DANO DA PERDA DE CHANCE OU OPORTUNIDADE
Sumário

I - O dano da “perda de chance ou oportunidade” consiste na possibilidade real de alcançar um determinado resultado positivo, ainda que de verificação incerta e que por intervenção de um terceiro foi impossível obter, razão pela qual a indemnização a conceder não visa a perda do resultado querido, mas a oportunidade que se perdeu.
II - Assim, apenas a omissão ou acção do terceiro que contendeu com um sério, real e muito provável desfecho favorável ao lesado pode configurar o dano, já que o dano está associado à possibilidade real do êxito que se frustrou.
III - Tal não ocorre quando não obstante a conduta omissiva do patrono oficioso do autor alegadamente lesado, traduzida na não apresentação de articulado no qual iriam ser vertidas as razões nas quais o mesmo impugnaria a regularidade e a licitude do seu despedimento, se conclui perante os elementos de facto disponíveis, que tal pretensão não teria reais e razoáveis probabilidades de obter provimento.

Texto Integral

Apelação nº2080/13.0TBVCD.P1
Tribunal recorrido: Comarca do Porto
Matosinhos – Inst. Local – Secção Cível – J2
Relator: Carlos Portela (663)
Adjuntos: Des. Pedro Lima Costa
Des. Pedro Martins

Acordam na 3ª Secção (2ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
B…, residente na Rua …, n.º…., ….-…, freguesia …, Vila do Conde, instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra C…, com sede na …, .., Planta ….., Madrid e D…, Advogado, com domicílio profissional na Rua …, n.º …, .º Traseiras, ….-…, Matosinhos onde concluiu pedindo:
A título principal:
a) Que a primeira ré fosse condenada a pagar ao autor a quantia de € 26.849,76, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento à taxa legal que vigorar ou;
b) Que fossem condenados o segundo réu e esta a pagar ao autor e ainda respectivamente o valor de €1.500,00 (correspondente à franquia contratada) e o restante até ao montante do valor da indemnização em causa (€26.849,75 - €1.500,00 = €26.849,75), tudo acrescido do valor dos juros de mora desde a citação até integral pagamento à taxa legal que vigorar;
A título subsidiário que fosse o segundo réu condenado a pagar ao autor a quantia de €26.849, acrescidas de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
Alegou, para tanto e em síntese, que em 1983, o autor celebrou um contrato de trabalho sem termo com a sociedade E…, Lda, que se dedica à construção civil de obras públicas e particulares, onde, a partir dessa data, passou a exercer a sua actividade profissional com a categoria profissional de 1.º Oficial de Carpinteiro.
Tal contrato terminou, por iniciativa da referida empresa, em 12 de Abril de 2010, mediante despedimento do autor.
Insurgindo-se contra tal despedimento, em 21 de Abril do mesmo ano, o autor instaurou no Tribunal Judicial de Matosinhos um procedimento de impugnação judicial de despedimento.
No âmbito de tal processo, foi realizada, no dia 7 de Maio de 2010, uma audiência de partes.
Finda a mesma sem que as partes lograssem obter acordo, o processo seguiu os seus termos, tendo a entidade patronal apresentado tempestivamente requerimento a motivar o despedimento.
O autor foi, então, notificado, através de carta registada expedida em 10 de Maio de 2010, para contestar a acção no prazo de 15 dias.
Tendo-lhe sido nomeado como patrono oficioso o aqui segundo réu, para o representar no aludido processo, a verdade é que, contra as instruções do autor, aquele não apresentou contestação nos autos.
Reconhecendo perante o autor que a falta de apresentação da contestação se deveu a um lapso, o certo é que o mesmo réu também não apresentou recurso da decisão que, julgando confessados os factos invocados pela entidade patronal com fundamento na falta de contestação do réu, aqui autor, indeferiu a pretensão deste.
Por força da conduta do segundo réu, que incumpriu a obrigação profissional de proceder à apresentação da contestação do autor, o autor viu vedado o direito a discutir em juízo os fundamentos invocados pela entidade patronal para o seu despedimento, os quais se baseiam numa factualidade falsa.
Assim, diz ter sofrido um dano na medida em que não lhe foi possível obter uma indemnização pelo despedimento ilícito, a qual, de acordo com a antiguidade e as sucessivas retribuições do autor, se quantifica em € 21.849,75.
