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CRIME DE DIFAMAÇÃO
ABUSO DE LIBERDADE DE IMPRENSA
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
Sumário
I – Conforme imperativo constitucional do art 26º nº 1 da CRP de tutela de «bom nome e reputação», o art 70º CC consagra a tutela da pessoa contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade moral e os arts 180º sgs do Código Penal incriminam a conduta de «difamação» e a de «injúria» - que pode ser qualificável como «calúnia» - para protecção da honra interior inerente à pessoa enquanto portadora de valores espirituais e morais e, para além disso, a valência deles decorrente, a sua boa reputação no seio da comunidade. II – Além do «bom nome e reputação», a CRP tutela igualmente – e em sede de «Direitos, Liberdades e Garantias pessoais» - genericamente – a «liberdade de expressão e informação» ex vi art 37º e – especificamente – a «liberdade de imprensa» ex vi art 38º – dos quais ressuma não se tratar de um «direito absoluto» mas de uma «liberdade com responsabilidade»- ex vi art 37º nº 3. III – Convoca-se assim a matéria particularmente sensível dos limites e das afectações à «liberdade de expressão» que são categorizáveis como «limites directos», «limites especiais», «restrições legais» e ainda as «situações de conflitos de direitos» a resolver pela metodologia da ponderação dos bens ou interesses em conflito que é aplicável quando não esteja a hipótese de conflito expressamente regulada na CRP e não seja suficiente o recurso a solução legal harmonizadora de um conflito. IV – Constituindo a CEDH «direito supra ordinário» ex vi art 8º nº 2 da CRP, à delimitação do objecto do crime doloso de difamação por meio de «abuso de liberdade de imprensa» importa a consideração da Jurisprudência do TEDH sobre «liberdade de expressão» como fundamental numa sociedade democrática ut conjugação do princípio geral do art 10º nº 1 com as excepções dos arts 10º nº 2 e 17º da CEDH. V – Não consubstancia crime doloso de difamação as expressões linguísticas - insertas em «artigo de opinião» expressivo de «luta-político-partidária-pessoal» - que - pecando pelo exagero que não eleva o nível redactorial – ainda se contém num exercício legítimo do «direito de informar» - com impressividade sem uma ofensividade censurável por desnecessidade ou gratuitidade - para asseverar uma «liberdade de informação» que se quer autêntica e não aparente.
Texto Integral
Na 1ª Secção Judicial / Criminal do TRP acordam em Conferência os Juízes no Recurso Penal 1469/12.6PEGDM.P1 vindo do 2º Juízo B do Tribunal de Instrução Criminal do Porto depois Juiz 5 1ª Secção de Instrução Criminal da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do Porto
O Inquérito 1469/12.6PEGDM [1] da III Secção do MP de MTS culminou - além do mais e ao que importa decidir - na ACUSAÇÃO de 06.02.2014 do MP versus os Arguidos 1. B… [2], 2. C… [3], 3. D… [4], 4. E… [5], 5. F… [6], 6. G… [7], 7. H… [8], 8. I… [9], 9. J… [10] e 10. AK… [11], porquanto:
«No dia 9 de Novembro de 2012, pelas 22 h, B…, na qualidade de jornalista, dirigiu-se à Junta de Freguesia …, local onde ia decorrer uma reunião do L…, pretendendo a B… fazer a cobertura da mesma.
Os jornalistas não estavam autorizados a entrar na sala onde decorria a reunião e na Junta de Freguesia não existe sala de imprensa, sendo que, como estava a chover, um membro do secretariado do L…, a testemunha M…, solicitou à testemunha, N…, tesoureira da Junta de Freguesia, que acomodasse no interior da Junta os elementos da imprensa.
Assim, quando a B… ali chegou, foi conduzida pela testemunha N… ao gabinete de trabalho desta testemunha, assumindo a B… o compromisso de não sair daquele local antes do final da reunião, vedada aos jornalistas.
Volvidos alguns minutos, entrou a testemunha O…, funcionária da Câmara Municipal de Matosinhos que disse à arguida que não podia ali permanecer e que devia sair.
A B… não saiu, continuando a falar ao telemóvel.
Por volta das 22h15m, o Presidente da Junta …, C…, também presente para participar na reunião do L…, passou pelo corredor onde se situa o gabinete onde se encontrava a B… e, vendo a luz acesa, entrou a fim de verificar o que se passava.
Deparando com uma pessoa que não era funcionária da Junta e que ele, Presidente, não conhecia, interpelou-a, dizendo-lhe: “Sou C…, o presidente da Junta de Freguesia e supostamente não deveria encontrar-se aqui ninguém. Por favor quem é a senhora e o que faz aqui?”
A arguida B… continuou a escrever velozmente num pequeno caderno e a falar ao telemóvel, não respondendo ao C….
Este insistiu, repetindo a apresentação e as perguntas, sendo que a arguida retorquiu, sem sequer olhar para o Presidente: “Foda-se, ainda agora esteve aqui uma gaja a chatear-me e agora é este palerma. Eu estou a trabalhar, você não vê? Deixe-me em paz”
Insistindo o C… para que se identificasse e dissesse o que fazia, a arguida B… respondeu: “Você não tem nada com isso, sou do P…, estou ao telefone com o meu chefe e você está a impedir-me de trabalhar, fora daqui já disse, eu estou devidamente autorizada”, pela tesoureira da Junta, “tenho aqui o telefone dela e vou ligar-lhe já”.
O arguido C… agarrou a B… por um braço, a fim de a pôr fora do gabinete, sendo que a B… se recusava a sair, dizendo que estava ao telefone e que pretendia ultimar um texto para mandar para a redacção do Jornal.
Então, o arguido C… agrediu corporal e voluntariamente a B…, à bofetada e apertando-lhe os braços, causando-lhe as lesões descritas nos exames médicos que lhe determinaram como consequência necessária e directa três dias de doença sem incapacidade para o trabalho.
Cerca das 23h30m, já no exterior das instalações da Junta, quando a arguida B… se cruzou com o Presidente da Junta, C…, disse-lhe: “Ainda aí estás, ó cobarde, não fugiste, estás à espera do balão?”
Sabia a arguida B… que o C… era Presidente da Junta de Freguesia e, tanto no interior do gabinete, como já na saída, agiu com o propósito de ofender a honra e consideração do C…, não ignorando que as palavras que lhe dirigiu eram adequadas a produzir tal resultado, aliás, por ela visado. *
Os arguidos E…, D…, I…, H… e F… são, respectivamente, director, subdirectores e directores-adjuntos do jornal diário “P…”.
No dia 10 de Novembro de 2012, os arguidos K… e J…, na sua qualidade de jornalistas do “P…” escreveram o artigo, fotocopiado a fls. 94 [12], sob o título “Autarca de … agride jornalista do “P…”, onde dizem:
“...a jornalista B… foi convidada pela tesoureira da Junta de Freguesia a ocupar o seu gabinete no edifício da Autarquia, para que pudesse exercer o seu trabalho. Por volta das 22.30 horas, a jornalista foi confrontada com uma situação anormal e violenta. Um indivíduo que não se identificou — mas que depois se percebeu tratar-se do presidente da Junta de …, C… — entrou no gabinete e deu-lhe ordem de expulsão.
Visivelmente transtornado, apagou as luzes da sala e atirou o telemóvel da jornalista contra uma parede...”.
Com esta notícia o jornal publicava também uma fotografia do Presidente da Junta … com a legenda: “C…, o autarca agressor”.
Os arguidos E…, I…, D…, H… e F…, na qualidade de, respectivamente, director, subdirectores e directores-adjuntos do “P…”, tiveram conhecimento do teor deste artigo e não se opuseram à sua publicação.
No dia 11 de Novembro de 2012, o jornalista e também subdirector do “P…”, D…, escreveu o artigo [13] intitulado “C… pensa com as pernas”, onde diz: “...A agressão de que foi alvo a jornalista do “P…” B… ... trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C…, presidente da junta da freguesia …. Só um cobarde é capaz de aterrorizar e agredir uma jornalista... C… não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das notáveis definições de cobardia: “Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas”. Isto é: foge dos problemas... De uma assentada escaparam-se-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa por entre os dedos das mãos...”
Os arguidos E…, I…, H… e F…, na qualidade de director, subdirector e directores-adjuntos do “P…”, respectivamente, tiveram conhecimento do teor deste artigo e não impediram a sua publicação.
No dia 16 de Novembro de 2012, o jornalista do “P…” I… escreveu o artigo, fotocopiado a fls. 96 [14], sob o título “A paciência de Q…”: “... X… acolitado por C…, presidente de …, um “valentaço” que agride B…, minha camarada de trabalho durante largos anos no P…, preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos...”
Os arguidos E…, D…, I…, H… e F…, na qualidade de director, subdirectores e directores-adjuntos do “P…” tiveram conhecimento do teor deste artigo e não se opuseram à sua publicação.
Agiram os arguidos D…, E…, F…, G…, H…, I…, J… e K… com o intuito de ofender a honra e consideração do Presidente da Junta …, bem sabendo que os escritos que produziram e consentiram que fossem publicados eram adequados a produzir tal resultado, de resto, por eles visado.
Agiram os arguidos livre, consciente e voluntariamente.
Cometeu a arguida B… dois crimes de injúria p. e p. pelos artº 181, nº 1, 184, com referência ao artº 132, nº 2 al) l) do Código Penal;
cometeu o arguido C… um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artº 143, nº 1 do Código Penal;
cometeram os arguidos K…, J… um crime p. e p. pelos artº 180, nº 1, 184, com referência ao artº 132, nº 2 al) l) do Código Penal e artº 30, nº 1 e 2 da Lei 2/99;
cometeu o arguido G… um crime p. e p. pelos artº 180, nº 1, 184, com referência ao artº 132, nº 2, al) l) do Código Penal e artº 30, nº 1 e 2 da Lei 2/99;
cometeu o arguido D… um crime p. e p. pelos artº 180, nº 1, 184, com referência ao artº 132, nº 2 al) l) do Código Penal e artº 30, nº 1 e 2 da Lei 2/99;
cada um dos arguidos E…, D…, I…, H… e F… cometeu três crimes p. e p. pelos artº 180, nº 1, 184, com referência ao artº 132, nº 2, al) l) do Código Penal e artº 30 e 31, nº 3 da Lei 2/99» [15].
Inconformados com o decidido, os Arguidos 1. B…, 3. D…, 4. E…, 5. F…, 6. G…, 7. H…, 8. I…, 9. J… e 10. K… requereram em 10.3.2014 a fls 370-389 II abertura de INSTRUÇÃO que culminou na Decisão Instrutória de 27-6-2014 a fls 504-537 III de NÃO PRONÚNCIA de tais 9 Arguidos por que ordenou à Secção que «…remeta para julgamento para apreciação dos factos relativamente ao arguido C…», porquanto:
«DECISÃO INSTRUTÓRIA:
O Tribunal é competente.
*
O Ministério Público tem legitimidade para acusar.
*
Não existem quaisquer questões prévias ou incidentais suscetíveis de obstar ao conhecimento do mérito da causa.
*
Inconformados com a acusação do Ministério Publico, os arguidos B…, K…, J…, G…, D…, E…, I…, H… e F… vieram requerer a abertura de instrução, alegando, em síntese que os factos constantes da acusação não integram a prática dos crimes injúria agravada p.p. pelos artº 181º nº1, 184º com ref. ao artº 132º nº2 al.l (imputados à arguida B…) e de difamação agravada p.p. pelos artsº 180º nº1, 184º com referência ao artº 132º nº2 al.l) e 30º nº1 e 2 da Lei 2/99, relativamente aos restantes pelas razões que deixaram invocadas no respectivo requerimento de abertura de instrução de fls.370 e segs. que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
Foram requeridas diligências de prova, que foram parcialmente deferidas pelos fundamentos constantes do nosso despacho de fls.411 e 412 tendo-se procedido à inquirição das testemunhas cujo depoimento se mostra junto a fls.475 e 476 e à tomada de declarações aos arguidos B… e K… cujas declarações se encontram gravadas em suporte digital e que reiteram as respectivas versões plasmadas no requerimento de abertura de instrução.
*
Foram analisados e reapreciados os documentos constantes dos autos e recolhidos ainda em fase de inquérito bem como os juntos nesta fase, designadamente: documentos de fls. 66 a 70, as notícias em causa que constituem os documentos de fls. 94 a 96 bem como os depoimentos das testemunhas ouvidas em fase de inquérito, e nesta fase de instrução.
Impõe-se assim e apenas nesta fase processual apreciar se, as condutas dos arguidos indiciam a prática pelos mesmos dos crimes que a cada um é imputado:
Começando pela arguida B…: | Vem esta arguida acusada da prática como autora material e em concurso real de dois crimes de injúrias agravadas p.p. pelos artº 181ºnº1, 184º com referência ao artº 132º nº2 al.l) todos do Cod. Penal.
Dispõe o artº 181º do Cod. Penal que “Quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra e consideração, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias”
Distingue-se entre difamação e injúria com base na imputação directa ou indirecta de um facto, mesmo sob a forma de suspeita ou na formulação directa ou indirecta de um juízo este e aquela ofensivos da honra e consideração ou ainda na mera reprodução directa ou indirecta de tal imputação ou juízo. Se o agente se dirige a terceiro há imputação, juízo ou reprodução em via indirecta e ocorre difamação. Se, ao invés, o agente se dirige ao sujeito passivo, por imputação de factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou por palavras que podem traduzir-se em juízo ou reprodução, estas e aqueles ofensivos da honra e consideração, age em via directa e temos injúria.
Atentemos agora, no bem jurídico que as normas prevenidas nos artsº 180º e 181º visam tutelar:
A noção de bem jurídico é objecto de profunda discussão. Neste domínio, apenas se adiantará que a norma incriminadora nasce para que uma relação entre algo e alguém resulte preservada, sendo que quando essa relação é assumida pela norma, consubstancia um bem jurídico. Assim, importa delimitar o conceito de bem jurídico em direito penal atenta a essencialidade de relações assumidas, sendo tal essencialidade prévia á norma, porque referida a uma compreensão social própria, resultando tal conceito num verdadeiro limite ao “direito de punir” por parte do Estado. Isto porque, a legitimidade de exercício de tal poder está acolhida na exclusiva protecção das relações concretas de uma comunidade de forma a que esta exista e se promova.
Assim, o bem jurídico-penal é concebido no âmbito de uma relação social dinâmica, necessariamente concreta, como meio que garante o desenvolvimento da pessoa humana ao permitir uma participação dentro do espaço político-social de que faz parte, de molde a promover-se e a promover a própria comunidade.
A honra manifesta-se num bem jurídico complexo, que compreende quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, suportado na sua dignidade, quer na própria reputação ou consideração exterior. Assim se protege a honra “strictu sensu” isto é, a estima ou pelo menos, o não desprezo moral por si próprio que sente, em geral, qualquer pessoa, ou por outras palavras, aquilo que um indivíduo vale por si próprio, a dignidade subjectiva, mas também, a consideração propriamente dita, ou seja, o valor atribuído a alguém pelo juízo do público, o apreço pelo menos, a não desconsideração que os outros tenham por ele - a dignidade objectiva.
Refira-se agora que, como critério orientador, os factos imputados ou a formulação de juízos hão-de ser ou resultar ofensivos do ponto de vista da generalidade das pessoas.
Por sua vez, o nexo de imputação do facto ao lesante traduz a necessidade do agente ter agido com culpa, maxime que a violação ilícita tenha sido praticada com dolo.
A culpa consubstancia-se na imputação psicológica de um resultado ilícito a uma pessoa. Se se produz um evento contrário á lei e esse evento é psíquica ou moralmente imputável a certo indivíduo, diz-se que agiu com culpa. Ou, dito de outro modo, a culpa é o nexo de imputação ético-jurídico que liga o facto ilícito á vontade do agente, correspondente a uma actuação deficiente, censurável, reprovável, abstraindo da pessoa, do destinatário, do dever violado.
Destas definições se retira que age com culpa quem, pelas suas capacidades, e atentas as circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo.
Por outro lado, o juízo de censura só é possível quando o agente seja imputável, isto é, quando tenha capacidade de prever os efeitos e medir o valor dos seus actos e para se determinar de acordo com o juízo que faça acerca deles – o necessário discernimento ou capacidade intelectual e emocional e a necessária liberdade de determinação ou capacidade volitiva.
A injúria é a manifestação por qualquer meio, de um conceito ou pensamento que importe ultraje, menoscabo ou vilipêndio contra alguém, dirigida ao próprio visado. O bem jurídico lesado na injúria é prevalentemente a chamada honra subjectiva, isto é, o sentimento da própria honorabilidade ou respeitabilidade pessoal. No crime de injúria, não se protege a susceptibilidade pessoal de quem quer que seja mas tão só, a dignidade individual do cidadão, expressa no respeito pela honra e pela consideração que lhe são devidas. Assim, uma das características da injúria é a sua relatividade, o que quer dizer que o carácter injurioso de determinada palavra ou acto é fortemente dependente do lugar, do ambiente em que ocorre, das pessoas entre quem ocorre e do modo como ocorre, daí que, só em cada caso concreto se possa afirmar se há ou não comportamento delituoso. Por outras palavras, em cada caso concreto haverá que ter em conta as condições ambientais, a classe social do ofendido e do seu agressor, o seu relacionamento, os laços de parentesco e confiança entre ambos, os hábitos de linguagem, a formação moral, etc.
A injúria por sua vez, concretiza-se em um ataque directo, sem a intromissão de terceiros à pessoa do ofendido. Estrutura-se por conseguinte, numa relação de existência comunicacional bipolar, contrariamente aqueloutra (a difamação) que se realiza, numa relação triangular.
Os processos executivos dos crimes de difamação e injúrias podem ser vários:
- imputação de um facto ofensivo (ainda que meramente suspeito) (vale aqui também para o crime de injúrias),
- formulação de um juízo de desvalor;
- reprodução de uma imputação ou de um juízo.
- Dirigir palavras, (no caso do crime de injúrias) ofensivos da honra e consideração.
(Cfr. Faria Costa, Comentário Conimbricense do Cód. Penal, anotações aos artsº 180º e 181º, pag.601 a 628).
Assim, o elemento constitutivo do tipo legal de crime que aqui cabe analisar são a ofensa propriamente dita, dirigida ao próprio visado. O exposto, impõe claramente a distinção entre facto e juízo. Sendo o facto um juízo de existência ou de realidade e o juízo terá de ser entendido no contexto, não como apreciação relativa á existência de uma ideia mas ao seu valor, ou seja, deve ser entendido relativamente ao grau de consecução dessa ideia, coisa ou facto, se valorados em função do fim prosseguido.
O cerne da determinação dos elementos objectivos tem sempre de se fazer pelo recurso a um horizonte de contextualização.
Numa outra perspectiva da nossa análise, repare-se que, no ordenamento jurídico, para que se verifique o crime tipificado no aludido artº 181º, necessário não é que o agente tenha procedido com “animus injuriandi”, ou seja, o chamado dolo específico, bastando tão só, para que esteja verificada a respectiva incriminação, que tenha actuado com dolo genérico em qualquer uma das modalidades admitidas no artº 14º do Cod. Penal, quer dizer, bastando a consciência, por parte do agente, de que a sua conduta é de molde a produzir a ofensa da honra e consideração de alguém. (Cfr. entre outros, Acs. da RC de 15/03/89 CJ XIV, 2º, pag.84 e da R.P. de 30/11/88 CJ, XII, 5º, pag. 221 vd. Também neste sentido, Leal Henriques e Simas Santos in Código Penal Anotado de 1982, vol. 2º, pag. 197).
Pode afirmar-se que o crime de injúrias pressupõe, desde logo, um elemento objectivo – concretizado na circunstância de o agente, dirigindo-se ao próprio visado imputar a essa pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, factos ofensivos da sua honra ou consideração, tratando-se, nesta medida, de um crime de dano.
Por outro lado, no que tange ao elemento subjectivo, é largamente dominante a doutrina e jurisprudência que entende bastar-se o crime em apreço com a presença do dolo enquanto elemento subjectivo geral da ilicitude, isto é, o conhecimento de que determinados factos são lesivos da honra ou consideração de outrem e a vontade ao menos eventual, de os concretizar (Cfr. Silva Dias “Alguns Aspectos do Regime Jurídico dos crimes de difamação e de injúria” AAFDL, 1989, pags. 35 e 36 e Maia Gonçalves “Código Penal Português Anotado 6ª ed., 1992, pag. 425 e 426 Ac R.C. de 28/11/96 Bol M.J. 461, pag.532 Ac.R.P. Bol.M.J.434 pag. 686 AC.R.C. 2/10/96 Bol M.J. 460, pag.818 Ac. R.E. 14/1/97 Bol M.J. 463, pag. 660.
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Os factos relativamente a esta arguida são os seguintes:
“Por volta das 22h15m., o Presidente da Junta …, C…, também presente para participar na reunião do L…, passou pelo corredor onde se situa o gabinete onde se encontrava a B… e, vendo a luz acesa, entrou a verificar o que se passava. Deparando com uma pessoa que não era funcionária da junta e que ele, Presidente, não conhecia, interpelou-a, dizendo-lhe: “Sou C…, o presidente da junta de freguesia e supostamente não deveria encontrar-se aqui ninguém. Por favor quem é a senhora e o que faz aqui?”(…) “a arguida B… continuou a escrever velozmente num pequeno caderno e a falar ao telemóvel, não respondendo ao C…. Este insistiu, repetindo a apresentação e as perguntas, sendo que a arguida retorquiu, sem sequer olhar para o Presidente: “Foda-se, ainda agora esteve aqui uma gaja a chatear-me e agora é este palerma. Eu estou a trabalhar, você não vê? Deixe-me em paz”. Insistindo o C… para que se identificasse e dissesse o que fazia, a arguida B… respondeu:” Você não tem nada com isso, sou do P…, estou ao telefone com o meu chefe e eu estou devidamente autorizada pela tesoureira da junta, tenho aqui o telefone dela e vou ligar-lhe já”(…) e cerca das 23h30, já no exterior das instalações da Junta quando a arguida B… se cruzou com o Presidente da Junta, C…, disse-lhe: “Ainda estás aí?, ó cobarde, não fugiste, estás à espera do balão?”.
