy.  deverá o arguido ser condenado apenas por um crime de roubo qualificado (o do apenso 6) em pena próxima do limite mínimo, apresentando-se ajustada uma pena de 4 anos,

zz. Absolvido do crime de roubo qualificado do apenso 11 valendo a presunção de inocência;

aaa. Condenado pelo crime de ofensas à integridade física qualificada em pena também esta próxima do seu limite mínimo, também se afigurando admissível pena de 4 anos de prisão,

bbb. Condenado por crime de detenção de arma proibida em pena de prisão suspensa na sua execução

           No provimento do recurso, defende que a “douta sentença” seja revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta.

                                                    *****

Respondeu o Exmo. Procurador-Geral Adjunto no Tribunal da Relação, conforme consta de fls. 2139 a 2145, e a terminar, refere que, “por força do disposto no artº 400.º, n.º 1, f), do CPP, está excluída do âmbito do recurso a ponderação das penas parcelares, cabendo apreciar somente o “quantum” da pena global”.

E acrescenta considerar “que no caso sub judicibus o julgador teve em conta as circunstâncias dosimétricas para a correcta graduação da pena”, devendo ser negado provimento ao recurso, confirmando-se o acórdão recorrido.

          O recurso foi admitido por despacho de fls. 2146.

          A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu douto parecer de fls. 2155 a 2164, referindo não merecer qualquer censura as penas parcelares e o cúmulo jurídico alcançado, mas defendendo dever ser anulado o acórdão recorrido no segmento da decisão atinente ao Apenso 11, determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, a fim de ser repetido, nessa parte, o julgamento para ampliação da matéria de facto, considerando a respectiva motivação da decisão de facto, de forma a permitir a justa e adequada decisão de direito, terminando por emitir parecer “no sentido da improcedência total do recurso do arguido, mas, oficiosamente, deve este Venerando Tribunal decidir pela nulidade parcial do Acórdão Recorrido, no segmento relativo à matéria de facto fixada, atinente ao Apenso 11, nos termos e para os efeitos do art. 410º, nº 2 al. a) do CPP”.

                                                   ******

Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente silenciou.

                                                   ******

Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 411.º, n.º 5, do Código de Processo Penal.

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Colhidos os vistos, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

                                                            *******

Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (neste sentido, o acórdão do Plenário da Secção Criminal, de 19-10-1995, proferido no processo n.º 46580, Acórdão n.º 7/95, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28-12-1995, e BMJ n.º 450, pág. 72, que fixou jurisprudência, então obrigatória, no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”) e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume o pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objecto do recurso e se fixam os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior.

                                                       *******

Questões propostas a reapreciação e decisão

 

       Como resulta das conclusões do presente recurso, onde o recorrente resume as razões de divergência com o deliberado, as questões propostas a reapreciação por este Supremo Tribunal são as seguintes:

       Questão I – Nulidade por omissão de pronúncia relativamente à pedida alteração de qualificação jurídica no que respeita ao crime de homicídio tentado - Conclusões A – alíneas a. a u.

       Questão II – Erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada no apenso 11 - Conclusões B – alíneas v. a nn.

       Questão III – Medida da pena – Conclusões C – Medida da pena - alíneas oo. a bbb.

               

        Oficiosamente, colocar-se-á a questão prévia de inadmissibilidade do recurso, no que toca às penas parcelares.

                                               *******

        Apreciando. Fundamentação de facto

          Factos Provados

            Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, já que da leitura do texto da decisão, por si só considerado, ou em conjugação com as regras de experiência comum, não emerge a ocorrência de qualquer vício decisório ou nulidade de conhecimento oficioso, mostrando-se a peça expurgada de insuficiências, erros de apreciação ou contradições que se revelem ostensivos, sendo o acervo fáctico adquirido suficiente para a decisão, coerente, sem contradição, harmonioso, e devidamente fundamentado. Por outro lado, o recurso no que toca a impugnação de matéria de facto é, como veremos, manifestamente improcedente.

     

Nota – Na exposição dos factos optou-se por colocar em letra reduzida as situações em que os factos foram praticados não pelo arguido, mas por incerto (s).

Apenso 9 - NUIPC 117/09.6JBLSB

No dia 16 de Junho de 2009, cerca das 09H00, no Posto de Abastecimento de Combustíveis da GALP situado na Avenida de Pádua, em Lisboa, o segurança da empresa CC, EE, e o técnico da empresa FF, GG, terminavam a reparação da avaria do terminal ATM ali existente.

Foi então que, quando o habitáculo onde a caixa ATM se encontrava ainda estava aberto, foram abordados por um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, que empunhava um revólver na mão direita e mantinha um capacete integral colocado na cabeça.

Quando abordou os trabalhadores da CC o referido indivíduo disse-lhes para lhe entregarem os cacifos existentes na ATM. Todavia, dado que o cofre estava em modo técnico, devido à reparação ainda em curso, não foi possível àqueles removerem apenas os cacifos, sendo necessário retirar o módulo onde os cacifos se encontravam inseridos.

Enquanto EE e GG tentavam remover o módulo chegou ao local HH, também técnico da empresa FF, que, de pronto, se viu sob a mira do revólver empunhado pelo indivíduo não identificado.

Uma vez na posse do módulo contendo um cacifo com notas de € 20,00 (vinte euros), o referido indivíduo colocou-se em fuga, na direcção de um dos dois motociclos, onde os seus companheiros o esperavam, a poucos metros, ainda na Avenida de Pádua.

Deste modo e como pretendia, o referido indivíduo não identificado fez sua a quantia de € 6.300,00 (seis mil e trezentos euros), contida naquele cacifo.

Apenso 1 - NUIPC 157/09.5JBLSB

No dia 3 de Setembro de 2009, pelas 15h20, a Carrinha de Transporte de Valores (CTV) da empresa CC com o n.º XXXX e matrícula XX-XX-YY estacionou nas imediações do estabelecimento "Tabacaria e Papelaria T…", situado na Avenida A... R..., n X, Loja X, X, U… da R…, em Odivelas, para que fosse efectuado o carregamento com notas do Banco Central Europeu de uma caixa ATM localizada no interior daquele estabelecimento.

Quando a CTV ali estacionou, o porta-valores II deslocou-se até à caixa ATM, situada no interior daquela tabacaria, para proceder ao fecho contabilístico da ATM.

De seguida, regressou à CTV, na posse de dois cacifos vazios, que carregou com 1500 (mil e quinhentas) notas de € 10,00 (dez euros) e 1000 (mil) notas de € 20,00 (vinte euros).

Quando regressava à tabacaria, na posse dos dois cacifos, recarregados da forma que resta descrita, um individuo cuja identidade não foi possível apurar, que trazia o capuz da camisola que trajava colocado sobre a cabeça, acercou-se de II, munido com um revólver, que empunhou e apontou a este.

Temendo pela vida, II correu na direcção da porta da tabacaria, onde entrou, tentando fechar aquela porta atrás de si.

Todavia, o referido indivíduo encostou-se àquela porta e empurrou-a, de molde a inviabilizar o seu encerramento.

Apercebendo-se do sucedido, JJ, proprietário do estabelecimento, acorreu em auxílio de II, ajudando-o a empurrar a porta, para a fechar.

Foi então que o indivíduo não identificado efectuou dois disparos na direcção da parte inferior daquela porta.

Os projécteis não acertaram em II e JJ. Todavia, estes, intimidados, afastaram-se da porta, tendo o referido indivíduo aproveitado para agarrar e levar consigo os dois cacifos que o II havia deixado no chão, junto à porta.

Desta forma e como pretendia, o indivíduo não identificado fez sua a quantia global de € 35.000,00 (trinta e cinco mil euros.

Apenso 2 - NUIPC 523/09.6 PKLRS

No dia 11 de Outubro de 2009, pelas 10h50, a CTV da empresa CC, com o n.º YYYY e matrícula XX-YY-XX, tripulada pelos vigilantes LL (motorista) e MM (porta-valores), estacionou junto do estabelecimento "Papelaria L… de C…", situado na A… XX de A…, na R…, local onde se iria proceder ao carregamento de uma caixa ATM ali localizada.

Nas imediações do local já se encontravam dois indivíduos não identificados, que seguiam num motociclo.

Acto contínuo, verificando que o vigilante MM já se encontrava na posse dos cacifos carregados (cada um com € 20.000,00), um dos indivíduos não identificados, que trazia um capuz sobre a cabeça e óculos de sol, abordou aquele, empunhando um revólver, que trazia consigo.

Apercebendo-se do sucedido com o seu colega, LL accionou o alarme sonoro da CTV.

Aproveitando a perturbação do indivíduo não identificado com o ruído, MM ainda o tentou agarrar, de molde a retirar-lhe o revólver, sem sucesso, porque a arma foi deflagrada e o projéctil atingiu-o no pé esquerdo.

Como consequência directa e necessária deste disparo, sofreu MM ferida do pé esquerdo com porta de entrada e de saída.

Então, aproveitando a imobilização do ofendido, decorrente de ter sido atingido, o referido individuo pegou nos dois cacifos, que se encontravam no chão, e correu com os mesmos ao encontro do seu companheiro, fugindo assim ambos do local.

Desta forma e como pretendia, apoderou-se de € 40.000,00 (quarenta mil euros), em notas de € 10,00 (dez euros) e € 20,00 (vinte euros).

Apenso 3 - NUIPC 201/09.6 JBLSB

No dia 30 de Novembro de 2009, cerca das 13H20, a CTV da empresa CC, com o n.º ZZZZ e matrícula ZZ-XX-XX, tripulada pelos vigilantes NN (motorista) e OO (porta-valores), estacionou na Avenida Dr. A… P… M..., junto ao Centro Comercial Odivelas Parque, em Odivelas, para proceder, como era hábito, à recolha de valores a alguns estabelecimentos localizados no interior daquela superfície comercial.

Nas imediações, numa das portas de acesso ao estacionamento do Centro Comercial, já se encontrava um indivíduo não identificado que vigiava a chegada daquela CTV.

O referido indivíduo trazia um capacete, com viseira, colocado na cabeça e calçava luvas.

O mencionado individuo não identificado deslocou-se para o local num motociclo de marca, modelo e matrícula não apurados, conduzido por outro indivíduo cuja identidade não foi apurada.

Assim, depois de verificar que o vigilante OO regressava à CTV, já na posse dos valores recolhidos, o primeiro indivíduo acima referido acercou-se do mesmo, empunhando um revólver, de características não apuradas.

Assustado com aquela abordagem e temendo ser atingido com a arma que lhe foi apontada, OO entregou-lhe um saco contendo € 15.619,41 (quinze mil, seiscentos e dezanove euros e quarenta e um cêntimos), em numerário e cheques.

Na posse daquele saco, o indivíduo não identificado fugiu para o interior do parque de estacionamento, onde o aguardava o seu companheiro, num motociclo.

Desta forma e como pretendia, fez sua aquela quantia.