Acrescem os danos não patrimoniais que lhe causou o despedimento ilícito, que se quantificam em € 5.000,00.
A Ordem dos Advogados, à qual o segundo réu pertence, contratou com a primeira ré um seguro de responsabilidade civil profissional obrigatório, de natureza colectiva, do qual beneficiam todos os advogados com a inscrição em vigor, até ao limite de €150.00,00 e com um limite máximo por sinistro de €100.000,00, com uma franquia por sinistro e retroactividade ilimitada.
A ré C… apresentou contestação onde começa por impugnar, por desconhecimento, a matéria factual invocada na petição inicial, com excepção do contrato de seguro.
Sustenta, além do mais, não estarem verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar a cargo do segundo réu, designadamente por inexistir uma conduta ilícita a este imputável.
Invoca, ainda, a prescrição do direito da autora nos termos do n.º 1 do art. 489º, nº1 do Código Civil.
Acresce, finalmente, que nunca o autor teria direito à peticionada indemnização uma vez que é verdadeira a factualidade em que a entidade patronal fundamentou o despedimento do autor - a qual, pela sua gravidade impossibilitou a manutenção da relação contratual - devendo, por conseguinte, tal despedimento qualificar-se como lícito e com justa causa.
Assim, mesmo a verificar-se uma conduta ilícita por banda do segundo réu nunca a mesma, face à manifesta improbabilidade de procedência da eventual contestação, poderia ser geradora dos danos invocados.
Mais defende que não se podendo responsabilizar o segundo réu, nunca a primeira ré seguradora poderá ser responsabilizada por qualquer prejuízo alegadamente sofridos pelo autor.
Também o réu D… apresentou contestação onde começou por invocar a excepção de ilegitimidade passiva do réu quanto ao segundo e terceiro pedidos formulados pelo autor.
De seguida, invocou a excepção de prescrição do direito do autor na medida em que, estando em causa uma eventual responsabilidade extracontratual, à data da interposição da acção, estava já esgotado o prazo de três anos contado desde o conhecimento pelo autor da opção de não contestar a acção de impugnação da regularidade e ilicitude do despedimento do autor.
Finalmente, impugnou a factualidade invocada pelo autor como fundamento da sua pretensão, alegando, em síntese, que a não apresentação da contestação resultou de uma opção consciente do segundo réu, tomada nos elementos constantes do processo disciplinar do réu, os quais confirmam a veracidade dos factos invocados pela entidade patronal do autor.
Tal decisão foi oportunamente comunicada ao ora autor, que a aceitou e, além do mais, reconheceu perante o réu a veracidade das imputações que lhe eram dirigidas.
Acabou a concluir pela improcedência da acção.
O autor respondeu às excepções invocadas, concluindo pela respectiva improcedência.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade invocada na contestação.
Seguiu-se despacho onde se fixou a matéria de facto assente e se seleccionaram os temas de prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do inerente formalismo legal, no culminar da qual se proferiu sentença onde se decidiu do seguinte modo:
1º) Improcedente a excepção de prescrição invocada pelos réus;
2º) Improcedente por não provada a acção e, em consequência se absolveram ambios os réus dos pedidos que contra si foram formulados.
Inconformado com esta decisão dela vweio recorrer o autor, apresentando desde logo e nos termos legalmente previstos as suas alegações.
Os réus responderam a tais alegações.
Foi proferido despacho onde por tempestivo e legal, se admitiu o recurso como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o proceso nesta Relação, foi emitido despacho que teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subidada adequados.
Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento desde recurso, cumpre apreciar e decidir.

*
II. Enquadramento de facto e de direito:
Por força do que decorre do disposto nos artigos 5º, nº1 e 7º, nº1 da Lei nº41/2013 de 26 de Junho, ao presente recurso são apliáveis as regras processuais postas a vigorar por este ultimo diploma legal.
Como é por demais sabido, o objecto deste recurso e sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelo autor/apelante nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do NCPC).
E é o seguinte o teor das mesmas:
1º) O Tribunal a quo incorreu em erro ao dar como não provados os factos constantes nos pontos d. e e. dos factos não provados constantes na sentença.