Analisado o tipo legal em causa, atentemos na prova produzida na perspectiva de que, a fase processual em que nos encontramos cura de prova de natureza indiciária, sendo certo que, as exigências em relação à prova, nesta fase, são diferentes das da fase de julgamento.
Desde já se diga que as expressões “Você não tem nada com isso, sou do P…, estou ao telefone com o meu chefe e você está a impedir-me de trabalhar, fora daqui já disse, eu estou devidamente autorizada pela tesoureira da junta, tenho aqui o telefone dela e vou ligar-lhe já (…) foda-se esteve aqui uma gaja a chatear-me(..) estou a trabalhar você não vê? Deixe-me em paz,(…) não fugiste? Estás à espera do balão? não contêm em si qualquer conotação injuriosa.
Na verdade, como refere o Ac. R.P. de 31/1/96 proc.9540900,no site da D.G.S.I.) “Só deve considerar-se ofensivo da honra e consideração de outrem, aquilo que, razoavelmente, isto é, segundo a sã opinião da generalidade das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores individuais e sociais. O que pode ser uma ofensa ilícita em certo lugar, meio ou época, ou para certas pessoas, pode não o ser em outro lugar ou tempo, do mesmo modo que a circunstância de ser ou não injuriosa uma palavra, depende, em grande parte, da opinião, dos hábitos, das crenças sociais”.
Por outro lado, como refere Beleza dos Santos in “Algumas Considerações Jurídicas sobre crimes de difamação e injúrias in R.L.J. ano 92, pag. 92 a 95 “os valores jurídico-penais que o legislador quis proteger com a punição da difamação e com a injúria, foram a honra e a consideração de uma pessoa: a honra diz respeito á estima, ao não desprezo moral por si próprio, que sente em geral qualquer pessoa e a consideração, ao juízo público, isto é, ao apreço ou não desconsideração que os outros tenham por ele”.(…) “A honra refere-se ao apreço de cada um por si, à auto avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral. A consideração ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém, um bom elemento social, ou ao menos de o não julgar um valor negativo.” O bem jurídico honra, traduz uma pretensão de respeito por parte dos outros quer decorre da dignidade humana. O seu conteúdo é constituído basicamente por uma pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros. Sem a observância social dessa condição não é possível à pessoa realizar os seus planos de vida e os seus ideais de excelência na multiplicidade de contextos e relações sociais em que intervém. O bem jurídico constitucional assim delineado apresenta um lado individual (o bom nome) e um lado social (a reputação ou consideração) fundidos numa pretensão de respeito que tem como correlativo uma conduta negativa dos outros, é ao fim ao cabo uma pretensão a não ser vilipendiado ou depreciado no seu valor aos olhos da comunidade.” (Cfr. Augusto Silva Santos, in Alguns Aspectos do regime jurídico dos crimes de difamação e de injúrias A.A.F.D.L. pag. 17/18).
Como refere o Ac. T.R.P. de 07/05/2005 proc. 0515154 “É próprio da vida social a ocorrência de algum grau de conflitualidade entre os membros da comunidade. Fazem parte da sua estrutura ontológica as desavenças, diferentes opiniões, choques de interesses incompatíveis que causem grandes animosidades. Estas situações, entre outros meios, expressam-se ao nível da linguagem, por vezes de forma exagerada ou descabida. Onde uns reconhecem firmeza, outros qualificam de gritaria, impropérios, má educação, ou indelicadeza”.
Ora, o direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidades do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa tenha apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros.
Não cabe aos tribunais avaliar se uma afirmação é justa, razoável ou grosseira. Não se pode pretender que as conversas discordantes tenham todas um discurso sereno, com adjectivação civilizada e detentoras de uma argumentação racional, pois isso seria privar do direito de manifestar o seu desagrado aos menos dotados do ponto de vista retórico, das boas maneiras, até da capacidade de raciocínio, recorrendo-se aos tribunais para punir tais excessos e ficando a discordância confinada ao grupo de pessoas polidas.
Assim, do exposto, podemos considerar que as expressões acima indicadas, no circunstancialismo em que ocorreram (se é que foram proferidas), não têm sem mais, a virtualidade de ser consideradas acções típicas de um crime de injúrias, sendo antes uma expressão de falta de civismo, grosseria, e mesmo falta de educação ou cultura. Não vemos como se pode depreender que em resultado dela, a honra da assistente ficasse abalada ou ofendida. Como refere Quintano Ripolles in “Tratado de la parte especial del Derecho Penal, I, Tomo II, pag. 1198 – Editorial Revista de Direito Privado, 1972, Madrid “Deve sempre distinguir-se, no que diz respeito á gravidade das expressões proferidas, as que podemos denominar de imprecativas, das que perseguem um fim referido a factos ou condutas de carácter concreto. Aquelas, a maior parte das vezes, não constituem mais que um simples desafogo verbal, que pode incomodar ou perturbar alguém mas intranscendentes para abalar a ordem jurídica”. (ainda no mesmo sentido v.g. Acs. T.R.P. de 5/11/2008, proc.0844658 e 14/07/2007 proc.0616784)
Cremos assim que nenhuma das acima referidas expressões é suficientemente forte para atingir o reduto mínimo de dignidade e bom nome de que o assistente legitimamente pode reclamar.
Já no que diz respeito às expressões “agora é este palerma” e “ó cobarde”, o certo é que, com exceção da versão do assistente nenhuma das testemunhas ouvidas quer em sede de inquérito, quer nesta fase de instrução ouviram e/ou presenciaram a arguida a proferir tais expressões dirigidas ao assistente. Por outro lado a arguida, nega peremptoriamente ter proferido tais expressões dirigidas ao assistente o que é confirmado quer pelo depoimento da testemunha N… tesoureira da junta que relatou os facos de forma consentânea com a versão da arguida e pelos depoimentos das testemunhas ouvidas nesta fase de instrução, designadamente as testemunhas S… e T… que acompanhavam a arguida já no exterior da junta e não ouviram a mesma proferir qualquer expressão injuriosa dirigida ao assistente o que foi de igual modo corroborado pelas declarações do co-arguido K…. Quanto às restantes testemunhas ouvidas em inquérito, nenhuma delas presenciou os factos no interior da junta ou pelo menos chegaram em momento posterior e com exceção das testemunhas U… que referiu ter presenciado a arguida no exterior da junta dirigir-se ao assistente dizendo algo como “ainda está à espera de soprar ao balão?” ou algo com esse sentido (depoimento de fls.83) nenhuma outra testemunha confirmou a versão do assistente. Ora, no que tange a esta expressão soprar ao balão já supra referimos pelas razões supra transcritas que não a consideramos ofensiva.
Cremos assim que a prova produzida em fase de inquérito é manifestamente insuficiente para se poder imputar à arguida ter proferido tais expressões dirigidas ao assistente.
A prova constante dos autos é assim manifestamente insuficiente para legitimar uma decisão de pronúncia relativamente à arguida B…, devendo ser proferido despacho de não pronúncia.
Quanto aos arguidos K… e J…:
Vêm estes arguidos acusados da prática de um crime p.p. pelo artº 180º nº1, 184º com referência ao artº 132º nº2 al.l) do Cod. Penal e 30º nº1 e 2 da Lei 2/99.
Os factos constantes da acusação relativamente a estes arguidos são os seguintes: No dia 10 de Novembro de 2012, os arguidos K… e J…, na qualidade de jornalistas do “P…” escreveram o artigo fotocopiado a fls. 94, sob o título “Autarca de … agride jornalista do P…” onde dizem “ a jornalista B… foi convidada pela tesoureira da junta de freguesia a ocupar o seu gabinete no edifício da autarquia para que pudesse exercer o seu trabalho. Por volta das 22h30, a jornalista foi confrontada com uma situação anormal e violenta. Um indivíduo que não se identificou – mas que depois se percebeu tratar-se do presidente da junta de …, C… – entrou no gabinete e deu-lhe ordem de expulsão” (…) Visivelmente transtornado, apagou as luzes da sala e atirou o telemóvel contra uma parede…(…). Com esta notícia o jornal publicava também uma fotografia doPresidente da Junta de … com a legenda: “C… o Autarca agressor”.
Dispõe o artº 180º do Cod. Penal que “Quem, dirigindo-se a terceiros, imputar a outra pessoa, mesmo que sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido com pena de prisão até 6 meses ou multa até 240 dias”.
Por seu turno, o artº 182º, equipara á difamação e á injúria verbais, as feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão.
Por sua vez, estabelece o artº 183º sob a epígrafe publicidade e calúnia “Se, nos casos dos crimes previstos nos artsº 180º, 181º e 182º a) A ofensa for praticada através de meios ou em circunstâncias que facilite a sua divulgação; b) Tratando-se da imputação de factos, se averiguar que o agente conhecia a falsidade da imputação; as penas são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo”.
Nº2 “Se o crime for cometido através de meio de comunicação social, o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias”.
Finalmente, o artº 30º da Lei 2/99 de 13 de Janeiro refere que “A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais, sem prejuízo do disposto na presente lei, sendo a sua apreciação da competência dos Tribunais judiciais”.
Prescreve ainda o artº 31º do mencionado diploma, no seu nº 1 “Sem prejuízo do disposto na lei penal, a autoria dos crimes cometidos através da imprensa cabe a quem tiver criado o texto ou imagem cuja publicação constitua ofensa a bens jurídicos protegidos pelas disposições incriminadoras. Tratando-se de declarações correctamente reproduzidas, prestadas por pessoas devidamente notificadas, só estas podem ser responsabilizadas”(…).
A tutela penal do direito ao bom nome e a sua relação com o direito à liberdade de expressão e informação pela imprensa estão previstas, além do mais, na regulamentação legal do crime de difamação cometido através da imprensa nos artsº 180º 182º e 183º do Cod. Penal, cometendo o crime de difamação, quem dirigindo-se a terceiros, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo ofensivos da sua honra e consideração, ou reproduzir tal imputação ou juízo.
Todavia, a conduta não é punível quando a imputação for feita para realizar interesses legítimos e o agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé a reputar verdadeira, salvo quando se tratar de imputação de facto relativo à intimidade da vida privada ou familiar, sem prejuízo do disposto nas alíneas b), c) e d) do nº2 do artº 31º do Cod. Penal, nsº2 e 3 do artº 180º. Diz-se também que a boa fé se exclui quando o agente não tiver cumprido o dever de informação que as circunstâncias do caso impunham, sobre a verdade da imputação (nº4 do mesmo preceito legal).
De tal regulamentação resultam limites, quer para a liberdade de imprensa, quer para o direito ao bom nome, sendo que a tutela de um recuará perante o outro conforme as circunstâncias do caso, segundo critérios baseados no disposto na regulamentação legal desses direitos e que têm vindo a ser desenvolvidos na doutrina e na jurisprudência.
Nos autos, equaciona-se a relação entre o direito ao bom nome e reputação, consagrado constitucionalmente e na lei ordinária e o direito à liberdade de expressão e de informação pela imprensa, especialmente na vertente “ direito do público a ser informado – direito de informar” também garantido na constituição da República Portuguesa e pela lei ordinária.
Assim, e quanto ao bom nome e reputação estabelece a CRP que “Portugal é um república baseada na dignidade da pessoa humana” (artº 1º) em que “ A integridade física e moral das pessoas é inviolável (artº 25º nº1) e onde são reconhecidos os direitos à identidade pessoal e ao bom nome e reputação (artº 26º).
Quanto ao direito à liberdade de expressão e de informação pela imprensa, estabelece o artº 37º nº1 da CRP que “Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pelas palavras, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar, e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações” não podendo o exercício desses direitos ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura (nº2 do mesmo artigo). E, estabelece o artº 38º nº1 e 2 da CRP “É garantida a liberdade de imprensa” e “A liberdade de imprensa implica a liberdade de expressão e de criação dos jornalistas”.
“Direito à honra” e “direito à informação”, são assim direitos fundamentais das pessoas constitucionalmente garantidos e em princípio de igual hierarquia, entre os quais, surge, teoricamente, na prática, como nos presentes autos, o conflito. Para este conflito, abre a própria constituição uma via de solução ao reconhecer expressamente a existência de limites ao exercício do direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento e, por aí, ao exercício da liberdade de imprensa.
O exercício da liberdade de expressão e de informação está sujeito a limites, cujo desrespeito é apreciado à luz dos princípios gerais do direito criminal (artº 37º nº3 da CRP). Por sua vez, o artº 3º da Lei 2/99 de 13/1 dispõe que “A liberdade de imprensa tem como únicos limites os que decorrem da Constituição e da lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, á imagem e á palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática”. O artº 30º nº1 da mesma lei estabelece que “ A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofendam bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais”.
Assim vem sendo entendido que são limites imanentes da liberdade de imprensa o relevo social do facto (o que em princípio exclui os factos da vida privada), a verdade no sentido de convicção da verdade alicerçada em esforço de rigor e objectividade e a moderação ponderação ou adequação na forma. Considera-se verificada a verdade da notícia quando o jornalista, cumprindo o dever de rigor e objectividade utiliza fontes de informação fidedignas e diversificadas por forma a testar a veracidade dos factos e se convence, em face dessa fontes, fundadamente, que os factos eram verdadeiros. Considera-se verificada a adequação do meio quando o jornalista noticia os factos por forma a não lesar o bom nome das pessoas mais do que é necessário ao relato dos factos.
Vem sendo igualmente entendimento da jurisprudência e resulta da regulamentação legal do crime de difamação que não é admissível, nem aliás possível, a prova da verdade dos juízos de valor, ou seja, não é permitida a prova da verdade das imputações quando o que se pretende é provar a adequação à pessoa ofendida dos uso dos juízos valorativos ou ofensivos. Diga-se que os juízos de valor ofensivos excedem o relato dos factos e lesam o bom nome das pessoas quando são mais do que o necessário ao relato desses mesmos factos.
Por fim, no tocante ao elemento subjectivo do crime de difamação cometido através da imprensa basta o dolo genérico, em qualquer das suas formas (directo, necessário, eventual) bastando assim que o agente, ao realizar voluntariamente a acção se tenha dado conta da capacidade ofensiva das palavras públicas ou seja, que são objectivamente ofensivas da integridade moral da pessoa visada, não se exigindo qualquer finalidade ou motivação especial. Afigura-se assim, que caso o agente actue com o objectivo de informar não deixa de verificar-se o crime quando actue com dolo.
Analisando agora o caso em concreto:
A notícia divulgada no jornal “P…”, da autoria dos arguidos, não imputa factos (não cria factos) apenas transpondo para o jornal um conjunto de factos (relato de determinado acontecimento ocorrido na junta de freguesia … em que o aqui assistente é o autor e a vítima uma jornalista que exercia as suas funções fazendo a cobertura de uma reunião da comissão política da concelhia de Matosinhos, onde é relatado que a jornalista foi agredida pelo autarca, descrevendo os factos e indicando e identificando uma testemunha que os terá presenciado referindo que desses factos a jornalista apresentou queixa às autoridades.
Prova de que os jornalistas não inventaram esses factos é que os mesmos indicaram as fontes de onde recolheram a informação e que efectivamente a queixa apresentada deu lugar ao presente processo onde inclusive o assistente é também arguido tendo sido proferida acusação imputando-lhe a prática como autor material de um crime de ofensa á integridade física simples p.p. pelo artº 143º do Cod. Civil sendo ofendida a jornalista B… factos esses que são os mesmos que foram divulgados pela notícia que constitui o documento de fls. 92. Essa convicção (do pano de fundo de verdade dos factos) permite-nos concluir que os arguidos, ao noticiarem tais factos agiram na prossecução de um interesse legítimo, acreditando de boa fé na veracidade dos factos imputados.
Por outro lado e como já acima se referiu, todo o procedimento dos arguidos respeitou o essencial das regras que lhes são impostas. Com efeito, divulgaram factos que efectivamente ocorreram, tanto mais que foi apresentada uma queixa crime e corre um processo em Tribunal e tiveram o cuidado de indicar testemunha que presenciou os mesmos. Não se exige aos jornalistas a verdade objectiva dos factos antes de os publicar. Exige-se apenas um esforço objectivo de avaliação sobre a credibilidade dos elementos recolhidos e com base neles, apenas divulgar aquilo que lhes parece seriamente corresponder à verdade.
Em nosso entender, os elementos até àquela data recolhidos eram de molde a criar nos arguidos a convicção da veracidade da imputação feita ao assistente, justificando, nessa medida, a sua divulgação.
Finalmente, dúvidas não restam que os arguidos ao actuarem do modo como o fizeram, respeitaram os deveres que lhes eram impostos como jornalistas, designadamente, os impostos nas alíneas a), c), f), g) e h) do artº 14º da lei 1/99 de 13/1.
Em conclusão, por tudo aquilo que já foi dito supra e atendendo ao inegável interesse público dos factos noticiados, à credibilidade da existência da verdade dos factos, é nosso entendimento que a notícia publicada assenta em factos tidos por verdadeiros ou mais não é do que o mero relato de factos que ocorreram, a conduta dos arguidos preenche a causa de exclusão da ilicitude prevista no artº 180º nº2 al.a) e b) parte final do Cod. Penal e, nessa medida, não é susceptível de censura penal.
Como se refere no Ac T.R.L. de 2/2/05 http://www.dgsi.pt “Os arguidos (…) situaram-se no exercício da função pública da imprensa, exercendo o direito de expressão e informação que serve à consecução da função pública de imprensa sendo certo que independentemente da comprovação da verdade dos factos, os arguidos observaram o dever prévio de informação e tiveram fundamento sério quer para noticiar o inquérito, quer para perspectivar a possibilidade de queixa crime contra o assistente, por parte do denunciante, quer ainda para figurar a verificação de um crime de abuso de função”.
Pelo exposto, entende-se que relativamente aos arguidos K… e J… não se mostram verificados os indícios suficientes da prática do crime que lhes foi imputado pelo que, relativamente a estes arguidos deverá ser proferido despacho de não pronúncia.
Analisando agora os factos relativamente aos arguidos D… e G…:
Vêm cada um destes arguidos acusados pela prática de um crime p.p. pelos artsº 180º nº1, 184º com referência ao artº 132º nº2 al.l) do Cod. Penal e artº 30º nº1 e 2 da Lei 2/99
São estes os factos constantes da acusação:
“No dia 11 de Novembro de 2012, o jornalista também subdirector do P… D…, escreveu o artigo intitulado “C… pensa com as pernas”, onde diz: “(…) A agressão de que foi alvo a jornalista do P… B… (…) trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C… não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das notáveis definições de cobardia: “Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa comas pernas”. Isto é, foge dos problemas (…) de uma assentada escaparam-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa entre os dedos das mãos”.
E, ”No dia 16 de Novembro de 2012, o jornalista do P… G… escreveu o artigo fotocopiado a fls. 96, sob o título “A paciência de Q…”: “(…) X… acolitado por C…, presidente de …, um “valentaço” que agride B… minha camarada de trabalho durante largos anos no P… preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos”
Antes de mais cumpre referir, que contrariamente ao artigo de 10 de Novembro de 2012 subscrito pelos arguidos J… e K… estes dois (de 11 de Novembro de 2012 e de 16 de Novembro de 2012) são artigos de opinião.
O artigo de opinião, como o próprio nome já diz, é um texto em que o autor expõe seu posicionamento diante de algum tema atual e de interesse de muitos.
É um texto dissertativo que apresenta argumentos sobre o assunto abordado, portanto, o escritor além de expor seu ponto de vista, deve sustentá-lo através de informações coerentes e admissíveis.
Logo, as ideias defendidas no artigo de opinião são de total responsabilidade do autor, e, por este motivo, o mesmo deve ter cuidado com a veracidade dos elementos apresentados, além de assinar o texto no final.
Analisando agora cada um dos textos de opinião cumpre apreciar se os mesmos contém alguma expressão ou imputam factos ofensivos capazes de atingir a honra e consideração do assistente.
Como refere o Ac. R.P. de 31/1/96 proc.9540900, no site da D.G.S.I.) “Só deve considerar-se ofensivo da honra e consideração de outrem, aquilo que, razoavelmente, isto é, segundo a sã opinião da generalidade das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores individuais e sociais. O que pode ser uma ofensa ilícita em certo lugar, meio ou época, ou para certas pessoas, pode não o ser em outro lugar ou tempo, do mesmo modo que a circunstância de ser ou não injuriosa uma palavra, depende, em grande parte, da opinião, dos hábitos, das crenças sociais”.
Segundo Nelson Hungria, citado por Leal Henriques e Simas Santos in Cod. Penal Anotado, a difamação “é a manifestação, por qualquer meio, de um conceito ou pensamento que importe ultraje, menoscabo ou vilipêndio contra alguém, dirigida ao visado”. Ainda segundo o mesmo autor, “o bem jurídico lesado é prevalentemente a chamada honra subjectiva, isto é, o sentimento da própria honorabilidade ou a respeitabilidade pessoal”.
