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PROVA ANTECIPADA
PRESSUPOSTOS
Sumário
A idade de 75 anos do réu é, só por si, insuficiente para justificar a necessidade de antecipação dos exames periciais para determinação do seu ADN.
Texto Integral
Proc. nº 994/06.2 TBVFR-B.P1
Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira – 2º Juízo Cível
Agravo
Recorrente: B…
Recorrido: C…
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos
Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO
A autora B…, por requerimento de 13.3.2012 dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, veio deduzir incidente de antecipação de prova, nos termos do art. 520º do Cód. do Proc. Civil, solicitando que se mande comparecer o réu C… em instituição pública com competência legal para a realização do arbitramento, em data previamente indicada por esta, com a cominação de que a recusa dará lugar à inversão do ónus da prova.
Nesse sentido, alega que passados seis anos desde a data da propositura da acção não foi ainda possível realizar a perícia médico-legal, reconstituição do perfil genético do réu, por forma a determinar se a autora é sua filha, por recusa daquele em se submeter à colheita de material genético para análise.
Mais alega que o réu tem já 74 anos de idade, aproximando-se daquela que é a esperança média de vida para o sexo masculino em Portugal, e que o seu decesso tornará muito mais difícil a recolha de material genético porque requererá a exumação dos restos mortais, sem contar com a possibilidade de os seus familiares procederem à cremação do corpo.
Refere ainda que o réu tem recorrido por diversas vezes ao Hospital, em urgência, queixando-se de problemas do foro cardiológico.
Conclui, assim, que, existindo justo receio de a mesma se vir a tornar impossível ou muito difícil, deve a prova requerida ser antecipada.
O réu, em 28.3.2012, deduziu oposição à pretensão da autora, pugnando pelo indeferimento do requerido. Para tal efeito, alegou que não se verificam os requisitos legais para decretar a produção antecipada de prova, quer porque inexistem as dificuldades e a morosidade de que a autora se pretende socorrer, quer porque os fundamentos invocados – idade avançada do réu e problemas do foro cardiológico – são falsos e incorrectos.
Para além disso, a autora não indicou qualquer prova dos factos por si invocados.
Juntou, por seu turno, prova documental e indicou testemunhas.
Em 29.3.2012 foi aberta conclusão ao Ex.mº Conselheiro Relator com a seguinte informação:
“(…) o requerimento que antecede, apresentado por C… foi apresentado no 2º dia após o terminus do prazo.
Mais informo que foi apresentada uma autoliquidação da multa prevista no art. 145º do C.P.C. mas referente ao 1º dia, pelo que V. Exª ordenará o que tiver por conveniente.”
O Ex.mº Sr. Conselheiro Relator proferiu então o seguinte despacho, com data de 16.4.2012:
“Veio a autora requerer a produção antecipada de prova.
O pedido é pertinente, atento o que neste STJ se decidiu sobre o ulterior julgamento da matéria de facto.
Acontece, porém, que esse julgamento da matéria de facto é da exclusiva competência das instâncias. Logo, é a elas que compete apreciar o requerimento em causa e dar aos autos o necessário andamento em ordem à produção antecipada de prova.
Este incidente tem natureza cautelar, pelo que tem de lhe ser dada prevalência no processamento dos autos.
Assim, baixem os autos para efeitos da requerida produção antecipada de prova, voltando depois a este Supremo para apreciação do recurso interposto.
Quanto à questão da liquidação de multa, constante da informação da presente conclusão, compete, por idênticas razões, às instâncias, a sua apreciação.”
Regressados os autos à 1ª Instância, com data de 23.7.2012 foi proferido o seguinte despacho judicial, que se passa a transcrever na sua parte mais relevante:
“(…)
Cumpre apreciar, desde já se dispensando a inquirição das testemunhas indicadas a fls. 1456, por desnecessidade.
Nos termos do artigo 510º do C.P.Civil “havendo justo receio de vir a tornar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de arbitramento ou inspecção, pode o depoimento, o arbitramento ou a inspecção realizar-se antecipadamente e até antes de ser proposta a acção.”
