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AUTO DE DENÚNCIA
LEITURA EM AUDIÊNCIA
Sumário
I – O auto de denúncia constitui prova documental, que atesta que esta foi realizada nas circunstâncias de tempo e lugar nele exaradas, pela pessoa ali identificada e com a indicação dos factos ali narrados, mas não constitui meio de prova da ocorrência desses mesmos factos. II – Nada obsta a que esse documento possa ser exibido à arguida no decurso da audiência e possa ser valorado pelo tribunal em sede de formação da convicção (artºs 345º3 e 355º CPP). III – O confronto do conteúdo das declarações produzidas no auto somente pode ser feito com observância das normas dos artºs 356º e 357º CPP como expressa o artº 345º3 CPP.
Texto Integral
Processo n.º 53/13.1GCETR.P1
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto
I – RELATÓRIO:
Nos presentes autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, foram submetidos a julgamento os arguidos B… e C…, tendo sido proferida sentença que os condenou:
1. O primeiro arguido, como autor material de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art. 143.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de 8€; e de um crime de injúria, p. e p. no art. 181.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 40 (quarenta) dias de multa à taxa diária de 8€, em cúmulo jurídico na pena única de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de 8€;
2. A segunda arguida, como autora material de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art. 143.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de 12€; e de um crime de injúria, p. e p. no art. 181.º, n.º 1 do CP, na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de 12€; em cúmulo jurídico na pena única de 130 (cento e trinta) dias de multa à taxa diária de 12€.
Quanto aos pedidos civis foi decidido:
1. Julgar o pedido de indemnização civil formulado pelo demandante B… parcialmente procedente e, consequentemente, condenar a demandada C… a pagar-lhe uma indemnização no montante global de 850€, a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento;
2. Julgar o pedido de indemnização civil formulado pela demandante C… parcialmente procedente e, consequentemente, condenar o demandado B… a pagar-lhe uma indemnização no montante global de 650€, a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento.
3. Julgar o pedido de indemnização civil/reembolso formulado pela Administração Regional de Saúde do Centro, IP totalmente procedente, e, consequentemente, condenar o demandado B… a pagar-lhe uma indemnização no montante de 31€, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento.
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Inconformada com a decisão condenatória, a arguida C… interpôs recurso, apresentando a motivação que remata com as seguintes CONCLUSÕES:
1. Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do artigo 412.º do CPP, consigna-se que a recorrente mantém interesse no recurso que já interpôs do douto despacho proferido na sessão de julgamento de 26-02-2014 e cujas alegações foram apresentadas em 27-03-2014.
2. O presente recurso abrange matéria de facto e matéria de direito.
3. Foi violado o princípio da imediação da prova e o disposto no artigo 355.º do CPP, quando a senhora juíza entendeu afirmar a uma testemunha que o seu depoimento que estava a ser prestado em audiência de julgamento estava a ser distinto do que prestara durante o inquérito e isto sem que tivesse sido autorizada a leitura do depoimento da aludida testemunha restado no inquérito. Mais agravando tal violação, o facto de se insistir com a testemunha se mantinha o seu depoimento, pois se tal sucedesse ser-lhe-ia instaurado um processo crime.
4. O tribunal entendeu não dar como provado que o arguido B… deu duas bofetadas à recorrente, sendo que uma delas a fez tombar ao solo batendo com a cabeça num muro e ainda que os óculos não se danificaram com tal agressão, não tendo a recorrente necessidade de comprar outros. No entanto dos autos resulta tal sobejamente provado. Utilizando-se apenas o depoimento das testemunhas que o tribunal entendeu como credíveis e o relatório do IML e ainda os documentos (factura e receita).
5. As testemunhas D… e E… referem que viram o arguido B… perseguir a recorrente já esta se afastava do local, com os netos, agredindo-a na cabeça fazendo-a cair e embater com a cabeça num muro, enquanto os netos pediam ao arguido para não bater mais na avó. O relatório do IML aponta lesões consentâneas com tal versão.