2º) Quando se conjuga os depoimentos das testemunhas, outra conclusão não se pode retirar se não a que não só os factos que levaram o aqui Recorrente a ser despedido não eram suficientes para reputar aquele de "despedimento com justa causa", como também se provou que era prática corrente e consentida a utilização de ferramentas da entidade patronal em beneficio pessoal.
3º) Inclusive, foi dado como provado que os trabalhadores utilizavam em benefício da entidade patronal, instrumentos pessoais.
4º) Contudo, tal facto é transversal a empresas deste tipo de ramo, pelo que se qualifica o mesmo como facto notório.
5º) Para tanto, serve de base a testemunha F… (ficheiro áudio 20141111153611_13547029_2871548.wma - 04:27 a 05:02; 05:54 a 06:06; 08:28 a 08:46; e 09:59 a 11:05) cujo depoimento é claro e aponta no sentido da existência de intercâmbio de instrumentos de trabalho e consentimento para tal, o mesmo acontecendo com a testemunha G… (ficheiro áudio 20141111145553_13547029_2871548.wma - 09:22 a 10:00; 10:36 a 11:33; 29:51 a 30:30; 31:45 a 31:50; 32:35 a 33:02; 35:20 a 36:01; e 37:41 a 37:56), e ainda com a testemunha H… (ficheiro áudio 20141111170004_13547029_2871548.wma - 33:42 a 34:30; e 37.33 a 37:52).
6º) Ainda, esta testemunha H… depôs sobre factos dos quais não tinha conhecimento pessoal e que o seu conhecimento se baseava no "ouvir dizer", em especial quando se referiu a factos relativos à autorização do uso de material da empresa e do seu procedimento (ficheiro áudio 20141111170004_13547029_2871548.wma - 33:21 a 33:40; 38:05 a 38:37; e 38:56 a 38:19).
7º) O tribunal a quo deveria considerar como provados os factos "d." e "e." que erradamente considerou como não provados.
8º) Isto porque existem testemunhas que afirmam que havia uma relação entre entidade patronal e trabalhador que permitia o intercâmbio de ferramentas.
9º) Resultou claramente do depoimento das testemunhas inquiridas que o incidente que levou ao despedimento do Recorrente foi orquestrado pela entidade patronal que se encontrava em dificuldade financeiras, e que pretendia despedir os seus trabalhadores.
10º) não ficou provado que o Recorrente alguma vez pretendeu apoderar-se do material que teria nos seus bolsos.
11º) Por estas razões deve o Tribunal ad quem dar como provados os factos constantes nos pontos "d.", e "e.", dos factos não provados constantes na sentença, e, por via disso, condenar os Réus no pedido formulado pelo Recorrente na sua P.I..
12º) Na douta sentença recorrida, o Tribunal a quo chegou à conclusão de que a relação jurídica que unia o autor e réu se traduzia numa relação de natureza contratual.
13º) Conclui-se que a conduta do Réu Dr. D… foi ilícita, o qual incumpriu com os deveres deontológicos a que estava adstrito.
14º) No entanto este foi absolvido uma vez que o autor não conseguiu demostrar a "significant chance" pelo que o pedido deveria improceder.
15º) Apesar de o autor não concordar com esta posição, sempre dirá que, tendo em conta o que foi acima exposto quanto aos factos erroneamente dados como não provados, facilmente se percebe que há motivos para, através da fundamentação de direito que consta na douta sentença, o Tribunal ad quem alterar a decisão final e conformá-la com os novos factos dados como provados.
16º) É que estes, quando conjugados com os outros, apenas permitem uma conclusão: de que o Recorrente foi lesado pelo Réu Dr. D…, pois este incumpriu com os seus deveres forenses, eliminando, desta feita, a chance séria de sucesso daquele na acção e como tal deverá o Recorrente ser indemnizado pelos Recorridos.
17º) Razões pelas quais deverá este Tribunal ad quem revogar a decisão proferida pelo Tribunal ad quo e julgar totalmente procedente, por provada, a acção instaurada pelo aqui Recorrente. 18º) Qualquer perda de chance é significativa e consubstancia um dano.