Para tal, nos termos do artigo 521º, nº 1 do C.P.Civil, o requerente justificará sumariamente a necessidade de antecipação e mencionará com precisão os factos sobre que há-de recair.
Compete, pois, à A. alegar e provar os factos que revelem a necessidade específica de antecipação, ou seja, alegar e provar o “periculum in mora.”
Conforme resulta do atrás exposto, a justificação do pedido da A. funda-se na circunstância de o facto que pretende provar – a procriação e filiação biológica com recurso a exames de sangue para determinação do ADN vir a tornar-se muito difícil senão impossível, face à idade avançada do R. e ao seu estado de saúde.
Conforme resulta dos autos, o R. tem actualmente 75 anos de idade e de acordo com o atestado médico junto a fls. 1457, datado de 26.3.2012, que a A. não impugnou, resulta que o R. “tendo sido submetido a exame físico, clínico e funcional cardio-respiratório, não apresenta qualquer sinal ou sintoma de falência de órgão ou sistema orgânico, que lhe condicione aumento de risco de morbi-mortalidade normal para a idade e apresenta índices de desempenho físico e cardio-respiratório em repouso e em esforço considerados óptimos para o seu escalão etário.”
Ora, em face destes factos apurados, não vislumbramos existir fundamento fáctico, nem o mesmo está sumariamente justificado, para ordenar a pretendida produção antecipada de prova, porquanto a referida idade do R. por si só não representa, a nosso ver, risco de impossibilidade de realização da prova pericial ordenada, tanto mais que do relatório médico junto, datado de 26.3.2012, o que resulta é que o R. não apresenta qualquer sinal que lhe condicione aumento de risco de morbi-mortalidade normal para a idade, apresentando bom nível de saúde física.
Acresce que, conforme já foi oportunamente anotado no despacho datado de 22.3.2007 (fls. 131/132), que apreciou anterior pedido de produção antecipada de prova, o eventual falecimento do R. não obsta à realização de exames após o seu decesso para os fins pretendidos, sendo que a ciência médica permite já realizar tais exames, com segurança e fidedignidade, após o falecimento, com recolha do material biológico após o falecimento.
Por outro lado, atenta a fase em que se encontram os autos, com decisão já proferida pelo STJ – não olvidando que foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional -, não se prevê qualquer retardamento excessivo na execução da perícia ordenada, tanto mais que, ao contrário do que parece sustentar a A., o que resulta do Acórdão proferido pelo STJ datado de 23.2.2012, é que deverão ser ordenados novos exames de ADN, de cuja notificação ao réu conste a menção de que a recusa injustificada em comparecer implica a inversão do ónus de prova nos termos do artigo 344º, nº 2, do C.P.Civil.
Pelo exposto, por falta de fundamento fáctico e legal, indefere-se a requerida produção antecipada de prova.
Custas pela requerente, com taxa de justiça que se fixa em 1 UC.”
Inconformada com este despacho, a autora dele interpôs recurso de agravo, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre o facto de a contestação apresentada pelo réu o ter sido fora do prazo legal e de não ter satisfeito o integral pagamento da multa devida, ao invés, teve aquele articulado em atenção e deu como provados factos que constavam de documento junto com o articulado.
2. A falta de pronúncia consubstancia a nulidade prevista no artigo 201º do C.P.C., porque se trata de acto que a lei prevê e cuja omissão influi decisivamente na decisão da causa.
3. A nulidade determina a anulação da douta sentença.
4. Sem prejuízo da nulidade assinalada, sempre o requerimento de antecipação deveria ter sido julgado procedente porque existe perigo de a demora na realização do exame, previsível dado a interposição de recurso para o T.C. e a postura persistente e reiterada do réu de falta de colaboração com a Justiça, vir a tornar o exame senão impossível muito mais difícil (artigo 521º do C.P.C.).
