ACIDENTE DE TRABALHO
RESPONSABILIDADE AGRAVADA
VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA
NEXO DE CAUSALIDADE
ÓNUS DA PROVA
Sumário


I - A responsabilidade, principal e agravada, do empregador pode ter dois fundamentos autónomos: (i) um comportamento culposo da sua parte; (ii) a violação, pelo mesmo empregador, de preceitos legais ou regulamentares ou de diretrizes sobre higiene e segurança no trabalho.

II - Ambos os fundamentos exigem, a par da prova do comportamento culposo ou da violação normativa, a necessária prova do nexo causal entre o ato e a omissão – que os corporizam – e o acidente que veio a ocorrer, sendo pacífico que o ónus da prova dos factos suscetíveis de agravar a responsabilidade do empregador recai sobre quem dela tirar proveito, sejam os beneficiários do direito reparatório, sejam as instituições seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade infortunística.

III - Resultando provado, de um passo, que a empregadora não afixou, no equipamento de trabalho utilizado pelo trabalhador sinistrado e outros trabalhadores, a sinalização com o peso máximo que aquele suportava, mas não resultando provado, de outro passo, qual o peso dos trabalhadores que laboravam em cima da plataforma de trabalho nem provado, por consequência, que o excesso de peso em cima deste equipamento tivesse sido a causa exclusiva do colapso das escovas de travamento da plataforma devido à fratura e colapso do pino central do atuador hidráulico, não poderá imputar-se à empregadora a responsabilidade na reparação, agravada, do acidente de trabalho.

Texto Integral

            Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

            1. AA intentou, no 3.º Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal do Trabalho de Lisboa, ação especial emergente de acidente de trabalho, contra «TAP - Air Portugal, S.A.» e «BB - Companhia de Seguros, S.A.», pedindo a condenação das rés no pagamento:

a) Das despesas, no total de € 1.756,00, em que incorreu por conta do acidente de trabalho sofrido, em apreciação nos presentes autos, e, cumulativamente, que seja fixada a desvalorização por si sofrida, que deve ser fixada em 26% de IPP, com todas as necessárias consequências legais, incluindo a fixação da respetiva pensão, calculada por referência à remuneração que efetivamente auferia numa média mensal - que ambas as rés aceitaram - de € 2.485,87.

b) Da pensão emergente de acidente de trabalho, calculada por referência à remuneração que efetivamente auferia numa média mensal - que ambas as rés aceitaram - de € 2.485,87, decorrente da desvalorização por si sofrida, que deve ser fixada em 26% de IPP;

c) Dos juros de mora, à taxa legal em vigor, relativamente às quantias peticionadas.

Alegou, para tanto, e em síntese, que, no dia 29 de Janeiro de 2004, quando se encontrava a prestar o seu trabalho de Técnico de Manutenção de Aeronaves, por conta, direção e no interesse da ré TAP, mediante retribuição, sofreu um acidente de trabalho. Tal acidente consistiu numa queda de uma plataforma onde o autor se encontrava quando procedia à montagem da porta da cabine de um avião SATA, que se encontrava no hangar.

A porta foi transportada nessa plataforma por quatro trabalhadores, sendo um deles o autor. A plataforma encontrava-se a 2,5 metros do solo e cedeu repentinamente, por colapso do pino central do atuador hidráulico, o que provocou direta e consequentemente a queda dos trabalhadores.

O autor sofreu lesões no joelho direito, que lhe determinaram um período de doença prolongado e uma incapacidade permanente.

O acidente de que foi vítima ficou a dever-se ao uso de um dispositivo técnico desadequado, tendo a entidade empregadora violado normas sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

Em exame médico efetuado na fase conciliatória do processo, o Sr. Perito considerou que o autor se encontra afetado de uma IPP de 26%.

A ré TAP tem a sua responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho transferida para a ré seguradora.

Todavia, na tentativa de conciliação presidida pelo Ministério Público, na fase inicial do processo, não foi possível obter acordo, porquanto a entidade empregadora discordou da sua responsabilização agravada, nos termos do disposto no art. 18.° da LAT, e a seguradora discordou da avaliação da incapacidade feita pelo Perito Médico.

O autor concordou com a proposta de conciliação apresentada pelo Ministério Público.

Em consequência do acidente e das lesões sofridas, o autor teve despesas com consultas e tratamentos.

Citada, a ré seguradora contestou, alegando, resumidamente, que, no acidente em apreço nos autos, houve uma manifesta e clara inobservância das elementares regras de segurança por parte da entidade empregadora, ao colocar à disposição dos seus trabalhadores (incluindo o sinistrado), uma ferramenta (a plataforma) que não dispunha das condições de segurança necessárias para ser utilizada.

Entende, por isso, que só subsidiariamente será responsável pela reparação do acidente.

Devidamente citada, também a ré TAP contestou a ação, excecionando a sua ilegitimidade, por considerar que tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho transferida para a ré seguradora.

No mais, impugnou a alegação de que o acidente se deveu a causa que lhe seja imputável, fosse a título de culpa ou a título de negligência.

Impugnou, igualmente, as despesas alegadamente feitas pelo autor.

O autor respondeu às contestações apresentadas, sustentando a legitimidade passiva da ré TAP, face à relação material controvertida apresentada, e reafirmando a versão dos factos que já havia apresentado na petição inicial.

Mais referiu que o facto de a ré TAP apresentar a UCS como uma entidade que nada tem a ver com a empresa, consubstancia «um novo exercício de lastimável má-fé processual».

A fls. 343 e ss. dos autos, a ré TAP respondeu ao pedido de litigância de má fé formulado pelo autor, referindo que a UCS não é uma unidade orgânica da TAP mas uma sociedade comercial autónoma, embora pertença ao grupo de empresas. Assim, o alegado em sede de defesa, jamais pode ser entendido como litigância de má-fé.