Por outro lado, como refere Beleza dos Santos in “Algumas Considerações Jurídicas sobre crimes de difamação e injúrias in R.L.J. ano 92, pag. 92 a 95 “ os valores jurídico-penais que o legislador quis proteger com a punição da difamação e com a injúria, foram a honra e a consideração de uma pessoa: a honra diz respeito á estima, ao não desprezo moral por si próprio, que sente em geral qualquer pessoa e a consideração, ao juízo público, isto é, ao apreço ou não desconsideração que os outros tenham por ele”.(…) “A honra refere-se ao apreço de cada um por si, à auto avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral. A consideração ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém, um bom elemento social, ou ao menos de o não julgar um valor negativo.” O bem jurídico honra, traduz uma pretensão de respeito por parte dos outros quer decorre da dignidade humana. O seu conteúdo é constituído basicamente por uma pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros. Sem a observância social dessa condição não é possível à pessoa realizar os seus planos de vida e os seus ideais de excelência na multiplicidade de contextos e relações sociais em que intervém. O bem jurídico constitucional assim delineado apresenta um lado individual (o bom nome) e um lado social (a reputação ou consideração) fundidos numa pretensão de respeito que tem como correlativo uma conduta negativa dos outros, é ao fim ao cabo uma pretensão a não ser vilipendiado ou depreciado no seu valor aos olhos da comunidade.” (Cfr. Augusto Silva Santos, in Alguns Aspectos do regime jurídico dos crimes de difamação e de injúrias A.A.F.D.L. pag. 17/18).
No fundo, o que está em causa é a pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros.
O artº 25º nº1 da Constituição da República dispõe que “A integridade moral e física das pessoa é inviolável”.
Dispondo o artº 26º que, “a todos são reconhecidos os direito á identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, á capacidade civil, á cidadania, ao bom nome e reputação, á imagem, á palavra, á reserva da intimidade da vida privada e familiar e á protecção legal contra quaisquer formas de descriminação”. Por seu lado, estabelece o artº 37º da Constituição da República que “todos têm o direito de exprimir e divulgar o seu pensamento por palavras, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar, e ser informados, sem impedimentos ou discriminações”.
Ambos os direitos, merecem tutela e garantia constitucionais, enquanto direitos fundamentais das pessoas, inscritos na Constituição da República – ao mesmo nível hierárquico de tutela – no mesmo Título II – Direitos, Liberdades e Garantias – e Capítulo I – Direitos, Liberdades e Garantias Pessoais – da Parte I.
Como refere o Ac. S.T.J. de 12/01/00 in B.M.J. 493 pag. 156 “A liberdade de expressão deve considerar-se como uma manifestação essencial das sociedades democráticas e pluralistas, nas quais, a crítica e a opinião livres contribuem para a igualdade e aperfeiçoamento dos cidadãos e instituições. Todavia direito fundamental de idêntico valor protege a integridade do cidadão, nomeadamente, o seu bom nome e reputação”.
Também a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, garante no seu artigo 10º nº1 o direito de qualquer pessoa á liberdade de expressão, compreendendo a liberdade de opinião e de receber ou transmitir ideias, sem ingerências de quaisquer autoridades públicas e sem consideração de fronteiras.
O direito de liberdade de expressão e o direito á consideração e á honra, ambos constitucionalmente garantidos, quando em confronto, devem sofrer limitações, de modo a respeitar-se o núcleo essencial de um e de outro” (Cfr. neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, pag. 110-111).
Não se colocando a questão, na hierarquização dos dois direitos constitucionalmente consagrados, como refere o Ac. do Tribunal Constitucional de 5 de Fevereiro, no processo 62/96 “ o conflito concreto que surja entre ambos, deve ser decidido, num quadro de coordenação, compatibilidade ou concordância prática em caso de confluência ou conflito devem considerar o efeito recíproco de mútuo condicionamento entre normas protectoras de diferentes bens jurídicos, que impõe a violação do núcleo essencial do direito ao bom nome e reputação, dificilmente poderá ser legitimada com base no exercício de um outro direito fundamental”.
“Na consideração do efeito recíproco de mútuo consentimento, a demonstração da existência de um interesse socialmente relevante – não estritamente político ou público –que justifique a conduta expressiva, constitui um elemento essencial de avaliação, uma vez que dadas as dimensões públicas do crédito e do bom nome, há que ponderar o impacto negativo efectivo da expressão nos bens jurídicos em presença, comparando-a com o impacto positivo das expressões na transparência e na verdade das relações sociais.” (Cfr. Jónatas Machado, in Liberdade de Expressão: dimensões constitucionais da esfera pública, no sistema social, pag. 770).
Tendo presente o carácter fragmentário e subsidiário do direito penal, que deve ser entendido como a última ratio da política social, será o critério constitucional da “necessidade social” que deve orientar o legislador na tarefa de determinar quais as situações em que a violação de um bem jurídico a intervenção do direito penal.
Em síntese, sendo inevitável o conflito entre a liberdade de expressão, na mais ampla acepção do termo e o direito á honra e consideração, a solução do caso concreto, há-se ser encontrada através da “convivência democrática” desses mesmos direitos, isto é, consoante as situações, assim haverá uma compressão maior ou menor de um ou outro.
No conflito entre o direito á honra e á liberdade de expressão, tem vindo a verificar-se um ponto de viragem, tendo por base e fundamento o relevo, a dignidade e a dimensão da liberdade de expressão como direito fundamental individual e como princípio conformador e essencial á manutenção do Estado de Direito democrático, reconhecendo-se que o exercício do direito de expressão, designadamente, enquanto direito de opinião e de crítica, constitui o próprio fundamento na resolução do conflito.
A maioria da Jurisprudência do Tribunais superiores tem vindo a defender, na esteira da opinião assumida por Costa Andrade, deverem considerar-se atípicos os juízos de apreciação e de valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, ets…, ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espectáculo, quando não ultrapassa o âmbito da crítica objectiva, isto é, enquanto a valoração e censura críticas se atêm exclusivamente ás obras, ás realizações ou prestações em si, não se dirigindo directamente á pessoa dos seus autores ou criadores, posto que não atingem a honra pessoal do cientista, do artista, do desportista, do profissional em geral, nem atingem a honra com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica. Mais entende o mesmo autor que a atipicidade da crítica objectiva pode e deve estender-se a outra áreas, aqui se incluindo as instâncias públicas com destaque para os actos da administração pública, as sentenças e os despachos dos juízes, as promoções do Ministério Público, as decisões e o desempenho político dos orgãos de soberania como o Governo e o Parlamento.
Por outro lado, segundo o mesmo autor, a atipicidade da crítica objectiva não depende do acerto, da adequação material ou da “verdade” das apreciações subscritas, as quais persistirão como actos atípicos seja qual for o seu bem fundado ou justeza material, para além de que o correlativo direito de crítica, com este sentido e alcance, não conhece limites quanto ao teor, á carga depreciativa e mesmo á violência das expressões utilizadas, isto é, não exige do crítico, para tornar claro o seu ponto de vista, o meio menos gravoso nem o cumprimento das exigências da proporcionalidade e danecessidade objectiva.
Costa Andrade defende mesmo que se devem considerar atípicos os juízos que, como reflexo necessário da crítica objectiva, acabam por atingir a honra do visado, desde que a valoração crítica seja adequada aos pertinentes dados de facto, esclarecendo no entanto, que se deve excluir a atipicidade relativamente a críticas caluniosas, bem como a outros juízos exclusivamente motivados pelo propósito de rebaixar e humilhar e, bem assim, em todas as situações em que os juízos negativos sobre o visado não têm nenhuma conexão com a matéria em discussão, consignando expressamente que uma coisa é criticar a obra, outra muito distinta é agredir pessoalmente o autor, dar expressão a uma desconsideração dirigida á sua pessoa.
Parte da jurisprudência dos nossos tribunais superiores vem sufragando tal opinião, sendo que, de acordo com a mesma, o direito de expressão, na sua vertente de direito de opinião e de crítica, quando se exerça e recaia nas concretas áreas atrás referidas e com o conteúdo e âmbito mencionados, caso redunde em ofensa á honra, se pode e deve ter por atípico, desde que o agente não incorra na crítica caluniosa ou na formulação de juízos de valor ao quais subjaz o exclusivo propósito de rebaixar e humilhar. (Cfr. Ac. S.T.J. de 07/03/07, proc.440/07, 3ª secção).
Começando pelo artigo de 11 de Novembro de 2012, subscrito pelo arguido D….
O mesmo contém o título “C… pensa com as pernas”. Trata-se de um título assaz chamativo, que nos atrai para a notícia pelo caracter invulgar da expressão. Mas logo de seguida o seu autor tem o cuidado de explicar o significado da expressão “pensar com as pernas” e pensar com as pernas significa ser cobarde, fugir dos problemas. O autor da notícia critica a atitude cobarde do autarca, de um homem com funções públicas de agredir uma jornalista, uma mulher. Esse facto é injurioso? Como já se referiu ele assenta numa verdade (verdade de fundo da notícia que acima já explicamos) por outro lado é comumente aceita pela regras vigentes em sociedade que o acto de agredir é reprovável (e criminalmente punível), também o é o ato de agredir uma mulher, por regra, com menos força física que um homem, consequentemente quando se diz que alguém é cobarde ou demonstra uma atitude cobarde explicando o porquê de lhe imputar essa característica da personalidade, não se pode afirmar que essa crítica é objectivamente ofensiva. Acresce que o autor da notícia cita aliás a obra onde foi colher esta expressão que não é da sua autoria mas sim – um significado de cobardia que vem mencionado no “dicionário do diabo” da autoria de Ambrose Bierce, crítico, satírico, escritor e jornalista, natural dos Estados Unidos e conhecido entre outras pela sua obra “ O Dicionário do Diabo” onde, cobarde para este autor era alguém que, numa situação perigosa pensa com as pernas.
O mesmo se diga da notícia publicada no dia 16 de Novembro de 2012 da autoria do jornalista G…. A expressão “valentaço” é aqui utilizada num sentido crítico para condenar a actuação do assistente que agride uma jornalista no exercício das suas funções.
Quanto às demais afirmações contidas naqueles artigos de opinião, nenhuma é suficientemente forte para atingir o reduto mínimo de dignidade e bom nome de que o assistente legitimamente pode reclamar. As referidas expressões situam-se no terreno da avaliação e crítica profissional enquanto dirigidas à respectiva actuação enquanto titular de um cargo político, donde estar excluída a ilicitude, senão ao abrigo do disposto no artº 180º nº2 do Cod. Penal, ao abrigo do disposto no artº 31º nº2 do mesmo diploma legal.
Tais expressões, traduzem apenas uma crítica à actuação pessoal (enquanto agressor de uma jornalista no exercício das suas funções) e profissional (enquanto autarca titular de um cargo político), sem extravasar, no que pode ser entendido como direito de expressão e de crítica.
Temos assim que relativamente a estes dois arguidos D… e G… deverá igualmente ser proferido despacho de não pronúncia.
Finalmente quanto aos arguidos E…, I…, H… e F…:
Vem cada um destes arguidos acusado pela prática de três crimes p.p. pelos artsº 180º nº1, 184º com ref. ao artº 132º nº2 al.l) do Cod. Penal e 31º nº3 da Lei 2/99. E isto porque, enquanto respectivamente, director, subdirectores e directores adjuntos do P…, tiveram conhecimento do teor destes artigos e não se opuseram à sua publicação.
Antes de mais, diga-se que, inexistindo responsabilidade criminal por parte dos autores das notícias em causa, inexiste também relativamente aos arguidos responsabilidade criminal.
Mas ainda que assim não se entendesse consideramos que desde logo relativamente aos artigos de 11 de Novembro e 16 de Novembro de 2012 não podem estes arguidos ser responsabilizados pois tratam-se de artigos de opinião como acima se definiram e estando o autores dos mesmos devidamente identificados só eles seriam responsabilizados criminalmente. Como dispõe o artº 31º nº4 e 5 da Lei da imprensa “nº 4 – Tratando-se de declarações correctamente reproduzidas, prestadas por pessoas devidamente identificadas, só estas podem ser responsabilizadas, a menos que o seu teor constitua instigação à prática de um crime(…)
“nº 5- “O regime previsto no número anterior aplica-se igualmente em relação aos artigos de opinião, desde que o seu autor esteja devidamente identificado”.
Assim, e relativamente a estes dois artigos não poderiam os arguidos ser responsabilizados.
No que tange ao artigo de 10 de Novembro de 2012.
Dos artsº 19º nº1, 20º nº1 a) e 31º da Lei da imprensa resulta clara a responsabilidade de quem dirige, sob pena de os escritos não assinados poderem ficar impunes, por mais difamatórios que fossem. A interpretação destes recortes normativos é, pois, clara e inequívoca e só não haverá responsabilidade se, por qualquer forma, o diretor ou quem o substitua se exonerar, demonstrando que, no caso concreto não pode exercer os seus poderes diretivos. O diretor (ou seu substituto) é o responsável máximo por todo o funcionamento do jornal, a ele cabendo, decidir, orientar e fiscalizar tudo o que é publicado, usufruindo das respetivas vantagens, mas suportando obviamente as inerentes responsabilidades. Trata-se de um cargo que, como acima se disse, a lei impõe que exista, através de norma específica para o efeito, o que desde logo atesta a responsabilidade de que o mesmo se reveste. Quando a lei exige que haja um responsável, é mesmo um responsável que não pode ser reduzido a um cargo meramente de fachada, ou figurativo, pois, se assim não fosse, não era necessária uma norma específica a impor a nomeação de um responsável e a definir-lhe responsabilidades, conforme resulta dos citados artsº 19º e 20º da Lei da imprensa e de outras normas próprias no âmbito de outros órgãos de informação. Em todos esses preceitos há um denominador comum, qual é o de que tem que haver sempre um responsável e, havendo uma cadeia hierárquica, cada um dos dirigentes, a partir do dirigente máximo, apenas pode exonerar-se das suas responsabilidades se provar que, em concreto, não pode exercer as suas funções diretivas, remetidas, então com as inerentes responsabilidades para outro dirigente e assim sucessivamente.
Cita-se a propósito o Ac. do Tribunal Constitucional de 10/07/87 BMJ 369 p250 “As competências do diretor de um periódico, em especial no que se reporta à determinação do seu conteúdo, impõe-lhe um dever de conhecimento, antecipação das matérias a publicar em ordem a impedir a divulgação daquelas suscetíveis de gerar responsabilidade criminal (…) considerando o especial significado dos crimes de abuso de liberdade de imprensa (…) a lei estabeleceu um quadro jurídico-normativo no qual a omissão, por parte do diretor do periódico, daquele dever de impedir a publicação de materiais jornalísticos com natureza criminal é, para este, geradora de uma presunção de autoria (…) respondendo como autor do crime, a menos que se exonere da responsabilidade”(…) e no Ac 270/87 de 10/07/87 in Acórdãos 10º vol, INCM 1987, pag. 291 diz-se o seguinte “ Em certos tipos de crime, considerando o risco criminal e a difícil prova direta de certas atividades, a lei põe esse risco a cargo do agente, prevendo tal efeito, a validade de um juízo circunstancial, sem que isso represente violação da presunção de inocência e do princípio in dubio pro réu. A responsabilidade criminal atribuída pelas normas impugnadas ao diretor do periódico (…) representa um juízo de valor circunstancial derivado das especificidades próprias da imprensa e dos crimes que através dela se podem cometer.
Cabendo ao diretor, a orientação, superintendência e determinação do conteúdo do periódico, compete-lhe impedir a publicação de materiais jornalísticos com natureza criminal, pelo que, hipotizando a lei a possibilidade de ele minimizar ou desprezar esse dever, e a dificuldade virtual de fazer essa prova, ponha esse risco correlativo a seu cargo”.
No Ac 447/87 de 18/11/97 in Acordão 10º vol. INMC 1987, pag. 547, consigna-se o seguinte “ No regime de imprensa é posta a cargo do diretor do periódico (…) a presunção de que conhecia o escrito ou a imagem em cuja publicação se consubstancia tal crime. Trata-se porém de uma presunção de puro facto que não se releva em si mesma arbitrária (mas antes consonante com os deveres legais dos diretores. (No mesmo sentido vg. Ac.R.G. de 17/05/04 http://www.dgsi.pt), competindo assim a este, para se isentar de responsabilidade criminal, a prova de que não conhecia o escrito ou que lhe não foi possível impedir a publicação.
Em suma, as competências do diretor de um jornal impõem-lhe um dever de conhecimento antecipado das matérias a publicar, de forma a impedir a divulgação daquelas suscetíveis de gerar responsabilidade criminal, ou seja, o mesmo é dizer que a omissão, por parte dele, daquele dever de impedir a publicação de matérias com repercussões criminais gera responsabilidade criminal, salvo se se provar que houve exoneração.
Feitas estas considerações, vejamos se existem nos autos indícios que permitam a pronúncia dos arguidos E…, H…, F… e I… enquanto diretor subdirectores e diretores adjuntos do jornal relativamente à notícia publicada no jornal “P…” de 10 de Novembro de 2012 e que aqui se dá por integralmente reproduzida.
Como se constata da referida notícia, os arguidos não foram os seus autores.
O texto em análise é um texto de informação.
Ora, a responsabilidade dos arguidos, só poderia ocorrer se se concluísse que ocorreu omissão relevante da sua parte. Essa omissão, porque o disposto no artº 31º da Lei 2/99 de 13 de Janeiro, Lei da imprensa, consagra um dever legal específico, dentro dos limites de imprensa de equiparação da omissão à ação, caracteriza-se como omissão pura ou própria. Acontece, como refere o Ac. R.P. de 6/6/07 http://www.dgsi.pt “não basta a simples omissão. O diretor de um jornal só pode ser punido quando, recaindo sobre ele o dever de agir, tenha atuado dolosamente”, ou seja, a sua responsabilidade só pode ocorrer por omissão dolosa por facto próprio e não por facto de outrem.
Ora, dos autos, não resultam quaisquer indícios que o diretor do jornal, os subdirectores e diretores adjuntos tenham atuado por omissão dolosa. Não é forçoso que todas as peças publicadas num jornal mereçam a aprovação expressa do director, subdirector e diretor adjunto isto porque existe uma relação de confiança entre o corpo editorial do jornal e os jornalistas. Daí, não se justificar que todos os trabalhos a serem publicados sejam necessariamente vistos apriori pelo seu diretor e/ou subdirector e/ou diretor adjunto, isto dado o elevado número de notícias num jornal sendo impossível ao diretor e/ou subdirector e/ou diretor adjunto conhecer de todas.
Ora, tendo em conta estes conceitos cremos não existirem elementos suficientes para se poder concluir pela participação dos arguidos E…, H…, F… e I… na publicação da notícia em causa.
Pelo exposto e por considerar não existirem nos autos indícios suficientes de que estes arguidos tivessem tido prévio conhecimento das notícias, ou que tendo, não se opuseram de forma dolosa à publicação das mesmas, entende-se que os mesmos não deverão ser pronunciados pelo crime de difamação de que vêm acusados.
A lei define no artº 283º nº2 do C.P.P. o que considera indícios suficientes, ou seja, o conjunto de elementos dos quais resulte a probabilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança.
A prova indiciária não conduz a um julgamento de certezas. A prova indiciária contém apenas, um conjunto de factos conhecidos que permitirão partir para a descoberta de outro/outros, que deixarão de se mover no campo das probabilidades para entrarem no domínio das certezas. Contudo, o indício é (em si) um facto certo, do qual, por interferência lógica baseada em regras de experiência, consolidadas e fiáveis, se chega á demonstração de um facto incerto, a provar segundo o esquema do chamado silogismo judiciário.
Por indiciação suficiente, entende-se a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, em razão dos meios de prova existentes, uma pena ou medida de segurança.
Conforme dispõe o artº 286º nº1 do C.P.P. “A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.
Para a pronúncia, como para a acusação, a lei não exige a prova no sentido da certeza moral da existência do crime, basta-se com a existência de indícios, de sinais de ocorrência de um crime, donde se possa formar a convicção de que existe uma probabilidade razoável de que foi cometido o crime pelo arguido. Contudo, essa possibilidade, é uma certeza mais positiva do que negativa, sendo que o juiz só deve pronunciar o arguido quando pelos elementos de prova recolhidos nos autos forme convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido.
Do já citado artº 308º do C.P.P. conjugado com a noção de indícios suficientes dada pelo artº 283ºnº2 do C.P.P., resulta pois, que a lei só admite a submissão a julgamento desde que da prova dos autos resulte uma probabilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força dela, uma pena, ou uma medida de segurança, não impondo porém, a mesma exigência de verdade requerida no julgamento final.
Analisada a prova dos autos e atentas as razões supra referidas, entendemos não reunirem os autos elementos que sustentem a sujeição dos arguidos a julgamento, porquanto não resulta existir probabilidade séria e razoável de lhes vir a ser aplicada uma pena, pelo cometimento dos crimes de que vêm acusados.
Pelo exposto, determino, NÃO PRONUNCIAR os arguidos B…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J… e K….
Notifique e, remeta para julgamento para apreciação do factos relativamente ao arguido C…» [16].
Inconformado com o decidido, o Assistente C… tempestivamente interpôs RECURSO pela Declaração de interposição com MOTIVAÇÃO a fls 562-568 III rematada com as seguintes 12 CONCLUSÕES [17]:
1. Dá-se aqui por integralmente reproduzido e por mera economia processual, o artigo de opinião, constante dos autos, publicado no dia 11 de Novembro de 2012 no P… pelo jornalista e subdirector daquele jornal, D….
2. Naquela publicação, o arguido D… para além de imputar ao assistente uma acusação falsa, ou seja, de que este agrediu uma jornalista colega do arguido,
3. ainda apelidou o assistente de «cobarde” bem como referiu que de “uma assentada escaparam-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa entre os dedos das mãos”.
4. Tais expressões são ofensivas, caluniosas e difamatórias e no propósito conseguido de rebaixar e humilhar o assistente, então Presidente da Junta de Freguesia …, bem como ofendê-lo na sua honra e consideração.