5. A idade do réu, 75 anos, é só por si determinante para que se julgue haver o perigo de decesso e consequente impossibilidade de recolha de material genético.
6. A recolha de material genético em cadáver torna o exame mais difícil ou mesmo impossível em caso de cremação.
7. Julgando como julgou o Tribunal “a quo” fez uma incorrecta aplicação do que dispõe o artigo 521º do Código do Processo Civil e como tal a sentença deverá ser anulada e substituída por uma outra que determine a realização antecipada da prova requerida.
O réu apresentou contra-alegações, nas quais se pronunciou pela confirmação da decisão recorrida, tendo juntado ainda documentação comprovativa das autoliquidações efectuadas correspondentes quer ao pagamento da multa devida nos termos do art. 145º, nº 5 do Cód. do Proc. Civil, na redacção decorrente do Dec. Lei nº 324/2003, de 27.12[1], quer ao pagamento da penalidade prevista no art. 145º, nº 6 do mesmo diploma nessa mesma redacção.
Colhidos os vistos legais, cumpre então apreciar e decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
Aos presentes autos, face à data da sua entrada em juízo, é ainda aplicável o regime de recursos anterior ao Dec. Lei nº 303/07, de 24.8.
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O objecto dos recursos encontra-se balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso – arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil -, sendo ainda de referir que neles se apreciam questões e não razões, que não visam criar decisões sobre matéria nova e que o seu âmbito é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
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As questões a decidir são as seguintes: I –Apurar se, no presente caso, deveria ter sido deferida a produção antecipada de prova requerida pela autora; II –Apurar se há que declarar a nulidade da decisão recorrida.
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A factualidade com relevo para o conhecimento do presente recurso é a que decorre do precedente relatório, para o qual se remete.
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Passemos à apreciação jurídica. I - Sob a epígrafe “produção antecipada de prova”, dispõe o art. 520º do Cód. do Proc. Civil que «havendo justo receio de vir a tornar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de arbitramento ou inspecção, pode o depoimento, o arbitramento ou a inspecção realizar-se antecipadamente e até antes de ser proposta a acção.»
Depois, no art. 521º, nº 1 do mesmo diploma estabelece-se que o seu requerente justificará sumariamente a necessidade da antecipação e mencionará com precisão os factos sobre que há-de recair.
Destes preceitos legais decorre que depoimentos, arbitramentos e inspecções podem ser produzidos antecipadamente, isto é, antes do momento processual em que normalmente seriam produzidos, se estiver em risco a conservação da fonte de prova (impossibilidade) ou a facilidade de a produzir (grande dificuldade). Tal acontece quando se justifique o receio de se vir a tornar impossível ou muito difícil um depoimento (de pessoa que se vai ausentar, de pessoa doente, etc.) ou a verificação, pericial ou por inspecção, de factos relevantes (nomeadamente, por se tratar de meio de prova indiciária sujeito a desaparecer).[2]
À semelhança do que sucede com os procedimentos cautelares, a produção antecipada de prova tem como requisito o “periculum in mora”, que consiste no risco de desaparecer ou se tornar muito difícil a produção de certa prova, antes do momento normal em que ela seria produzida.[3]
A produção antecipada de prova representa, assim, a medida ajustada a evitar que o decurso do tempo inutilize ou dificulte a produção de determinados meios de prova com potencialidade de influir na decisão da matéria de facto.[4]
Detalhando o fundamento da antecipação [justo receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a produção de certa prova no período normal da instrução], Alberto dos Reis (in “Código do Processo Civil Anotado”, vol. III, 4ª ed., pág. 332) escreve que tratando-se de prova por arbitramento ou inspecção judicial, o justo receio traduz-se no perigo de se apagarem os vestígios dos factos que se pretendem verificar. Tratando-se de prova por depoimento, o justo receio pode resultar: a) da iminência ou risco de morte da pessoa cujo depoimento se pretende obter; b) da idade avançada dessa pessoa; c) de doença grave que ela esteja sofrendo e que seja susceptível de a impossibilitar de depor.