NUIPC 210/09.5JBLSB

No dia 14 de Dezembro de 2009, cerca das 11H50, a CTV da empresa CC, com o n.º XXX e matrícula XX-ZZ-YY, tripulada pelos vigilantes LL (motorista) e PP (porta-valores), estacionou nas imediações do hipermercado L..., situado na Rua J... F..., nº x, na Q... do B... N..., em Carnide, para proceder, como era hábito, ao carregamento da caixa ATM localizada no interior daquela superfície.

Nas imediações estavam dois indivíduos não identificados, vigiando a chegada daquela CTV.

Um dos indivíduos trazia o rosto parcialmente coberto com o capuz da camisola que vestia e com uns óculos de sol e calçava luvas.

Esse indivíduo deslocou-se para o local num motociclo de marca, modelo e matrícula não apurados, conduzido pelo seu companheiro, que ficou imobilizado com a viatura na Rua José Farinha, na intercepção com a Rua Domingos Rebelo.

Assim, depois de verificar que o porta-valores efectuava viagem em direcção à ATM, já na posse dos cacifos carregados - um com 800 (oitocentas) notas de € 20,00 (vinte euros) e outro com 900 (novecentas) notas de € 10,00 (dez euros) -, referido individuo com capuz seguiu no seu encalço e abordou-o junto à ATM, empunhando um revólver, de características não apuradas.

O vigilante LL, que permanecia ao volante da CTV, apercebeu-se das suas intenções e, de pronto, ligou o alarme sonoro da CTV e deslocou-a para o meio da via, de molde a poder seguir o referido indivíduo.

Entretanto, vendo-se na mira daquele revólver e receando ser atingido por um disparo deflagrado do mesmo, PP entregou ao indivíduo não identificado os cacifos com dinheiro que transportava consigo.

Na posse dos cacifos, aquele largou a correr, na direcção da Rua Domingos Rebelo, sendo perseguido pela CTV, conduzida pelo vigilante LL.

Todavia, na intercepção da Rua Domingos Rebelo com a Rua José Farinha o indivíduo não identificado logrou alcançar o seu companheiro e abandonar o local no motociclo por este conduzido.

Desta forma, fez sua a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros).

Apenso 4 - NUIPC 215/09.6 JBLSB

No dia 24 de Dezembro de 2009, cerca das 11H35, a CTV da empresa CC, com o n.º XXX e matrícula XX-ZZ-ZZ, tripulada pelos Vigilantes LL (motorista) e QQ (porta-valores), foi estacionada defronte do Centro Comercial Santo António, sito na Rua de Santo António, em Santo António dos Cavaleiros, para que fosse efectuado o carregamento de uma caixa ATM localizada no interior daquela superfície comercial.

Nas imediações do Centro Comercial estavam dois indivíduos não identificados, vigiando a chegada daquela CTV.

Um dos indivíduos trazia o capuz da camisola colocado na cabeça, usava óculos de sol e calçava luvas.

Verificando que o porta-valores já havia procedido ao carregamento dos dois cacifos que havia retirado do interior da caixa ATM, esse indivíduo seguiu no seu encalço e abordou-o, quando este estava no interior do citado Centro Comercial, acocorado junto à ATM. Acto contínuo, apontou-lhe um revólver, de características não apuradas, ao mesmo tempo que lhe dizia para lhe entregar o dinheiro que trazia consigo.

Assustado com aquela abordagem e verificando que o individuo empunhava um revólver, o vigilante QQ afastou-se dos dois cacifos, que havia pousado no chão.

Então, após desferir duas coronhadas na cabeça do vigilante, o individuo não identificado pegou naqueles cacifos, fugindo de imediato do local, na direcção da Rua Comandante Sacadura Cabral, onde o seu companheiro o aguardava, numa moto, sem matrícula.

Desta forma e como pretendia fez sua a quantia de € 51.000,00 (cinquenta e um mil euros), em notas de € 10,00 (dez euros) e € 20,00 (vinte euros), que se encontravam acondicionadas no interior daqueles dois cacifos.

Como consequência directa e necessária da agressão de que foi alvo, sofreu o ofendido QQ escoriações e pequeno hematoma na região parietal direita, as quais lhe determinaram 4 (quatro) dias de doença, sendo os 2 (dois) primeiros com incapacidade para o trabalho.

Apenso 5 - NUIPC 9/10.0 JBLSB

No dia 19 de Janeiro de 2010, cerca das 08H45, a CTV da empresa BB, com o n.º NNNNN e matrícula NN-NN-NN, tripulada pelos vigilantes RR (motorista) e SS (porta-valores), estacionou defronte do estabelecimento "Papelaria C… de P…", situada na Praça V… de C… B…, P…, em Santa Iria da Azóia, para proceder, como era hábito, ao carregamento da caixa ATM localizada no interior daquele estabelecimento.

Nas imediações estavam dois indivíduos não identificados, vigiando a chegada daquela CTV.

Deslocaram-se para o local num motociclo de marca HONDA, modelo CBR 600 F, de matrícula não apurada.

Um dos indivíduos trazia colocado na cabeça um capacete integral, com a viseira puxada para baixo.

Assim, depois de verificar que o vigilante SS havia entrado na papelaria, esse indivíduo entrou também naquele estabelecimento.

Aí acercou-se do Vigilante, quando este se preparava para abrir o cofre da ATM, e atingiu-o com diversos socos, dizendo-lhe para lhe entregar o saco.

Perante a negativa do ofendido, que lhe disse que não trazia consigo qualquer saco, o referido individuo não identificado efectuou um disparo, na direcção do chão, com o revólver que trazia consigo, dizendo para o ofendido abrir o cofre da ATM.

Entretanto, o vigilante RR, que permanecia ao volante da CTV, apercebeu-se do sucedido, quando ouviu o som do disparo e, de pronto, ligou o alarme sonoro da CTV.

Alertado pelo som do alarme, o indivíduo ainda apontou o revólver que trazia consigo na direcção das pernas de SS, efectuando novo disparo, que atingiu superficialmente a perna esquerda daquele, causando-lhe ferimento que lhe determinou 7 (sete) dias de doença, sendo os primeiros 3 (três) com incapacidade para o trabalho.

Acto contínuo, assustado com o alerta decorrente do som do alarme da CTV, o mencionado individuo acabou por fugir em direcção ao motociclo, onde o seu companheiro o aguardava, com o motor ligado, e abandonou o local, na companhia daquele.

Deste modo e por motivos alheios à sua vontade, não fez sua a quantia de € 104.000,00 (cento e quatro mil euros) com a qual aquela ATM iria ser recarregada.

Apenso 8 - NUIPC 13/10.4 JBLSB

No dia 25 de Janeiro de 2010, por volta das 10h25, a CTV da empresa CC, com o n.º XXXX e matrícula XX-XX-XX, tripulada pelos vigilantes TT (motorista) e UU (porta-valores), foi imobilizada defronte do cabeleireiro "R…", sito no L… de S… J…, n.º X D, na C… Q…, em Algés, para que aqueles procedessem, como era habitual, ao carregamento de uma caixa ATM localizada ao lado daquele estabelecimento.

Nas imediações estavam dois indivíduos não identificados, vigiando a chegada daquela CTV.

Para o efeito, utilizaram um motociclo, de marca, modelo e matrícula desconhecidos.

Um dos indivíduos, cujo rosto estava parcialmente coberto por um gorro tipo "passa-montanhas", posicionou-se em local próximo da ATM, enquanto o seu companheiro permaneceu ao comando daquele motociclo, estacionado nas imediações, na Rua Bento de Jesus Caraças.

Assim, constatando que o vigilante UU já havia carregado os cacifos que retirara da ATM, o mencionado indivíduo aproximou-se daquele e apontou-lhe uma arma de fogo, de características não determinadas, que trazia consigo. Concomitantemente disse-lhe para lhe dar aqueles cacifos.

Assustado com aquela abordagem, o vigilante largou os dois cacifos, pousando-os no chão, e o individuo não identificado de pronto pegou nos mesmos, fugindo de imediato do local, ao encontro do seu companheiro.

Desta forma e como pretendia fez sua a quantia de € 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros), que se encontrava acondicionada no interior daqueles cacifos, em notas de € 10,00 (dez euros) e € 20,00 (vinte euros).

Apenso 14 - NUIPC 44/10.4 JBLSB

No dia 19 de Março de 2010, cerca das 09h00, a CTV da empresa BB com o número XZXZ e matrícula CC-CC-CC, tripulada pelos vigilantes VV (motorista), XX (porta-valores) e YY (vigilante), estacionou na Avenida C… de L…, no C…, defronte da pastelaria "Q… do C…", a fim de ser efectuado o carregamento da ATM ali existente.

XX e YY fizeram uma primeira deslocação ao local, sem levarem consigo qualquer valor e, não detectando nada anormal, regressaram à CTV e pegaram num saco contendo € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros), destinados ao carregamento daquela ATM.

Assim, quando YY se encontrava junto à porta do estabelecimento e XX já se encontrava no seu interior, junto à ATM, foram abordados, primeiro YY e de seguida XX, por um individuo não identificado, que se apresentava com o rosto coberto por um gorro, tipo "passa-montanhas", que empunhou e lhes apontou uma arma de fogo, de características não apuradas, que transportava consigo.

Assustados por se verem na mira daquela arma XX e YY nada fizeram, permitindo assim que aquele individuo se apossasse do saco com numerário carregado por XX.

Na posse daquele saco, o mencionado indivíduo abandonou o estabelecimento em fuga.

VV ainda tentou seguir o referido indivíduo, mas sem sucesso.

Desta forma e como pretendia, o referido indivíduo apoderou-se dos citados € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros), que fez seus.

Todavia, na fuga deixou cair várias notas, perfazendo o montante total de € 2.195,00 (dois mil, cento e noventa e cinco euros), que foram recuperadas e entregues ao representante da BB.

Apenso 11 - NUIPC 60/10.6 JBLSB

No dia 05 de Maio de 2010, por volta das 10h20, a CTV da empresa CC, com o n.º XXXX e matrícula XX-XX-XX, tripulada pelos Vigilantes DD (motorista) e WW (porta-valores), foi imobilizada defronte da “Farmácia B..”, sita na Rua T… V.., n.º XX-B, em Lisboa, para que aqueles procedessem ao carregamento de uma caixa ATM localizada no interior daquele estabelecimento.

O arguido, acompanhado por um indivíduo do sexo masculino de identidade não apurada, já se encontrava nas imediações do local, vigiando.

O arguido e companheiro deslocaram-se para o local num motociclo, de matrícula desconhecida e cilindrada alta.

O arguido tinha a cabeça coberta pelo capuz da camisola que envergava, ocultava o rosto com óculos de sol e trazia luvas calçadas.

Assim, constatando que o porta-valores se deslocava pela segunda vez à caixa ATM, transportando dois cacifos já carregados com dinheiro, o arguido aproximou-se daquele, quando o mesmo se encontrava acocorado junto à ATM, no interior da farmácia, e apontou-lhe uma arma de fogo, de características não determinadas, que trazia consigo. Concomitantemente empurrou-o, derrubando-o e disse-lhe para permanecer deitado no chão.