6. Devia pois ter sido dado por provado que o arguido B…, após ter dado uma bofetada à recorrente, junto à porta do prédio onde esta fora buscar os netos, foi ainda no seu encalço quando ela se afastava do local com os netos pela mão, desferiu-lhe uma pancada na cabeça, fazendo-a cair e batendo com a cabeça num muro, resultando as lesões constantes do relatório do IML.
7. Foi violado o princípio do contraditório, pois o tribunal valorou documentos sem que a recorrente tivesse ido possibilidade de sobre eles se pronunciar no prazo legal.
8. Foi violado o princípio da proporcionalidade pois, não obstante o arguido B… ter um rendimento superior ao da recorrente, foi a esta fixado um valor de taxa de multa diária muito superior.
9. Acresce que o tribunal valorou incorrectamente parte de documentos, nomeadamente os relativos aos rendimentos da recorrente e bem assim da propriedade dos seus bens, valorando apenas os rendimentos, omitindo as despesas, sendo que dos atos constavam documentos que permitiam apurar, indiciariamente que fosse, as despesas habituais da exploração agrícola da recorrente.
10. A sentença recorrida não valorizou o facto de arguido B… não ter tido qualquer lesão e a recorrente apresentar lesões que lhe determinaram oito dias de doença, violando o princípio da proporcionalidade.
Terminou pedindo que se proceda a nova audiência de julgamento, ou caso assim se não entenda, se considere provado que o arguido B… agrediu a recorrente por duas vezes, sendo que numa delas a recorrente foi projectada contra um muro causando-lhe as lesões constantes do relatório do IML, mais seja revista a pena aplicada, o mesmo se dizendo do pedido cível formulado pela recorrente.
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Igualmente inconformada com o despacho proferido em audiência no dia 26-2-2014, a arguida C… interpôs recurso, apresentando a motivação que remata com as seguintes CONCLUSÕES:
1. O artigo 356.º do CPP, dando corpo aos princípios da oralidade e da imediação, consagra um princípio de proibição de utilização das declarações do assistente, arguido e testemunhas prestadas aquando do inquérito sendo permitida a sua leitura excecionalmente e em casos devidamente previstos na lei.
2. O douto despacho recorrido ao autorizar a leitura do auto de denúncia da ofendida/assistente mas que também tem a qualidade de arguida, auto esse que contem declarações da mesma, viola o artigo 356º-1-b) do CPP.
3. Acresce que tendo-se a tal oposto a arguida mais frontal se torna tal violação tanto mais que a leitura foi permitida em deferimento dum requerimento que se fundamentou para esse pedido no artigo 356.º2-b) do CPP.
4. E mesmo que se entendesse que estamos perante uma peça processual que se não equipara à prestação de declarações nem mesmo assim deixaria, o despacho recorrido, de violar os princípios da oralidade e imediação sendo que tal entendimento sempre seria inconstitucional por violar o nº5 do artigo 32º da CRP, sendo que sempre estaria abrangida pela proibição contida no nº 1-b) do artº 356.º do CPP.
Terminou pedindo que seja anulado o despacho e bem assim os ulteriores termos processuais que digam respeito à arguida/recorrente.
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O assistente B… respondeu ao recurso interlocutório e ao recurso da sentença, pugnando pelo respectivo não provimento.
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O Ministério Público junto do tribunal a quo respondeu aos recursos, pronunciando-se no sentido da improcedência e formulando as seguintes CONCLUSÕES:
1. A Mª Juiz adoptou sempre uma postura correctíssima, tratando todos os intervenientes processuais de igual forma.
2. Alega o recorrente que a Juiz ao fazer a advertência da testemunha que teria dito algo diferente em inquérito do que estava a dizer em julgamento e que o mesmo a faria incorrer em crime prejudicou o livre depoimento da mesma.
3. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não conseguimos perceber este argumento da recorrente.
4. Muito bem está o Tribunal na tentativa da descoberta da verdade material se lembra as testemunhas (sim, porque foi mais do que uma testemunha a lembrar-se ou a esquecer-se de factos que não se tinha lembrado ou esquecido em inquérito, sendo certo que tanto eram testemunhas de um como de outra parte e o tratamento do tribunal foi igual para todas) de que tinham prestado depoimento diverso.