A necessidade da antecipação, conforme flui do nº 1 do art. 521º do Cód. do Proc. Civil, terá que ser justificada, mas apenas sumariamente, o que significa que o requerente deverá alegar e provar sumariamente o facto ou factos que mostrem aquela necessidade de antecipação, isto é, que revelem o “periculum in mora”, o justo receio de perda ou a grande dificuldade futura da prova a produzir. Não se exige, pois, um juízo de certeza, bastando apenas a probabilidade ou verosimilhança de que a fonte de prova venha a perder-se ou de que a produção de prova se torne muito difícil. Como tal, o juiz não deve ser especialmente exigente na apreciação da prova oferecida, não se mostrando necessário que adquira a segurança completa de que existe o “periculum in mora”, sendo suficiente que a justificação produzida pelo requerente o habilite a formar o juízo de probabilidade ou verosimilhança acima referido.[5]
No caso presente, verifica-se que o fundamento avançado pela autora para o seu pedido se centra na circunstância de a prova da procriação e da sua filiação biológica com recurso a exames de sangue para determinação de ADN e reconstituição do perfil genético do réu se poder vir a tornar muito difícil ou até impossível face à idade avançada deste e ao seu estado de saúde.
Porém, não apresentou qualquer meio de prova donde resulte que o estado de saúde do réu seja precário, designadamente a nível cardiológico.
Aliás, é o réu que apresenta um atestado médico, datado de 26.3.2012, com o seguinte teor:
“(…) tendo sido submetido a exame físico, clínico e funcional cardio-respiratório, não apresenta qualquer sinal ou sintoma de falência de órgão ou sistema orgânico, que lhe condicione aumento de risco de morbi-mortalidade normal para a idade e apresenta índices de desempenho físico e cardio-respiratório em repouso e em esforço considerados óptimos para o seu escalão etário.”
Daqui decorre, que não estando minimamente comprovado que o réu seja pessoa doente, o fundamento que justificaria a antecipação da produção de prova teria sempre que radicar na sua idade avançada – 75 anos.
Só que esta idade, só por si, não nos permite concluir no sentido da impossibilidade ou da grande dificuldade da realização da prova pericial que é pretendida pela autora com vista à determinação da sua paternidade.
Não se pode esquecer que nas últimas décadas se assistiu a uma significativa melhoria das condições sanitárias e um dos seus resultados mais visíveis foi o aumento da esperança média de vida.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística sobre a mortalidade no período 2009/2011 o valor da esperança média de vida à nascença foi estimado em 76,43 anos para os homens. Por outro lado, para o mesmo período, a esperança média de vida aos 65 anos é de 16,81 anos.[6]
Como tal, para um cidadão português do sexo masculino que atinja os 65 anos de idade, a actual esperança média de vida supera os 81 anos.
Assim, a idade de 75 anos, não sendo acompanhada por qualquer patologia médica, não constitui hoje importante factor de risco para a produção de prova, justificativo da sua antecipação.
O risco de morte súbita, em virtude, designadamente, de acidente ou de doença inesperada, existe aos 75 anos, tal como em qualquer outra idade.
Ao que acresce ainda que no caso específico do réu este, de acordo com o atestado médico que foi junto aos autos, não apresenta qualquer sinal ou sintoma de falência de órgão ou sistema orgânico, que lhe condicione aumento de risco de morbi-mortalidade normal para a idade, evidenciando ainda índices de desempenho físico e cardio-respiratório em repouso e em esforço que, nesse mesmo atestado, são considerados como óptimos para o seu escalão etário.
É certo que o juiz, ao analisar o requerimento com vista à antecipação da prova, não deve ser especialmente exigente no que toca ao apuramento da factualidade que justifique tal antecipação, mas o requerente não pode deixar de alegá-la e prová-la, ainda que sumariamente.