Foi dado cumprimento ao disposto no preceituado no art. 1.º, n.° 2 do DL n.º 59/89, de 22 de Fevereiro.

Procedeu-se ao saneamento do processo, com conhecimento da exceção dilatória da ilegitimidade passiva da ré TAP invocada, que foi julgada improcedente.

Selecionaram-se os factos assentes e organizou-se a Base Instrutória.

A fls. 468 e ss., o autor apresentou novo articulado, no qual alegou novas despesas que efetuou com tratamentos e consultas, sendo os factos posteriores à apresentação da petição inicial, não podendo, por isso, ter sido invocados anteriormente.

As rés impugnaram os factos alegados.

Por despacho judicial, proferido a fls. 481, foi admitido o articulado superveniente, bem como a cumulação do pedido apresentada e foram acrescentados quesitos à Base Instrutória.

Procedeu-se a julgamento e, a fls. 674 a 691, foi proferida sentença que condenou a ré TAP, a título principal, ao abrigo do art. 18.º da LAT, e condenou a ré seguradora a título subsidiário.

Inconformada com a decisão final proferida, a ré TAP interpôs recurso de Apelação.

Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, constante de fls. 808 a 814 dos autos, foi decidido anular a decisão recorrida, ordenando-se a ampliação da matéria de facto, com repetição do julgamento quanto à matéria a ampliar e prolação de nova sentença.

Em obediência ao mesmo acórdão foi ampliada a Base Instrutória, que não sofreu reclamação.

A Audiência Final decorreu com observância de todo o formalismo legal, tendo sido fixada a matéria de facto sem reclamações.

Seguidamente foi proferida a sentença de fls. 888-906, na qual foi exarada a seguinte decisão:

«Nesta conformidade e decidindo, julga-se a ação procedente e, consequentemente, condenam-se as rés nos seguintes termos:

A) A ré TAP, no pagamento ao autor:

- Da pensão anual e vitalícia no valor de € 29.830,47 (valor da retribuição anual do sinistrado), devida desde 8/11/2004;

- Do montante de € 2.076,28, relativo a despesas feitas pelo autor em tratamentos devidos pelo acidente;

- Dos juros de mora, sobre as quantias em dívida, calculados à taxa legal, desde 8/11/2004, até integral pagamento.

B) A ré Companhia de BB, no pagamento ao autor, a título subsidiário:

- Da pensão anual e obrigatoriamente remível de € 2.144,51, devida desde 8/11/2004;

- Das despesas com tratamentos no valor total de € 2.076,28.

- Dos juros de mora, sobre as quantias em dívida, calculados à taxa legal, desde 8/11/2004, até integral pagamento.

C) Absolve-se a ré TAP do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Custas pela entidade patronal.

Fixa-se à ação o valor de € 338.086,69.

Registe e Notifique.»

2. Inconformada, a ré «TAP» apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.

É contra esta decisão que se insurge a mesma ré no recurso de revista que interpôs para o Supremo Tribunal de Justiça, alinhando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«1) Apurou-se que a porta que os trabalhadores em causa estavam a suportar em cima da plataforma/escada não caiu ao chão, antes ficando presa (fixa) no próprio avião e a cerca de 3 metros do solo.

2) A porta do avião não caiu ao chão, ficando antes fixada no avião e a aproximadamente 3 metros do solo.

3) Se a porta do avião estava presa (fixa) ao avião e por isso não caiu ao chão no momento do colapso do equipamento em causa, o peso da porta não podia concorrer para o peso que incidia sobre o mesmo equipamento.

4) Atenta a factualidade dada como provada, não poderia nunca decidir-se pela responsabilidade, principal e agravada, do empregador, aqui Apelante, na ocorrência do acidente de trabalho em apreço nos autos.

5) Para concluir pela responsabilidade, principal e agravada, da Recorrente, o Tribunal “a quo” considerou que a falta de aviso ou sinal indicador da carga máxima admissível para a plataforma de trabalho, foi condição suficiente para que tivesse ocorrido a sua utilização com carga superior, não podendo deixar de considerar-se também que, se no local constasse o aviso imposto por lei, provavelmente os trabalhadores não teriam utilizado aquele equipamento na execução do trabalho em causa.

6) Um dos vícios do Acórdão em crise reside na circunstância de se qualificar de forma indiferenciada o equipamento / mecanismo de que o sinistrado veio a cair como sendo uma plataforma, quando tal menção não é exata ou correta.

7) Resulta do Despacho de Arquivamento proferido no âmbito do processo-‑crime que, na sequência da participação efetuada pelo Ministério Público, correu termos sob o n.° 3172/05.4TDLSB na 6.ª Secção do Departamento de Investigação e Ação Penal, que existe um equívoco na classificação do equipamento utilizado pelo sinistrado e pelos seus colegas para aceder à abertura do avião onde iria ser instalada a porta.

8) O equipamento em causa é uma escada acionada através de um sistema hidráulico (vide factos provados sob os n.°s 31 e 32).

9) O facto de ter uma plataforma não significa que a mesma possa ser qualificada como plataforma de trabalho móvel.

10) Estranha-se o enquadramento que acaba por ser dado pelo Acórdão em crise, uma vez que, conforme decorre dos próprios factos provados sob os n°s. 31 e 32, nos mesmos se referencia o equipamento em questão, como sendo antes uma escada telescópica.

11) Não existe qualquer obrigação legal de indicação do peso que as escadas devam suportar.

12) Deste modo, as referências que no Acórdão Recorrido se fazem à violação da obrigatoriedade legal da indicação da carga máxima admissível, não são, em rigor, aplicáveis, uma vez que o equipamento em questão não é uma plataforma móvel, mas tão-somente uma escada, ainda que hidráulica.

13) Do artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 82/99, de 13/3, resulta apenas uma obrigação geral de aviso ou sinalização indispensável a garantir a segurança dos trabalhadores, existindo legislação especial que regulamenta as especificações mínimas de segurança de tais equipamentos (escadas), sem que preveja a alegada obrigação de aviso de peso máximo suportado.