5. Uma coisa seria esquecerem-se de factos, outra completamente diferente e que constitui crime (e como muito bem fez a Mª Juiz, advertiu desse mesmo facto as testemunhas em causa) é dizer-se o oposto que havia sido dito em inquérito e que esteva na base de um despacho de acusação ou arquivamento.
6. Aliás, esta matéria está a ser actualmente investigada em sede de inquérito.
7. Daqui não se pode é extrair que a partir do momento em que a Mª fez a advertência, que o depoimento deixou de ser livre, porque se assim fosse, o mesmo teria sido alterado logo em sede de audiência de julgamento, o que não aconteceu (dai a extracção de certidões).
8. Pelo exposto, entende-se que não houve qualquer violação do principio da imediação e do art.º 355.º do CPP.
9. Pretende o recorrente que o depoimento das testemunhas, juntamente com o alegado pela própria recorrente levaria a não dar como provados os factos listados pelo Tribunal ‘a quo’– pois não ficou com a certeza clara e absoluta de que os factos se passaram conforme descritos nos factos provados.
10. Ora, isso não pode ser acolhido, até pelo que já se deixou explanado atrás no ponto A, uma vez que quase todas as testemunhas vieram mentir ao Tribunal, tendo por isso que ser valorado essencialmente o declarado pelos arguidos e a prova documental.
11. Acrescendo que, da demais prova produzida, os factos postos em crise resultaram como demonstrados para além de qualquer dúvida, não deixando que se anteveja como plausível hipótese contrária.
12. Analisada a prova produzida, mormente a indicada pela recorrente, de forma global e unitária, a única conclusão que se pode extrair é a de que o Tribunal recorrido apreciou correctamente a mesma e daí extraiu as consequentes conclusões de facto.
13. Efectivamente, compete ao juiz a quo, no seu livre arbítrio, fazer a valoração da prova produzida em sede de julgamento.
14. A convicção do Tribunal para dar como provados os factos supra descritos resultou da apreciação crítica e selectiva de toda a prova produzida em audiência conexionada com as regras de experiência comum.
15. In casu, a arguida tem uma Vacaria, sendo que no prazo de cerca de 10 meses, recebeu a quantia de 75.000 euros.
16. Para além disso, tem ainda registados em seu nome 6 viaturas, sendo que existem ainda mais três registados em nome do seu marido.
17. Assim sendo, não se pode falar de alguém que vive com necessidades e que passa por dificuldades.
18. Considera-se assim adequado o quantitativo diário aplicado.
19. Pelo que vem exposto, deve o presente recurso improceder, pois há que concluir que a pena imposta não foi nem demasiado severa nem demasiado branda, antes, afigura-se-nos justa.
20. Deste modo se conclui que o despacho recorrido fez uma correcta interpretação e aplicação das normas que regem as matérias em apreço, não tendo violado qualquer delas, nomeadamente não violou o disposto nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, nem os princípios de direito natural aplicáveis.
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Nesta instância o Ministério Público emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta.
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Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II – FUNDAMENTAÇÃO: A. O despacho proferido em 26-02-2014 é do seguinte teor: Ao abrigo do disposto no art.º 340º do CPP, conjugada com o disposto no art.º 164º, n.º 1 do CP, decide-se permitir a análise e confronto da arguida com o auto de denúncia de folhas 2 a 5 do processo apensado, uma vez que se trata de documento exarado por órgão de policia criminal, no qual é vertido o teor da denúncia apresentada, sendo que a tal não se aplica o disposto no art.º 356º, n.º 1 do CPP, uma vez que este último preceito se refere à leitura dos autos e declarações neles vertidos, prestados por sujeitos processuais, observado o formalismo legal, não sendo esse o caso do elemento probatório referido pelo arguido/assistente. Notifique».
B.Apreciação do recurso:
Conforme jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, sem prejuízo da apreciação de todas as matérias que sejam de conhecimento oficioso.