Por isso, se o requerente não consegue provar, mesmo que de forma sumária, factualidade que justifique a antecipação da prova, sendo certo que a idade de 75 anos, só por si, não tem essa virtualidade, não há outra alternativa que não seja a sua rejeição.
Não se ignora que a autora esgrimiu ainda outros argumentos em favor da sua pretensão, alegando que o decesso do réu tornará muito mais difícil a recolha de material genético porque requererá a exumação dos restos mortais, sem contar com a possibilidade de os seus familiares procederem à cremação do corpo.
Trata-se de argumentos que, fundando-se, em última análise e de novo na idade do réu e na previsibilidade de uma morte relativamente próxima, também não poderão ser acolhidos.
De qualquer modo, à semelhança do que foi afirmado na decisão recorrida, sempre se dirá que o falecimento do réu não obsta à realização de exames para os fins pretendidos, uma vez que os progressos da ciência médica tornam hoje possível realizar, com segurança e fidedignidade, tais exames mesmo após o falecimento.
Na verdade, através da exumação do cadáver (com recolha de dentes ou ossos), de objectos e material biológico deixados pelo falecido (seja no seu meio – envelopes, selos, etc.; seja no meio hospitalar – biopsias, doações de sangue, análises clínicas, etc.) ou com recurso a amostras dos parentes do falecido, é hoje possível, mesmo depois da morte do investigado, efectuar a perícia médico-legal para os fins que são visados pela autora.
E quanto à exumação dos restos mortais entende-se ser ainda de sublinhar que, como é do conhecimento geral, a progressiva degradação do cadáver não é impeditiva da realização do exame em causa.[7]
Já no que concerne à cremação, que naturalmente inviabiliza a exumação, também esta não é de molde a impedir a realização dos exames pretendidos pela autora, atendendo a que estes se poderão efectuar tendo por base, como acima se assinalou, objectos e material biológico deixados pelo falecido ou amostras obtidas de parentes seus.
Por outro lado, a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional por parte do réu e a postura deste em não colaborar na realização do exame hematológico que permitiria apurar da paternidade da autora também não são argumentos justificativos da antecipação da perícia.
A possibilidade de recorrer para o Tribunal Constitucional está legalmente consagrada e não pode ser encarada como um mero expediente dilatório e quanto à recusa de colaboração do réu na concretização da perícia deverá assinalar-se que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.2.2012[8] de algum modo a minimiza significativamente ao determinar que sejam ordenados novos exames de ADN, de cuja notificação ao réu conste a menção de que a recusa injustificada em comparecer implica a inversão do ónus da prova nos termos do art. 344º, nº 2 do Cód. Civil.
Por conseguinte, não tendo a requerente alegado e provado factos, mesmo sumariamente, que justificassem a necessidade de antecipação dos exames periciais para determinação do ADN do réu, sendo que para tal efeito, conforme já atrás se expôs, a idade deste (75 anos), é, só por si, fundamento insuficiente, impõe-se a confirmação do decidido pela 1ª Instância no sentido do indeferimento de tal antecipação de prova.[9]
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II – A autora/recorrente, nas suas alegações, suscitou também a questão da nulidade da decisão recorrida, em virtude de nesta não se ter emitido pronúncia sobre a circunstância da oposição apresentada pelo réu o ter sido fora do prazo legal e sem satisfação do integral pagamento da multa devida.
Conforme flui dos autos, o réu deduziu oposição ao pedido de antecipação de prova formulado pela autora, fazendo-a acompanhar da autoliquidação da multa prevista no art. 145º, nº 5 do Cód. do Proc. Civil referente à prática do acto no primeiro dia útil subsequente ao termo do prazo.
No Supremo Tribunal de Justiça abriu-se conclusão ao Ex.mº Conselheiro Relator, informando que a oposição apresentada pelo réu deu entrada não no primeiro, mas sim no segundo dia após o termo do prazo.
O conhecimento da questão atinente à liquidação da multa, tal como do pedido de antecipação de prova, foi cometido pelo Supremo Tribunal de Justiça às instâncias.