19º) A perda de "toda e qualquer expectativa de ganho de causa na acção, independentemente das vicissitudes processuais que a mesma conheceria, na hipótese de tal não haver sucedido, o que, por si só, representa um dano ou prejuízo autónomo"
20º) Ainda citando este acórdão, “o dano da “perda de chance” que se indemniza não é o dano final mas o dano “avançado”, constituído pela perda de chance, que deve ser medida em relação à chance perdida e não pode ser igual à vantagem que se procurava, nem superior nem igual à quantia que seria tribuída ao lesado, caso se verificasse o nexo causal entre o fact e o dano final.”
21º) Ora, do exposto percebe-se que a situação que o STJ cuidou é em todo semelhante ao caso aqui em crise, sendo de referir que o Acórdão citado vai de encontro ao que o Recorrente aqui defende, a saber, que qualquer perda de chance, no caso concreto, é indemnizável.
22º) Por mais ou menos relevante que essa chance fosse, continuaria a ser uma chance de sucesso.
23º) Chance essa que, quando arredada por outrem, pela prática de um ilícito, será sempre indemnizável.
24º) Tendo em conta que ficou provado que o Réu Dr. D… infringiu o contrato que tinha com o Recorrente, e que lhe fez "perder toda e qualquer expectativa de ganho de causa na acção, independentemente das vicissitudes processuais que a mesma conheceria, na hipótese de tal não haver sucedido, o que, por si só, representa um dano ou prejuízo autónomo para aquele" - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-2013, proc. n.º488/09.4TBESP.P1.S1 - deverá o Recorrente ser indemnizado.
25º) Assim, deverá o Tribunal ad quem revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que considere totalmente procedente, por provado, o peticionado pelo Recorrente.
Já os réus/apelados concluem as suas contra alegações, pugnando ambos pela improcedência do recurso e pela confirmação da sentença recorrida.
Perante o antes exposto, resulta pois claro que são as seguintes as questões suscitadas no âmbito deste recurso:
1ª) -A que diz respeito à impugnação da decisão da matéria de facto;
2ª) -A que tem a ver com a procedência do pedido formulado pelo autor.
Impondo-se iniciar a nossa análise pela primeira destas duas questões, cabe desde já deixar ditto o seguinte:
Todos sabemos que com o D.L.nº39/95 de 15.02, foram ampliados de forma significativa os poderes da Relação no que toca à alteração da decisão da matéria de facto.
Assim e para tanto consignou-se a possibilidade de serem registados os depoimentos oralmente prestados perante o tribunal de 1ª instância, a fim de facultar ao tribunal de recurso a sua reapreciação.
De todo o modo, é fundamental não esquecer que foram recusadas opções legislativas que permitissem a dedução de impugnações genéricas.
Por isso, para além da indicação dos concretos pontos de facto que se pretendem ver modificados, consignou-se ainda primeiro no art.º690º-A, depois no art.º685º-B e finalmente no art.º640º, a necessidade da indicação precisa dos meios de prova, que, na tese do recorrente, foram incorrectamente apreciados.
Em suma, a impugnação da decisão da matéria de facto pressupõe a verificação cumulativa das seguintes condições:
a) A especificação ou identificação dos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
b) A indicação dos concretos meios probatórios constantes do processo, do registo ou da gravação da prova que imponham uma decisão diversa sobre os referidos pontos de facto, sendo certo que se os fundamentos da impugnação incluírem meios de prova gravados, devem indicar-se os depoimentos por referência ao que está assinalado na respectiva acta de julgamento.
Ora nos autos, o que verificamos é que oautor/apelante cumpriu cabalmente tais obrigações.
Assim e como se verifica das suas alegações, o mesmo pretende que sejam dados como provados os seguintes factos:
-Os factos nos quais se baseou a entidade patronal para proceder ao despedimento eram falsos (d);
-Era prática comum na empresa, porque previamente consentida pelo seu legal representante, os trabalhadores utilizarem, for a do local de trabalho, e em benefício próprio, as ferramentas da entidade patronal (e).
Para tanto faz alusão aos depoimentos prestados em julgamento pelas testemunhas F…, G… e H….
Ora como é por demais sabido, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, não pode subverter o princípio da livre apreciação das provas inscrito no art.º607º, nº5 do NCPC, Segundo o qual o juiz aprecia livremente as provas, decidindo Segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Como nos era imposto, não deixamos de proceder à audição dos depoimentos prestadso em julgamento pelas testemunhas então inquiridas ponto assento tónico naquilo que foi ditto por aquelas às quais o autor e ora apelante alude neste seu recurso.