14) O equipamento em questão tinha apenas 5 a 6 meses de uso, tendo sido sujeito a uma inspeção visual na qual não foi detetada nenhuma anomalia ou deficiência visível.

15) A Recorrente não pode ser responsabilizada por uma opção dos trabalhadores envolvidos no sinistro que, apesar de serem trabalhadores ou técnicos experientes, optaram por montar a porta do avião sem recurso ao equipamento adequado e sem esperar que o avião fosse posicionado no local mais adequado.

16) A Recorrente não violou qualquer obrigação legal de aviso do peso máximo suportado pelo equipamento utilizado pelo trabalhador aquando do sinistro, não se podendo concluir pela responsabilidade principal e agravada da entidade patronal na produção do sinistro.

17) Razão pela qual, deverá ser revogado o Acórdão em crise, devendo reconhecer-se a inexistência de qualquer culpa da Recorrente na produção do sinistro, com as demais consequências legais.

18) O Acórdão em crise violou, entre outros, o disposto no artigo 13.°-C, n.° 10 da Portaria 53/71, de 3/3, alterada pela Portaria 702/80, de 22/9, no artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 82/99, de 13/3, no artigo 273.° do Código do Trabalho, que prevê a alegada obrigação de aviso de peso máximo suportado.

19) A correta aplicação do Direito aos factos provados nos autos fará concluir que a Recorrente não teve culpa na produção do sinistro e à consequente revogação do Acórdão em crise»

Conclui no sentido de dever ser revogado «o Acórdão em crise e, consequentemente, absolver-se a Recorrente de todos os pedidos».

O autor contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto concluiu pela improcedência da revista, parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

3. No caso vertente, a única questão suscitada no recurso prende-se com a responsabilização, a título agravado, da ré empregadora, com fundamento na violação, por esta, de regras de segurança no trabalho.

Cumpre conhecer e decidir.


II

1. Os factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido foram os seguintes:

1 - O autor começou a trabalhar por conta, direção e no interesse da ré TAP, em 21 de Janeiro de 1980;

2 - Para desempenhar as funções de Técnico de Estruturas;

3 - Ultimamente, exerce as funções típicas da categoria profissional de TMA (Técnico de Manutenção de Aeronaves);

4 - Auferindo um salário anual de € 29.830,47;

5 - A ré TAP tinha a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a ré seguradora pelo referido salário;

6 - O autor possuía já uma incapacidade fixada em 4%, acordada na tentativa de conciliação do processo n.° 6074/03.TTLSB, que correu termos no Tribunal do Trabalho de Cascais, em virtude de um prévio acidente sofrido, também enquanto laborava por conta e direção da 1.ª ré;

7 - Tendo igualmente nessa altura lhe sido fixada uma pensão anual, pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa, obrigatória de € 895,93;

8 - No dia 29/1/2004, pelas 21 horas, estando a prestar o seu trabalho de Técnico de Manutenção de Aeronaves, por conta, direção e no interesse da ré TAP, ao proceder à montagem da porta da cabine de um avião da SATA (CS TGW), que se encontrava no hangar 6, sobre uma plataforma, esta cedeu repentinamente tendo provocado a queda do autor.

9 - A plataforma encontrava-se a cerca de 2,5 metros do solo;

10 - Tal plataforma possuía um sistema de elevação em altura que atuava hidraulicamente por comando manual;

11 - O travamento da mesma era feito por duas escoras laterais em tubo, nas extremidades das quais existe uma peça soldada, que serve de elemento de ligação para fazer a rotação do fulcro da plataforma e sistema hidráulico ao centro, possuindo ainda dois sistemas de “patolas” de travamento ao solo, também manuais, de cada lado da estrutura;

12 - Em consequência da queda, o autor sofreu uma rotura completa do ligamento cruzado anterior, do joelho direito;

13 - Em exame médico realizado na face conciliatória do processo, foi considerado que o autor se encontrava afetado de uma IPP de 26%, a partir de 7/11/2004 (data da alta);

14 - Realizada a tentativa de conciliação, na fase inicial do processo, a mesma veio a frustrar-se, porquanto:

- A seguradora discordou do grau de incapacidade fixado em exame médico;

- A entidade empregadora, não aceitou responsabilizar-se pelo acidente, por entender que não houve qualquer violação, da sua parte, das normas sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

15 - No Apenso para Fixação de Incapacidade, o autor foi considerado afetado de uma IPP de 10,27%, desde a data da alta;

16 - A plataforma de onde o autor caiu foi encostada junto à zona da porta do lado esquerdo da cabine do avião por trabalhadores pertencentes ao turno anterior, que a tinham utilizado para retirar a porta e depois foi utilizada para transportar e montar a porta, já durante o turno do autor;

17 - A porta teve de ser transportada nessa mesma plataforma por quatro trabalhadores;

18 - Quando a plataforma está no máximo da altura, a estabilidade da mesma diminui;

19 - E existe oscilação;

20 - A plataforma, quando no máximo de elevação, não possuía degraus suficientemente grandes para permitir o apoio integral dos pés;

21 - Inexistia qualquer etiqueta com o peso máximo admissível e lotação;

22 - As escoras de travamento da plataforma colapsaram devido à fratura do pino central do atuador hidráulico;

23 – Eliminado. ([1])

24 - O autor agiu segundo ordens diretas do seu superior hierárquico;

25 - Devido às lesões sofridas, o autor teve de depender do apoio de canadianas para se poder locomover;

26 - Mantendo um sofrimento rotuliano misto;

27- Em consequência das lesões sofridas com a queda, o autor teve de recorrer aos seguintes tratamentos: hidrocinesiterapias, hidromassagens, fortalecimentos musculares manuais, entre outros que lhe foram prescritos;

28 - Com tais tratamentos despendeu as seguintes quantias:

- 3/8/2005 (consulta de ortopedia) - 55,00€ - 16/9/2005 (consulta de fisiatria) - 37,41€

- 30/9/2005 (vários tratamentos) - 69,25€

- 30/9/2005 (vários tratamentos) - 93,75€

- 10/10/2005 (vários tratamentos) - 56,25€

- 21/10/2005 (consulta de fisiatria) - 37,41€

- 19/12/2005 (vários tratamentos) - 50,50€

- 19/12/2005 (vários tratamentos) - 122,00€

- 19/12/2005 (vários tratamentos) - 155,50€ - 19/12/2005 (vários tratamentos) - 11,25€

- 20/2/2006 (vrios tratamentos) - 116,82€

- 20/2/2006 (vários tratamentos) - 177,82€

- 20/2/2006 (vários tratamentos) - 197,82€

- 25/8/2006 (consulta de fisiatria) - 7,50€ - 1/2/2007 (consulta de fisiatria) - 7,50€

- 15/6/2007 (consulta de fisiatria) - 7,50€;

29 - O autor fez tratamentos de acupunctura;

30 -Em tratamentos de acupunctura, o autor despendeu os seguintes montantes:

- 27/6/2007 - 36,00€

- 28/6/2007 - 36,00€

- 5/7/2007 - 36,00c

- 6/7/2007 - 36,00€

- 7/7/2007 - 35,00€

- 8/7/2007 - 36,00€

- 10/7/2007 - 36,00€

- 14/7/2007 - 36,00€

- 16/7/2007 - 36,00€

- 18/7/2007 - 46,00€

- 20/7/2007 - 36,00€

- 25/7/2007 - 36,00€

- 27/7/2007 - 36,00€

- 31/7/2007 - 76,00€;

31 - No processo de aquisição da plataforma utilizada pelo autor, a ré TAP, no seu pedido de compra fez constar que as escadas telescópicas pretendidas deveriam ter uma altura variável de 2 metros e 3,5 metros e uma largura útil de 2,90 HTS;

32 - A ré TAP contactou várias empresas para a aquisição das referidas escadas telescópicas;

33 - A empresa a quem a produção da Escada/Plataforma solicitada foi adjudicada, a sociedade CC, Lda., é uma empresa credenciada na conceção e produção deste tipo de equipamentos;

34 - O equipamento Escadas/Plataforma foi adjudicado em Agosto de 2002 e entregue em 2 de Julho de 2003;

35 - A Escada/Plataforma, poderia ser utilizada a uma altura de 3,5m e tinha capacidade para elevar 300 Kg;

36 - Na receção da Escada/Plataforma foi efetuada uma inspeção visual na qual não foi detetada nenhuma anomalia ou deficiência visível;

37 - O autor e os restantes membros da equipa de trabalho são técnicos experientes;

38 - A plataforma integrava os equipamentos habitualmente utilizados indiscriminadamente pelos trabalhadores da ré, em múltiplas tarefas;

39 - Com vista a minorar as dores constantes nas articulações dos joelhos, originados pela queda ocorrida em 29/1/2004, o autor deveria fazer infiltrações;

40 - Assim, e conforme instruções anteriormente recebidas do seu médico, logo que tivesse adquirido o medicamente prescrito – Dorolene – deveria realizar consulta médica;

41 - O autor encomendou o medicamento e pagou-o de imediato, ficando a aguardar a sua entrega em momento posterior;

42 - Ao receber o fármaco, deslocou-se para a consulta no dia 10 de Novembro de 2009, com o Dr. DD;

43 - Que lhe prescreveu a realização de tratamento de infiltração em ambos os joelhos;

44 - O custo do fármaco foi integralmente suportado pelo autor, no valor de € 320,00;

45 - No momento da fratura do pino central do atuador hidráulico, com o colapso das escoras e travamento que desencadeou a queda do autor, encontravam-se em cima da plataforma os 4 trabalhadores, incluindo o autor;

46 - Nesse momento, três dos trabalhadores que se encontravam em cima da plataforma estavam a segurar a porta.

2. A temática em discussão nos autos, maxime, a data do acidente de trabalho de que foi vítima o sinistrado – ocorrido em 29 de Janeiro de 2004 – demanda a aplicação do regime contido na Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, (doravante denominada LAT), bem como do seu regulamento, contido no DL n.º 143/99, de 30 de Abril (regime, aliás, seguido e aplicado pelas instâncias, sem discordância das partes).

2.1. Sustenta a recorrente que, «[a]tenta a factualidade dada como provada, não poderia nunca decidir-se pela responsabilidade, principal e agravada, do empregador, aqui Apelante, na ocorrência do acidente de trabalho em apreço nos autos», confundindo-se, pois, esta sua asserção com aquele que é o objeto da revista.

Discorre, depois, acerca da inidoneidade da omissão da colocação, no equipamento em uso pelo sinistrado, do aviso ou sinal indicador da carga máxima admissível para a ocorrência do acidente, aduzindo não ser seguro que «se no local constasse o aviso imposto por lei provavelmente os trabalhadores não teriam utilizado aquele equipamento na execução do trabalho em causa».

Finalmente, aponta que o «equipamento em causa, [por não ser] uma plataforma móvel, mas tão-somente uma escada, ainda que hidráulica» não carecia de indicação sinalética acerca da carga máxima admissível.

            Quid iuris?

            2.1.1. De acordo com o preceituado no artigo 18.º, n.º 1, da LAT, sob a epígrafe “casos especiais de reparação”, «[q]uando o acidente tiver sido provocado pela entidade empregadora ou seu representante ou resultar da falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, as prestações fixar-se-ão segundo as regras seguintes (...)».

Essas regras prevêem critérios, nelas descritos, que beneficiam o sinistrado e agravam a responsabilidade da entidade que responde pela reparação, identificada no seguinte artigo 37.º, n.º 2, da LAT: «[v]erificando-se alguma das situações referidas no artigo 18.º n.º 1, a responsabilidade nela prevista recai sobre a entidade empregadora, sendo a instituição seguradora apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na presente lei».