5. Dá-se aqui por integralmente reproduzido, por mera economia processual, o artigo de opinião, constante dos autos, e publicado no dia 16 de Novembro de 2012, no P…, pelo jornalista G….
6. Naquela publicação, o arguido G…, dá publicidade a uma agressão por parte do assistente a uma colega do arguido, que nunca existiu.
7. Na mesma notícia, o arguido apelida o assistente de “valentaço” a ainda refere que o assistente se preocupa em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos.
8. Escreveu o arguido e publicou uma notícia falsa e emitiu sobre o assistente juízos de valor que caem no domínio da ofensa, da difamação com o exclusivo propósito, conseguido, de rebaixar e humilhar o visado, ofendendo-o na sua honra e consideração.
9. Os autos fornecem indícios suficientes e fortes, dos quais resulta a probabilidade razoável de aos arguidos vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena.
10. Na verdade, com o seu artigo de opinião, o jornalista e subdirector do P…, D…, cometeu dois crimes, um crime p. e p. pelo art.ºs 180º nº 1, e 184º com referência ao art.º 132.º n.º 2 al. l) do Cód. Penal e art.º 30º nº 1 e 2 da Lei nº 2/99, e ainda outro crime p. e p. pelo art.ºs 180º nº 1, e 184º com referência ao art.º 132.º n.º 2 al. l) do Cód. Penal e art.º 30º e 31º nº 3 da Lei 2/99.
11. O jornalista do P…, aqui arguido, G…, com o seu artigo de opinião cometeu um crime p. e p. pelo art.ºs 180º nº 1, e 184º com referência ao art.º 132.º n.º 2 al. l) do Cód. Penal e artº 30º n.º 1 e 2 da Lei 2/99.
12. Ao decidir pela não pronúncia dos arguidos pelos crimes de que vinham acusados, a Mm.ª Juiz, violou frontalmente o disposto no art.º 283º n.º 2 do C.P.P.» [18],
Por considerar - a propósito do teor do artigo do Arguido:
● D… que «No dia 11 de Novembro de 2012, o jornalista e também subdirector do P…, D…, escreveu o artigo intitulado “C… pensa com as pernas” onde diz “(...) A agressão de que foi alvo a jornalista do P…, B… (...) trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C…, não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das notáveis definições de cobardia: “Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas”. Isto é: foge dos problemas (...) De uma assentada escaparam-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa por entre os dedos das mãos”», que:
«Não restam dúvidas que se trata de um artigo de opinião.
E, como refere a Mm.ª Juiz do Tribunal de Instrução Criminal na sua decisão, tal artigo “é um texto em que o autor expõe o seu posicionamento diante de algum tema actual e de interesse de muitos.
É um texto dissertativo que apresenta argumentos sobre o assunto abordado, portanto, o escritor além de expor seu ponto de vista, deve sustentá-lo através de informações coerentes e admissíveis.
Logo, as ideias defendidas no artigo de opinião são de total responsabilidade do seu autor, e, por este motivo, o mesmo deve ter cuidado com a veracidade dos elementos apresentados, além de assinar o texto final.”
Como também bem refere a Mm.ª Juiz, o autor da notícia e arguido critica a atitude cobarde do autarca, de um homem com funções públicas de agredir uma jornalista, uma mulher.
Mas que prova tem o autor da notícia que a jornalista foi agredida?
A versão da jornalista e que esta apresentou queixa.
Vejamos! A jornalista é parte interessada e por isso faz circular a versão que entender.
E o facto de apresentar queixa contra alguém quer dizer que a queixa tem fundamento e que com base na mesma resultará a condenação do agressor?
Não será despiciendo dizer que basta atentar na leitura cuidadosa do processo, desde a queixa na PSP e nas várias declarações prestadas pela jornalista no processo para se perceber várias versões dos acontecimentos, culminando com o relatório médico da agressão constante do Instituto de Medicina Legal.
Já quanto ao eventual agressor, este foi condenado na notícia porque para o autor do artigo de opinião, houve mesmo agressão.
Será bastante para se condenar alguém, ou, chamar cobarde, o facto de uma pessoa apresentar queixa contra outra?
E, se se provar em audiência de julgamento que não houve agressão alguma?
Ao escrever e divulgar o artigo de opinião, o arguido, não temos dúvidas, incorreu numa crítica ofensiva, caluniosa, difamatória e no propósito conseguido de rebaixar e humilhar o assistente, no momento Presidente da Junta de Freguesia …» [19];
G… que «No dia 16 de Novembro de 2012, o jornalista do “P…” G… escreveu o artigo, fotocopiado a fls. 96, sob o título “A paciência de Q…”: “... X… acolitado por C…, presidente de …, um “valentaço” que agride B…, minha camarada de trabalho durante largos anos no P…, preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos...”» - que:
«O arguido G… decide escrever esta notícia e dar-lhe publicidade, tomando as “dores” da colega jornalista sem sequer esboçar dúvida e fazendo de imediato juízos de valor.
E, como se referiu acima, não é pelo facto da jornalista ter apresentado queixa contra quem diz que a agrediu que serve para condenar alguém, ou sobre ela se emitirem juízos de valor.
Na verdade, para além da expressão “valentaço”, o arguido vai mais longe e refere que o assistente se preocupa em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos.
Ora, não se coíbe o arguido de emitir e fazer publicar juízos de valor sobre o assistente que caem na ofensa, na difamação e também no exclusivo propósito de rebaixar e humilhar o visado» [20].
ADMITIDO o Recurso a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo para este TRP ut arts 399, 401-1-b-II, 406-2, 407-2-c, 408 a contrario e 427 do CPP por Despacho a fls 569 III notificado aos Sujeitos Processuais inclusive nos termos e para os efeitos dos arts 411-6 e 413-1 do CPP, apresentaram RESPOSTA:
● O MINISTÉRIO PÚBLICO a fls 573-591 III sem conclusões mas com o remate que «… deverá o despacho em causa ser confirmado e mantido, e, consequentemente, o recurso ser rejeitado, por manifesta improcedência – art 420.º, n.º 1, do CPP» por considerar que «… a pretensão do recurso dos assistentes [«…claramente…não…»] tem alguma probabilidade de êxito, pelo menos, legalmente ancorada» porquanto:
«A tutela penal do direito ao bom nome e reputação, é nestes termos, assegurada pelo referido artigo 180º, do CP, que prevê e pune o crime de difamação, bem como pelo artigo 181º, ambos do C Penal, este último, que prevê e pune o crime de injúria, normas que na descrição dos respetivos tipos, utilizam a expressão “ofensivos da honra e consideração”.
O crime de difamação tutela o bem jurídico - pessoalíssimo e imaterial – da honra, assente na imputação indireta de factos e juízos desonrosos. A difamação consiste na imputação a alguém, levada a terceiros e na ausência do visado, de facto ou conduta que encerre em si uma reprovação ético-social, sendo ofensivos da honra e consideração do visado, enquanto pretensão de respeito que decorre da dignidade da pessoa humana e pretensão ao reconhecimento da dignidade moral da pessoa por parte dos outros. A lei não exige o propósito de ofender a honra e consideração de alguém, bastando a consciência, por parte do agente, de que a sua conduta é de molde a produzir a ofensa da honra e consideração de alguém.
O tipo objetivo de difamação estará preenchido com a imputação de factos, palavras ou juízos desonrosos, desonestos ou vergonhosos, a par do dolo genérico, em qualquer uma das suas modalidades.
Em sentido amplo, o bom nome e reputação, incluem, enquanto síntese do apreço pelas qualidades determinantes da identidade de cada indivíduo e pelos valores pessoais adquiridos pelo mesmo, quer no plano moral, intelectual, sexual, familiar, profissional ou político.
A honra é encarada numa dupla perspetiva – normativa e fáctica – como bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer apropria reputação ou consideração exterior.
O direito ao bom nome e reputação “consiste essencialmente no direito a não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social mediante imputação feita por outrem, bem como no direito a defender-se dessa ofensa e a obter a competente reparação”.
A honra constitui um “bem de personalidade e imaterial, que se traduz numa pretensão ou direito do indivíduo a não ser vilipendiado no seu valor aos olhos da sociedade e que constitui modalidade do livre desenvolvimento da dignidade humana, valor a que a Constituição atribui a relevância de fundamento do Estado português; enquanto bem da personalidade e nesta sua vertente externa, trata-se de um bem relacional, atingindo o sujeito enquanto protagonista de uma atividade económica, com repercussões no campo social, profissional e familiar e mesmo religioso”.
“Só deve considerar-se ofensivo da honra e consideração de outrem, aquilo que, razoavelmente, isto é, segundo a sã opinião da generalidade das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores individuais e sociais. O que pode ser uma ofensa ilícita em certo lugar, meio, época, ou para certas pessoas, pode não o ser em outro lugar ou tempo, do mesmo modo que a circunstância de ser ou não injuriosa uma palavra depende, em grande parte, da opinião, dos hábitos, das crenças sociais”.
Segundo Nélson Hungria, a difamação “é a manifestação, por qualquer meio, de um conceito ou pensamento que importe ultraje, menoscabo ou vilipêndio contra alguém, dirigida ao visado”.
Ainda segundo o mesmo autor, “o bem jurídico lesado é, prevalentemente, a chamada honra subjetiva, isto é, o sentimento da própria honorabilidade ou a respeitabilidade pessoal”.
Por outro lado, "os valores jurídico-penais que o legislador quis proteger com a punição da difamação e com a injúria, foram a honra e a consideração de uma pessoa: “a honra diz respeito à estima, ao não desprezo moral por si próprio, que sente em geral qualquer pessoa", e a consideração, ao juízo do público, isto é, ao apreço ou não "desconsideração que os outros tenham por ele".
"A honra refere-se ao apreço de cada um por si, à auto avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral. A consideração ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém, um bom elemento social, ou ao menos de o não julgar um valor negativo".
“O bem jurídico honra, traduz uma pretensão de respeito por parte dos outros, que decorre da dignidade humana. O seu conteúdo é constituído basicamente por uma pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros. Sem a observância social desta condição não é possível à pessoa realizar os seus planos de vida e os seus ideais de excelência na multiplicidade de contextos e relações sociais em que intervém. O bem jurídico-constitucional assim delineado apresenta um lado individual (o bom nome) e um lado social (a reputação ou consideração) fundidos numa pretensão de respeito que tem como correlativo uma conduta negativa dos outros; é, ao fim e ao cabo, uma pretensão a não ser vilipendiado ou depreciado no seu valor aos olhos da comunidade”.
No fundo, o que está em causa é a pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros.
O bem jurídico assim delineado apresenta um lado individual - bom nome - e um lado social - a reputação ou consideração - fundidos numa pretensão de respeito que tem como correlativo uma conduta negativa por parte dos outros.
O artigo 25º, nº1, da Constituição da República, dispõe que “a integridade moral e física das pessoas é inviolável”.
Dispondo depois o artigo 26º que, “a todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de descriminação”
Por seu lado, estabelece o artigo 37º da Constituição da República, que “todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento por palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e ser informados, sem impedimentos ou discriminações”.
Ambos os direitos, merecem tutela e garantia constitucionais, enquanto direitos fundamentais das pessoas, inscritos na Constituição da República – ao mesmo nível hierárquico de tutela - no mesmo Título II – Direitos, liberdades e garantias - e Capítulo I – Direitos, liberdades e garantias pessoais – da Parte I.
“A liberdade de expressão deve considerar-se como uma manifestação essencial das sociedades democráticas e pluralistas, nas quais a crítica e a opinião livres contribuem para a igualdade e aperfeiçoamento dos cidadãos e instituições. Todavia direito fundamental de idêntico valor protege a integridade moral do cidadão, nomeadamente o seu nome e reputação”.
Também, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (doravante CEDH), garante no seu artigo 10º, nº1, o direito de qualquer pessoa à liberdade de expressão, compreendendo a liberdade de opinião e de receber ou transmitir ideias, sem ingerências de quaisquer autoridades públicas e sem consideração de fronteiras, bem como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos protege, igualmente, tal direito, no seu artigo 19º, nº2.
Da mesma forma, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (doravante DUDH), consagra no seu artigo 19º, o direito dos indivíduos à liberdade de opinião e expressão, que implica o direito de procurar, receber, difundir informações por qualquer meio de expressão e sem consideração de fronteiras.
“Tão importante, assim, vem a ser assegurar o livre exercício dos direitos de livre expressão do pensamento, elemento imprescindível ao funcionamento e aperfeiçoamento das instituições democráticas”, “como garantir o respeito pelos demais direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, em que, em idêntico plano constitucional, se inclui a da dignidade humana, dos direitos à integridade moral e ao bom nome e reputação”.
A Constituição reconhece a existência de limites ao exercício do direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento, preceituando, no artigo 37.º, n.º 3, que “as infrações cometidas no exercício destes direitos - de expressão e informação - ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal ou do ilícito de mera ordenação social, sendo a sua apreciação respetivamente da competência dos tribunais judiciais ou de entidade administrativa independente, nos termos da lei”.
Deste n.º 3 conclui-se, que a liberdade de expressão não é ilimitada, “há certos limites ao exercício do direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento. A liberdade de expressão não pode efetivamente prevalecer sobre direitos fundamentais dos cidadãos ao bom nome e reputação, à sua integridade moral, à reserva da sua vida privada. Esses limites encontram-se concretizados na lei penal. A injúria e a difamação não podem reclamar-se de manifestações da liberdade de expressão”.
“O direito de liberdade de expressão e o direito à consideração e à honra, ambos constitucionalmente garantidos, quando em confronto, devem sofrer limitações, de modo a respeitar-se o núcleo essencial de um e outro”.
Se, nos termos do artigo 18º, nº2, da Constituição da República, a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, para resolver o conflito entre bens ou interesses de igual valor constitucional ter-se-á que obter a “harmonização” ou “concordância prática “do bens em colisão, traduzida numa mútua compressão por forma a atribuir a cada um a máxima eficácia possível.
Também, a CEDH, no artigo 10º, nº2 e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, no artigo19º, nº3, consagram que a liberdade de expressão não é absoluta, sofrendo as restrições - necessárias à coexistência numa sociedade democrática – de outros direitos como os da honra e reputação das pessoas.
A expressão liberdade de expressão tem longínquas raízes históricas, surpreendendo-se na Constituição dos EUA, o primeiro texto legal a referir-se claramente a tal liberdade, (a par da liberdade de imprensa), cfr. 1º Aditamento na Declaração de Direitos e Garantias (Bill of Rights), sendo, que ainda no ano de 1789 é formalmente consagrada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, emergente da Revolução Francesa, a “livre comunicação dos pensamentos e das opiniões”, conquanto, logo aqui se previsse a responsabilização do cidadão pelos abusos da liberdade de falar, escrever e imprimir livremente.
São cada vez mais frequentes os conflitos entre o direito à honra, bom nome e reputação, por um lado, e o direito de expressão do pensamento, por outro, mormente num tempo de frequentes intromissões, na vida privada das pessoas, cada vez mais facilitadas, pelo progresso da ciência e da técnica e consequente avanço e modernização dos meios de comunicação social.
Mas numa sociedade democrática, a liberdade de expressão reveste a natureza de verdadeira garantia institucional, impondo por vezes, um recuo da tutela jurídico-penal da honra. Recuo, que tem que ser justificado por um correto exercício da liberdade de expressão, aferido pelo interesse geral.
Rodrigues da Costa, distinguindo o “direito de crónica”, afim do direito de informação, do “direito de opinião e de crítica”, como expressões, todas elas, desdobradas da “liberdade de expressão”, no balanceamento que se posta no conflito entre a liberdade de imprensa (forma de veiculação qualificada da liberdade de expressão) e o direito à honra, assevera que se a imprensa não deve na sua missão ter os direitos ilimitados que muitas vezes reclama, também a repressão da tutela da honra se não deve estender de molde a poder ficar aniquilada a mencionada liberdade e, aceitando situarem-se, aqueles direitos, no mesmo plano, defende que o direito à honra e consideração só pode ser sacrificado se, ofendido que seja pelo exercício da liberdade de imprensa, o ato ofensivo tiver sido justificado, isto é, se tiver decorrido de uma causa justificativa fundada no quadro da função social e cultural assinalada à imprensa, respeitados que sejam os limites da necessidade, adequação e proporcionalidade.
Não se colocando a questão, tanto, na hierarquização dos dois direitos constitucionalmente consagrados, o conflito concreto que surja entre ambos, deve ser decidido, num quadro de “coordenação, compatibilidade ou concordância prática em casos de confluência ou conflito devem considerar o efeito recíproco de mútuo condicionamento entre normas protetoras de diferentes bens jurídicos, que impõe a violação do núcleo essencial do direito ao bom nome de reputação, dificilmente poderá ser legitimada com base no exercício de um outro direito fundamental”.
A liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições primordiais do seu progresso e do desenvolvimento de cada pessoa. Sob reserva do parágrafo 2º do artigo 10º, da CEDH, a liberdade de expressão vale não só para as informações ou ideias acolhidas com favor ou consideradas como inofensivas ou indiferentes, mas também, para aquelas que melindram, chocam ou inquietam. Assim é exigido pelo pluralismo, pela tolerância e espírito de abertura sem os quais não existe sociedade democrática. Como se prevê no referido parágrafo 2º, esta liberdade está sujeita a exceções que devem, contudo ser interpretadas restritivamente e a necessidade de qualquer restrição deve ser demonstrada convincentemente.
“No conflito entre o direito à honra e a liberdade de expressão, tem vindo a verificar-se um ponto de viragem, tendo por base e fundamento o relevo, a dignidade e a dimensão da liberdade de expressão considerada numa dupla dimensão, concretamente como direito fundamental individual e como princípio conformador e essencial à manutenção e aprofundamento do Estado de Direito democrático, reconhecendo-se que o exercício do direito de expressão, designadamente enquanto direito de opinião e de crítica, constitui o próprio fundamento do sistema democrático, o que justifica a assunção de uma nova perspetiva na resolução do conflito.
Neste contexto (…) na esteira da orientação assumida por Costa Andrade, deverem considerar-se atípicos os juízos de apreciação e de valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc., ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espetáculo, quando não se ultrapassa o âmbito da crítica objetiva, isto é, enquanto a valoração e censura críticas se atêm exclusivamente às obras, às realizações ou prestações em si, não se dirigindo diretamente à pessoa dos seus autores ou criadores, posto que não atingem a honra pessoal do cientista, do artista, do desportista, do profissional em geral, nem atingem a honra com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica.
Mais entende aquele insigne Mestre que a atipicidade da crítica objetiva pode e deve estender-se a outras áreas, aqui se incluindo as instâncias públicas, com destaque para os atos da administração pública, as sentenças e despachos dos juízes, as promoções do MP, as decisões e o desempenho político de órgãos de soberania como o Governo e o Parlamento.
A doutrina dominante, face ao Direito português, tempera a conceção normativa do bem jurídico protegido no crime de difamação com uma dimensão fáctica: a honra é vista, assim, como um bem jurídico complexo que inclui quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo radicado na sua dignidade, quer a própria consideração ou reputação exterior.
A ofensa dos valores da dignidade pessoal, que constituem a essência do conceito de honra, tem de ser integrada no contexto em que foi proferida, não podendo ser esquecido que estamos num domínio de crítica que provém de uma situação concreta.
No caso dos autos e salvo o devido e substantivo respeito pelo recorrente, entendemos que a razão está do lado do MªJIC “a quo”.
Com efeito a acusação é, a nosso ver, algo generalista e até conclusiva, não especificando, em termos factuais e objetivos em que medida os factos relatados ou os supostos juízos de valor pudessem sequer sugerir e não vem articulada com suporte factual suficiente ao desiderato do recorrente, na altura Presidente da Junta … – e sobre factos que realmente o Mº Pº imputou e acusou o ora recorrente de ofensas á integridade física a uma jornalista do P… do Porto -mas enquanto cidadão comum, se tenha movido, adentro da sua atuação, por interesses ilegítimos; não deparamos com a sua especificação, nem os mesmos se poderão depreender do teor dos artigos em causa, ou da factualidade aduzida na acusação.
A verdade aqui, está sempre na vertente do assistente, do seu lado, o único a quem se deve confiar.
Vejamos o que está em causa nos ditos artigos:
- o de 11 de Novembro de 2012 – “…O C… pensa com as pernas … a agressão de que foi alvo a jornalista do P…, B… … trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome C… …”
Objectivamente o agressor é o assistente/arguido C… e a jornalista B… a vitima, no sentido em que o agressor, a atingiu corporalmente dentro das instalações da Junta de Freguesia de ….
Será que o artigo é injurioso, por referir que o recorrente pensa com as pernas e praticou um ato cobarde? Claramente que não
O artigo faz críticas à actuação do ora recorrente, na altura Presidente da Junta de Freguesia …, que é “grosseiro” com uma jornalista em serviço naquela junta de freguesia e para além disso a atingiu corporalmente, não deixando de ter em conta que a ofendida é mulher, teoricamente mais fraca “fisicamente”. E referir que é cobarde (citando Ambrose Bierce) nada tem de injurioso.
Realça o recorrente que o artigo baseia-se na opinião da jornalista e que a queixa desta não significa a condenação da sua própria pessoa. É verdade, mas não pode de se salientar que o MºPº entendeu que existiam indícios suficientes de que os factos denunciados pela jornalista tinham pernas para andar, tanto mais que deduziu acusação, por esses factos contra o ora recorrente
- o de 16 de Novembro de 2012 – No referido artigo o visado G… refere que “…um valentaço, citando o nome do recorrente, que agride B…, minha camarada de trabalho…preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos …”
Será que o artigo é injurioso, por referir que o recorrente é um valentaço, colocado entre aspas e dizendo que agrediu a sua colega de profissão? Claramente que não
Queria em nosso entender o artigo deixar claro que o recorrente foi muito valente …mas por agredir uma mulher, que por acaso era jornalista
Estamos em crer, que nenhuma das expressões utilizadas e, aqui objeto de apreciação, no contexto do que foram escritos os artigos em causa, por si só ou na sua articulação em conjunto, podem ser consideradas ofensivas da honra e consideração do assistente, tudo à luz das considerações de Direito vindas de expender.