Assustado com aquela abordagem, WW manteve-se deitado no chão, e o arguido de pronto pegou nos dois cacifos que aquele havia colocado no interior da ATM, que ainda permanecia aberta, fugindo de imediato do local, ao encontro do seu companheiro.

Desta forma e como pretendia fez sua a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), em duas mil notas de € 5,00 (cinco euros) e duas mil notas de € 20,00 (vinte euros).

Na fuga, o arguido e companheiro passaram defronte da farmácia, na citada moto.

DD ainda dirigiu a carrinha no encalço do motociclo onde seguia o arguido, perdendo-lhe o rasto na N 117, no sentido da Amadora.

 Apenso 15 - NUIPC 65/10.7 JBLSB

No dia 20 de Maio de 2010, pelas 08h50, a CTV da empresa CC, com o número XXXX e matrícula XX-XX-XX, tripulada pelos vigilantes DD (motorista) e AB (porta-valores), estacionou defronte das instalações do supermercado "M... B...", situadas na Avenida E… A… C…, nº XX, em Oeiras, para efectuar o carregamento de uma ATM ali existente.

Quando AB já se encontrava no interior daquele estabelecimento, preparando a ATM para ser abastecida, com dois cacifos contendo € 22.000,00 (vinte e dois mil euros), em notas do Banco Central Europeu, foi surpreendido por um individuo não identificado, que o abordou apontando-lhe ao peito um revólver, de características não apuradas, ao mesmo tempo que lhe dizia: "Dá cá o dinheiro!".

O referido indivíduo trazia um capuz colocado sobre a cabeça e ocultava parcialmente o rosto com os óculos de lentes escuras que trazia colocados.

Assustado e temendo vir ao ser atingido com um projéctil deflagrado por aquela arma, AB ficou imobilizado, aproveitando, então, o mencionado individuo para se apoderar daqueles cacifos com notas.

Uma vez na posse dos cacifos e respectivo conteúdo, que fez seu, o indivíduo abandonou o local, em fuga.

Apenso 16 - 67/10.3 JBLSB

No dia 25 de Maio de 2010, pelas 10h40, a CTV da empresa CC com o número YYYY e matrícula YY-YY-YY, tripulada pelos vigilantes AC (motorista) e AD (porta-valores) imobilizou-se na Alameda António Sérgio, em Linda-a-Velha, defronte do Centro Comercial Torre das Flores, para que fosse efectuado o carregamento com notas do Banco Central Europeu de uma caixa ATM localizada no interior daquela superfície comercial.

Nas imediações estavam dois indivíduos não identificados, vigiando e aguardando a chegada daquela CTV e que se deslocaram num motociclo, de cor preta, da marca SUZUKI, modelo GSXR 600, sem chapa de matrícula.

Quando a CTV ali estacionou o Vigilante AD deslocou-se até à caixa ATM, situada no interior do centro comercial, para proceder ao respectivo carregamento.

Então, um dos referidos indivíduos, ainda com um capacete colocado na cabeça, abordou o Vigilante, quando este estava junto à caixa ATM, e exibiu-lhe um revólver, de características não determinadas, ao mesmo tempo que lhe dizia para lhe entregar os cacifos com dinheiro.

Intimidado, AD entregou dois cacifos com € 30.000,00 (trinta mil euros), em notas do Banco Central Europeu.

De seguida, já na posse daqueles cacifos com dinheiro, o referido indivíduo saiu daquele centro comercial e juntou-se ao seu companheiro, que o aguardava no motociclo, parado nas imediações.

Assim e como pretendia, logrou fugir do local, levando consigo a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros).

Apenso 7 - NUIPC 70/10.3 JBLSB

No dia 5 de Junho de 2010, cerca das 11H00, a CTV da empresa BB, com o n.º ZZZZ e matrícula ZZ-ZZ-SS, tripulada pelos vigilantes RR (motorista) e AE (porta-valores), foi estacionada defronte do estabelecimento “Q… do C..”, na Avenida C.. de L..., no Cacém, para que fosse efectuado o carregamento de uma caixa ATM localizada no interior daquela pastelaria.

Nas imediações estavam dois indivíduos não identificados, encontrando-se um deles com o rosto parcialmente coberto com o capuz da camisola que envergava e uns óculos de sol.

Assim, quando o vigilante AE se dirigiu à citada pastelaria, levando consigo um saco engodo, para dar início ao procedimento de carregamento da ATM, foi seguido por aquele indivíduo, que entrou no estabelecimento pouco depois daquele.

Alertado pela forma de trajar e atitude do arguido, o vigilante RR accionou o alarme sonoro da CTV, para avisar o colega.

Foi então que o referido indivíduo abordou AE, que havia aberto a ATM, e apontou-lhe um revólver, de características não apuradas, ao mesmo tempo que lhe dizia para lhe entregar o saco que trazia consigo.

AE entregou o saco engodo ao mencionado individuo, que o levou consigo, convicto de que teria dinheiro no seu interior, fugindo de seguida pelas escadas de acesso a uma passagem inferior de uma artéria, onde o seu companheiro o aguardava, num motociclo.

Desta forma, por razões alheias à sua vontade, o referido indivíduo não fez sua qualquer quantia.

Apenso 6 - NUIPC 79/10.7 JBLSB

No dia 22 de Junho de 2010, pelas 12h00, a CTV da empresa CC com o nº XXXX, tripulada pelos vigilantes AF (motorista) e AG (porta-valores), foi estacionada na rotunda existente nas imediações da agência da Companhia de S... T..., sita na Rua Q... de S... M..., em Algés, para que fosse efectuado o carregamento com notas do Banco Central Europeu de uma caixa ATM localizada no interior daquela agência.

O arguido AA, acompanhado por indivíduo do sexo masculino desconhecido dos autos, já se encontrava nas imediações do local, vigiando e aguardando a chegada da CTV.

O arguido e companheiro deslocaram-se numa moto de cilindrada alta.

Quando a CTV ali estacionou, o porta-valores AG deslocou-se até à caixa ATM, situada no interior daquela agência, para proceder à remoção dos cacifos vazios que se encontravam na ATM.

Pouco depois, o porta-valores regressou à CTV, com os cacifos vazios e procedeu ao seu carregamento, com a quantia monetária de € 51.000,00 (cinquenta e um mil euros), em notas.

Quando o porta-valores se dirigiu para a citada agência, transportando consigo os cacifos contendo € 51.000,00, foi abordado pelo arguido, que trazia um capacete integral colocado na cabeça e empunhava um revólver.

Percebendo os intuitos do arguido, o vigilante entrou rapidamente no interior da agência e fechou a porta.

Todavia, o arguido seguiu no seu encalço e pontapeou a porta, até lograr abri-la.

Uma vez no interior da agência, o arguido apontou o revólver ao ofendido e pediu-lhe os cacifos.

Face à renitência do ofendido, o arguido efectuou um disparo na direcção das pernas do mesmo. O projéctil não o acertou. Contudo, intimidado, AG acabou por entregar os cacifos ao arguido, que de pronto abandonou o local.

Acto contínuo, o ofendido AG seguiu no encalço do arguido.

Vendo-se perseguido, o arguido voltou a apontar o revólver que trazia consigo, efectuando, pelo menos, dois disparos na direcção do tronco do ofendido e seguramente um outro, em circunstâncias não concretamente apuradas.

AG foi atingido no tórax por um dos dois mencionados projécteis deflagrados.

Porém, o ofendido ainda conseguiu agarrar o arguido, retirar-lhe o capacete que trazia colocado na cabeça, vendo-lhe, assim, o rosto.

De seguida, o arguido logrou libertar-se e juntou-se ao seu companheiro, que o aguardava perto na moto.

Assim e como pretendiam, fugiram do local, levando consigo a citada quantia de € 51.000,00 (cinquenta e um mil euros).

AG foi prontamente assistido no serviço de urgências do Hospital de São Francisco Xavier. Apresentava traumatismo torácico por ferida perfurante do hemitórax esquerdo, hemotorax por feridas perfurantes, transfixivas dos dois lobos pulmonares, lesão da pleura mediastinica justa aórtica e equimose da adventícia da aorta. Foi sujeito a cirurgia cardiotorácica para encerramento de quatro feridas do pulmão por toracotomia esquerda.

O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o propósito de tirar a vida ao ofendido AG, disparando na direcção de zona do corpo onde sabia que se alojavam órgãos vitais.

Tal propósito resulta do número de disparos, da distância relativa a que se encontrava da vítima e do instrumento utilizado, o qual sabia idóneo para causar a morte a qualquer pessoa que por ele fosse daquela forma atingida.

Tal desiderato só não veio a ser atingido devido à pronta assistência médica que foi prestada ao ofendido.

 

Apenso 12 - NUIPC 91/10.6 JBLSB

No dia 07 de Julho de 2010, cerca das 12h00, a CTV da empresa CC, com o n.º XXX, tripulada pelos Vigilantes AH (motorista) e AI (porta-valores), estacionou junto às instalações da companhia "I... Bo...", situada na Rua C... de A..., nº xx, Loja A, em Alfornelos, local onde se iria proceder ao carregamento de uma caixa ATM localizada no interior daquelas instalações, com € 54.000,00 (cinquenta e quatro mil euros).

Nas imediações do local encontravam-se dois indivíduos do sexo masculino, não identificados, a bordo de um motociclo, que vigiavam o local, no sentido de controlarem a chegada da viatura da CC.

Um dos indivíduos trazia o rosto semi-oculto com o capuz da camisola que vestia e com os óculos de sol que trazia colocados.

Acto contínuo, esse indivíduo abordou o porta-valores, quando este subia as escadas de acesso à "Império Bonança", transportando em cada mão um cacifo para colocar no interior da caixa ATM, e disse-lhe "Larga, larga!", ao mesmo tempo que lhe apontava uma pistola.

Assustado com aquela abordagem, o porta-valores largou de imediato os cacifos, os quais foram prontamente agarrados pelo referido individuo não identificado, ignorando que estes não se encontravam carregados, dado aquele primeiro carregamento, por questões de segurança, ser simulado.

Acto contínuo, e após se apoderar das chaves de abertura dos cacifos, o indivíduo fugiu de imediato em direcção ao motociclo conduzido pelo seu companheiro, que o aguardava nas imediações, no Largo João das Regras.

Deste modo, e por razões alheias à sua vontade, o indivíduo não se apoderou de qualquer quantitativo monetário

Apenso 13 - NUIPC 152/10.1 JBLSB 

No dia 04 de Dezembro de 2010, cerca das 10h30, a CTV da empresa CC, com o n.º XXXX e matrícula XX-XX-XX, tripulada pelos Vigilantes AJ (motorista) e AL (porta-valores), estacionou defronte do supermercado "P… D…", sito na Avenida A... E..., nº zz, A/B, em Queluz, para que fosse efectuado o carregamento com notas do Banco Central Europeu de uma caixa ATM localizada no interior daquele estabelecimento, junto às caixas registadoras.