Como se vê, no contexto do regime atendível, a responsabilidade, principal e agravada, do empregador pode ter dois fundamentos autónomos: (i) um comportamento culposo da sua parte; (ii) a violação, pelo mesmo empregador, de preceitos legais ou regulamentares ou de diretrizes sobre higiene e segurança no trabalho.

A única diferença entre ambos reside na prova da culpa, que é indispensável no primeiro caso e desnecessária no segundo.

Todavia, esta desnecessidade não constitui qualquer desvio às regras gerais sobre responsabilidade civil, onde a verificação da culpa – real ou presumida – do agente constitui, por regra, elemento essencial.

Na verdade, por um lado, o regime em vigor passou a considerar que a falta de observância das normas de segurança constitui fundamento autónomo bastante para o agravamento da reparação; por outro, uma vez que a culpa (mera culpa) se traduz na omissão dos deveres de cuidado exigidos ao agente, a falta de cumprimento das assinaladas regras mais não consubstancia, afinal, do que a omissão concreta de um especial dever de cuidado imposto por lei.

Em contrapartida, ambos os fundamentos exigem, a par, respetivamente, do comportamento culposo ou da violação normativa, a necessária prova do nexo causal entre o ato ou a omissão – que os corporizam – e o acidente que veio a ocorrer.

É pacífico que o ónus da prova dos factos suscetíveis de agravar a responsabilidade do empregador recai sobre quem dela tirar proveito, sejam os beneficiários do direito reparatório, sejam as instituições seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade.

Cingindo-nos, como importa, ao fundamento questionado (2.ª parte do transcrito artigo 18.º, n.º 1), logo se conclui que a sua verificação pressupõe a concorrência de dois requisitos: (i) que sobre o empregador recaia o dever de observar determinadas regras de comportamento, cuja observância teria impedido, segura ou muito provavelmente, a consumação do evento, assim se omitindo o cuidado exigível a um empregador normal; (ii) que entre essa conduta omissiva e o acidente intercorra um nexo de causalidade adequada. ([2])

2.1.2. No que respeita à matéria atinente à segurança, higiene e saúde no trabalho, há muito que essa matéria encontra, na lei, proteção, não deixando de se aplicar, genericamente, a todos os empregadores. ([3])

O Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro (vigente à data em que ocorreu o acidente, mas entretanto revogado pelo artigo 120.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 102/2009, 10 de Setembro), conforme resulta da atinente nota preambular, trata-se de uma lei-quadro, que visou não só dotar o País de um quadro jurídico global que garantisse uma efetiva prevenção de riscos profissionais, mas também dar cumprimento às obrigações do Estado decorrentes da ratificação da Convenção n.º 155 da OIT, sobre segurança, saúde dos trabalhadores e ambiente de trabalho, e adaptar a ordem jurídica interna à Diretiva do Conselho n.º 89/391/CEE, de 12 de Junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho.

Este diploma contém os princípios que visam promover a segurança, higiene e saúde no trabalho, nos termos dos artigos 59.º e 64.º da Constituição (artigo 1.º). No entanto, as suas disposições devem considerar-se derrogadas pelos artigos 272.º a 280.º do Código do Trabalho de 2003 (aqui aplicáveis, atento o previsto na alínea a) do n.º 3 do artigo 12.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro) no âmbito de aplicação desse Código, isto é, no domínio do contrato de trabalho subordinado e dos contratos equiparados (cf. artigos 7.º, n.º 2, do Código Civil e artigos 10.º e 13.º do sobredito Código do Trabalho).

O artigo 273.º do Código do Trabalho de 2003, que corresponde ao artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 441/91, prescreve que «[o] empregador é obrigado a assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspetos relacionados com o trabalho» (n.º 1), devendo, de acordo com o seu n.º 2, proceder, na conceção das instalações, dos locais e processos de trabalho, à identificação dos riscos previsíveis, combatendo-os na origem, anulando-os ou limitando os seus efeitos, de forma a garantir um nível eficaz de proteção [alínea a)], integrar no conjunto das atividades da empresa, estabelecimento ou serviço e a todos os níveis a avaliação dos riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores, com a adoção de convenientes medidas de prevenção [alínea b)], planificar a prevenção na empresa, estabelecimento ou serviço num sistema coerente que tenha em conta a componente técnica, a organização do trabalho, as relações sociais e os fatores materiais inerentes ao trabalho [alínea d)], dar prioridade à proteção coletiva em relação às medidas de proteção individual [alínea f)], dar instruções adequadas aos trabalhadores [alínea n)], ter em consideração se os trabalhadores têm conhecimentos e aptidões em matéria de segurança e saúde no trabalho que lhes permitam exercer com segurança as tarefas de que os incumbir [alínea o)].

O mesmo artigo 273.º dispõe que, na aplicação das medidas de prevenção, deve o empregador mobilizar os meios necessários, nomeadamente nos domínios da prevenção técnica, da formação e da informação, e os serviços adequados, internos ou exteriores à empresa, estabelecimento ou serviço, bem como o equipamento de proteção que se torne necessário utilizar, tendo em conta, em qualquer caso, a evolução da técnica (n.º 3).

Em suma, há muito que existe consagrada uma explícita obrigação do empregador de aplicar as medidas necessárias para prevenir a ocorrência de acidentes, devendo pôr à disposição do trabalhador os meios de proteção adequados, nomeadamente o correto equipamento de proteção coletiva e/ou individual.

O Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho nos Estabelecimentos Industriais, constante da Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, alterada pela Portaria n.º 702/80, de 22 de Setembro, estatui, no seu artigo 1.º que «[o] presente Regulamento tem por objetivo a prevenção técnica dos riscos profissionais e a higiene nos estabelecimentos industriais».