Com efeito, tendo presente, o evidenciado contexto dos factos, o circunstancialismo envolvente à temática abordada, a figura pública do recorrente, na altura dos factos, traduz, inequivocamente, o relevo social e atual dos factos.
Nem se pode dizer que nos aludidos artigos – dada a sua natureza e objectivo - tenham emitido algum juízo de valor ou censura sobre a forma de actuar do recorrente.
A questão subjacente aos artigos, o seu ponto de partida, é real, sobre questão de interesse público, atual, com interesse, de resto, sempre renovado.
Neste quadro, o teor de tais artigos, o que ali foi escrito como opinião pelos arguidos, e, cuja compreensão terá que ocorrer num enquadramento, necessariamente, informativo, pressupondo uma interpretação literal da mensagem - onde se inserem tão só, factos – sem juízos valorativos acerca do desempenho profissional dos assistentes – conectados e interligados entre si - mostra-se justificado pelos interesses da livre discussão das questões relacionadas com a justiça, em geral, com o MP, enquanto corpo e com os assistentes, em concreto, enquanto manifestação da liberdade de expressão.
Na ponderação dos interesses em conflito, as afirmações contidas nos referidos artigos e como foram denunciadas pelo assistente, representam um meio razoavelmente proporcionado à prossecução da finalidade legítima visada, tendo em conta o interesse da sociedade democrática em assegurar e manter a liberdade de expressão.
O exercício do direito de opinião e de crítica, de resto, pode valer como causa justificativa, em termos penais, de quaisquer ofensas à honra que o exercício daqueles direitos seja, porventura, portador, tendo em consideração o dito princípio da ponderação de interesses, estando por isso excluída a ilicitude da conduta dos arguidos, de acordo com o artigo 31º, nº2, alínea b), do C Penal ou na consideração do Prof. Costa Andrade, de exclusão da tipicidade.
Em conclusão, no binómio liberdade de expressão - direito à honra, no segmento dos artigos aqui em causa, os arguidos situaram-se no âmbito estrito do exercício da liberdade de expressão, que reconhecidamente, tem um papel essencial na vida pública num Estado de Direito e numa sociedade democrática e pluralista.
Tais artigos têm o propósito de exercer tal direito e revela-se como um meio adequado e razoável, do cumprimento do fim que se pretendia atingir no caso concreto, havendo que considerar atípicas as considerações nela contidas e que o recorrente, neste particular, entendeu terem ofendido a sua honra e consideração.
É exatamente nesse sentido que se entende que em nenhuma das referências neles contidas, está em causa a honra e consideração da pessoa do assistente/recorrente sendo todas elas, desprovidas da necessária relevância jurídico-criminal, mesmo vistas as coisas em termos do exigível dolo genérico.
Em síntese, sendo inevitável o conflito entre a liberdade de expressão, na mais ampla aceção do termo e o direito à honra e consideração, a solução do caso concreto, há-de ser encontrada através da “convivência democrática” desses mesmos direitos: isto é, consoante as situações, assim haverá uma compressão maior ou menor de um ou outro.
E, no caso concreto, atento que vem de ser dito, não pode deixar de se dar prevalência àquele primeiro.
Na instrução, as provas recolhidas não constituem pressupostos da decisão de mérito, mas de mera decisão quanto á prossecução do processo, até à fase de julgamento. Daí que a mera existência de indícios, de sinais do crime, sejam o bastante para a pronúncia, para a sujeição a julgamento.
É que a prova indiciária não conduz a um julgamento de certezas: contém, apenas, um conjunto de factos conhecidos que permitirão partir para a descoberta de outro ou outros factos que deixarão de se mover no campo das probabilidades para entrarem no domínio das certezas. Todavia, o indício é um facto certo do qual, por interferência lógica baseada em regras de experiência, consolidadas e fiáveis, se chega á demonstração do facto incerto a provar, seguindo o silogismo judiciário.
E também certo que, no juízo de quem pronuncia, deverá estar presente a necessidade de proteção da pessoa contra intromissões abusivas na sua esfera de direitos, designadamente as salvaguardadas no art. 30.°, da Declaração Universal do Direitos do Homem e que entre nós mereceram consagração constitucional (art. 2.° da DUDH e art. 27.° da CRP).
A sujeição de uma pessoa a julgamento, ainda que a decisão final se traduza em absolvição, que seria no presente caso quase uma certeza, não é um ato neutro quer do ponto de vista das suas consequências morais quer jurídicas.
Nessa esteira, expende o Prof F. Dias que “O Ministério Público tem ... de considerar que já a simples dedução de acusação representa um ataque ao bom nome e reputação do acusado, o que leva a defender que os indícios só serão suficientes e a prova bastante quando, já em face dela, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição” [21].
Ora, conforme dispõe o art. 286.° n.° 1 do CPP “A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento”.
Para a pronúncia, a lei não exige a prova no sentido de certeza moral da existência do crime, bastando-se com a existência de indícios, de sinais de um crime, donde se pode formar a convicção de que existe uma possibilidade razoável, que não absoluta, de que o crime foi cometido pelo arguido. Tal possibilidade é uma probabilidade mais positiva do que negativa, pelo que o juiz só deve pronunciar quando pelos elementos de prova recolhidos nos autos forma a convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido.
Daí que o art. 308.° n.° 1 do CPP refira que “ Se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respetivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia”.
Da conjugação dos arts. 308º, nº1 e 283.° n.° 2, ambos do CPP, extrai-se que a lei só admite a submissão a julgamento quando da prova dos autos resulte urna probabilidade razoável de aos arguidos vir a ser aplicada, por força daquela prova, uma pena ou uma medida de segurança, não sendo exigida a mesma certeza e plenitude de prova requerida pelo julgamento [22].
Assim, a abstração da terminologia legal possibilidade razoável tem sido entendida, de acordo com a jurisprudência dominante quando há mais probabilidades do arguido ser condenado que absolvido.
Não se trata pois aqui, nesta fase processual, de factos apurados/provados ou não apurados/provados, sob pena de violação, com a pronúncia, do princípio fundamental em que assenta todo o direito penal: da presunção de inocência, pois, como refere Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, pág. 356, no comentário a este princípio: "A dúvida sobre a culpabilidade do acusado é a razão de ser do processo. O processo nasce porque uma dúvida está na sua base e uma certeza deveria ser o seu fim". Trata-se apenas e tão só nesta fase de, como refere a lei, art. 308º, nº 1 do CPP, "recolha, ou não de indícios".
E como refere José da Costa Pimenta [23], "indício é a circunstância certa através da qual se pode chegar em indução lógica, a uma conclusão acerca da existência ou inexistência de um facto que se há-de provar" - "o indício, para o ser verdadeiramente, tem de conduzir a um convencimento – um convencimento que esteja acima de qualquer dúvida razoável, sob pena de, desnecessariamente, se enxovalhar a dignidade das pessoas. Há pois regras a que a valoração dos indícios deve obedecer. A primeira é a da certeza e inequivocidade da circunstância indiciante, de forma a afastar múltiplas inferências. Com esta regra se distingue indício da mera conjectura".
A razão de ser dos factos aprovados ou não, é a razão de ser, assim, do fim último da discussão da causa: a sentença após discussão da causa, arts. 365º, 368º e 372º, do CPP.
Por isso andou igualmente bem a Mª JIC quando entendeu não pronunciar os arguidos, pela não verificação da prática por estes, dos factos de que se encontram acusados pelo assistente/recorrente.
O despacho sob censura não violou qualquer dispositivo legal, nomeadamente os indicados pelo recorrente» [24];
● Os Arguidos D… e G… a fls 592-603 III concluindo que:
A. A decisão instrutória proferida é justa e correcta.
B. Os artigos que os Recorridos escreveram não podem ser analisados separadamente da restante factualidade dos autos e que o Tribunal plasmou na sua decisão instrutória e que, por exemplo, foram de molde a não pronunciar a Arguida jornalista e os demais Arguidos jornalistas pela notícia (de 10.11.12) que publicaram no P… sobre os factos.
C. Os factos a que os Arguidos tiveram acesso foram todos no sentido de a jornalista B… ter sido agredida pelo Recorrente, factos que se encontram nos autos e foram explicados e contextualizado em sede de instrução por várias testemunhas ouvidas, nos quais o Tribunal assentou a decisão de não pronúncia de todos os Arguidos.
D. Os Recorridos escreveram os seus artigos com base no conhecimento que tiveram da matéria por parte quer da Jornalista B…, quer pelo teor da notícia publicada de véspera (dia 10) no P…,
E. Factos gravíssimos, que partiram de alguém que desempenhava cargo público e político, e com acrescidas responsabilidades.
F. Também os ora recorridos leram o teor do comunicado emitido pelo Sindicato de Jornalistas no dia 10.11.12 censurando a conduta do Recorrente e que motivaram que o L… tivesse decidido abrir um inquérito ao Recorrente por violação estatutária.
G. Factos confirmados ainda por outra notícia em que o líder do L…/Matosinhos, X…, confirma todos os factos noticiados.
H. Ou seja, os Recorridos possuíam variadíssimos elementos que confirmavam a mesma história, e não apenas a versão da Jornalista.
I. Perante todo este quadro, narrado em primeira mão (claro está) pela Jornalista, mas testemunhado por outros intervenientes, os Recorridos só podiam considerar ser justa (como era) a crítica que fizeram nos seus escritos.
J. As expressões utilizadas têm total correspondência com os factos tal como estes chegaram ao conhecimento destes Arguidos, não dispondo de qualquer relevância penal, sobretudo no caso do Arguido G….
K. Dizer que agrediu (quando foi o que se passou) e chamar “cobarde” ou “valentaço” quando foi do que se tratou, quando o alvo das agressões é uma mulher, que se encontrava a trabalhar, é o mínimo.
L. Semelhante conduta, partindo de alguém que desempenha um cargo público e que tem responsabilidades políticas e dirigido a uma profissional da comunicação social, que se encontrava no exercício das suas funções é (só pode ser) objecto da máxima censura, desde logo social.
M. E é no uso da crítica e de uma opinião com estilo próprio que os Recorridos recorrem à imagem utilizada nos textos, tudo sempre dentro dos limites da lei, aliás como se oferece quem alcança na vida pública destaque pelos cargos públicos que ocupa.
N. Os Recorridos exprimiram a sua opinião de uma forma contundente, mas fizeram-no de boa fé face à leitura que fez das notícias amplamente divulgadas pelos periódicos da altura e pelo relato que lhes chegou via jornalista (em quem depositavam toda a confiança) e nas demais pessoas que vieram a público falar dos factos (v.g. X… e a tesoureira N…).
O. E, portanto, não há facto ilícito, típico e culposo.
P. Os artigos dos Recorridos fundam-se no estrito exercício da liberdade de expressão, e em função do superior interesse público, não relevando de qualquer intromissão na vida privada do Recorrente, nem constituindo qualquer devassa da mesma, e encontravam-se sustentados em depoimentos e informações obtidas.
● Andou bem o Tribunal a quo ao não pronunciar os Recorridos nos termos em que o fez, sendo de todo provável que em julgamento sempre haveria lugar à absolvição dos mesmos.
● Termos em que se não deve dar provimento ao presente recurso, devendo manter-se a decisão de não pronúncia proferida» [25],
Por considerarem que:
A. Quanto aos factos
«2. Sustenta, no fundo, o Recorrente que “até prova em contrário”, os ora Recorridos D… e G… deveriam ser pronunciados.
Considera que, uma vez que não há prova nos autos que o Assistente (e co-Arguido) tenha agredido a jornalista B…, não podiam os Recorridos escrever o que escreveram.
Está errado.
Desde logo pela suposta falta de prova nos autos em como o Assistente (e co-Arguido) realmente agrediu a jornalista, e no exercício das suas funções.
Mas, como é evidente, os artigos que os Recorridos escreveram não podem ser analisados separadamente da restante factualidade dos autos e que o Tribunal plasmou na sua decisão instrutória e que, por exemplo, foram de molde a não pronunciar a Arguida jornalista e os demais Arguidos jornalistas pela notícia (de 10.11.12) que publicaram no P… sobre os factos.
Ou seja, o Tribunal considerou que a actuação dos demais arguidos (B…, K…, J…, E…, H…, F… e I…) não tinha ido contra o Direito, designadamente em quanto tange do publicado no P…, matéria totalmente idêntica àquela em que os ora Recorridos se basearam para escreverem o que escreveram.
Donde que, fatalmente, estes só podiam ser igualmente despronunciados.
3. O Arguido D… era acusado do crime de difamação, p. e p. nos artigos 18O, n 1, e 1842 do Código Penal pelo artigo que escreveu e foi publicado no “P…” (P…) na edição de 11.11.12 e o Arguido G… pelo artigo que escreveu e foi publicado no P… em 16.11.12.
É por isso forçoso ter presente que a “história” do Recorrente não era como ele a contou, tudo começando com uma deslocação da jornalista B… no dia 9.11.12 à Junta de Freguesias …, local onde ia efectivamente decorrer uma reunião do L… e para a qual aquela foi escalada a fim de efectuar a respectiva cobertura jornalística.
A jornalista foi conduzida pela tesoureira da Junta, N…, até o seu gabinete e onde teria de permanecer até ao final dos trabalhos, no que a Assistente anuiu, e tendo ficado instalada com o portátil aberto e já a trabalhar.
De repente, entrou na sala uma senhora que não se identificou - que depois veio a verificar-se ser O… - a ordenar-lhe aos gritos que saísse da sala.
Apesar de a jornalista estar ao telefone com V… (vice-Presidente da Câmara) e, educadamente, ter solicitado uns “cinco minutinhos” para terminar a entrevista que estava a fazer, a senhora em causa continuou aos berros e quando a jornalista lhe perguntou se tinha autorização para a expulsar, esta respondeu: “Tenho, porque tenho o dobro da tua idade”.
Ao seu lado estava um homem que não se identificou: o Arguido C… (ora Recorrente), que ordenou à jornalista que saísse da sala, ao que esta respondeu estar devidamente autorizada pela tesoureira e que apenas precisava de uns minutos para acabar o texto.
Afirmando, então, ser o presidente da Junta … insistiu em expulsar a jornalista do P… do gabinete da tesoureira e do edifício, num tom agressivo e ameaçador e de forma descontrolada.
Avançou na sua direcção, afirmando que esteve “no Ultramar” e numa tentativa de a retirar da sala puxou-lhe pelo braço esquerdo.
Assustada, a Jornalista ligou para o telefone da tesoureira que subiu de imediato e insistiu em explicar ao Recorrente que aquela estava no gabinete com a sua autorização.
Quando a jornalista estava com o telefone na cara para fazer uma chamada para o seu chefe, o Recorrente avançou na sua direcção e com uma bofetada projectou o telefone para a parede, tendo-lhe marcado a cara com os dedos conforme os agentes da PSP de … que se deslocaram ao local puderam verificar, e como consta dos autos.
Quando estava a levantar-se e após apanhar o telefone do outro lado da sala, a jornalista ainda vê o Recorrente com o seu computador portátil no ar e pronto para o atirar o chão, no que foi impedido pela tesoureira que o arrancou das mãos, tentando em seguida controlar o mesmo com a ajuda de M….
A determinada altura o Recorrente pagou a luz e, com receio, a Jornalista exigiu que voltassem a ligá-la, tendo, depois disso, X…, líder do L… de Matosinhos, que abandonou a mesa dos trabalhos e entrou por outra porta do gabinete em socorro da Arguida, conseguido acalmar aquele.
Tudo consubstanciando (além das agressões corporais de que foi vítima), uma situação de terror que a Jornalista nunca havia experimentado e que a atormentou, e vem atormentando, posteriormente.
Razões porque apresentou queixa crime contra o Recorrente, como consta deste processo.
Todos estes factos encontram-se nos autos, foram explicados e contextualizados em sede de instrução por várias testemunhas ouvidos, e foram neles que o Tribunal assentou a decisão de não pronúncia de todos os Arguidos [26].
B. Dos artigos
4. O Arguido D… escreveu o seguinte:
C… pensa com as pernas
A agressão de que foi alvo a jornalista do P… B… quando legitimamente cobria um evento político com relevantes implicações políticas no concelho de Matosinhos, tem duas leituras. É claro que, antes de tudo o mais, trata se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C…. Sá um cobarde é capaz de aterrorizar e agredir uma jornalista, por saber que tem pela frente alguém incapaz de lhe responder à altura. C… não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das mais notáveis definições de cobardia: “barde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas”. Isto é: foge dos problemas. (...)
De uma assentada, escaparam-se-lhe dois “tachos”, com a mesma facilidade com que a areia escapa por entre os dedos das mãos. (...)
Por seu lado, o Arguido G… escreveu que:
(...) X…, acolitado por C…, presidente de …, um “valentaço” que agride B…, minha camarada de trabalho durante largos anos no P…, preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos...
Estes Arguidos escreveram os seus artigos com base no conhecimento que tiveram da matéria por parte quer da Jornalista B…, quer pelo teor da notícia publicada de véspera (dia 10) no P….
Notícia que descrevia os factos e que assentou no contacto dos Jornalistas J… e K… com a tesoureira N… e com o fotografo W….
Fontes que confirmaram que o Recorrente C…:
a) agrediu a jornalista;
b) atirou o telemóvel da jornalista contra uma parede em consequência da agressão;
c) ameaçou atirar o computador da jornalista ao chão, no que foi impedida pela tesoureira da Junta;
d) e ainda apagou as luzes do gabinete.
Factos gravíssimos, que partiram de alguém que desempenhava cargo público e político, e com acrescidas responsabilidades.
Mas não só!
Também os ora recorridos leram o teor do comunicado emitido pelo Sindicato de Jornalistas no dia 10.11.12 censurando a conduta do Recorrente (cfr. doc. 1 junto com o RAI dos Arguidos a fls....):
SJ condena agressão de autarca a jornalista no P…
1. A Direcção do Sindicato dos Jornalistas tomou conhecimento de que o presidente da Junta de Freguesia …, Matosinhos, insultou e agrediu ontem à noite, no interior das instalações daquele órgão autárquico, uma jornalista ao serviço do “P…”.
2. A jornalista, B…, que cobria uma reunião da Comissão Política Concelhia do L…, a decorrer no salão da Junta de Freguesia, tinha sido convidada pela tesoureira da Junta de Freguesia (JF) a utilizar o seu gabinete para trabalhar, uma vez que não poderia assistir aos trabalhos, cujo final teria de aguardar.
3. Quando se encontrava a trabalhar no referido local, a jornalista foi interrompida por ume senhora que pretendia expulsá-la e, depois, pelo próprio presidente da JF, C…, tendo ela pedido apenas que a deixassem terminar a chamada telefónica que então mantinha.
4. No entanto, segundo a nossa camarada, o autarca arrancou lhe das mãos o telefone, arremessando-o contra uma parede. tendo tentado também lançar ao chão o computador portátil, do que foi impedido pela tesoureira, mas passou a insultar e a proferir ameaças contra a jornalista e chegou a agredi-la na face.
5. O grave incidente descrito justificou a chamada ao local de elementos da Policia de Segurança Pública, que registaram a ocorrência, e justifica também a apresentação de queixa formal por parte da jornalista, mas não pode ficar-se por um simples processo judicial sobre ameaças e agressão.
6. Inteiramente solidária com a jornalista B…, a Direcção do Si repudia vivamente o comportamento do autarca, o qual é duplamente condenável: pelo atentado contra o exercício de funções profissionais e a liberdade de informar; e pela ofensa que o próprio faz, ao exercício de funções de eleito local. 7. Como cidadão eleito democraticamente para um órgão autárquico, o presidente da Junta de Freguesia … deveria conhecer os valores essenciais da liberdade de imprensa (e o livre exercício da profissão de jornalista) e do poder local democrático, assim como deveria saber que, em democracia, tais valores se cruzam e obrigam aos seus titulares a protecção mútua.
8. Nestes termos, a Direcção do SJ considera que, independentemente das consequências criminais do sucedido, a nossa camarada é credora de um pedido de desculpas formal e público por parte do autarca, que deve também explicações aos seus concidadãos.
Factos que motivaram igualmente que o L… tivesse decidido abrir um inquérito ao Recorrente por violação estatutária.
Factos confirmados por outra notícia (doc. 2 junto ao RAI dos Arguidos) em que o líder do L…/Matosinhos, X..., confirma todos os factos noticiados:
«“Fui em socorro da jornalista após receber um pedido de ajuda. Tinha sido vítima de agressão e ameaças e as coisas acalmaram com a minha entrada”, disse ao P….
“Consegui acalmar o presidente da Junta, que acabou por sair”, reforçou, garantindo que B… estava “devidamente autorizada” dada “a gentileza da tesoureira da Junta de … em ceder o seu gabinete”, o que tem “poder” para fazer. A jornalista estava no referido gabinete com autorização da tesoureira, como confirmou a própria N…, enquanto decorria, à porta fechada, a reunião para escolher o candidato a Matosinhos.»
Factos confirmados ainda pela tesoureira N…: «ela própria impediu que C… atirasse ao chão o portátil da jornalista, após ter atirado o telemóvel.» (doc. 2).
Ou seja, os recorridos possuíam vastíssimos elementos que confirmavam a mesma história, e não apenas a versão da Jornalista.