No entanto, não podemos deixar de recordar que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova – seja audio, seja mesmo video – , por mais fiel que ela seja das incidências concretas da audiência.
Isto, porque na formação da convicção do juiz não intervêm apenas factores racuionalmente demonstráveis (neste sentidio cf. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo civil, vol.II 2ª edição, pág.251).
Assim sendo e ainda hoje, o que se mostra necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique «os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado» (cf. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág.348).
Deste modo e mesmo não se discutindo a sua natureza de primeiro tribunal de 2ª instância que ao tribunal de recurso está atribuído, cabe pois, apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal de 1ª instância face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos.
Ora no caso concreto, o que verificamos é que não merece qualquer reparo o modo como o Sr. Juiz “a quo” fundamentou a decisão da matéria de facto que antes proferiu (cf. fls.628 e 629).
Assim, também nós consideramos que o autor ora apelante não logrou ter como provada matéria de facto suficiente para demonstrar, como aliás pretendia, a ilicituade do seu despedimento.
Isto porque dos depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas que indicou, não é de todo permitido concluir que era prática habitual e generalizada a utilização por todos os trabalhadores, em proveito próprio e fora dos horários normais de trabalho, das ferramentas que pertenciam à sua entidade patronal.
E mais ficou por provar, que tal prática se verificava na altura em que se verificaram os factos imputados ao autor.
Na verdade e sobre esta matéria falou a testemunha F…, mulher do autor, mas apenas para dizer o que a tal propósito ouviu da boca do seu marido.
Por outro lado, é certo que sobre estes factos também falaram as testemunhas comuns a ambas as partes D… e H…, antigos colegas de trabalho do autor.
Quanto a estas subscrevemos também nós a opinião segundo a qual foram isentos e coerentes os dois depoimentos.
E destes extraímos conclusões em tudo idênticas às que extraiu o Tribunal “a quo” ou seja:
Ambas referiram que pelo menos alguns funcionários utilizavam, fora do trabalho e em proveito próprio, ferramentas da empresa, mas que tal procedimento dependia sempre de autorização prévia do patrão.
Já a testemunha G… afirmou que ele próprio e por diversas vezes, chegou a lever ferramentas da entidade patronal para utilização pessoal, mas que sempre o fez com autorização do patrão, mas alegando desconhecer se outros colegas assim procediam sem estarem para tal autorizados autorizados.
Aliás a verificação desta exigência de autorização prévia e pontual, para o uso de ferramentas da entidade patronal em proveito próprio dos trabalhadores foi confirmada pelos restantes depoimentos escritos que instruem o processo disciplinar de despedimento cujas cópias estão juntas aos autos a fls.175 e seguintes.
No entanto as mesmas não deixaram de salientar que na altura da ocorrência dos factso que determinaram o despedimento do autor, existia um claro mal-estar entre este e o legal representante da entidade patronal.
Tudo fruto das dificuldades financeiras que a empresa vinha vivendo e que levaram à rescisão amigável dos contratos com a maioria dos trabalhadores, acordos esses que não abrangeram o autor que por ser o funcionário mais antigo da empresa teria que receber uma indemnização mais elevada.
Perante tudo isto e como antes já deixamos referido, também nos parece razoável considerar que a tolerância da entidade patronal relativamente ao uso de ferramentas pelos trabalhadores já tinha deixado de existir.
Por outro lado e como se verifica da prova documnental que foi produzida nos autos, nomedamentea aquela que consubstanciou o processo disciplinar de despedimento que foi levantado ao autor e conforme foi confirmado pelas testemunhas que intervieram no mesmo, a verdade é que o autor sabia que não estava autorizado a levar consigo as lâminas que lhe foram encontradas no bolso do casaco, facto para o qual não deu qualquer justificação.
Finalmente, tem também razão o Sr. Juiz “a quo” quando salienta a circunstância do autor não ter trazido ao processo qualquer prova que pudesse questionar a veracidade dos demais factos constantes da nota de culpa e da posterior motivação do despedimento, designadamente aqueles que tinham a ver com a ferramenta que foi encontrada no seu cacifo e com a intenção de apropriação da mesma que lhe foi imputada, nas quais e como já vimos se fundou a decisão que levou ao seu despedimento.