Atendendo ao enquadramento do equipamento em causa nos autos, estatui, por seu turno, o artigo 13.º - C, ns. 1, 2, 3 e 10, daquela Portaria que:

«1 – As plataformas de trabalho, fixas ou móveis, devem ser construídas com materiais apropriados, não escorregadios, ter a resistência suficiente para suportar cargas e esforços a que irão ser submetidas e assegurar a estabilidade de modo eficaz.

2 – As plataformas devem ser horizontais, regulares, contínuas e convenientemente fixadas nos pontos de apoio.

3 – É proibida a acumulação de pessoas ou de materiais nas plataformas de trabalho além do estritamente indispensável aos trabalhos em curso.

(…)

10 – Em cada plataforma móvel deve figurar, por forma bem visível, a indicação da carga máxima admissível».

O Decreto-Lei n.º 82/99, de 16 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 113/99, de 3 de Agosto, vigente à data da ocorrência do acidente, mas entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro, veio, por seu turno, estabelecer prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização, pelos trabalhadores, de equipamentos de trabalho.

Para efeitos do citado diploma, entende-se por «equipamento de trabalho» qualquer máquina, aparelho, ferramenta ou instalação utilizado no trabalho [artigo 2.º, alínea a)].

Em ordem a assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização dos equipamentos de trabalho, o empregador deve: «a) Assegurar que os equipamentos de trabalho sejam adequados ou convenientemente adaptados ao trabalho a efetuar e garantam a segurança e a saúde dos trabalhadores durante a sua execução» (artigo 4.º, alínea a), do citado diploma), impondo o artigo 24.º que «os equipamentos devem estar devidamente sinalizados, com avisos ou outra sinalização indispensável para garantir a segurança dos trabalhadores».

2.1.3. No âmbito dos acidentes de trabalho e como fundamento da responsabilidade agravada do empregador, a lei exige, a par da omissão de um comportamento promotor da segurança, higiene e saúde no trabalho, que entre essa omissão e o acidente intercorra um nexo causal adequado.

Neste domínio, é pacífico afirmar-se que o nosso sistema positivo acolheu a «teoria de causalidade», ao consignar, no artigo 563.º, do Código Civil, que «...a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão».

Como a transcrita previsão legal logo sugere, a adequação relevante não é aquela que se basta com o simples confronto entre o facto e o dano isoladamente considerados mas, pelo contrário, aquela que atende a todo o processo causal que, na prática, conduziu efetivamente ao dano, exigindo-se, assim, que o efeito danoso tenha resultado do facto, seja considerado causa dele, pelo processo por que este é abstratamente adequado a produzi-lo. ([4])

Conforme se vê, a lei exige, para fundamentar a reparação, que o comportamento do agente seja abstrata e concretamente adequado a produzir e efeito lesivo.

Por isso se diz que a afirmação de um nexo causal entre o facto e o dano comporta duas vertentes:

- a vertente naturalística, de conhecimento exclusivo das instâncias, porque contido no âmbito restrito da matéria factual, que consiste em saber se o facto praticado pelo agente, em termos de fenomenologia real e concreta, deu origem ao dano;

- a vertente jurídica, já sindicável pelo Supremo, que consiste em apurar se esse facto concreto pode ser havido, em abstrato, como causa idónea do dano ocorrido.

Estas duas vertentes são cumulativas e, portanto, indissociáveis na tarefa de indagação do processo causal para efeitos da reparabilidade de um sinistro.

2.2. O Acórdão recorrido, na abordagem das questões antes elencadas e em consonância com o julgado na 1.ª instância, decidiu no sentido de a ora recorrente ser responsável pela reparação, a título agravado, dos danos que para o sinistrado advieram do acidente que foi vítima.

Alicerçou esse seu juízo na seguinte fundamentação:

«[I]importa então averiguar, em face da matéria (…) apurada, analisando o processo causal do acidente, se o comportamento imputado à empregadora — falta de afixação no equipamento utilizado pelos trabalhadores da carga máxima – contribuiu, ainda que em conjugação com outros fatores, para a verificação do acidente, ou seja, se, caso houvesse essa indicação, os trabalhadores não o teriam utilizado. Começa a Apelante por esgrimir que tal equipamento não pode ser qualificado como plataforma de trabalho, sendo que da factualidade assente consta, indiferenciadamente, a alusão a escadas/plataforma.

Antes de mais, cumpre referir que é a própria Apelante que, na sua contestação, aceita que o referido equipamento era uma plataforma ou, pelo menos, uma escada telescópica a que estava acoplada uma plataforma. Como quer que seja, atento o Regulamento Geral de Segurança e Higiene em trabalho nos Estaleiros Industriais, aprovado pela Portaria 53/71, de 3.2 com as alterações introduzidas pela Portaria 702/80, de 22.9, verificamos que a lei apenas destrinça, dentro do âmbito das comunicações verticais, as escadas móveis (art. 13-A), as escadas duplas ou escadotes (art.13-B) e as plataformas de trabalho, fixas ou móveis (art. 13-C). Ora, atentas as características do equipamento em causa nos autos, não vemos que o equipamento utilizado possa ser qualificado como uma escada, mas antes como uma plataforma de trabalho móvel.

Dispõe o art. 273° do CT de 2003 (legislação aplicável à data dos factos), que sobre o empregador recai a obrigação geral de assegurar que todos os seus trabalhadores exercem as suas funções em condições de segurança, higiene e saúde. Por sua vez o art. 13° C, n°10 da Portaria 53/71, de 3/2, alterada pela Portaria 702/80, de 22/9, preceitua que, em cada plataforma de trabalho móvel (como era o caso da plataforma em discussão nos autos), deve figurar, por forma bem visível a indicação da carga máxima admissível.