5. Perante todo este quadro, narrado em primeira mão (claro está!) pela Jornalista, mas testemunhado por outros intervenientes, os Recorridos só podiam considerar ser justa (como era) a crítica que fizeram nos seus escritos.
As expressões utilizadas têm total correspondência com os factos tal como estes chegaram ao conhecimento destes Arguidos, não dispondo de qualquer relevância penal, sobretudo no caso do Arguido G….
Dizer que agrediu (quando foi o que se passou) e chamar “cobarde” ou “valentaço” a alguém não será simpático, mas quando os factos ocorreram como ocorreram não permitem censura penal.
O Recorrente agrediu a jornalista B… e fê-lo quando esta se encontrava a trabalhar e sabendo-a indefesa pela sua própria condição e força física.
Não é um acto cobarde? Um homem bater numa mulher? E sem sequer provocação?
Um político, autarca, que se vale da sua posição, para agredir uma profissional da comunicação social?
Não é de “valentaço”?
É inaceitável l
6. Semelhante conduta, partindo de alguém que desempenha um cargo público e que tem responsabilidades políticas e dirigido a uma profissional da comunicação social, que se encontrava no exercício das suas funções é (só pode ser) objecto da máxima censura, desde logo social.
Foi o que fizeram os Recorridos, dentro da liberdade de expressão que a Constituição e a lei lhes conferem.
E é no, uso da crítica e de uma opinião com estilo próprio que os Recorridos recorrem à imagem utilizada nos textos, tudo sempre dentro dos limites da lei, aliás como se oferece quem alcança na vida pública destaque pelos cargos públicos que ocupa.
Note-se que — e essa é uma das grandes diferenças entre uma notícia e um artigo de opinião — quando um articulista escreve o que escreve, não está a narrar factos a se, mas a dar a sua opinião, sobre factos, e o leitor sabe distinguir as coisas e sabe que está a ler uma opinião, e não a narração de factos.
Foi no quadro de factos que os Recorridos receberam que se criou a convicção de que eram justas as críticas que produziram. Críticas feitas a um político, no exercício de funções públicas e que bate a uma jornalista que estava a trabalhar.
7. A polémica política contundente e por vezes violenta deve ter o seu espaço de liberdade numa sociedade democrática sob pena de estarmos a pô-la em causa.
No domínio da política e da crítica aos governantes e às suas actuações, o “efeito irradiante” da liberdade de expressão, fundado na sua dimensão comunitária e não estritamente individual, tem de ser valorado e ponderado, o que o Tribunal a quo doutamente foi capaz de fazer.
Os Recorridos exprimiram a sua opinião de uma forma contundente, mas fizeram-no de boa fé face à leitura que fez das notícias amplamente divulgadas pelos periódicos da altura e pelo relato que lhes chegou via jornalista (em quem depositavam toda a confiança) e nas demais pessoas que vieram a público falar dos factos (v.g. X… e a tesoureira N…).
Como referiu o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no Acórdão Sunday Times contra o Reino Unido de 26.04.1979, neste tipo de polémica sempre transborda algo para a pessoa do criticado, sem que contudo seja necessário numa sociedade democrática criminalizar tal actuação, sob pena de se coarctar a liberdade de expressão injustificadamente.
De acordo com o cristalino pensamento de Costa Andrade, quando o ofendido exerce um cargo político e com responsabilidades governamentais, embora não veja, por esse lado, diminuída a protecção da sua honra, no que tange à sua vida privada, «o quadro é já outro do lado da esfera pública. Isto é, quando se trata de criticar e combater o pensamento, as palavras, as atitudes e as condutas das ‘public figures’ no âmbito da publicidade, por exemplo, no campo da acção política. Dito ainda com Mahrenholtz: ‘quando alguém pisa o palco público com a finalidade de se impor na publicidade, então ele participa e quer participar naquela relação de efeitos recíprocos que é própria do actor político e do público político ... ele quer intervir na publicidade, quer afirmar a sua imagem, mas numa sociedade assente na liberdade ele não pode ter esse processo na mão. O controlo público dos ‘public figures’ é o fundamento irrenunciável da vida política em liberdade’. Tudo aqui se conjuga no sentido de uma mais acentuada redução da dignidade penal e da carência da tutela penal da honra.»[27]
E, portanto, não há facto ilícito, típico e culposo.
Os artigos dos Recorridos fundam-se no estrito exercício da liberdade de expressão, e em função do superior interesse público, não relevando de qualquer intromissão na vida privada do Recorrente, nem constituindo qualquer devassa da mesma, e encontravam-se sustentados em depoimentos e informações obtidas.
Razão porque só podia ser de não pronúncia, também nesta parte, a decisão do Tribunal a quo» [28].
Em Vista ut art 416-1 do CPP o Exmo Procurador Geral Adjunto emitiu a fls 609-610 III o PARECER «… que o recurso deve ser julgado improcedente» por considerar que:
«O MP na 1ª instância veio responder (cf. págs.573-591), em extensa e completa peça, onde evidencia, com recurso, quer á dicotomia constitucional, direito de liberdade de expressão vs. direito à honra e consideração e sua via de possível superação, através do princípio da «concordância prática» (sem deixar de também chamar á colação, entre outros, um impor[ante diploma, maxime nesta matéria, que é a CEDH) bem como a doutrina e jurisprudência autorizada. Neste particular, como logo ressalta da leitura da proficiente peça, centra-se a problemática, em causa, na esfera pública, dado, naturalmente, o requerente da instrução, ser um político em exercício de funções públicas, donde decorrem, limitações ás situações que in concreto relevam, na sede em causa, da tipicidade, como se desenvolve, na resposta, discorrendo sobre o caso concreto, para concluir, que as condutas imputados aos arguidos, não relevam da tipicidade, dos crimes imputados.
Diga-se, de resto, porque não valerá a pena alongar-nos, face á completude e segura fundamentação da resposta, em apreço, que esta decisão de não pronúncia, vem na, nos seus fundamentos, na esteira de decisões, da COUR EUROPEENNE DES DROITS DE L‘HOMME / CEDH / TEDH, como se pode verificar da consulta no seu site: www.echr.co.int/» [29].
NOTIFICADOS os demais Sujeitos Processuais para, querendo, responderem em 10 dias seguidos ex vi art 417-2 do CPP, NÃO o fizeram.
Na oportunidade efectuado EXAME PRELIMINAR e colhidos os VISTOS LEGAIS os autos foram submetidos à CONFERÊNCIA. APRECIANDO
A Pronúncia querida pelo Assistente C… ora Recorrente dos 2 Arguidos ora Recorridos:
D… pela autoria material - com o título«C… pensa com as pernas» e pelos segmentos «A agressão de que foi alvo a jornalista do P… B… (...) trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C…, não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das notáveis definições de cobardia: “Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas”. Isto é: foge dos problemas (...) De uma assentada escaparam-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa por entre os dedos das mãos» no corpo de texto do artigo dele na edição em papel do P… de 11.11.2012 - de um crime doloso – enquanto Jornalista do P… autor do artigo - de «difamação agravada» pela conjugação das circunstâncias «membro de órgão das autarquias locais» e «no exercício das suas funções ou por causa delas» p.p. pelos arts 180-1 e 184 ex vi 132-2-l do CP e 30-1-2 da LI [30] [31] em concurso ideal heterogéneo com um crime doloso – na qualidade de Subdirector do P… como ele expressamente alegou na subscrição do seu artigo – de «difamação agravada» pela conjugação das circunstâncias «membro de órgão das autarquias locais» «no exercício das suas funções ou por causa delas» p.p. pelos arts 180-1 e 184 ex vi 132-2-l do CP e 31-3 da LI [32],
G… pela autoria material com os segmentos «X… acolitado por C…, presidente de .., um “valentaço” que agride B…, minha camarada de trabalho durante largos anos no P…, preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos» no corpo de texto do seu artigo na edição em papel do P… de 16.11.2012, de um crime doloso – enquanto Jornalista do P… autor do artigo - de «difamação agravada» pela conjugação das circunstâncias «membro de órgão das autarquias locais» e «no exercício das suas funções ou por causa delas» p.p. pelos arts 180-1 e 184 ex vi 132-2-l do CP e 30-1-2 da LI,
Pressupõe o julgamento «indiciado» segundo o Direito Processual Penal de factos susceptíveis de integrarem segundo o Direito Criminal / Penal todos os elementos dos tipos objectivo e subjectivo doutrinal e jurisprudencialmente tidos por constitutivos dos sobreditos crimes dolosos, o que perpassa pela realização de um juízo de indiciação ou não, nos seguintes termos:
Apesar do CPP de 01.01.1988 ter sofrido no ínterim 21 alterações a última pela Lei Orgânica 2/ 2014 de 6/8, o art 283-2 quanto a «Acusação pelo Ministério Público» continua a estatuir apenas que «Consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança» aplicável a «Despacho de pronúncia ou de não pronúncia» ex vi art 308-2-I do CPP.
Porém, a citada concretização legal de «indícios suficientes» para pronunciar tal como para acusar redunda numa cláusula geral e abstracta com conceitos indeterminados que tem reclamado atenção da Doutrina e preocupação da Jurisprudência porque a dedução de uma Acusação ou Pronúncia infundada probatoriamente redunda em absolvição de um Arguido submetido a final sem propriedade a Julgamento sujeito a escrutínio público pela prática de crime que não se demonstrou e pelo qual até pode ter estado preso preventivamente durante meses até tal Decisão Final.
Donde a persistência dos esforços doutrinal e jurisprudencial de compreensão de tal cláusula geral e abstracta com conceitos indeterminados, sendo possível condensar, pelo critério dos dife rentes graus em que assentam quanto a «possibilidade» versus «certeza», três compreensões distintas sobre sentido / objecto / alcance de «indícios suficientes»:
I - quando existe uma simples possibilidade, ainda que mínima, de condenação do agente, após produção da prova em Audiência, assim bastando que a submissão do Arguido a Julgamento não constitua “um acto manifestamente inútil e clamorosamente injusto” mas tão só uma mera possibilidade, ainda que reduzida, de condenação;
II – quando deles resulte uma maior probabilidade de condenação do Arguido após produção da prova em Audiência, do que a sua absolvição, assim, recorrendo ao conceito matemático de probabilidade associado a um juízo de prognose, vg GERMANO MARQUES DA SILVA e JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, sendo possível afirmar que o juízo indiciário a formular no final de Inquérito ou Instrução será menos exigente que o formulado na Decisão Final;
III – quando existe uma possibilidade particularmente forte de uma futura condenação, quando dos elementos probatórios recolhidos em Inquérito e Instrução resultar a convicção de que foi cometido um crime, o Arguido foi o seu agente e por ele será condenado em Julgamento.
A I compreensão não se adequa ao texto legal porque «possibilidade razoável» é mais do que uma «possibilidade mínima» por aquela exigir uma «possibilidade mínima» dir-se-á «agravada» com um grau de verosimilhança qualificável não de «possível» mas de «verificável».
Ao texto da lei, como fundamento e limite do resultado de uma possibilidade de interpretação, parece adequar-se melhor a II compreensão como uma «posição razoável» que sugere a realização de uma ponderação entre as perspectivas de condenação versus absolvição futuras, mostrando-se apenas «razoável» quando a balança pender para a condenação.
Porém, hodiernamente já não se subscreve uma tal perspectiva dir-se-á perfunctória e redutora da compreensão da citada cláusula geral e abstracta com conceitos indeterminados, por haver que buscar sua compreensão na consideração doutras cláusulas gerais e abstractas com conceitos indeterminados quanto a «indícios» que por demais pululam no CPP para definir os níveis de convicção da decisão judiciária de acusar / pronunciar / condenar verbi gratie:
«4. A CRP e a lei distinguem vários graus de convicção no processo penal:
a. Prova além da presunção da inocência (artigo 32.°, n.º 2, da CRP tal como o artigo 6.°, § 2.°, da CEDH) b. Indícios fortes (artigo 27.°, n.° 3, al.ª b), da CRP, artigos 200.°, n.° 1, 201.°, n.° 1, e 202.°, n.° 1, al.ª a), do CPP) c. Sinais claros (artigo 256.°, n.°s 2 e 3, do CPP) d. Indícios fundados (artigo 174.°, n.° 5, al.ª a), do CPP) e. Indícios suficientes (artigos 277.°, n.° 2, 283.°, n.° 1, 285, n.° 2, 298.°, 302, n.° 4, 308.°, n.° 1, 391.°-A, n.° 1, do CPP) f. Prova bastante (artigo 277.°, n.° 1, do CPP) g. Indícios (artigos 171.°, n.° 1, 174.°, n.ºs 1 e 2, 246, n.° 5, al.ª a), do CPP) h. Imputação (artigos 1.º, al.ª f, 197.°, n.° 1, 198.°, n.° 1, e 199.°, n.° 1, do CPP) i. Suposição (artigo 210.° do CPP) j. Fundado receio (artigos 142.°, n.° 1, 227.°, n.° 1, 228.°, n.° 2, 257.°, n.° 2, al.ª b), do CPP), fundado motivo para recear (artigo 272.°, n.º 3 alª b), do CPP) k. Suspeitas fundadas (artigos 58.°, n.° 1, a), 250.°, 272.°, n.° 1, do CPP) l. Suspeito (artigo 27.°, n.° 1, al.ª g), da CRP, e artigo 1.º, al.ª e), do CPP)
5. A multiplicidade de expressões não corresponde a igual número de graus de convicção relevantes no processo penal. Efectivamente, distinguem-se quatro níveis de convicção no direito Português:
a. Indícios para além da presunção da inocência, correspondente ao crivo do direito internacional criminal de guilt beyond reasonable doubt b. Indícios fortes ou sinais “claros”, correspondente ao crivo da clear evidence ou dringende Tatver dacht c. Indícios suficientes ou prova bastante, correspondente ao crivo da reasonable suspicion ou probable cause ou hinreichende Tatverdacht d. Indícios, indícios fundados, suspeitas, suspeitas fundadas, fundado receio, imputação do crime, correspondente ao crivo da bona fide suspicion ou Anfangsvefrdacht
7. Indícios para além da presunção de inocência são as “razões” que sustentam e revelam uma convicção indubitável de que, de acordo com os elementos conhecidos no momento de prolação da sentença, um facto se verifica.
8. “Indícios fortes” são as “razões” que sustentam e revelam uma convicção indubitável de que, de acordo com os elementos conhecidos no momento de prolação de uma decisão interlocutória, um facto se verifica. Este grau de convicção é o mesmo que levaria à condenação se os elementos conhecidos no final do processo fossem os mesmos do momento da decisão interlocutória. A diferença entre um e outro reside apenas na variação da base dos elementos conhecidos no momento da decisão interlocutória e no momento da sentença. Por esta razão, o legislador só consagra o crivo dos indícios fortes para a aplicação das medidas cautelares mais graves, que implicam uma limitação de tal maneira intensa da liberdade que constituem, no plano fáctico, uma antecipação dos efeitos negativos da condenação pelos factos (artigo 193.°, n.° 1)
10. “Indícios suficientes” são as “razões” que sustentam e revelam uma convicção sobre a maior probabilidade de verificação de um facto do que a sua não verificação. Indícios suficientes dos factos da acusação são as “razões” que sustentam e revelam que é mais provável que os ditos factos se tenham verificado do que não se tenham verificado (assim também, FIGUEIREDO DIAS, 1974: 133, GERMANO MARQUES DA SILVA, 1990: 348, e 2000 b: 179, e, na jurisprudência, o caso paradigmático do acórdão do TRC, de 9.3.2005, in CJ, XXX, 2, 36, mas diferentemente NORONHA E SILVEIRA, 2004: 171, ADÉRITO TEIXEIRA, 2004: 160, e FERNANDA PALMA, 2005: 122, que se referem a uma probabilidade “forte”, “alta” ou “particularmente qualificada”).
12. “Indício”, “suspeita”, “receio” são “razões” que sustentam e revelam uma convicção sobre a probabilidade, mesmo mínima, de verificação de um facto. Esta “razão” liga a circunstância indiciadora e o facto a provar e é constituída por uma inferência lógica baseada numa máxima de experiência ou numa lei científica (PAOLO TONINI, 2007: 176)» [32].
Assim se apreende, por compreensão e não por uma impressão aritmética / matemática, um critério operativo de Acusação ou Pronúncia que se funda no juízo positivo de verificação de:
«I - Indícios suficientes…os elementos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, fazendo nascer a convicção de que virá a ser condenado; são vestígios, suspeitas, presunções, sinais, indicações, suficientes e bastantes para convencer de que há crime e de que alguém determinado é o responsável, de forma que, logicamente relacionados e conjugados formem um todo persuasivo da culpabilidade; enfim, os indícios suficientes consistem nos elementos de facto reunidos no inquérito (e na instrução), os quais, livremente analisados e apreciados, criam a convicção de que, mantendo-se em julgamento, terão sérias probabilidades de conduzir a uma condenação do arguido pelo crime que lhe é imputado.
II - A suficiência dos indícios está contida a mesma exigência de verdade requerida para o julgamento final, mas apreciada em face dos elementos probatórios e de convicção constantes do inquérito (e da instrução) que, pela sua natureza, poderão eventualmente permitir um juízo de convicção que não venha a ser confirmado em julgamento; mas se logo a este nível do juízo no plano dos factos se não puder antever a probabilidade de futura condenação, os indícios não são suficientes, não havendo prova bastante para a acusação (ou para a pronúncia).
III - O juízo sobre a suficiência dos indícios, feito com base na avaliação dos factos, na interpretação das suas intrínsecas correlações e na ponderação sobre a consistência das provas, contém sempre, contudo, necessariamente, uma margem (inescapável) de discricionariedade.
IV - Não se exigindo o juízo de certeza que a condenação impõe - a certeza processual para além de toda a dúvida razoável -, é mister, no entanto, que os factos revelados no inquérito ou na instrução apontem, se mantidos e contraditoriamente comprovados em audiência, para uma probabilidade sustentada de condenação» [33].
Ora mercê da substantiva consagração no “Título II | Direitos, Liberdades e Garantias”da “Parte I – Direitos e deveres fundamentais” de que “A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação” (art 26-1 da CRP), lembra-se que:
«Ao reunir num único artigo nada menos do que nove direitos distintos, a Constituição sublinha aquilo que, para além da sua diversidade, lhes confere carácter comum, e que consiste em todos eles estarem directamente ao serviço da protecção da esfera nuclear das pessoas e da sua vida, abarcando fundamentalmente aquilo que a literatura juscivilista designa por direitos de personalidade (cfr. AcTC n° 110/05). Não é por acaso que este preceito surge imediatamente a seguir ao direito à vida e ao direito à integridade pessoal (arts. 24° e 25°) e que a sua epígrafe refere «outros direitos pessoais», o que quer dizer: outros, além da vida e da integridade pessoal, mas integrantes da mesma categoria específica. Daí que, tal como esses, alguns destes direitos de personalidade gozem de protecção penal e que eles constituam igualmente limite de outros direitos fundamentais, que com eles possam conflituar (v. g., limite à liberdade de informação e de imprensa)» [34].
«VII. O direito ao bom nome e reputação (n° 1) consiste essencialmente no direito a não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social mediante imputação feita por outrem, bem como no direito a defender-se dessa ofensa e a obter a competente reparação (cfr. Cód. Penal, arts. 164° e 165°) [35]. Neste sentido, este direito constitui um limite para outros direitos (designadamente, a liberdade de informação e de imprensa). Tal como sucede em relação a outros direitos enunciados neste artigo, o âmbito do direito ao bom nome e reputação não é menos intenso na esfera política do que na esfera pessoal, devendo ser harmonizado e balanceado com a liberdade do debate político e com a liberdade de crítica política, que são inerentes à democracia. Neste aspecto, o TEDH tem adoptado um critério assaz liberal na protecção da liberdade de expressão e opinião e do direito de crítica politica em desfavor do bom nome e da reputação política dos titulares de cargos políticos ou dos agentes políticos. No contexto constitucional português, os direitos em colisão devem considerar-se como princípios susceptíveis de ponderação ou balanceamento nos casos concretos, afastando-se qualquer ideia de supra ou infravaloração abstracta» [36].
Ora a tutela penal dos «direitos ao bom nome e reputação» é asseverada civilmente em sede art 70 do Código Civil conforme o qual «A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral», sendo nula «Toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade …, se for contrária aos princípios da ordem pública» ex vi art 81-1 daquele, mas igualmente pelas incriminações, em sede de «Crimes contra a honra», da «difamação» (epigrafe do art 180-1) conforme o qual «Quem [com dolo], dirigindo-se a um terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido com pena de prisão [de um] até seis meses ou com pena de multa [de 10] até 240 dias” [conforme (ademais) arts 41-1 e 47-1], da «injúria» (epígrafe do art 181-1) conforme o qual «Quem [com dolo] injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração, é punido com pena de prisão [de um] até três meses ou com pena de multa [de 10] até 120 dias» [conforme (ademais) arts 41-1 e 47-1], às «… verbais … [equiparando-se] … as feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão» (art 182) e sendo qualificáveis «calúnia» (epigrafe do art 183-1-b) «Tratando-se da imputação de factos, se averiguar que o agente conhecia a falsidade da imputação; [caso em que] as penas da difamação ou da injúria são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo» (art 183-1-b, estes todos do CP de 15.9.2007).