Nas imediações do local encontravam-se dois indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, vigiando e aguardando a chegada daquela viatura, que se deslocaram em motociclo de cilindrada elevada, de matrícula e modelo desconhecidos.

Quando o Vigilante AL se deslocou, pela segunda vez, à caixa ATM situada no interior daquele estabelecimento, trazendo consigo dois cacifos, carregados com notas de € 10,00 (dez euros) e € 20,00 (vinte euros), no montante global de € 36.000,00 (trinta e seis mil euros), foi abordado por um dos referidos indivíduos, que trazia o rosto oculto pelo capuz da camisola que vestia e por um par de óculos com lentes escuras.

Perante a exibição da pistola que o indivíduo empunhava, AL nada fez, com receio de poder ser atingido por um projéctil deflagrado por aquela arma.

Já na posse daqueles dois cacifos e de todo o dinheiro acondicionado no seu interior, o indivíduo abandonou o local, em passo de corrida, ao encontro do seu companheiro, que já o aguardava defronte do estabelecimento.

Desta forma e como pretendia, logrou fugir do local, fazendo sua aquela quantia.

*

Relativamente aos factos descritos nos apensos 6 e 11 o arguido AA actuou deliberada, livre e conscientemente, em conjugação de esforços e intentos com outro indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, com o intuito de se apoderar dos valores descritos atrás, que se encontravam à guarda da ofendida CC, muito embora soubesse que não lhe pertenciam e que agia contra a vontade da respectiva proprietária.

Para o efeito, valeu-se da ameaça empregue contra os ofendidos encarregues de transportarem os receptáculos de valores, com a qual os constrangeu aos seus intentos, pois que, como sabia e queria, a simples exibição das armas de fogo que trazia consigo, aliada ao efeito surpresa da abordagem, violentava a liberdade daqueles, levando-os a acreditar que poderiam ser atingidos por um disparo deflagrado das armas que lhes foram exibidas, caso não acatassem as ordens do arguido.

Mais, o arguido ao deter e usar a arma acima referenciada no apenso 6 bem sabia que não era titular de licença de uso e porte de arma de defesa. Todavia, ainda assim, não se coibiu de a deter, transportar e utilizar, designadamente na prática dos factos acima referidos, consciente da ilicitude da sua conduta.

Sabia, ainda, que todas as suas descritas condutas eram proibidas e puníveis.

II - PARA ALÉM DA FACTUALIDADE PROVADA, ACIMA DESCRITA, COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSA, E NO QUE CONCERNE O PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CÍVEL DEDUZIDO PELA CC, PROVOU-SE QUE :

Apenso 9

O cacifo continha 315 notas de € 20,00.

Apenso 6

O ofendido AG foi atingido por um projéctil deflagrado na coxa esquerda.

No serviço de urgências do Hospital S. Francisco Xavier apresentava ferimento na coxa esquerda.

III - PARA ALÉM DA FACTUALIDADE PROVADA, ACIMA DESCRITA, COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSA, E NO QUE CONCERNE O PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CÍVEL DEDUZIDO PELA PROSSEGUR, PROVOU-SE QUE :

Apensos 5, 7 e 14

A demandante accionou o seguro de responsabilidade civil para poder ressarcir o seu cliente, o B… S… T… do montante de € 82.805,00. Para o efeito suportou a franquia de € 3.000,00.

IV – Provou-se, ainda, que:

O arguido é o mais novo de quatro irmãos, filhos de um casal caboverdiano, a residir em Portugal desde 1973.

O arguido terá recebido uma educação regrada que valorizava os hábitos de trabalho.

Frequentou a escola até aos 16 anos de idade, tendo concluído a escolaridade obrigatória e frequentado, sem êxito, o 10.º ano. Na sequência do falecimento do seu pai, do AVC sofrido pela mãe, na mesma altura, e agravamento da toxicodependência do seu irmão mais velho, o arguido abandonou a sua escolarização e passou a trabalhar de forma mais regular. Anteriormente, o mesmo trabalhava habitualmente em períodos de férias, desenvolvendo actividades indiferenciadas e curtos períodos.

Ainda em contexto escolar, o arguido iniciou os consumos esporádicos de haxixe que mantém e estabeleceu os primeiros contactos com o sistema de Administração de Justiça Penal, tendo sido condenado a pena de prisão suspensa na sua execução.

O seu percurso profissional tem-se caracterizado por alguma mobilidade, decorrente de situações laborais indiferenciadas, na área da construção civil, de operador de armazém, e, desde 2009, em estabelecimentos comercias de vestuário e alimentares, trabalhando para familiares.  

Esteve inscrito no centro de emprego, desde 2006, ano em que se inscreveu num curso de formação profissional de "Mecatrénica" não tendo obtido até ao presente qualquer resposta.

À data da sua prisão, encontrava-se a viver com a progenitora, pernoitando esporadicamente em casa da sua namorada. A dinâmica familiar caracteriza-se, assim, pela entreajuda e constituiu-se como suporte emocional e material para ambos.

O arguido trabalhava, há mais de um ano, de forma irregular, num café/restaurante de um familiar localizado num bairro social - Bairro 6 de Maio na Damaia - Café "A…", apesar de não dispor de vínculo laboral. Auferia rendimentos incertos, que oscilavam entre os € 300,00 a € 600,00 por mês.

Encontra-se preso no Estabelecimento Prisional de Lisboa nem sempre apresentando um comportamento adequado e uma postura adaptada ao meio institucional em causa, tendo registado uma sanção disciplinar por posse de telemóvel.

Dispõe de suporte afectivo e sócio-económico proporcionado pela progenitora, mas esta denota total ausência de controlo e de supervisão no cumprimento das regras e vivências quotidianas do arguido.

*

V - O certificado do registo criminal do arguido averba as seguintes condenações:

- em 19/12/2005, no Proc. 901/04.7 POLSB, pela prática em 02/07/2004, de um crime de roubo, na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de quatro anos;

- em 24/04/2008, no Proc. 587/07.7 GTCSC, pela prática em 05/11/2007, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 80 dias de multa;

- em 02/04/2009, no Proc. 489/06.4 PHLRS, pela prática em 10/03/2006, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena de seis meses de prisão, substituída por 180 dias de multa;

- em 01/03/2011, no Proc. 2/10.9 SJLSB, pela prática em 06/03/2010, de três crimes de injúria e de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena única de dez meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano.

                                             

                                                                             ********

        Questão Prévia - Admissibilidade do recurso - (Ir)recorribilidade quanto às penas parcelares, aplicadas em medida igual ou inferior a oito anos de prisão e confirmadas pelo Tribunal da Relação

       

Nas conclusões C – Medida da pena, alíneas oo. a ww., yy. e bbb., o recorrente invoca a excessividade das penas aplicadas, referindo-se às parcelares e à pena única apenas na conclusão ww., mas face à confirmação pelo Tribunal da Relação de Lisboa das penas aplicadas em Oeiras, somente estará em reapreciação a pena única. 

         Há que abordar a questão da admissibilidade do presente recurso, face ao disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP.

Defendeu o Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa a inadmissibilidade do recurso interposto pelo arguido, nos termos do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, no que toca às penas parcelares.
         Este Supremo Tribunal tem entendido, que em caso de dupla conforme total, como ora ocorre, à luz do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, são irrecorríveis as penas parcelares aplicadas em medida igual ou inferior a oito anos de prisão e confirmadas pela Relação, restringindo-se a cognição às penas de prisão aplicadas em medida superior a oito anos.         
          O presente recurso foi interposto de acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-11-2012, tratando-se de um acórdão confirmatório, na totalidade, de condenação proferida na primeira instância em 19 de Abril de 2012, na vigência do regime de recursos introduzido com a entrada em vigor da 15.ª alteração do Código de Processo Penal, operada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, e que teve lugar em 15 de Setembro de 2007, tendo o processo tido início em 14 de Dezembro de 2009, sendo que os factos julgados foram praticados em 5 de Maio e 22 de Junho de 2010.
      Os parâmetros a ter em consideração na análise que se segue são a data do início do processo, as datas da decisão de 1.ª instância e do acórdão recorrido, e as medidas concretas das penas aplicadas.
      Haverá que ter em conta que o acórdão ora recorrido é um acórdão confirmativo, havendo na parte que nos interessa, ou seja, no que respeita à posição processual do ora recorrente, entre uma e outra decisões uma identidade total, completa, absoluta e plena, e como assim, como se procurará demonstrar, impeditiva de recurso relativamente a penas parcelares, que foram de 2 anos de prisão, 6 anos de prisão, por duas vezes, e 8 anos de prisão.
      A lei reguladora da admissibilidade dos recursos é a que vigora no momento em que é proferida a decisão objecto de recurso.

       Vejamos as disposições legais aplicáveis.

      É admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça nos casos contemplados no artigo 432.º do Código de Processo Penal, sem prejuízo de outros casos que a lei especialmente preveja, como explicita o artigo 433.º do mesmo diploma legal.

      No que importa ao caso presente rege a alínea b) do n.º 1 do artigo 432.º do Código de Processo Penal, que se manteve inalterada e que estabelece que:

“1 - Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:

 b) De decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º”.

Com a entrada em vigor, em 15 de Setembro de 2007, da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, foi modificada a competência do Supremo Tribunal de Justiça em matéria de recursos de decisões proferidas, em recurso, pelas relações, restringindo-se a impugnação daquelas decisões para este Supremo Tribunal, no caso de dupla conforme, a situações em que tenha sido aplicada pena de prisão superior a oito anos.

 

Estabelecia o artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na redacção da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto:

«1 - Não é admissível recurso:

(…)

f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções.»

A partir da alteração introduzida pela aludida Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, passou a estabelecer o artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal:

«1 – Não é admissível recurso:

(…)

f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos».

A alteração legislativa de 2007 teve um sentido restritivo, impondo uma maior restrição ao recurso, referindo a pena aplicada e não já a pena aplicável, quer no recurso directo, quer no recurso de acórdãos da Relação que confirmem decisão de primeira instância, circunscrevendo a admissibilidade de recurso das decisões da Relação confirmativas de condenações proferidas na primeira instância às que apliquem pena de prisão superior a oito anos.

Com efeito, à luz do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, na redacção actual, só é possível o recurso de decisão confirmatória da Relação no caso de a pena aplicada ser superior a 8 anos de prisão.

anteriormente, porém, à luz da redacção de 1998 da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, a restrição ora referida era defendida em acórdãos do Tribunal Constitucional, como no Acórdão n.º 64/2006, de 24-01-2006, processo n.º 707/2005, publicado in Diário da República, II Série, de 19-05-2006 (e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 64.º volume, 2006, págs. 447 e ss.), que decidiu, em Plenário, com seis votos de vencido, reafirmando o juízo de não inconstitucionalidade constante do acórdão n.º 640/2004, de 12-11-2004, da 3.ª secção, com o qual estava em contradição o acórdão n.º 628/2005, de 15-11-2005, publicado in DR, II Série, de 23-05-2006, “não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso interposto apenas pelo arguido para o Supremo Tribunal de Justiça de um acórdão da Relação que, confirmando a decisão da 1.ª instância, o tenha condenado numa pena não superior a oito anos de prisão, pela prática de um crime a que seja aplicável pena superior a esse limite”.