O Decreto- Lei 82/99, de 16/3, que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n°89/655/CEE, do Conselho, de 30/11/89, alterada pela Diretiva n° 95/63/CE, do Conselho, de 5/12/95, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho, consagra no seu art. 5.º, n.° 1 que os equipamentos de trabalho devem satisfazer os requisitos mínimos de segurança constantes do capítulo II. E, neste capítulo, dispõe o art. 24°, que os equipamentos de trabalho devem estar devidamente sinalizados, com avisos ou outra sinalização indispensável para garantir a segurança dos trabalhadores. Resulta da matéria de facto apurada que a plataforma utilizada tinha uma capacidade elevatória até 300 kg e que, no momento da fratura do pino central do atuador hidráulico, com o colapso das escoras de travamento, que desencadeou a queda do Autor, se encontravam em cima da plataforma os quatro trabalhadores, sendo que três deles seguravam a porta do avião.

Embora não se tivesse apurado o peso da porta, é das regras da experiência comum que estava claramente ultrapassado esse limite de peso. Por outro lado, tendo ficado provado que a plataforma foi adjudicada à empresa que a construiu em Agosto de 2002 e entregue à Ré em 2.7.2003 (escassos meses antes da ocorrência do acidente) - facto n° 34 - e que na altura da receção foi efetuada uma inspeção visual na qual não foi detetada nenhuma anomalia ou deficiência visível, é lícito presumir que a fratura do pino central do atuador hidráulico que levou ao colapso das escoras de travamento se deveu ao peso excessivo suportado pela plataforma.

Visando a medida imposta pela regra de segurança infringida pela Ré permitir que os trabalhadores se apercebessem qual era o peso máximo suportável pela plataforma e, assim, evitar a sua utilização com carga superior, não pode deixar de considerar-se que, se no local constasse o aviso imposto por lei, provavelmente os trabalhadores não teriam utilizado aquele equipamento na execução do trabalho em causa (vd. Ac. do STJ de 23.9.09, disponível em www.dqsi.pt). Não merece, pois, censura a decisão recorrida, quando, em 1.ª linha, responsabiliza a Ré /Patronal pelas consequências do acidente, sendo a sua responsabilidade agravada, nos termos do art. 18, n° 1 da Lei 100/97».

2.3. Analisando sistematicamente os fundamentos invocados pela recorrente para afastar a sua responsabilidade agravada, começar-se-á por aquele que se traduz na pretendida ausência de obrigação legal que impusesse a colocação, no equipamento em utilização pelo sinistrado, da sinalização atinente à lotação e carga máxima admissíveis. Diz-nos a recorrente, nas conclusões 8.ª e 9.ª, da alegação de recurso, que «[o] equipamento em causa é uma escada acionada através de um sistema hidráulico», sendo que «[o] facto de ter uma plataforma não significa que a mesma possa ser qualificada como plataforma de trabalho móvel».

2.3.1. No que respeita a esta temática, adianta-se já não assistir razão à recorrente. Por duas razões distintas.

Em primeiro lugar, é verdade que o equipamento em causa nos autos é, em determinados factos (factos 32. e 33.), denominado «escada» – a indiciar alguma indefinição terminológica –; todavia, não podemos olvidar que uma plataforma, neste caso elevatória, não poderá funcionar sem ter acoplado um sistema de elevação em altura que, no caso, era uma escada. Daí a referida menção.

Em segundo lugar, é necessário atentar nos factos provados sob os números 8), 9), 10), 16), 17), 18) 20), 22), 31), 33), 34), 35), 36), 38), 45) e 46), nos quais é, sempre, feita menção ao equipamento em utilização como sendo uma plataforma de trabalho. Ora, a recorrente não sindicou, no momento oportuno, a qualificação, denominação e/ou características do equipamento em causa, procurando, agora, nesta fase, vislumbrar na sua estrutura complexa e na terminologia usada na matéria de facto, a incorreta subsunção jurídica dos factos, em ordem a afastar o enquadramento jurídico julgado adequado. Seja como for, não lhe é lícito, nesta fase recursória colocar em crise o juízo decisório factual alcançado nas instâncias acerca da natureza do equipamento utilizado, atendendo aos meios de prova que, para o efeito, entenderam ser de relevar e que, atendendo aos limitados poderes do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito da matéria de facto estão, necessariamente, subtraídos à sua sindicância.

Ante o exposto, o equipamento em causa não pode deixar de, por reporte aos factos provados, ser qualificado como foi nas instâncias, a demandar, tal como aí ponderado, a tomada das medidas de segurança necessárias à sua utilização, no caso, a menção sinalética quanto ao peso máximo que comportava.

A omissão, provada no facto 21), dessa sinalização no equipamento em causa, importa que se conclua pela violação, em concreto, pela recorrente, das normas previstas nas disposições que se deixaram elencadas no ponto 2.1.2., maxime, as previstas no artigo 13.º-C, ns.º 1 e 10, da Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, alterada pela Portaria n.º 702/80, de 22 de Setembro, e no artigo 24.º, do DL n.º 82/99, de 16 de Março, alterado pela Lei n.º 113/99, de 3 de Agosto.

Improcedem, por isso, as conclusões 6.ª a 13.º, da alegação de recurso.

2.3.2. Anunciou-se já que, a par da possibilidade de se imputar ao empregador a violação, em concreto, de norma protetora da segurança, higiene e saúde no trabalho, importa que, para a afirmação da sua responsabilização, seja apurado ou provado o necessário nexo causal entre essa violação e o sinistro laboral. Atenta a esta problemática, invoca a recorrente que «não poderia decidir-se pela responsabilidade, principal e agravada, do empregador, na ocorrência do acidente de trabalho em apreço nos autos», sendo que, «[p]ara [assim] concluir (…) o Tribunal “a quo” considerou que a falta de aviso ou sinal indicador da carga máxima admissível para a plataforma de trabalho, foi condição suficiente para que tivesse ocorrido a sua utilização com carga superior, não podendo deixar de considerar-se também que, se no local constasse o aviso imposto por lei, provavelmente os trabalhadores não teriam utilizado aquele equipamento na execução do trabalho em causa».