Ora após expender sobre (e refutar / rejeitar) a «concepção fáctica de honra» bem assim a «concepção normativa de honra» e ainda o «conceito normativo-social de honra» e também o «conceito normativo-pessoal de honra», a propósito da subscrita «concepção dual de honra» expendeu JOSÉ DE FARIA COSTA que:
«§ 14 Em face destas dificuldades [37], não surpreende que a doutrina dominante tempere a concepção normativa com uma dimensão fáctica (concepção dual): a honra é vista assim como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior. Na sintética formulação do Supremo Tribunal Federal alemão, o que se protege “é a honra interior inerente à pessoa enquanto portadora (Träger) de valores espirituais e morais e, para além disso, a valência (Geltung) deles decorrente, a sua boa reputação no seio da comunidade. Fundamento essencial da honra interior e, desta forma, núcleo da capacidade de honra do indivíduo, é a irrenunciável dignidade pessoal (Personenwürde) que lhe pertence desde o nascimento e cuja inviolabilidade a Lei Fundamental reconhece no art. 1 (...). Da honra interior decorre a pretensão jurídica, criminalmente protegida, de cada um a que nem a sua honra interior nem a sua boa reputação exterior sejam minimizadas ou mesmo totalmente desrespeitadas” (BGH, 18-11-1957, JZ 1958 617).
«§ 15 Uma conclusão que, acentue-se desde já, é a única compatível com a nossa própria lei. Na verdade, e ao contrário do que acontece noutras legislações, o ordenamento jurídico-penal português, na linha da tradição anterior e, sobretudo, em inteira consonância com a ordem constitucional, alarga a tutela da honra também à consideração ou reputação exteriores. Forma de perceber as coisas que é posta em destaque e salientada por Figueiredo Dias quando escreve: “a jurisprudência e a doutrina jurídico-penais portuguesas têm correctamente recusado sempre qualquer tendência para uma interpretação restritiva do bem jurídico ‘honra’, que o faça contrastar com o conceito de ‘consideração’ (...) ou com os conceitos jurídico-constitucionais de ‘bom nome’ e de ‘reputação’. Nomeadamente, nunca teve entre nós aceitação a restrição da ‘honra’ ao conjunto de qualidades relativas à personalidade moral, ficando de fora a valoração social dessa mesma personalidade; ou a distinção entre opinião subjectiva e opinião objectiva sobre o conjunto das qualidades morais e sociais da pessoa; ou a defesa de um conceito quer puramente fáctico, quer — no outro extremo — estritamente normativo” (FIGUEIREDO DIAS, RLJ 115° 105)» [38].
Decorridos cinco anos, mais expendeu JOSÉ DE FARIA COSTA: «O facto de a honra ser um bem jurídico pessoalíssimo e imaterial, a que não temos a menor dúvida em continuar a assacar a dignidade penal, mas um bem jurídico, apesar de tudo, de menor densidade axiológica do que o grosso daqueles outros que a tutela do ser impõe. Uma prova evidente de tal realidade pode encontrar-se nas molduras penais - de limites extraordinariamente baixos - que o legislador considerou adequadas para a punição das ofensas à honra. E a explicação para tal “estreitamento” da honra enquanto bem jurídico, para uma certa perda da sua importância relativa, pode justificar-se, segundo cremos, de diferentes modos e por diferentes vias. Por um lado, julgamos poder afirmar-se uma sua verdadeira erosão interna, associada à autonomização de outros bens jurídicos que até algumas décadas estavam misturados com essa pretensão a ser tratado com respeito em nome da dignidade humana que é o núcleo daquilo a que chamamos honra. Referimo-nos a valores como a privacidade, a intimidade ou a imagem, que hoje já têm expressão constitucional e específica protecção através do direito penal. Por outro lado, cremos ser também indesmentível a erosão externa, a que a honra tem sido sujeita, quer por força da banalização dos ataques que sobre ela impendem - tão potenciados pela explosão dos meios de comunicação social e pela generalização do uso da internet, quer por força da consequente consciencialização colectiva em torno do carácter inelutável de tais agressões e da eventual imprestabilidade da reacção criminal» [39].
Para precisar objectiva e subjectivamente o quid incriminado «Difamação» pelo art 180-1, considera-se a judiciosa síntese do Conselheiro Jubilado VICTOR DE SÁ PEREIRA e do Advogado ALEXANDRE LAFAYETTE, Código Penal Anotado e Comentado, Quid Juiris, 2008, pgs 483 a 485: 4. Distingue-se entre difamação e injúria (artigo 181.°) com base na «imputação [directa ou indirecta] de um facto, mesmo sob a forma de suspeita» ou na «formulação [directa ou indirecta] de um juízo», este e aquela «ofensivos da honra ou consideração», ou ainda na mera «reprodução [directa ou indirecta] de tal imputação ou juízo». Se o agente se dirige a terceiro, há imputação, juízo ou reprodução em via indirecta e ocorre difamação. Se, ao invés, o agente se dirige ao sujeito passivo, por «imputação de factos, mesmo sob a forma de suspeita» ou por «palavras» (que podem traduzir-se em juízo ou reprodução), estas e aqueles «ofensivos da honra ou consideração», age em via directa e temos injúria. Em nenhum destes casos, de resto, a lei exige aquilo que se costuma designar por dolo específico, isto é, animus diffamandi (cfr. nota 2. ao artigo seguinte).
5. Não há mais lugar para o critério do Código de 1886, segundo o qual existiria difamação no caso de ofensa com imputação de factos e aconteceria injúria na hipótese de ofensa sem imputação de factos. Hoje, na verdade, o agente procede «perante terceiros sem a presença do ofendido» e há difamação, ou o agente procede «perante o ofendido» (situação onde se enquadra ou pode enquadrar-se a actuação «perante terceiro com a presença do ofendido», que vale actuação «perante terceiro e perante o ofendido»») e existe injúria. Voltar-se-á a este tema na análise do artigo seguinte, cujas notas 7., 9. e 10. devem ser aqui consideradas (cfr. nota 2., também ao artigo seguinte).
6. Constitui um facto aquilo que é ou acontece, «na medida em que se considera como um dado real da experiência». Cura-se de algo que, pois, se assume «como um juízo de afirmação sobre a realidade exterior, como um juízo de existência». O juízo, por sua vez, em geral e na acepção adoptada pela lei, há-de ser entendido «não como apreciação relativa à existência de uma ideia ou de uma coisa mas ao seu valor» (ibidem, 609). Equiparados o facto e o juízo (n.° 1), poderia considerar-se despida de interesse a distinção apontada, mas há vantagem em que se saiba separar um do outro «mormente quando se tiver que lidar com a específica causa de exclusão do ilícito em que a noção de facto constitui um ponto nuclear (“imputação de facto relativo à intimidade da vida privada e familiar” - art.° 180.°, n.° 3)» (ibidem, 611; cfr. n.° 2).
7. A suspeita é essencialmente cobarde, traiçoeira, ferina. «Qualquer aprendiz de maldecência e muito particularmente o senso comum sabem que a insinuação, as meias verdades, a suspeita, o inconclusivo são a maneira mais conseguida de ofender quem quer que seja» (ibidem, 612). E a lei, claro, também o sabe.
11. Segundo o ac. RC de 13 de Junho de 2001, «o crime de difamação é um crime de perigo abstracto-concreto, isto é, um crime em que basta a possibilidade de ofensa à honra e consideração, sem necessidade de concretização do perigo, mas em que tal perigo terá de ser concretamente possível» (CJ, XXVI, 3/53). E em sentido idêntico se pronunciou o ac. RP de 2 de Março de 2005, onde se decidiu: «Os crimes de difamação e injúria são crimes de perigo abstracto-concreto, pois que o perigo não surge na lei como simples motivo da incriminação, nem é aí incluído como facto típico, antes está referido ao modo de ser da acção típica, a qual encerra em si mesma uma genérica aptidão para produzir o evento danoso, que é a ofensa à honra e consideração alheias. Em tais crimes o dolo basta-se com a consciência da genérica perigosidade da conduta ou do meio da acção previstos nas respectivas normas genéricas incriminadoras» (CJ, XXX, 2/201; cfr. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal, I, 2.ª, edição, 3 1 0/3 1 1). Por outro lado, o ac. STJ n.° 5/96, de 14 de Março de 1996, que ficou transcrito na nota 3. ao artigo 119.°, pronunciou-se, justamente, no sentido de que «a difamação não tem a natureza de crime permanente».
13. A difamação é um crime doloso, onde é possível o dolo eventual. De qualquer maneira, bastando o chamado dolo genérico (cfr., supra, 4.), podem o animus jocandi (intuito de gracejar), o animus consulendi (objectivo de advertir ou informar), o animus corrigendi (propósito de admoestar) e o animus deffendendi (escopo de defesa) atingir um grau tal que exclua toda e qualquer eficácia ofensiva. Mais difícil há-de ser, aliás, que um tal resultado se extraia do animus narrandi (fim de narrar ou descrever), certo como a lei incrimina a simples reprodução. E tudo isto há-de aferir-se, não se impondo qualquer dolo específico (cfr., supra, 4.), além do mais à luz da consideração de que o agente teria tido (ou não) ao seu alcance um modo diverso de exprimir-se (cfr. nota 9. ao artigo seguinte)» [40].
Assim sendo apenas segundo estrito prisma do Direito Criminal / Penal, mais cumpre relevar que a Ordem Jurídica também tutela - ao nível do Direito Constitucional e em sede de «Direitos, Liberdades e Garantias pessoais» - genericamente – a «Liberdade de expressão e informação» ex vi art 37 da CRP e – especificamente – a «Liberdade de imprensa…» ex vi art 38 da CRP – de cujos articulados ressuma como enquadramento da apreciação para decisão do Recurso sub judice que «Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações» - art 37-1 da CRP – que não é um «direito absoluto» mas uma «liberdade com responsabilidade» porque adiante a CRP previne que «As infracções cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal ou do ilícito de mera ordenação social, sendo a sua apreciação respectivamente da competência dos tribunais judiciais ou de entidade administrativa independente, nos termos da lei» - art 37-3 da CRP - e assim sendo «garantida a liberdade de imprensa» - art 38-1 da CRP – que «implica: A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos respectivos órgãos de comunicação social, salvo quando tiverem natureza doutrinária ou confessional» - art 38-2-a da CRP.
Enquanto o «direito de informação» do art 37-1-II da CRP «integra três níveis: o direito «de informar», o direito «de se informar», e o direito «de ser informado. O primeiro consiste, desde logo, na liberdade de transmitir ou comunicar informações a outrem, de as difundir sem impedimentos; mas pode também revestir uma forma positiva, enquanto direito a informar, ou seja, direito a meios para informar. O direito de se informar consiste, designadamente, na liberdade de recolha de informação, de procura de fontes de informação, isto é, no direito de não ser impedido de se informar, embora sejam admissíveis algumas restrições na recolha de informações armazenadas em certos arquivos (ex: arquivos secretos dos serviços de informação). Finalmente, o direito a ser informado é a versão positiva do direito de se informar, consistindo num direito a ser mantido adequada e verdadeiramente informado, desde logo pelos meios de comunicação … e pelos poderes públicos …., sem esquecer outros direitos específicos à informação reconhecidos na Constituição, directa … ou indirectamente» [41], quanto à «liberdade de imprensa» do art 38-1 observa-se como «sintomático que as primeiras especificações … sejam os direitos dos jornalistas» entre os quais a «liberdade de expressão e criação» que «consubstancia a chamada liberdade interna de imprensa» como um dos «dois direitos «internos» dos jornalistas» [42] do art 38-2-a-I-II da CRP.
Ora, «Perante a informação, na perspectiva da comunicação social, patenteiam-se nítidas as diferenças de posição dos cidadãos em geral e dos jornalistas em particular. | Quanto aos cidadãos em geral, aquilo que sobretudo importa é o direito de se informar e o direito a serem informados. Diversamente, nos jornalistas, que são os profissionais da informação, não se afigura possível dissociar esses direitos e o direito de informar; verificam-se uma conjugação, uma interpenetração ou, de certa maneira, uma tensão entre esses três aspectos. | Nos cidadãos em geral, o direito de informar surge, antes de mais, como um direito negativo, o direito de não ter impedimentos ou discriminações que não se sujeitarem a sanções por procurarem informação. Para os jornalistas, não é apenas um direito negativo; é também um direito positivo, e nesta dupla face vai, justamente, encontrar-se o direito de acesso às fontes de informação (como pressuposto do direito de informar) para, depois, poderem informar. | O direito de informar manifesta-se, outrossim, de modo diferente nos cidadãos e nos jornalistas. Naqueles, vai a par ou em conjunto com a liberdade de expressão. Nos jornalistas, é muito mais do que isso: é um direito de expressão e um direito de criação; e é um direito oponível não apenas ao Estado mas também à empresa de comunicação social em que trabalhem» [43] para asseverar a realização na Comunidade ou Sociedade da «liberdade de expressão do pensamento» que, «além de envolver um princípio objectivo que atravessa toda a ordem constitucional (Ac. n.° 292/2008), na sua dimensão subjectiva, é ainda uma situação jurídica complexa.
a) Traduzindo uma das mais profundas exigências da pessoa humana, a liberdade de expressão tem por objecto a livre comunicação espiritual aos outros do próprio pensamento. Para o efeito, deve entender-se que: (i) a Iivre comunicação do pensamento abrange igualmente a liberdade negativa de pensamento, entendida como o direito ao silêncio e o direito a não manifestar exteriormente opiniões, ideias ou pensamentos; (ii) o pensamento objecto da expressão não tem de revestir certas características particulares, designadamente as da veracidade ou da inteligibilidade, podendo consistir na manifestação de conteúdos comunicativos incompreensíveis; (iii) certas formas de acção, bem como o modo da expressão (neste sentido, veja-se a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de 3 de Fevereiro de 2009, no caso Women on Waves e outros c. Portugal) podem considerar-se protegidas pela liberdade de expressão do pensamento (nomeadamente as acções simbólicas); (iv) o pensamento tem de ser, de alguma forma, atribuível ao sujeito que se expressa, não estando defendida a difusão do pensamento juridicamente pertencente a um terceiro; (v) no pensamento, cabem as ideias, as opiniões, os juízos, a narração de factos ou casos da vida, os comentários, a propaganda, etc.; (vi) na liberdade de expressão não pode caber a divulgação de notícias falsas, isto é, o pensamento que resulte subjectivamente falso (a mentira, o dolo ou a fraude), mas já o objectivamente erróneo resulta exercício lícito da liberdade de expressão, o qual só pode ser combatido ou por manifestações contrárias ou pelo exercício do direito de rectificação (cfr. JOSÉ DE MELO ALENDRINO, Estatuto constitucional, págs. 84 e segs.)» [44].
Convoca-se assim a «matéria particularmente sensível dos limites e das afectações à liberdade de expressão (para uma sistemática dos limites e das restrições, JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, A estruturação do sistema de direitos, liberdades e garantias na Constituição portuguesa, vol. II — Construção dogmática, Coimbra, 2006, págs. 424-482, com amplas indicações), há absoluta necessidade de distinguir pelo menos quatro realidades (às quais se aplicam modelos de análise, regimes jurídicos e metodologias diferentes): os limites directos, os limites especiais, as restrições legislativas e as situações de conflito de direitos.
— Os limites directos da liberdade de expressão correspondem a normas constitucionais que excluem imediatamente uma certa parcela do direito (sobre o conceito de limite, JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, Direitos Fundamentais — Introdução geral, Estoril, 2007, págs. 111 e segs.); na constituição, o único limite directo da liberdade de expressão é a exigência de que o pensamento seja referido a quem se expressa (consultar supra, Anotação IV), não estando protegida a expressão do pensamento alheio ou o plágio, por exemplo; não havendo razão para invocar relativamente à liberdade de expressão, como chegou a ser feito (Acs. n.ºs 81/84, 1 1/85), a doutrina dos limites imanentes (abandonada nesta matéria pelo menos desde o Ac. n.° 113/97), tão-pouco tem sentido o apelo à doutrina da limitação decorrente das leis gerais ou por recurso ao artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (como extemporaneamente se esboçou no Ac. n.° 292/2008).
— No entanto, há formas constitucionalmente protegidas de expressão que conhecem limites especiais, como sucede no caso da expressão publicitária, uma vez que o artigo 60.°, n.º 2, exclui a publicidade oculta, indirecta ou dolosa (Ac. n.° 633/2006); por outro lado, a Constituição admite expressamente que a liberdade de expressão de certas categorias de pessoas possa ser restringida, na medida das exigências próprias das funções desempenhadas (Acs. n.° 103/87, 23 1/2000, 372/2003, 384/2003), podendo para o efeito considerar-se a norma que prevê esse estatuto especial também como um limite especial (artigo 270.°).
- Situação diferente é — para a protecção de outros bens, valores ou interesses constitucionais primários (como a igual dignidade das pessoas, a vida, a integridade moral, a honra, a imagem, a privacidade, o Estado de direito democrático) — a das normas penais (artigos l 80.°, 181.°, 192.°, 297.°, 298.°, 326.° do Código Penal) que punem a difamação, a injúria, a devassa da vida privada, a instigação pública a um crime, o incitamento à guerra, o incitamento à violência (cfr. Acs. Nºs 67/99, 201/2004, 605/2007); estas afectações da liberdade de expressão (que devem ser vistas como excepção, e não como regra), ainda que em geral possam presumir-se legítimas, não estão isentas de escrutínio, carecendo de uma devida justificação, nos termos do artigo 18.°, n.°s 2 e 3 (por todos, sobre a problemática do controlo das aí chamadas restrições em sentido amplo, JORGE REIS NOVAIS, As restrições aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição, Coimbra, 2003, págs. 639 e segs., 821 e segs.); são aliás muito duvidosas incriminações como as da ofensa a organismo público, do ultrage a símbolos estrangeiros ou do ultrage a símbolos nacionais e regionais, previstas nos artigos 187.°, 323.° e 332.° do Código Penal (sobre o tópico, JoÃO RAPOSO, O crime de “ultrage aos símbolos nacionais” nos direitos português e norte-americano. Uma análise comparatística sobre as questões do bem jurídico, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2003, págs. 795-834; JORGE REIS NOVAIS, As restrições, págs. 942 e segs.).
— Uma quarta hipótese é a de conflito, num caso concreto, entre a liberdade de expressão e outro ou outros direitos na esfera jurídica de outro titular (ou eventualmente com um interesse jurídico-constitucional objectivo). Não estando expressamente regulada pela Constituição, requer esta hipótese (quando, para encontrar a regra do caso, não seja suficiente o recurso às soluções legais harmonizadoras) uma metodologia que tem de levar em consideração um leque variável de factores (cfr. JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, Direitos Fundamentais, pág. 117), não dispensando muitas vezes [vejam-se as fórmulas presentes, por exemplo, nos artigos 32.°, 34.°, 35º, 36.°, n.° 1, ou 180.°, n.° 2, alínea a), do Código Penal] a ponderação dos bens ou interesses em conflito (Acs. n.0s 1 13/97, 254/99 e 407/2007).
Todavia, são poucos os direitos fundamentais e menos ainda os interesses objectivos que podem legitimar uma afectação da liberdade de expressão nas duas hipóteses afinal relevantes (as últimas duas assinaladas), tanto mais por ser muito difícil de demonstrar — como se tem visto no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (consultar infra, Anotação X) — que um outro bem ou interesse goze à partida (ou mesmo no caso concreto) de um peso superior ao da liberdade de expressão; com efeito, não há equivalência entre a ideia de hierarquia entre os direitos fundamentais (normalmente recusada: para uma discussão do assunto, JOSÉ DE MILO ALEXANDRINO, A estruturação do sistema, vol. II, págs. 398-399) e a ideia de maior ou menor importância entre os bens jusfundamentais (que não pode deixar de ser afirmada)» [45].
É que «As infracções cometidas no exercício das liberdades de expressão e de informação podem envolver, em razão da sua gravidade, responsabilidade penal ou responsabilidade contra-ordenacional (n.° 3).
Como primeira nota sobre esta matéria, ainda que possam colocar-se problemas delicados (como no chamado negacionismo, na utilização negativa de símbolos religiosos, no discurso do ódio ou na expressão de ideias racistas ou de qualquer modo extremistas, por ostensivamente contrárias aos valores constitucionais fundantes), tem de se reconhecer que a Constituição exclui inequivocamente a existência de qualquer delito de opinião (cfr. J. J. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição, I, pág. 575).
Em segundo lugar, subsiste em alguma doutrina e jurisprudência uma insistente e perniciosa linha de argumentação (na realidade, trata-se de uma linha de continuidade face a concepções autoritárias da ideia de abuso da liberdade de imprensa, que era tradicional nos ordenamentos de matriz francesa). Essa Iinha de argumentação (que ainda incorre no vício de sobrepor os limites do direito de informação aos limites da liberdade de expressão) envolve dois momentos: o primeiro é o de, na base do n.° 3, postular os limites da liberdade de expressão (quando esses limites têm de ser evidenciados e justificados); o segundo é o de diminuir o peso da própria liberdade de pensamento e de expressão (não só por não ser absoluta, como então se enfatiza, mas pelo facto de a expressão poder ser objecto de perseguição penal). O erro de perspectiva e sobretudo as consequências derivadas desse erro são evidentes e graves.
São evidentes, porque o n.° 3 foi ainda pensado para a salvaguarda da liberdade (e não para a limitação da liberdade), prevendo uma dupla garantia: (i) “garantia substantiva: a sujeição aos princípios gerais de Direito criminal ou do ilícito de mera ordenação social, o que, por exemplo, veda a existência de um regime especial de crimes de liberdade de imprensa; e (ii) garantia adjectiva: o julgamento das infracções criminais pelos tribunais judiciais — que nunca podem ser tribunais com competência exclusiva para o seu julgamento (artigo 209.°, n.° 4) — e apreciação das contra-ordenações por autoridade independente (artigo 39.°) com possibilidade de recurso da decisão, nos termos gerais, para os tribunais” (cfr. JORGE MIRANDA, Artigo 37.°, págs. 430-431).