        Acerca da nova formulação legal introduzida em Setembro de 2007, que conduziu a uma restrição do recurso e entendendo daí não decorrer violação do direito de recurso, por estar assegurado um duplo grau de jurisdição e não se impor um, aliás, não previsto duplo grau de recurso, tem-se pronunciado este Supremo Tribunal, conforme se colhe dos acórdãos apontados a seguir.

         No acórdão de 09-01-2008, processo n.º 4457/07-3.ª, pode ler-se: Após a revisão do CPP, da nova redacção da al. f) do n.º 1 do art. 400º, resulta que é admissível recurso para o STJ de acórdão da Relação, proferido em recurso, que confirme decisão cumulatória que haja condenado o arguido em pena única superior a 8 anos de prisão, ainda que aos crimes parcelarmente considerados seja aplicável pena de prisão inferior a 8 anos, embora, no caso e no que respeita à medida concreta da pena, o recurso fique limitado à pena conjunta resultante do cúmulo.

        Como se extrai do acórdão de 03-04-2008, processo n.º 574/08 - 5.ª Secção, no domínio da actual versão do CPP, as als. e) e f) do n.º 1 do art. 400.º referem-se à pena aplicada e não à aplicável, sem menção da frase “mesmo em caso de concurso de infracções”.

        Houve, portanto, uma inversão do legislador quanto a esta questão da recorribilidade, restringindo drasticamente o recurso da Relação para o Supremo. Importa, por isso, não ir mais além do que a letra da lei.

       Daí que seja razoável concluir que, actualmente, ao contrário do que dantes sucedia, a questão da irrecorribilidade deve aferir-se pela pena única aplicada e já não atendendo às penas parcelares, isto é, o que importa é a pena que foi aplicada como resultado final da sentença, toda ela abrangida no âmbito do recurso, nos termos do art. 402.º, n.º 1, do CPP, salvo declaração em contrário por parte do recorrente.
      Segundo o acórdão de 18-06-2008, processo n.º 1624/08-3.ª, a lei reguladora da admissibilidade do recurso – e por consequência, da definição do tribunal de recurso – será a que vigorar no momento em que ficam definidas as condições e os pressupostos processuais do próprio direito ao recurso (seja na integração do interesse em agir, da legitimidade, seja nas condições objectivas dependentes da natureza e conteúdo da decisão: decisão desfavorável, condenação e definição do crime e da pena aplicável), isto é, no momento em que primeiramente for proferida uma decisão sobre a matéria da causa, ou seja, a da 1.ª instância.
       Sendo o acórdão de 1.ª instância proferido já na vigência do regime de recursos posterior à entrada em vigor das alterações introduzidas pela Lei n.º 48/2007, tendo a arguida sido condenada numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão e tendo o Tribunal da Relação confirmado o decidido pela 1.ª instância, não é admissível recurso para o STJ, atento o disposto no art. 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, que determina a irrecorribilidade de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos (na redacção anterior, o critério da recorribilidade em caso de idêntica decisão nas instâncias – “dupla conforme” – partia da pena aplicável ao crime e não da pena concretamente aplicada).

       Segundo o acórdão de 18-06-2008, processo n.º 1971/08-3.ª “a nossa jurisprudência e doutrina são unânimes em reconhecer que a lei reguladora da admissibilidade do recurso é a vigente na data em que é proferida a decisão recorrida – lex temporis regit actum – e isto porque as expectativas eventualmente criadas às partes ao abrigo da lei antiga se dissiparam à face da lei nova, não havendo que tutelá-las”.

       Nos acórdãos de 15-07-2008, processo n.º 816/08-5.ª e de 14-08-2008, processo n.º 2523/08-5.ª, defende-se a obrigatoriedade de reponderação da medida da pena do concurso, se a aplicada nesse âmbito for superior a 8 anos de prisão, ainda que os crimes que fazem parte desse concurso, singularmente considerados, tenham sido punidos na 1ª instância com penas inferiores ou iguais a tal limite e confirmadas pela Relação.

      Explicita-se aí: Actualmente, se é a pena aplicada que constitui a referência da recorribilidade, essa pena tanto pode ser a referida a cada um dos crimes singularmente considerados, como a que se reporta ao concurso de crimes (pena conjunta ou pena única).

      O legislador aferiu a gravidade relevante como limite da dupla conforme e como pressuposto do recurso da decisão da Relação para o STJ pela pena efectivamente aplicada, quer esta se refira a um crime singular, quer a um concurso de crimes.

      Tal significa que o STJ está obrigado a rever as questões de direito que lhe tenham sido submetidas em recurso ou que ele deva conhecer ex officio e que estejam relacionadas com os crimes cuja pena aplicada tenha sido superior a 8 anos de prisão e também a medida da pena do concurso, se a aplicada nesse âmbito for superior a 8 anos de prisão, ainda que os crimes que fazem parte desse concurso, singularmente considerados, tenham sido punidos na 1.ª instância com penas inferiores ou iguais a tal limite e confirmadas pela Relação.

       No acórdão de 10-09-2008, processo n.º 1959/08-3.ª, diz-se: “Por efeito da entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29-08, foi alterada a competência do STJ em matéria de recursos de decisões proferidas, em recurso, pelos Tribunais de Relação, tendo-se limitado a impugnação daquelas decisões para este Tribunal, no caso de dupla conforme, às situações em que seja aplicada pena de prisão superior a 8 anos – redacção dada à al. f) do n.º 1 do art. 400º do CPP – quando no domínio da versão pré - vigente daquele diploma a limitação incidia relativamente a decisões proferidas em processo por crime punível com pena de prisão não superior a 8 anos”.

        No acórdão de 29-10-2008, processo n.º 3061/08-5.ª, refere-se: Considerando as datas dos veredictos da 1.ª e 2.ª instâncias, já em plena vigência da Lei 48/2007, será de observar a nova redacção conferida à alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, donde resulta a inviabilidade da interposição de recurso para o STJ, sendo o acórdão recorrido (da Relação) condenatório e confirmatório (em recurso) de pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, não superior, portanto, ao ali apontado limite de 8 anos.
      Pode ler-se no acórdão de 13-11-2008, processo n.º 3381/08-5.ª - No caso de concurso de infracções, tendo a Relação confirmado, em recurso, decisão de 1ª instância que aplicou pena de prisão parcelar não superior a 8 anos, essa parte não é recorrível para o STJ, nos termos do artigo 400, n.º 1, alínea f), do CPP, na versão da Lei n.º 48/2007, de 29-08, sem prejuízo de ser recorrível qualquer outra parte da decisão, relativa a pena parcelar ou mesmo só à operação de formação da pena única que tenha excedido aquele limite.
      Como se retira dos acórdãos de 07-05-2008, processo n.º 294/08 - 3.ª; de 10-07-2008, processo n.º 2146/08 - 3.ª; de 03-09-2008, processo n.º 2192/08-3.ª; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08 - 3.ª; de 04-02-2009, processo n.º 4134/08 - 3.ª; de 04-03-2009, processo n.º 160/09 - 3.ª; de 17-09-2009, processo n.º 47/08.9PBPTM.E1-3.ª, in CJSTJ 2009, tomo 3, pág. 188; e de 07-04-2010, processo n.º 1655/07.0TAGMR.G1.S1-3.ª, todos com o mesmo relator, com a revisão do Código de Processo Penal deixou de subsistir o critério do «crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos» para se estabelecer o critério da pena aplicada não superior a oito anos; daí que se eliminasse a expressão «mesmo no caso de concurso de infracções». Assim, mesmo que ao crime seja aplicável pena superior a 8 anos, não é admissível recurso para o Supremo, se a condenação confirmada não ultrapassar 8 anos de prisão. E, ao invés, se ao crime não for aplicável pena superior a oito anos de prisão, só é admissível recurso para o STJ se a condenação confirmada ultrapassar oito anos de prisão, decorrente de cúmulo, e restrito então à pena conjunta. (Quanto a este último aspecto, cfr. acórdãos de 23-09-2009, processo n.º 27/04.3GBTMC.S1-3.ª; de 21-10-2009, processo n.º 296/06.4JABRG.G1.S1-3.ª.).
      Neste sentido, podem ainda ver-se os acórdãos de 21-01-2009, processo n.º 2387/08-3.ª, por nós relatado, não conhecendo da pena aplicada por crime de maus tratos a cônjuge, mas apenas de homicídio qualificado atípico e de pena única; de 11-02-2009, processo n.º 113/09-3.ª, no sentido de ser recorrível apenas a pena única, quando ultrapasse os 8 anos de prisão; de 25-03-2009, processo n.º 486/09-3.ª; de 15-04-2009, processo n.º 583/09-3.ª; de 16-04-2009, processo n.º 491/09-5.ª “o recurso para o Supremo de acórdão da Relação que confirme decisão condenatória de 1.ª instância apenas tomará conhecimento das questões relativas aos crimes cujas penas parcelares ultrapassem aquele limite de 8 anos, e não as havendo, limitar-se-á à pena única, se superior a 8 anos”; de 29-04-2009, processo n.º 391/09-3.ª, por nós relatado, não conhecendo da pena aplicada por detenção de arma, mas apenas de tráfico de estupefacientes e de pena única; de 07-05-2009, processo n.º 108/09-5.ª; de 14-05-2009, processo n.º 998/07.8PBVIS.C1.S1-5.ª, onde se afirma que “são irrecorríveis os acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos”; de 27-05-2009, processo n.º 50/06.3GAOFR.C1.S1, por nós relatado, em que se conheceu apenas da medida da pena única fixada em 11 anos de prisão e não das penas aplicadas pelos sete crimes em equação; de 27-05-2009, no processo n.º 384/07.0GDVFR.S1-3.ª; de 25-06-2009, processo n.º 145/02.2PAPBL.C1.S1-3.ª e de 10-12-2009, processo n.º 496/08.2GTABF.E1.S1-3.ª, proferido pelo mesmo relator do anterior, onde se diz: «Tendo havido confirmação total, em recurso, pela Relação, de acórdão condenatório em penas de prisão não superiores a 8 anos – arts. 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al. f), do CPP – as soluções normativas sobre admissibilidade dos recursos para o STJ decorrentes da revisão de 2007 do processo penal, introduzidas pela Lei n.º 48/2007, não o permitem»; ou seja, «não é admissível recurso relativamente às penas parcelares e sobre as questões que lhe sejam conexas, e apenas a pena única, aplicada em medida superior a 8 anos de prisão, é passível de recurso»; de 17-09-2009, processo n.º 47/08.9PBPTM-E1-3.ª; do mesmo relator, de 23-09-2009, processo n.º 27/04.3GBTMC.S1-3.ª e processo n.º 463/06.0GAEPS.S1-5.ª; de 12-11-2009, processo n.º 200/06.0JA PTM.E1.S1-3.ª, onde se considera que a decisão de tribunal da Relação que confirmou as diversas penas parcelares (entre os 9 meses e os 4 anos de prisão) não é recorrível para o STJ, mas já o é a decisão que agravou a pena conjunta correspondente ao concurso de crimes por que o arguido foi condenado; de 14-01-2010, processo n.º 135/08.1GGLSB.L1.S1-5.ª; de 27-01-2010, processo n.º 401/07.3JELSB.L1.S1-5.ª; de 04-02-2010, processo n.º 1244/06.7PBVIS.C1.S1-3.ª; de 10-03-2010, processo n.º 492/07.7PBBJA.E1.S1; de 18-03-2010, no processo n.º 175/06.5JELSB.S1-5.ª e no processo n.º 538/00.0JACBR-B.C1.S1-5.ª; de 12-05-2010, processo n.º 4/05.7TACDV.S1-5.ª; de 09-06-2010, processo n.º 862/09.6TBFAR.E1.S1-5.ª; de 23-06-2010, processo n.º 1/07.8ZCLSB.L1.S1-3.ª; de 30-06-2010, processo n.º 1594/01.9TALRS.S1-3.ª; de 14-07-2010, processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1-3.ª; de 29-09-2010, processo n.º 234/00.8JAAVR.C2.S1-3.ª; de 20-10-2010, processo n.º 851/09.8PFAR.E1.S1-3.ª.