No caso concreto, o recurso interlocutório coloca a questão de saber se a leitura em audiência do auto de denúncia, com a finalidade de a arguida ser confrontada com o seu teor, está sujeita ao condicionalismo previsto nos artigos 356.º e 357.º do Código Processo Penal.
No que concerne ao recurso da sentença as questões colocadas são a violação dos princípios da imediação e da proibição de valoração de provas não produzidas em audiência; a impugnação da matéria de facto; a violação do princípio do contraditório; a dosimetria da pena e a violação do princípio da proporcionalidade.
1- RECURSO INTERLOCUTÓRIO
Dos autos recolhem-se, com relevo para o conhecimento do recurso, os elementos seguintes:
a) No decurso da audiência pela defensora do arguido B… foi apresentado o requerimento do teor seguinte:
«O arguido B… em face das declarações ora prestadas pela assistente/arguida vem requerer que a mesma seja confrontada com o auto de denúncia elaborado em 30/1/2013 pelas 00:10 horas e constante de folhas 2 a 5 do processo n.º 54/13.0GCERT, nos termos do disposto no art.º 356º, n.º 2 al. b) e 5º do CPP, tanto mais que a assistente/arguida refere que não se recorda se disse ou não à GNR se tinha dado uma chapada ao arguido/assistente B…».
b) Não houve oposição por parte do Ministério Publico.
c) O mandatário da recorrente pronunciou-se sobre o requerimento nos termos seguintes:
«A arguida opõe-se ao requerido, sendo que, salvo o devido respeito, também o requerido nunca seria admissível, atento o disposto no art.ºn.º1, al. b) do artº 356º do CPP.»
d) Após a prolação do despacho recorrido, e tendo sido requerida também a leitura do auto de denúncia do processo principal, a Mma Juíza procedeu à leitura dos autos de denúncia.
Importa notar, desde já, que o julgamento incidiu sobre a matéria de acusação pública, na qual a recorrente surge na dupla qualidade de arguida e de ofendida, o que aliás sucede igualmente com o arguido/assistente B….
No decurso da audiência a recorrente assumiu a dupla posição processual de arguida e de assistente, tendo sido a propósito das declarações que prestou sobre os factos que lhe são imputados que surgiu o requerimento sobre o qual recaiu o despacho recorrido. Sucede que o acto processual em causa consiste na denúncia apresentada pela recorrente, mas pretende-se que a leitura[1] incida sobre um segmento dessa denúncia em que a assistente relatou a sua reacção à atitude do arguido B…, isto é, visa a abordagem da matéria conexa com a imputação de factos constante da acusação.
Na realidade, o requerente formulou a pretensão de a arguida ser confrontada com o que foi por si afirmado na denúncia quanto a ter «dado uma chapada» ao ofendido B… por ter declarado em audiência não se recordar se produzira ou não essa declaração quando apresentou a denúncia.
Neste contexto o requerimento foi apresentado por B…, enquanto assistente e foi na qualidade de arguida que a recorrente se pronunciou, deduzindo oposição.
Portanto, resulta inequívoco que o sentido e alcance do requerimento era o de fazer a arguida reflectir sobre o que declarara em audiência por contraposição com o declarara perante o órgão de polícia criminal aquando da denúncia.
Certo é que o auto de denúncia não corresponde formalmente a auto de declarações, porém, não se suscitam quaisquer dúvidas de que contém a reprodução das declarações prestadas pela denunciante perante a autoridade judiciária.
Acresce que o excerto da denúncia visada no requerimento contém declaração que extravasa o conteúdo das imputações formuladas contra o denunciado e integra antes a assunção por parte da denunciante de factos susceptíveis de envolver a sua responsabilidade criminal, sem que lhe tenha sido efectuada qualquer advertência, tampouco, nessa altura, foi a declarante constituída arguida, relativamente a essa matéria. Portanto, decorre das disposições conjugadas dos artigos 57.º n.º 1, 58.º n.º 5 e 59.º n.º 1 do Código Processo Penal, que as declarações “confessórias” da arguida, prestadas embora na qualidade de denunciante, não possam ser utilizadas como prova.