São graves, porque levam a que Portugal (ao contrário da Espanha, por exemplo) seja um dos países pertencentes ao Conselho da Europa que revela possuir um dos padrões mais baixos de tutela jurisdicional das liberdades de expressão, de informação e de imprensa, na medida em que o Estado português foi condenado nas oito das dez queixas apresentadas nessa matéria junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (cfr. FRANCISCO TEIXEIRA DA MOTA, O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, págs. 39-84). Por outras palavras, os tribunais portugueses não têm feito prevalecer, como deviam, os interesses da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa sobre os bens e interesses a que dão primazia (habitualmente, a honra, o bom nome ou a vida privada). Justamente condenado, por desconhecer a importância da liberdade expressão, resultando esse padrão tanto da jurisprudência ordinária (sete das oito condenações resultam de decisões finais oriundas dos tribunais comuns), como da jurisprudência constitucional (entre outros, já neste século, vejam-se os Acs. n.°’ 249/2000, 348/2008, 605/2007 e 292/2008). De resto, até hoje, o Tribunal Constitucional português ainda não proferiu uma decisão verdadeiramente marcante sobre o lugar e o significado da liberdade de expressão do pensamento no sistema constitucional (merece todavia leitura, sobre uma das dimensões dessa liberdade, o voto de vencido da Conselheira MARIA LÚCIA AMARAL no Ac. n.° 292/2008)[46].
E assim importa à delimitação do objecto do crime doloso de difamação por meio de abuso de liberdade de imprensa a consideração da Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem do art 10-1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que constitui «direito supra ordinário» ut art 8-2 da CRP conforme o qual «As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial [47] e enquanto vincularem internacionalmente o Estado português» pois que – quanto a «força jurídica (ou o valor ou a eficácia) das normas de Direito Internacional recebidas na ordem interna frente às força jurídica (ou ao valor ou à eficácia) das normas de produção interna» - «pode hesitar-se entre reconhecer-lhes grau idêntico ao das normas constitucionais ou grau infra constitucional, conquanto supra legal» [48] mormente tendo presente que a Lei 48/2007 de 29/8 inovou a vigência em 15.9.2007 - como fundamento do Recurso Extraordinário de Revisão em processo penal de uma condenação criminal e conexa civil - «Uma sentença vinculativa do Estado português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça» como já aplicou em caso de «(ab)uso de liberdade de imprensa» no processo 709/97.4JAPRT-A.P1 deste TRP em que se decidiu que «I – O Estado Português ao ratificar a CEDH recebeu-a como direito convencional para vigorar no seu direito interno. II – Respeitar uma decisão do TEDH é cumpri-la, razão pela qual a lei portuguesa admite a revisão de sentença transitada em julgado sempre que uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça [art. 449.º, n.º 1, al. g), do CPP]. III – Assim, não há qualquer contradição se o TEDH, com base nos factos dados como provados por uma sentença portuguesa, concluir pela violação de norma da Convenção e condenar o Estado Português a pagar uma indemnização; e, no seguimento de tal condenação, se proceder à revisão da sentença proferida, ajustando a nova decisão à interpretação decidida pelo TEDH» [49] que «considerou violado o art.º 10º CEDH – violação do direito de liberdade de expressão através da imprensa, com o sancionamento penal do jornalista e sua entidade patronal, porque “ não representava um meio razoavelmente proporcional ao prosseguimento do fim legitimo visado [contributo da imprensa nas discussões de problemas de interesse geral] tendo em conta o interesse da sociedade democrática em assegurar e manter a liberdade da imprensa …” o que se traduz no fundo em considerar legitima a actuação dos arguidos/ demandados e não passível de sancionamento penal, à luz daquela liberdade» [50] cujo objecto é delimitado pela conjugação do art 10-1 com os arts 10-2 e 17 conforme os quais:
«Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades publicas e sem considerações de fronteiras. O presente artigo não impede que os Estados submetam as empresas de radiodifusão, de cinematografia ou de televisão a um regime de autorização prévia» - art 10-1 da CEDH;
«O exercício desta liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial» - art 10-2 da DEDH. Porém, sob «Proibição do abuso de direito»:
«Nenhuma das disposições da presente Convenção se pode interpretar no sentido de implicar para um Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de se dedicar a actividade ou praticar actos em ordem à destruição dos direitos ou liberdades reconhecidas na presente Convenção ou a maiores limitações de tais direitos e liberdades do que as previstas na Convenção» - art 17 da CEDH.
Assim é - quanto à compreensão que o TEDH tem feito do art 10-1 da CEDH - que «valoriza enormemente o papel da imprensa e da liberdade de imprensa. Neste campo diminui o âmbito de apreciação dos Estados. A imprensa desempenha um papel essencial no bom funcionamento da democracia, exercendo o papel de «cão de guarda» da sociedade democrática. E através da liberdade de imprensa que a opinião pública conhece e julga as ideias e atitudes dos dirigentes políticos. Os limites de critica admissível são maiores relativamente a um político, visado nessa qualidade, do que relativamente a um simples particular. O político sabe que os seus actos e palavras são atentamente observados pelos jornalistas e cidadãos, especialmente quando profere declarações que são susceptíveis de crítica. Os funcionários públicos também estão sujeitos a crítica, a meio caminho entre os políticos e os privados» [51].
E - quanto à compreensão que o TEDH tem feito do art 10-2 da CEDH- que «as ingerências nesta liberdade, como as previstas no art° 10°, n° 2, exigem uma interpretação restritiva e devem corresponder a uma «necessidade social—imperiosa», devendo essas ingerências ser «proporcionadas ao fim em vista». A necessidade da restrição a tal liberdade é examinada à luz do caso concreto, que tem em conta o conteúdo das declarações, o seu contexto, a natureza e a severidade das penas aplicadas» [52].
Assim elucidados os sucessivos parâmetros nacionais – de direito processual e de direito substantivo legal e supra legal- e internacionais – a CEDH objecto pela CRP de recepção directa e imediata como direito interno supralegal - determinantes de uma delimitação estrita do objecto do crime doloso de difamação pelo objecto da liberdade de imprensa que é tida nacional e internacionalmente como fundamental numa Sociedade Democrática na medida em que, «Constantemente chamado a tomar decisões políticas, o cidadão tem de estar completamente informado, conhecer as opiniões dos outros e estar em condições de as confrontar criticamente. Ora é precisamente a imprensa que mantém esta permanente discussão em acção. Produz informações, toma ela própria posição sobre as questões, e actua, por isso, como força orientadora dos debates públicos... Por outro lado, a imprensa funciona como instância de ligação e controlo entre o povo e os representantes eleitos, assegurando a transparência dos estados e movimentos da opinião pública, mediatizando, por isso, decisões políticas atentas às representações e aspirações colectivas» [53], claro está que o Recurso não merece provimento por se afigurar que: O binómio título «C… pensa com as pernas» mais os segmentos «A agressão de que foi alvo a jornalista do P…, B… (...) trata-se de um ato reprovável praticado por um cobarde com nome: C…, não conhecerá o Dicionário do Diabo. Está lá uma das notáveis definições de cobardia: “Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas”. Isto é: foge dos problemas (...) De uma assentada escaparam-lhe dois “tachos” com a mesma facilidade com que a areia escapa por entre os dedos das mãos» do artigo de D… no P… em papel de 11.11.2012 e o segmento mais pequeno «X… acolitado por C…, presidente de …, um “valentaço” que agride B…, minha camarada de trabalho durante largos anos no P…, preocupa-se em atropelar toda a gente para chegar aos Paços do Concelho de Matosinhos» do artigo de G… no P… em papel de 16.11.2012 – cujos teores e autorias se afiguram inquestionáveis tal como o convencimento da ocorrência determinante da sua elaboração pois que o Assistente ora Recorrente nem se afoitou a impetrar o crime doloso de «calúnia» - é manifesto que se inserem em «artigos (claramente) de opinião» - que têm como «pano de fundo» a expressão de lutas político-pessoais-partidárias no Município de Matosinhos - como um qualquer «homem médio» imediatamente se apercebe quando confrontado como «declaratário normal» com o teor de cada um deles cuja expressão linguística peca – ostensivamente no caso do artigo de 11.11.2012 - pelo exagero que não eleva o nível redactorial expectável do P… – assim a afectação da sensibibilidade pessoal do Assistente visado pelos artigos - mas que objectivamente – tal o critério de aferição para precludir a inconstitucionalidade da aplicação a uns e não a outros da incriminação da difamação conforme a sensibilidade de uns versus a de outros «leve a melhor» - ainda se contém num exercício legítimo do «direito de informar» os leitores do P… em papel por utilização de modo capaz de despertar a atenção para o caso de um «homem médio» que ajuizará não só o que se disse mas também - e quantas vezes des/favoravelmente - o como se disse uma vez que a credibilidade do conteúdo exposto é tida como razão directa também da forma ou modo da exposição de tal conteúdo, ao menos no processo comunicacional indirecto e difuso como a edição de um «artigo de opinião» em que a relação declarante-declaratário é impessoal.
Com efeito, afigura-se que os título e segmentos citados dos dois artigos sub judice não têm carga linguística desvaliosa como aquela em causa no Acórdão do TEDU de 23.10.2007 no caso Almeida Azevedo com Portugal censurado pela violação do art 10 da CEDH por «punir criminalmente e/ou condenar em indemnização civil um presidente de secção local dum partido da oposição numa autarquia (Arouca) que critica o presidente da Câmara local num jornal local e o apoda de “mentiroso completo e sem complexos”, de “falta de pudor inqualificável” de “intolerante e perseguidor”. A propósito de um panfleto a favor de determinada via. O debate em questão sobre o traçado da via tinha interesse geral bem como versava sobre a qualidade do ambiente. O Tribunal Europeu declarou que as expressões eram provocatórias e deselegantes. Porém, o presidente em causa intervinha como homem político e não como simples cidadão, pelo que deveria dar mostras de grande tolerância, especialmente quando as suas declarações se prestavam a críticas. Tão expressões não são excessivas tendo em conta as declarações virulentas do adversário e o contexto de forte polémica relativamente à via em questão» [54].
Em suma, no reconhecimento não só de que «A liberdade de informação deve atender às regras de prudência, circunspecção, objectividade e sinceridade na expressão no pensamento» que consubstanciam formal e substancialmente o conteúdo informado - descritiva ou narrativa, opinativa ou valorativamente - mas também de que «A liberdade jornalística inclui o recurso a uma certa dose de exagero, e até de provocação, bem como a escolha dos meios técnicos a utilizar e o modo de expressão» - a impressividade sem uma ofensividade censurável por desnecessidade ou gratuidade - e até de que «Os jornalistas não são obrigados a distanciar-se do conteúdo de citações que possam provocar ou pôr em causa a honra de terceiros» [55] para asseverar uma «liberdade de informação» que se quer autêntica e não aparente,
DECIDINDO
1. Nega-se provimento ao Recurso do Assistente C….
2. Decaída in totum condenam-o em 5 UC de taxa de justiça ex vi arts 513-1 do CPP e 8-9 e tabela III do RCP.
3. Notifiquem-se os Sujeitos Processuais conforme art 425-6 do CPP.
4. Transitado, remeta-se ao Juiz 5 da 1ª Secção de Instrução Criminal da Instância Central do Porto, para execução do decidido.
Porto,18 de Março de 2015
Castela Rio
Lígia Figueiredo ___________
[1] Com origem em RDA do «Auto de Denúncia» de 12.11.2012 de B… versus C…. No sobredito Inquérito 1469/… foram incorporados a fls:
62 sgs o Inquérito 2480/13.5TAMTS com origem em RDA da «Participação Criminal» de 02.5.2013 de C… versus B…;
86 sgs o Inquérito 2482/13.1TAMTS com origem em RDA da «Participação Criminal» de 02.5.2013 de C… versus D…, E…, H…, F…, I… e G….
[2] Nascida a 14.11.1975 em França, casada, jornalista e residente em … – GDM,
infra id por B… unicamente para simplificação de exposição.
[3] Nascido a 11.6.1952 em Vila Real, casado, aposentado e residente em … - MTS,
infra id por C… unicamente para simplificação de exposição.
[4] Nascido 20.8.1970 em Valpaços, casado, jornalista e residente em … – VNG,
infra id por D… unicamente para simplificação de exposição.
[5] Nascido a 09.11.1951 no Porto, casado, jornalista, Director do P… e residente no Porto,
infra id por E… unicamente para simplificação de exposição.
[6] Nascido a 19.8.1956 em Angola, casado, jornalista, Director-adjunto do P… e residente no Porto,
infra id por F… unicamente para simplificação de exposição.
[7] Nascido a 23.4.1942 no Porto, casado, jornalista e residente no Porto, infra id por G… unicamente para simplificação de exposição.
[8] Nascido a 12.12.1964 no Porto, solteiro, jornalista e Sub-director do P… e residente no Porto, infra id por H… unicamente para simplificação de exposição.
[9] Nascido a 30.5.1956 no Porto, divorciado, jornalista, Sub-director do P… e residente em Póvoa de Lanhoso, infra id por I… unicamente para simplificação de exposição.
[10] Nascido a 27.7.1968 na Murtosa, casado, jornalista e residente na … - MTS, infra id por J… unicamente para simplificação de exposição.
[11] Nascido a 11.01.1969 no Porto, casado, jornalista e residente no Porto, infra id por K… unicamente para simplificação de exposição.
[12] Nota do Relator - a folha 94 do processo é uma «folha de suporte» da folha integrada pelas pgs 47-48 da edição em papel do P… de sábado 10.11.2012 sendo que na parte central da metade superior da (última) pág (a) 48 consta o seguinte artigo, conforme scanerização como imagem a cores pelo Relator:
………………………………………………
………………………………………………
………………………………………………
[13] Nota do Relator - a folha 94 do processo é uma «folha de suporte» da folha integrada pelas pgs 11-12 da edição em papel do P… de domingo 11.11.2012 sendo que na parte superior da pág 12 consta o artigo com a apresentação seguinte, conforme scanerização como imagem a cores pelo Relator:
………………………………………………
………………………………………………
………………………………………………
[14] Nota do Relator - a folha 96 do processo é uma «folha de suporte» da folha integrada pelas pgs 17-18 da edição em papel do P… de sexta feira 16.11.2012 sendo que na parte central da pág 17 consta o artigo apresentado numa única coluna - que seguidamente se reproduz em três colunas unicamente para inexistência neste Acórdão de grandes áreas em branco - conforme scanerização como imagem a cores pelo Relator:
………………………………………………
………………………………………………
………………………………………………
[15] Conforme scanerização pelo Relator da Acusação de 06.02.2014 a fls 248-255 II.
[16] Conforme copy paste pelo Relator do suporte digital oportunamente enviado com o processo.
[17] Delimitadoras de objecto de Recurso e poderes de cognição deste TRP ex vi consabidas Jurisprudência reiterada dos Tribunais Superiores e Doutrina processual penal sem prejuízo do conhecimento de questão oficiosa vg JOSÉ ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, V, pgs 362-363, ASTJ de 17.9.1997 in CJS 3/97, ASTJ de 13.5.1998 in BMJ 477 pág 263, ASTJ de 25.6.1998 in BMJ 478 pág 242, ASTJ de 03.2.1999 in BMJ 484 pág 271, ASTJ de 28.4.1999 in CJS 2/99 pág 196, GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, III, 3ª edição, Verbo, 2000, pág 347, ASTJ de 01.11.2001 no processo 3408/00-5, SIMAS SANTOS, LEAL HENRIQUES, Recursos em Processo Penal, 7ª edição, Rei dos Livros, Maio de 2008, pág 107.
[18] Conforme scanerização pelo Relator.
[19] Conforme scanerização pelo Relator.
[20] Conforme scanerização pelo Relator.
[21] «Direito Processual Penal, 1a ed., 1974, p. 133».
[22] «Ver Germano M. Silva, Curso de Direito Processual Penal, III, págs. 99 a 100».
[23] «CPP anotado, pg. 35 e ss ».
[24] Conforme copy paste pelo Relator do suporte digital graciosa e oportunamente enviado com o processo.
[25] Conforme scanerização pelo Relator.
[26] «Com excepção naturalmente do aqui Recorrente».
[27] In “Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal”, Coimbra Editora, págs. 307 e segs.
[28] Conforme scanerização pelo Relator.
[29] Conforme scanerização pelo Relator.
[30] Lei de Imprensa – Lei 2/99 de 13/1 que foi rectificada pela Declaração 9/99 de 4/3 e alterada pelas leis 18/2003 de 11/6 e 19/2012 de 8/5.
[31] O art 30 epigrafado «Crimes cometidos através da imprensa» estatui que: «1 -A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais, sem prejuízo do disposto na presente lei, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais. 2 - Sempre que a lei não cominar agravação diversa, em razão do meio de comissão, os crimes cometidos através da imprensa são punidos com as penas previstas na respectiva norma incriminatória, elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo».
[32] O art 31 epigrafado «Autoria e comparticipação» estatui que: «1 - Sem prejuízo do disposto na lei penal, a autoria dos crimes cometidos através da imprensa cabe a quem tiver criado o texto ou a imagem cuja publicação constitua ofensa dos bens jurídicos protegidos pelas disposições incriminadoras.
2 - Nos casos de publicação não consentida, é autor do crime quem a tiver promovido.
3 - O director, o director-adjunto, o subdirector ou quem concretamente os substitua, assim como o editor, no caso de publicações não periódicas, que não se oponha, através da acção adequada, à comissão de crime através da imprensa, podendo fazê-lo, é punido com as penas cominadas nos correspondentes tipos legais, reduzidas de um terço nos seus limites.
4 - Tratando-se de declarações correctamente reproduzidas, prestadas por pessoas devidamente identificadas, só estas podem ser responsabilizadas, a menos que o seu teor constitua instigação à prática de um crime.
5 - O regime previsto no número anterior aplica-se igualmente em relação aos artigos de opinião, desde que o seu autor esteja devidamente identificado.
6 - São isentos de responsabilidade criminal todos aqueles que, no exercício da sua profissão, tiveram intervenção meramente técnica, subordinada ou rotineira no processo de elaboração ou difusão da publicação contendo o escrito ou imagem controvertidos».
[33] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2ª edição, Lisboa, Maio de 2008, pgs 330-331 - negritos do Relator.
[34] Expressivas formulações do ARC de 10.9.2008 de ALBERTO MIRA no processo 195/07.2GBCNT.C1 - in www.dgsi.pt/jtrc - que relevou JORGE NORONHA E SILVEIRA, O Conceito de Indícios Suficientes no Processo Penal Português, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Coordenação Científica de Maria Fernanda Palma, Almedina, pág 171., como se relevou verbi gratiae no ARP de 12.02.2014 de Castela Rio com Lígia Figueiredo no processo 253/12.1GAVLC.P1.
[35] GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, I, Coimbra Editora, Jan 2007, pág 461.
[36] Do Código Penal de 1982 quanto aos crimes de difamação e de injúrias, arts 180 e 181 no Código Penal de 1995 e 2007, respectivamente.
[37] GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, I, Coimbra Editora, Jan 2007, pág 461.
[38] Daquelas 2 concepções e daqueles 2 conceitos.
[39] JOSÉ DE FARIA COSTA, Comentário Conimbrincense do Código Penal, I, Coimbra Editora, 1ª edição, Janeiro de 1999, pág 607.
[40] JOSÉ DE FARIA COSTA, Direito Penal Especial, Coimbra Editora, 2004, pgs 104-105.
[41] VICTOR DE SÁ PEREIRA e do Advogado ALEXANDRE LAFAYETTE, Código Penal Anotado e Comentado, Quid Juiris, 2008, pgs 483 a 485.
[42] GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra Editora, 4ª edição, Janeiro de 2007, pág 573.
[43] GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra Editora, 4ª edição, Janeiro de 2007, pgs 573-574.
[44] JORGE MIRANDA, anotação VI ao artigo 38 da CRP, JORGE MIRANDA, RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2010, pgs 865-866.
[45] JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, anotação IV ao artigo 37 da CRP, JORGE MIRANDA, RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2010, pgs 848-849.
[46] JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, anotação V ao artigo 37 da CRP, JORGE MIRANDA, RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2010, pgs 850-852.
[46] JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, anotação X ao artigo 37 da CRP, JORGE MIRANDA, RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2010, pgs 856-857.
[47] A CEDH foi aprovada para ratificação pela Lei 65/78 de 13/10 in DR I Série 236 de 13.10.1978.
[48] JORGE MIRANDA, anotação XII ao artigo 8 da CRP, JORGE MIRANDA, RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2010, pgs 165-166.
[49] Do sumário do ARP de 12.10.2011 de José Carreto com Joaquim no processo 709/97.4JAPRT-A.p1 in www.dgsi.pt – para o qual se remete para simplificação de exposição.
[50] Da fundamentação do ARP de 12.10.2011 de José Carreto com Joaquim no processo 709/97.4JAPRT-A.p1 in www.dgsi.pt – para o qual se remete para simplificação de exposição.
[51] JORGE DE JESUS FERREIRA ALVES, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada e Protocolos Adicionais Anotados (Doutrina e Jurisprudência, Legis Editora, maio de 2008, anotação 3 ao art 10, pág 241.
[52] JORGE DE JESUS FERREIRA ALVES, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada e Protocolos Adicionais Anotados (Doutrina e Jurisprudência, Legis Editora, maio de 2008, anotação 5 ao art 10, pág 242.
[53] MANUEL DA COSTA ANDRADE, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade das pessoas, 1996, pág 52.
[54] Como reporta JORGE DE JESUS FERREIRA ALVES, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada e Protocolos Adicionais Anotados (Doutrina e Jurisprudência), Legis Editora, Maio de 2008, pág 253.
[55] JORGE DE JESUS FERREIRA ALVES, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada e Protocolos Adicionais Anotados (Doutrina e Jurisprudência), Legis Editora, Maio de 2008, pág 242.