        No acórdão de 16-12-2010, proferido no processo n.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª, citando os supra referidos acórdãos de 13-11-2008, processo n.º 3381/08-5.ª; de 16-04-2009, processo n.º 491/09-5.ª; de 12-11-09, processo n.º 200/06.0JA PTM.E1.S1-3.ª e de 12-05-2010, processo n.º 4/05.7TACDV.S1-5.ª, consigna-se que: 

I - No regime estabelecido pelos arts. 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, não é admissível  recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.

II - Nos casos de julgamento por vários crimes em concurso, em que tenha sido aplicada a cada um dos crimes pena de prisão não superior a 8 anos, confirmada pela Relação, e em que a pena única seja superior a 8 anos, o recurso da decisão da Relação só é admitido no que respeita à pena única, em virtude da conformidade (“dupla conforme”) no que respeita à determinação das penas por cada um dos crimes.

E assim, conheceu o acórdão apenas da medida da pena única de 9 anos de prisão, num contexto em que o arguido foi condenado por três crimes de abuso sexual de criança, com as penas parcelares de 2 anos e 6 meses de prisão, de 5 anos de prisão e de 7 anos de prisão, e na pena única de 9 anos de prisão, tudo confirmado pelo tribunal da Relação.

       E ainda mais recentemente, podem ver-se, no mesmo sentido, os acórdãos de 19-01-2011, proferidos no processo n.º 6034/08.0TDPRT.P1.S1-3.ª e no n.º 421/07.8PCAMD.L1.S1-3.ª; de 17-02-2011, nos processos n.º 1499/08.2PBVIS.C1.S1-3.ª e n.º 227/07.4JAPRT.P2.S1-3.ª; de 10-03-2011, no processo n.º 58/08.4GBRDD-3.ª, de 23-03-2011, por nós relatado, no processo n.º 322/08.2TARGR.L1.S1 (restringindo-se a cognição à medida da pena aplicada pelo crime de uxoricídio e da pena conjunta); de 24-03-2011, processo n.º 907/09.0GCVIS.C1.S1-5.ª; de 31-03-2011, no processo n.º 669/09.0JAPRT.S1-5.ª, CJSTJ 2011, tomo 1, pág. 227; de 13-04-2011, igualmente por nós relatado, no processo n.º 918/09.5JAPRT.P1.S1, restringindo-se a reapreciação à pena conjunta; de 04-05-2011, processo n.º 626/08.4GAILH.C1.S1-3.ª (em caso de dupla conforme, de confirmação de penas parcelares inferiores a 8 anos pela Relação, mas em que a pena imposta seja superior a 8 anos de prisão, só pode ser discutida esta pena unitária no STJ); de 18-05-2011, processo n.º 811/06.3TDLSB.L1.S1-3.ª; de 24-05-2011, processo n.º 17/05.9GAAVR.C1.S1-3.ª (em que se defende ser recorrível apenas a pena única que ultrapasse os 8 anos de prisão, sendo o recurso rejeitado, por no caso concreto, embora de forma incorrecta, estar em causa no recurso apenas a pena de 8 anos de prisão aplicada por um dos crimes, no caso de tráfico de estupefacientes, sem se ter em conta a subsistente pena aplicada pela detenção de arma proibida); de 06-07-2011, processo n.º 774/08.0JFLSB.L1.S1-3.ª, por nós relatado (não conhecimento do recurso da arguida, condenada na pena única de 5 anos de prisão, e restringindo-se a cognição, no caso do recurso do arguido, à pena única, com exclusão de vários crimes de falsificação de documento e de burla qualificada); de 15-12-2011, processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1 (conhecendo do crime de tráfico de estupefacientes e pena do concurso e não dos crimes de falsificação de documento e de coacção tentada); de 11-01-2012, no processo n.º 131/09.1JBLSB.L1.S1 (irrecorribilidade das penas parcelares por roubo, restringindo-se a cognição à pena conjunta); de 21-03-2012, processo n.º 103/10.3PBBRR.L1.S1 (irrecorribilidade das penas parcelares, restringindo-se o recurso ao conhecimento da pena única aplicada); de 12-09-2012, processo n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 (irrecorribilidade das penas parcelares); de 26-09-2012, processo n.º 460/10.1JALRA.C1.S1-3.ª (irrecorrível em relação a crime de detenção de arma, cognição restrita a penas de homicídio qualificado e pena única); de 3-10-2012, processo n.º 125/11.7PGALM.L1.S1; de 28-11-2012, processo n.º 10/06.4TAVLG.P1.S1; de 05-12-2012, processo n.º 250/10.1JALR.E1.S1 (o acórdão confirmatório da Relação é irrecorrível no que toca às penas aplicadas pelos crimes de detenção de arma proibida e de condução ilegal, conhecendo-se do recurso quanto a pena de homicídio qualificado e pena única); de 20-12-2012, processo n.º 553710.5TBOLH.E1.S1-5.ª; de 22-01-2013, processo n.º 184/11.2GCMTJ.L1.S1 (verificada a dupla conforme em qualquer das parcelares está assegurado um grau de acerto decisório, não justificativo de mais um grau de recurso, formando-se caso julgado sobre essas penas parcelares e versando o recurso sobre a pena única, que excede os 8 anos de prisão); de 24-01-2013, processo n.º 184/03.6TASTB.E2.S1-5.ª; de 13-02-2013, processo n.º 401/07.3GBBAO.P1.S1. (irrecorribilidade das penas parcelares, restringindo-se o recurso ao conhecimento da pena única de 9 anos de prisão); de 14-03-2013, processo n.º 43/10.6GSSTC.E1.S1 (havendo dupla conforme quanto às penas parcelares e única, como apenas a pena única excede 8 anos de prisão, somente quanto a ela é admissível recurso para o STJ).

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      Esta solução quanto a irrecorribilidade de decisões proferidas, em recurso, pelo Tribunal da Relação, enquanto confirmativas da deliberação da primeira instância – no caso, relativamente às penas parcelares e única aplicadas – não ofende qualquer garantia do arguido, nomeadamente, o direito ao recurso, expressamente incluído na parte final do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição pela 4.ª Revisão Constitucional (introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro – Diário da República, I-A, n.º 218/97, de 20-09-1997, entrada em vigor em 05-10-1997).     

       O direito ao recurso em matéria penal inscrito como integrante da garantia constitucional do direito à defesa (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa) está consagrado em um grau, possibilitando a impugnação das decisões penais através da reapreciação por uma instância superior das decisões sobre a culpabilidade e a medida da pena, sendo estranho a tal dispositivo a obrigatoriedade de um terceiro grau de jurisdição, por a Constituição, no seu artigo 32.º, se bastar com um duplo grau de jurisdição, já concretizado no caso dos autos, aquando do julgamento pela Relação.

      No caso em reapreciação, há uma afirmação de identidade de decisão completa, total, pois que o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou o acórdão do Colectivo de Oeiras, estando-se, pois, perante a assunção de uma dupla conforme condenatória total.

      O princípio da dupla conforme é assegurado através da possibilidade de os sujeitos processuais fazerem reapreciar, em via de recurso, pela 2.ª instância, a precedente decisão; por outro lado, impede, ou tende a impedir, que um segundo juízo, absolutório ou condenatório, sobre o feito, seja sujeito a uma terceira apreciação pelos tribunais.

      As garantias de defesa do arguido em processo penal não incluem um 3.º grau de jurisdição, por a Constituição, no seu artigo 32.º, se bastar com um 2.º grau, já concretizado, no caso dos autos, aquando do julgamento pela Relação.

     O acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal da Relação em segunda instância, consubstancia a garantia do duplo grau de jurisdição.

      O Tribunal Constitucional tem sido chamado a decidir da constitucionalidade quanto à perspectiva de violação do direito ao recurso, a propósito das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, concretamente se o direito ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição impõe um duplo recurso ou um triplo grau de jurisdição em matéria penal, sendo a resposta maioritariamente no sentido negativo - acórdãos n.º s 189/2001, de 3 de Maio, processo n.º 168/01-1.ª Secção (Acórdãos do Tribunal Constitucional – ATC –, volume 50, pág. 285), 215/2001, 336/2001, 369/2001, de 19 de Julho, 435/2001, de 11 de Outubro, 451/2003, de 14 de Outubro, processo n.º 527/03-1.ª Secção, 495/2003, de 22-10-2003, processo n.º 525/03-3.ª Secção (citando os acórdãos n.º s 189/2001 e 369/2001), 102/2004, de 11 de Fevereiro, 390/2004, de 02-06-2004, processo n.º 651/03-2.ª Secção, versando sobre a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, publicado in DR, II Série, de 07-07-2004 e ATC, volume 59, pág. 543, 610/2004, de 19 de Outubro, 640/2004 (supra citado), 104/2005, de 25 de Fevereiro, 255/2005, de 24 de Maio, processo n.º 159/05-1.ª Secção, 64/2006 (supra citado), 140/2006, de 24 de Março, 487/2006, de 20 de Setembro, processo n.º 622/06 (ATC, volume 65, pág. 815, sumário), 682/2006, de 13 de Dezembro, processo n.º 844/06-2.ª Secção (ATC, volume 66, pág. 835, sumário), 263/2009, de 25 de Maio, processo n.º 240/09-1.ª Secção (ATC, volume 75, pág. 249), 645/2009, de 15 de Dezembro, processo n.º 846/09- 2.ª Secção (ATC, volume 76, pág. 575) e 174/2010, de 4 de Maio, processo n.º 159/10-1.ª Secção.