Sucede, porém, que a 1ª Instância decidiu do requerimento com vista à antecipação da prova, sem nada dizer quanto à questão da liquidação da multa, ou seja, sem se pronunciar sobre se a multa prevista no art. 145º, nº 5 do Cód. do Proc. Civil foi autoliquidada de forma correcta pelo réu.
Não o tendo sido, deveria o réu ter sido notificado para proceder ao pagamento da multa a que se refere o art. 145º, nº 6 do Cód. do Proc. Civil, notificação essa a ser efectuada pela secretaria, independentemente de despacho, tal como decorre deste preceito legal.
Se é certo que a 1ª Instância ignorou totalmente a questão referente à liquidação da multa, também é verdade que a mesma nenhuma repercussão poderá ter no desenvolvimento dos autos, uma vez que o réu, embora discordando da exactidão da informação prestada pela secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, procedeu entretanto às autoliquidações correspondentes quer ao pagamento da multa devida nos termos do art. 145º, nº 5 do Cód. do Proc. Civil na redacção decorrente do Dec. Lei nº 324/2003, de 27.12, quer ao pagamento da penalidade prevista no art. 145º, nº 6 do mesmo diploma nessa mesma redacção.[10]
Redacção esta que o réu entendeu ser a subjacente à informação lavrada no Supremo Tribunal de Justiça e que, por isso, teve em conta para as referidas autoliquidações.
Neste contexto, entendemos que, a ter havido omissão de pronúncia por parte da 1ª Instância, a hipotética nulidade que daí adviria tem que se considerar como sanada, face às autoliquidações efectuadas pelo réu.
De qualquer forma, ainda que assim não se entendesse, a consequência a extrair de tal omissão sempre seria a prévia notificação do réu para os efeitos do art. 145º, nº 6 do Cód. do Proc. Civil e nunca o desentranhamento da sua oposição e a confissão dos factos articulados, conforme parece pretender a autora/recorrente.
Como tal, não poderá ser acolhida a argumentação por esta explanada no tocante à eventual nulidade da decisão recorrida.
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DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em negar provimento ao recurso de agravo interposto pela autora B…, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da autora/recorrente, sem prejuízo de apoio judiciário.
Porto, 27.11.2012
Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires
Márcia Portela
Manuel Pinto dos Santos
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[1] O réu, nas suas contra-alegações, reporta-se, por lapso, ao Dec. Lei nº 38/2003.
[2] Cfr. Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 2ª ed., pág. 446.
[3] Cfr. Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, ob. e loc. cit.
[4] Cfr. Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, III vol., 3ª ed., pág. 74.
[5] Cfr. José Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 337; Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, ob. cit., pág. 447.
[6] Dados recolhidos na edição do jornal “Público” de 30.5.2012, disponível in www.publico.pt.
[7] Cfr. Ac. Rel. Coimbra de 16.10.2007, p. 211/07.8 TBSLV-E.C1, disponível in www.dgsi.pt.
[8] Não se encontra junto aos presentes autos de recurso em separado, mas consta in www.dgsi.pt (p. 994/06.2 TBVFR.P1.S1).
[9] No Ac. Rel. Porto de 19.3.2009 (p. 59/07.0 TBMSF-B.P1, disponível in www.dgsi.pt.) deferiu-se a antecipação da prova, relativamente à produção do depoimento de uma testemunha de 77 anos de idade. Só que esta, diversamente do que ocorre no caso “sub judice” em que não se assinala qualquer patologia médica, padecia de surdez de grau avançado, de diabetes e de hipertensão arterial.
[10] É a seguinte a redacção dos nºs 5 e 6 do art. 145º do Cód. do Proc. Civil, decorrente do Dec. Lei nº 324/2003, de 27.12: «5. Independentemente de justo impedimento, pode o acto ser praticado dentros dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1º dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial, não podendo a multa exceder 3 UC. 6. Decorrido o prazo referido no número anterior sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial, não podendo a multa exceder 20 UC.»