Ora, como se afirmou no aresto citado pelo assistente,[2] o auto de denúncia, «é meio através do qual se dá conhecimento da prática de um crime e que impulsiona o procedimento criminal como resulta do disposto nos artigos 243.º a 247.º do Código de Processo Penal, tratando-se de um meio de prova documental na medida em que documenta a denúncia de determinado crime de acordo com a definição do artigo 164.º n.º 1 do Código de Processo Penal», ou seja, o documento em causa atesta que foi realizada a denúncia nas circunstâncias de tempo e lugar nele exaradas, pela pessoa ali identificada e com a indicação dos factos ali narrados, mas já não constitui meio de prova da ocorrência desses mesmos factos[3].
Nessa perspectiva, nada obsta a que tal documento possa ser exibido à arguida no decurso da audiência e possa ser valorado pelo tribunal em sede de formação da convicção, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 345.º n.º 3 e 355.º do Código Processo Penal.
Todavia, o confronto do conteúdo das declarações produzidas no auto somente pode ser feito com observância das normas dos artigos 356.º e 357.º do Código Processo Penal, como expressamente está ressalvado no citado artigo 345.º n.º 3 do mesmo diploma legal.
Por conseguinte, não se reconhece fundamento legal ao despacho recorrido, não podendo, em consequência, ser valorada a prova, ou seja, as declarações prestadas pela arguida após confronto com a aludida denúncia e quanto a essa matéria, atento o disposto nos artigos 355.º e 356.º do Código Processo Penal.
No entanto, não se mostra afectada a restante produção de prova que em nada colidiu com o acto processual inválido, o qual também não se repercutiu na fixação da matéria de facto, uma vez que a convicção do tribunal não assentou nessa prova, como resulta da motivação da decisão de facto[4].
Nestes termos, procede parcialmente o recurso.
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III – DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso interlocutório e, em consequência, declarar a inadmissibilidade de valoração das declarações prestadas pela arguida quanto ao teor do auto de denúncia, e, ainda, negar provimento ao recurso interposto da sentença, confirmando na íntegra a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, quanto ao recurso da sentença, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça.
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Porto, 03-12-2014
Maria dos Prazeres Silva
Coelho Vieira
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[1] Embora o texto do requerimento se reporte ao confronto da arguida com a denúncia, apoia-se no artigo 356.º n.º 2 alínea b) do Código Processo Penal, e é perceptível que se pretende a leitura do teor da denúncia para em face do mesmo a arguida se pronunciar sobre um aspecto das suas declarações prestadas em audiência.
[2] Acórdão da Relação de Coimbra de 03-07-2013, proc. 148/11.6GBTMR.C1, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Como aliás também se acentua no citado acórdão, no qual se realça que pode constituir factor relevante para aferir da credibilidade da prova e não propriamente da veracidade do conteúdo das declarações prestadas oralmente «(…) nada obsta a que o seu conteúdo seja valorado, não como meio exclusivo de provar os factos que retrata como tendo sido objecto de denúncia que terão de ser provados por outro meio, mas como meio de confronto entre o que aí se fez constar e o teor da prova oral porque nesse aspecto pode revelar-se essencial para aferir da credibilidade da prova».
[4] Vd. Motivação supra, onde se refere quanto às declarações da arguida: «(…) negou peremptoriamente que tenha dado qualquer sapatada, empurrão ou bofetada ao arguido/assistente B…, assim como negou que tenha proferido as expressões que lhe são imputadas. Ao invés, disse que foi o arguido/assistente B… que lhe chamou «assassina», «filha da puta» e «rota», esclarecendo ainda que quando este último lhe dirigiu tais expressões o fez já na presença dos seus netos, assim como das testemunhas D… e F…, que, segundo afirmou, «assistiram a tudo».(…)»; sendo que a única referência à denúncia é do teor seguinte: “Por outro lado, referiu ainda que nesse mesmo dia se voltou a cruzar com o arguido/assistente B… no posto da GNR, onde ambos se deslocaram para ir apresentar queixa, tendo, na altura, a arguida/assistente C… descrito tudo o sucedido ao militar que recebeu a denúncia».