O Tribunal Constitucional tem vindo a afirmar que o direito ao recurso como garantia de defesa do arguido não impõe um duplo grau de recurso.

A apreciação do caso por dois tribunais de grau distinto tutela de forma suficiente as garantias de defesa constitucionalmente consagradas – neste sentido, o acórdão n.º 49/2003, de 29 de Janeiro, proferido no processo n.º 81/2002, da 3.ª Secção, publicado no Diário da República, II Série, de 16-04-2003 e em ATC, volume 55, versando sobre caso de acórdão condenatório, que não confirma a decisão absolutória proferida em primeira instância e a interpretação do artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/98.

Neste acórdão considera-se que o direito ao recurso, no domínio do processo penal, se basta com a existência de um duplo grau de jurisdição, mesmo em situações de acórdãos condenatórios, proferidos pelas Relações, revogatórios de decisões absolutórias da 1.ª instância, neste sentido se pronunciando igualmente os supra referidos acórdãos n.º 255/2005, de 24-05, processo n.º 159/05-1.ª Secção, n.º 487/2006, de 20-09, processo n.º 622/06, n.º 682/2006, de 13-12, processo n.º 844/06-2.ª Secção (ATC, volume 66.º, pág. 835), n.º 424/2009, infra referenciado. 

Como se dizia no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 44/2005, de 26-01-2005, processo n.º 950/04-1.ª Secção, publicado no Diário da República, II Série, de 13-02-2006, pronunciando-se sobre a alínea c) do n.º 1 do artigo 400.º, e seguindo o citado acórdão n.º 49/2003 “…estando cumprido o duplo grau de jurisdição, há fundamentos razoáveis para limitar a possibilidade de um triplo grau de jurisdição, mediante a atribuição de um direito de recorrer de decisões condenatórias. Tais fundamentos são a intenção de limitar em termos razoáveis o acesso ao STJ, evitando a sua eventual paralisação (…). Não se pode, assim, considerar infringido o n.º 1 do artigo 32.º da Constituição (…) já que a apreciação do caso por dois tribunais de grau distinto tutela de forma suficiente as garantias de defesa constitucionalmente consagradas”, no mesmo sentido se pronunciando, entre vários outros, o acórdão n.º 390/2004, de 02-06-2004, processo n.º 651/03 -2.ª Secção, citado pelo anterior – versando sobre a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, publicado in DR, II Série, de 07-07-2004 e ATC, volume 59, pág. 543; acórdão n.º 2/2006, de 03-01-2006, da 2.ª Secção, publicado no DR, II Série, de 13-02-2006 e ATC volume 64, pág. 937, em sumário (Não é constitucionalmente imposto, mesmo em processo penal, um 3.º grau de jurisdição); o supra citado acórdão n.º 64/2006, de 24-01-2006, tirado em Plenário (face à contradição das soluções dos acórdãos n.º 628/2005 e 640/2004), no processo n.º 707/2005, publicado in DR, II Série, de 19-05-2006 e Acórdãos do Tribunal Constitucional, volume 64.º, 2006, págs. 447 e seguintes (a Constituição não impõe um triplo grau de jurisdição ou um duplo grau de recurso, mesmo em Processo Penal); e acórdão n.º 140/2006, de 21-02-2006 (2.ª Secção), publicado no DR, II Série, de 22-05-2006 (e ATC, volume 64, pág. 950, em sumário).

        No mesmo sentido se tem pronunciado o Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente, nos arestos supra referidos e ainda de 06-02-2008, processo n.º 111/08-3.ª; de 03-04-2008, processo n.º 4827/07-5.ª; de 17-04-2008, processo n.º 903/08-3.ª; de 30-04-2008, processo n.º 110/08-5.ª; de 05-06-2008, processo n.º 1226/08-5.ª; de 03-09-2008, processo n.º 2510/08-3.ª; de 29-10-2008, processo n.º 3061/08 -5.ª; de 13-11-2008, processo n.º 4455/07-5.ª; de 27-11-2008, processo n.º 2854/08-3.ª; de 21-01-2009, processo n.º 2387/08; de 22-04-2009, processo n.º 480/09-3.ª; de 29-04-2009, processo n.º 391/09-3.ª; de 07-10-2009, processo n.º 35/01.6AFIG.C2.S1-3.ª; de 21-10-2009, processo n.º 306/07.8GEVFX.L1.S1 -3.ª, onde se pode ler: “o nosso sistema de recursos não abdica de um duplo grau de jurisdição em matéria penal, de acordo com o artigo 14.º, n.º 5, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aprovado para ratificação pela Lei n.º 29/78, de 12-06, que não impõe um triplo grau de jurisdição. Em consonância o artigo 5.º, n.º 4, da CEDH, limita-se, e só, a assegurar o direito ao recurso de qualquer pessoa condenada em pena de prisão ou a detenção. E nem se diga que a solução preconizada, atenta contra o direito fundamental do acesso ao direito e à justiça consagrado no artigo 20.º da CRP, porque o direito de defesa do arguido não exige, sempre e em todas as condições, mais do que um grau de recurso”.

E ainda no citado acórdão de 29-10-2009, processo n.º 18/06.0PELRA.C1.S1-5.ª Secção, in CJSTJ 2009, tomo 3, pág. 224; de 02-12-2010, processo n.º 263/06.8JFLSB.L1.S1-5.ª; de 19-01-2011, processo n.º 421/07.8PCAMD.L1.S1-3.ª; de 09-11-2011, processo n.º 43/09.9PAAMD.L1.S1-3.ª, de 21-12-2011, processos n.º 130/10.0GCVIS.C1.S1-3.ª e n.º 37/06.6GBMFR.S1-3.ª; de 28-12-2011, processo (habeas corpus) n.º 150/11.8YFLSB.S1-3.ª; de 29-03-2012, processo n.º 334/04.5IDPRT.P1.S1 – 3.ª (o direito ao recurso, como garantia constitucional, postula apenas o duplo grau de jurisdição que não se confunde com o duplo grau de recurso); de 11-04-2012, processo n.º 1042/07.0PAVHG.P1.S1-3.ª; de 26-04-2012, processo n.º 438/07.2PBVCT.G1.S1-5.ª.

      

Relativamente à questão da constitucionalidade do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, pronunciaram-se no mesmo sentido de não inconstitucionalidade os acórdãos n.º s 20/2007, de 17 de Janeiro-3.ª Secção (Diário da República, II Série, de 20-03-2007 e ATC, volume 67, pág. 831, sumário), 36/2007, de 23-01-2007, 2.ª Secção (ATC, volume 67, pág. 832), 346/2007, de 06-06-2007, 1.ª Secção, (ATC, volume 69, pág. 852), 530/2007, de 29-10-2007, 3.ª Secção (ATC volume 70, pág. 766, em sumário), 599/2007, de 11-12-2007, 2.ª Secção (ATC, volume 70, pág. 772). 

A constitucionalidade da norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na actual redacção, na medida em que condiciona a admissibilidade de recurso para o STJ aos acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, foi apreciada pelo Tribunal Constitucional, que decidiu não a julgar inconstitucional – acórdão n.º 263/2009, de 25 de Maio, processo n.º 240/09-1.ª Secção (ATC, volume 75, pág. 249), acórdão n.º 645/2009, de 15 de Dezembro, processo n.º 846/2009 - 2.ª Secção (ATC, volume 76.º, pág. 575 (tendo em atenção ainda o artigo 5.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do CPP, em sumário), acórdão n.º 649/2009, de 15 de Dezembro, processo n.º 846/09 - 3.ª Secção, confirmando decisão sumária que emitiu juízo de não inconstitucionalidade  (ATC volume 76, pág. 575, em sumário), acórdão n.º 551/2009, de 27-10-2009, 3.ª Secção, versando a questão, inclusive, ao nível do artigo 5.º do CPP (ATC, volume 76, pág. 566) e acórdão n.º 174/2010, de 4 de Maio, processo n.º 159/10-1.ª Secção.
       Por seu turno, o acórdão n.º 424/2009, de 14 de Agosto, proferido no processo 591/09-2.ª Secção, decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alíneas e) e f), conjugada com a norma do artigo 432.º, n.º 1, alínea c), do CPP, na redacção emergente do Decreto-Lei n.º 48/2007, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o STJ de acórdão da Relação que, revogando a suspensão da execução da pena decidida em 1.ª instância, aplica ao arguido pena não superior a 5 anos de prisão efectiva.
       E, mais recentemente, no acórdão n.º 385/2011, de 27-07-2011, proferido no processo n.º 470/11, da 2.ª Secção, foi decidido “Não julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP, interpretada no sentido de ser irrecorrível uma decisão do Tribunal da Relação que, apesar de ter confirmado a decisão de 1.ª instância em pena não superior a 8 anos, se pronunciou pela primeira vez sobre um facto que a 1.ª instância não havia apreciado”.
       Na fundamentação deste acórdão, tendo-se por adquirido que no caso a Relação mantivera a decisão condenatória da 1.ª instância, “apesar de ter ampliado os pressupostos factuais da mesma”, pode ler-se:
     “Ora, com uma reapreciação jurisdicional, independentemente do seu resultado, revela-se satisfeito esse direito de defesa do arguido, pelo que a decisão do tribunal de recurso já não está abrangida pela exigência de um novo controle jurisdicional.

      O facto de nessa reapreciação se ter ampliado a matéria de facto considerada relevante para a decisão a proferir, traduz precisamente as virtualidades desse meio de controle das decisões judiciais, não sendo motivo para se considerar que estamos perante uma primeira decisão sobre o thema decidendum, relativamente à qual é necessário garantir também o direito ao recurso.   
      Na verdade, a ampliação da matéria de facto julgada provada não modifica o objecto do processo. Tal como na decisão da 1.ª instância, o acórdão do Tribunal da Relação que sobre ela recai limita-se a verificar se o arguido pode ser responsabilizado pela prática do crime de que estava acusado e, na hipótese afirmativa, a definir a pena que deve ser aplicada, o que se traduz num reexame da causa”.
      Referimos já o acórdão n.º 649/09, de 15 de Dezembro de 2009, proferido no processo n.º 846/09, 3.ª Secção, do Tribunal Constitucional, o qual decidiu:

      “a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na redacção da Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto, na medida em que condiciona a admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça aos acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.

      b) Não julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na redacção da Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto, e artigo 5.º, n.º 2, do mesmo Código, interpretada no sentido de que, em processos iniciados anteriormente à vigência da Lei n.º 48/2007, não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância, proferida após a entrada em vigor da referida lei, e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.”
      De igual modo, no acórdão n.º 643/11, de 21-12-2011, proferido no processo n.º 624/11, da 3.ª Secção e decisão sumária n.º 366/12 (proferida no processo n.º 552/12, da 2.ª Secção), o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre a interpretação normativa em causa, não a tendo julgado inconstitucional.