 

Neste concreto, e partindo da situação real posterior ao facto, não podemos deixar de atender às razões da recorrente: a falta de observação, pela ré, daquelas conjugadas regras sobre segurança no trabalho, concretamente, o facto de não estar afixada no equipamento utilizado pelo sinistrado sinalização com o peso máximo admissível não foi, em abstrato, condição necessária da eclosão do acidente. Inexiste, entre os dois factos, uma ligação que, segundo as regras comuns da vida, permita afirmar que, existindo o primeiro, provavelmente, não se daria o segundo.

Isto é, no contexto de um juízo de probabilidade ex post, nada autoriza a concluir que o incumprimento da sobredita regra sobre segurança no trabalho foi causa adequada daquele concreto acidente, pois este poderia ter ocorrido mesmo que a recorrente tivesse cumprido os deveres de sinalização em causa.

Efetivamente, analisada a matéria de facto provada, não se pode deixar de entender que a omissão praticada pela ré empregadora e ora recorrente não integrou o processo causal que conduziu ao acidente, uma vez que este se ficou a dever ao facto de as escoras de travamento da plataforma terem colapsado devido à fratura do pino central do atuador hidráulico [facto provado n.º 22)]. No mais, nenhum facto constante dos provados consente a conclusão de que aquele colapso e fratura se deveram à circunstância de o equipamento em causa não conter sinalização acerca do peso máximo admissível e de, por isso, se encontrarem em cima da plataforma número de trabalhadores e outro material – no caso uma porta de um avião – que excediam aquele peso e que, por isso, vieram tais colapso e fratura a ocorrer. Na verdade, não só se desconhece, em absoluto, o peso dos trabalhadores que se encontravam em cima da plataforma de trabalho, bem como se desconhecem o peso e características da porta do avião, e se desconhece, de todo, e por maioria de razão, se o colapso e fratura do pino central do atuador hidráulico ocorreu por excedido o peso máximo de 300 Kg em cima da plataforma, sendo insuficiente, para afirmar a exclusividade desse fator – que, como dito, sempre quedaria por provar – a circunstância de, aquando da receção do equipamento, ter sido feita uma inspeção visual na qual não foi detetada qualquer anomalia ou deficiência visível. Com efeito, não só essa verificação distou mais de 5 meses da data do acidente, como a circunstância de que o não apuramento de qualquer anomalia ou deficiência visíveis não afasta a possibilidade de existência de outras que escapassem a uma mera verificação visual.

O apuramento do peso dos trabalhadores e da porta que se encontravam em cima da plataforma, bem como o apuramento da exclusividade do excesso de carga em cima daquele equipamento para a fratura e colapso do pino central do atuador hidráulico eram essenciais para que se pudessem considerar verificados todos os expostos requisitos da responsabilidade agravada da recorrente.

A ausência de prova desses factos, a par da inexistência da sua alegação nos pertinentes articulados, não autoriza, por um lado, que se confirme o juízo decisório das instâncias, nem, por outro lado, que se recorra ao disposto no artigo 729.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, porquanto, como se sabe, a ampliação da decisão de facto está reservada para as situações em que o ónus da alegação foi cumprido, e não para aquelas outras em que esse ónus foi omitido ou para suprir a eventual inconcludência probatória dos factos constitutivos do direito.

Em síntese, quer o autor, quer a seguradora – que eram as partes oneradas com o ónus probatório dos factos determinantes da responsabilização agravada e principal da ora recorrente – não lograram provar que a sinalização na plataforma de trabalho em causa nos autos seria suficiente para evitar que os trabalhadores utilizassem aquele equipamento e para evitar a fratura e colapso do pino central do atuador hidráulico.

Não se pode, por isso, sustentar que se verifica nexo de causalidade entre a inobservância daquelas regras sobre segurança no trabalho por parte da recorrente e a eclosão do acidente, sendo que cabia ao autor e/ou à seguradora, como dito, alegar e provar os factos conducentes a essa conclusão, ónus que não se mostra cumprido (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).

Não se tendo provado esse nexo causal, não se mostram preenchidos os pressupostos da responsabilização do empregador, previstos no artigo 18.º, ns.º 1 e 2, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, termos em que procedem as conclusões 4.ª, 5.ª, da alegação do recurso de revista, resultando prejudicada a apreciação das demais conclusões.


III

            Pelo exposto, procede a Revista, em consequência do que:

a) Absolve-se a ré «TAP – Air Portugal, S.A.” de todos os pedidos formulados pelo autor;

b) Condena-se a seguradora «BB, S.A.», a título principal, pela reparação das consequências decorrentes do acidente que vitimou o sinistrado, nos moldes fixados – ainda que, aí, em termos subsidiários – no ponto B), da decisão, da sentença da 1.ª instância.

Custas, no Supremo e nas instâncias, a cargo da entidade responsável.

Anexa-se o sumário do acórdão.

Lisboa, 2 de Dezembro de 2013

Melo Lima (Relator)

          

Mário Belo Morgado

          

Pinto Hespanhol

_________________________

[1] Facto eliminado pelo tribunal de 1.ª instância, por ter sido entendido como conclusivo e face aos factos que foram mencionados na ampliação da matéria de facto, para a concretização de tal conclusão. Anteriormente dele constava: «e por excesso de peso».
[2] Seguimos, de muito perto, o Acórdão desta Secção, de 22 de Setembro de 2010, proferido na Revista n.º 190/04.3TTVCT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[3] Seguiremos, neste âmbito, jurisprudência há muito sedimentada nesta secção, de que o Acórdão proferido na Revista n.º 181/07.2TUFIG.C1.S1, de 28 de Novembro de 2012, acessível em www.dgsi.pt, é exemplo.
[4] Cfr., neste sentido, Pessoa Jorge, in “Ensaio Sobre os Pressupostos Da Responsabilidade Civil” – “Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal”, Lisboa, 1 a 72, reedição, página 389.