      Acontece que, em recurso interposto de acórdão deste Supremo Tribunal proferido no processo n.º 1324/08.4PPPRT.P1.S1, desta Secção, datado de 9 de Maio de 2012, aclarado em acórdão de 20 de Junho seguinte, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, que em 5 de Dezembro de 2012, pelo acórdão n.º 590/2012, proferido pela 1.ª Secção, decidiu, com um voto de vencido:

      «Julgar inconstitucional o artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal (CPP), na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objecto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa».


      Pelo Ministério Público foi interposto recurso obrigatório deste acórdão para o Plenário, nos termos do artigo 79.º - D, n.º 1, da LTC, sendo evidente que as soluções dos acórdãos n.º 590/2012 e n.º 649/2009, divergem em absoluto sobre a questão de saber se é constitucionalmente conforme “interpretar o artigo 400.º, n.º 1, alínea f) , no sentido de que havendo uma pena única superior a 8 anos de prisão, não pode ser objecto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal.»      
      O acórdão recorrido veio a ser revogado pelo acórdão n.º 186/2013, de 4 de Abril de 2013, tirado em Plenário, proferido no processo n.º 543/12, da 1.ª Secção, com cinco votos a favor, três declarações de voto e cinco votos de vencido, onde se inclui a relatora do acórdão n.º 590/2012, tendo sido decidido:

       «Não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objecto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão».

      Em suma, tendo-se alterado o paradigma de «pena aplicável» para «pena aplicada», o regime resultante da actual redacção da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal tornou inadmissível o recurso para o STJ de acórdãos condenatórios proferidos pelas Relações quando, confirmando decisão anterior, apliquem pena não superior a 8 anos de prisão.


      No sujeito caso concreto, como vimos, as penas parcelares aplicadas ao recorrente foram a de 8 anos de prisão por um dos crimes (homicídio qualificado tentado) e as restantes inferiores, acontecendo que a confirmação pelo tribunal de recurso é total, integral, completa, absoluta.

      No caso em apreciação estamos perante uma identidade total de decisão, uma dupla conforme total, pois que o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou o acórdão condenatório do Colectivo de Oeiras na totalidade, mantendo-se exactamente a factualidade assente, a qualificação jurídico-criminal e as penas aplicadas.

      Está-se, pois, perante dupla conforme condenatória total – o acórdão da Relação de Lisboa é confirmativo da deliberação então reaprecianda, na totalidade, estando-se perante uma situação de identidade total, em que a confirmação integral é alcançada de modo expresso, com conhecimento do mérito.

      O princípio da dupla conforme, impeditivo de um terceiro grau de jurisdição e segundo grau de recurso, que não pode ser encarado como excepção ao princípio do direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, é assegurado através da possibilidade de os sujeitos processuais fazerem reapreciar, em via de recurso, pela 2.ª instância, a precedente decisão; por outro lado, como revelação ou indício de coincidente bom julgamento nas duas instâncias, impede, ou tende a impedir, que um segundo juízo, absolutório ou condenatório, sobre o feito, seja sujeito a uma terceira apreciação pelos tribunais.

      Como se refere no acórdão de 16-09-2008, processo n.º 2383/08-3.ª, subjaz a tal instituto a ideia de que a concordância de duas instâncias quanto ao mérito da causa é factor indiciador do acerto da decisão, o que, em casos de absolvição ou de condenação em pena de prisão de pequena ou média gravidade, prévia e rigorosamente estabelecidos pelo legislador, justifica a limitação daquele direito.
                                                           *******
      Conclui-se que, sendo as penas parcelares aplicadas e confirmadas de 8 anos de prisão, uma, e inferiores todas as outras, não é admissível recurso quanto à sindicância das mesmas penas e questões que lhes sejam conexas, o qual se restringirá, pois, a conhecer da pena do concurso.

      Não sendo, pois, admissível o recurso com o alcance de discutir a medida das penas aplicadas por tais crimes, manter-se-ão as penas, que são de considerar como definitivamente fixadas.

       As penas parcelares aplicadas pelos dois crimes de roubo, pelo crime de homicídio qualificado tentado e crime de detenção de arma proibida, por que foi condenado o recorrente, manter-se-ão, pois, por não ser admissível o recurso quanto às mesmas.
       Conclui-se assim pela inadmissibilidade do recurso, nos termos do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, no que respeita às referidas penas parcelares.

        Como decorre do n.º 3 do artigo 414.º do Código de Processo Penal, a decisão que admita o recurso não vincula o tribunal superior.
       O recurso é assim de rejeitar - artigos 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal.
     
      Com esta solução, nos termos dos artigos 137.º e 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aqui aplicáveis, ex vi do artigo 4.º do Código de Processo Penal, fica prejudicado o conhecimento das questões submetidas a reexame pelo recorrente, como a de nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia sobre o problema da qualificação jurídica – homicídio qualificado tentado, ou, como defende o recorrente, crime de ofensa à integridade física qualificada, p. p. pelo artigo 145.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal –, a pretensão de reapreciação da imputação do roubo do apenso 11, que o recorrente colocou nas conclusões B, alíneas v. a jj. e repetindo nas conclusões C, alíneas xx. e zz. e a Exma. PGA suscitou no parecer emitido, bem como a medida das penas parcelares.  

      Resolvida esta questão prévia, e delimitado o objecto do recurso, avançar-se-á para a apreciação da única questão que resta.

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Apreciando – Fundamentação de Direito

Questão única – Medida da pena única

       

       Como se referiu supra, só “por arrastamento” o recorrente invoca a pena única e pede redução da respectiva medida, o que faz na conclusão C - Medida da pena,  alínea ww., cujo teor aqui se relembra:

“ww. Assim, entende-se que, discordando das penas parcelares aplicadas, haverá necessariamente de reformar também a pena única em que foi condenado o arguido, reduzindo-a substancialmente”.

      No recurso anterior dizia o recorrente “(…) da soma das penas parcelares, deverá ser efectuado o cúmulo, nos termos do artigo 77.º do Cod. Penal, não repudiando que a pena aplicada em cúmulo seja próxima dos quatro (4) anos”.

       Estabelece, quanto a regras de punição do concurso de crimes, o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, em vigor desde 01-10-1995 (e inalterado pelas subsequentes 26 modificações legislativas introduzidas no diploma), que “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

       E nos termos do n.º 2, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão e 900 dias, tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

       O que significa que no caso presente, a moldura penal do concurso é de 8 anos a 22 anos de prisão.

       Na apreciação do ilícito global há que ter em conta a natureza e gravidade dos crimes cometidos, estando em causa a prática de um homicídio qualificado na forma tentada, cometido na sequência do segundo de dois crimes de roubo agravado e um crime de detenção de arma proibida utilizada no segundo assalto.

       O conjunto dos factos foi praticado num período temporal curto, sendo os factos praticados nos dias 5 de Maio (primeiro assalto) e 22 de Junho de 2010 (segundo assalto, tentativa de homicídio e uso de arma proibida), estando em causa dois roubos qualificados levados a cabo com a participação de outro indivíduo, deslocando-se aos locais em moto de cilindrada alta, escolhendo as alturas em que funcionários da CC procediam ao carregamento de caixas ATM numa farmácia e num banco, actuando com disfarce, apropriando-se de cacifos que continham dinheiro destinado a tais caixas, para tanto ameaçando com arma de fogo o funcionário porta valores que os transportava, e no plano patrimonial atingindo valores de alguma amplitude, como € 50.000,00, no primeiro assalto e € 51.000,00, no segundo.

       No homicídio qualificado tentado relevam as graves lesões causadas com o disparo, maxime, quatro feridas num pulmão que não conduziram à morte face a pronta intervenção cirúrgica, transcrevendo-se o que foi dado por provado: “AG foi prontamente assistido no serviço de urgências do Hospital de São Francisco Xavier. Apresentava traumatismo torácico por ferida perfurante do hemitórax esquerdo, hemotorax por feridas perfurantes, transfixivas dos dois lobos pulmonares, lesão da pleura mediastinica justa aórtica e equimose da adventícia da aorta. Foi sujeito a cirurgia cardiotorácica para encerramento de quatro feridas do pulmão por toracotomia esquerda”.

        No presente caso é evidente a conexão e estreita ligação entre os quatro crimes cometidos pelo recorrente, estando presente a mesma motivação de angariação de dinheiro de modo fácil, sendo utilizado o mesmo modo de execução nos assaltos, e nos factos de 22 de Junho de 2010, ocorrendo em sequência, tendo a arma sido utilizada para ameaçar na concretização do roubo, a exemplo do já ocorrido em 5 de Maio, e atingindo AG, sendo lesados bens jurídicos diversos, violando o arguido direitos de personalidade, na perspectiva de integridade física e direitos patrimoniais.
        A facticidade provada não permite formular um juízo específico sobre a personalidade do arguido que ultrapasse a avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados, não se mostrando provada personalidade por tendência, ou seja, que o ilícito global seja produto de tendência criminosa do agente, embora não corresponda a um episódio isolado de vida, pois que já sofreu quatro condenações de que releva uma por roubo em que foi condenado em 19-12-2005 na pena de 1 ano de prisão, suspensa na execução por 4 anos, sendo que uma outra proferida em 01-03-2011, no processo 2/10.9SJLSB, sancionou crimes que estarão em concurso com os crimes destes autos.
      Em suma: estamos perante um caso de pluriocasionalidade, sendo que a pena unitária tem de responder à valoração, no seu conjunto e interconexão, dos factos e personalidade do arguido.

      Considerando a sequência da prática dos crimes, estando em causa bens jurídicos violados com diferente natureza, o grau de lesividade ao nível pessoal, mas também no plano patrimonial, ponderando o contexto em que tudo se passou, afigura-se equilibrada e proporcional a pena conjunta encontrada, não se mostrando, pois, necessária intervenção correctiva deste Supremo Tribunal de Justiça, e não se justificando necessidade de fazer incidir um maior factor de compressão, será de manter a mesma.

       

   

DECISÃO

Pelo exposto, acordam no Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar o recurso interposto pelo arguido AA, no que respeita às penas parcelares, por ser irrecorrível o acórdão confirmativo do Tribunal da Relação de Lisboa, e negar provimento no que toca à pretensão de redução da pena única.

Custas pelo recorrente, nos termos dos artigos 374.º, n.º 4, 513.º, n.º s 1, 2 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril, e com as alterações introduzidas pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Suplemento n.º 252), pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril e pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro), o qual aprovou – artigo 18.º – o Regulamento das Custas Processuais, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, uma vez que de acordo com os artigos 26.º e 27.º daquele Decreto-Lei, o novo regime de custas processuais é de aplicar aos processos iniciados a partir de 20 de Abril de 2009, e o presente, como se viu, teve início em 14-12-2009).

Nos termos do artigo 420.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, o recorrente vai tributado na importância de 5 (cinco) UC (unidades de conta).

Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Lisboa, 22 de Maio de 2013
Raul Borges (relator)
Henriques Gaspar