Em suma, dos depoimentos prestados em julgamento pelas testemunhas então ouvidas, os quais devem ser conjugados com os depoimentos que por escrito foram prestados no processo disciplinar que levou ao despedimento do autor e ora apelante, o que se verifica é que nenhuma prova foi produzida quanto aos factos alegados por este último e que foram vertidos nas alíneas d) e e) dos factos não provados.
Por ser assim bem andou pois o tribunal “a quo” quando pelas razões já antes melhor referidas, decidiu ter os mesmos como não provados.
Deste modo e não existindo qualquer fundamento para alterar a decisão que então foi proferida, indefere-se nesta parte o recurso interposto pelo autor/apelante e mantém-se integralmente a decisão (de facto) recorrida.
Em face do acabado de decidir estão pois provados os seguintes factos:
1. Em 1983, o autor celebrou um contrato de trabalho sem termo com a sociedade E…, Lda., que se dedica à construção civil de obras públicas e particulares;
2. A partir dessa data, passou a exercer a sua actividade profissional remunerada, por conta, sob autoridade, fiscalização e direcção de tal empresa com a categoria profissional de 1.º Oficial de Carpinteiro;
3. De Janeiro de 2000 a Fevereiro de 2001, auferiu a retribuição mensal d e € 42 6,47;
4. De Março de 2001 até Fevereiro de 2003, auferiu uma retribuição mensal de 442,43 €;
5. De Março de 2003 até Dezembro de 2008, auferiu uma retribuição mensal de 469,90 €;
6. E de Janeiro de 2009 até Abril de 2010, uma retribuição mensal de 531,5 0 € ;
7. O contrato de trabalho supra referido terminou por iniciativa daquela empresa em 12/04/2010, mediante despedimento, com fundamento nos factos constantes da motivação junta ao processo de impugnação de despedimento cuja cópia está junta a fls. 33 e segs. com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. Por requerimento datado de 21 de Abril de 2004, o autor impugnou judicialmente tal despedimento no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, sendo que tal impugnação deu origem ao processo n.º478/10.4TTMTS, que correu termos no 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos;
9. No âmbito desse processo foi marcada audiência de partes para o dia 07/05/2010, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos;
10. Naquela audiência de partes, as partes não lograram chegar a acordo, pelo que o processo prosseguiu os seus termos, tendo a entidade patronal apresentado, no dia 17 de Maio de 2010, o articulado para motivar o despedimento junto a fls. 33 e segs, com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido;
11. O aqui autor foi notificado, através de carta registada expedida em 19 de Maio de 2010, para contestar a acção no prazo de 15 dias;
12. O autor requereu junto dos serviços da Segurança Social que lhe fosse nomeado um Advogado para o representar no indicado processo judicial;
13. Após comunicação do aqui autor de que tinha requerido apoio judiciário na modalidade de nomeação de Advogado, foi ali proferido despacho judicial declarou interrompido o prazo para contestar ao abrigo do disposto no art.º 24, n.º 4 da lei n.º 47/2007 de 28/08, informando que tal prazo se iniciaria a partir da notificação ao patrono nomeado da designação ou da notificação ao trabalhador da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono nos termos do n.º 5 do citado preceito legal; 14. O ora segundo réu foi nomeado Patrono ao aqui autor, para contestar a acção que correu termos no 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos sob o Proc. nº478/10.4TTMTS;
15. Tal nomeação foi notificada ao 2º Réu por email datado de 01 de Julho de 2010;
16. Por carta registada expedida em 2 de Julho de 2010, o 2.º Réu convocou o Autor para uma reunião no seu escritório, informando-o que tinha sido nomeado Defensor Oficioso, designando o dia 7 de Julho de 2010, pelas 10:30 horas, para realização de tal reunião;
17. Na data designada para a reunião o beneficiário compareceu no escritório do exponente, tendo informado o mesmo que a sua entidade patronal o havia despedido e ainda que, como não concordava com o seu despedimento, levou a questão para tribunal dando origem a um processo de impugnação Judicial de regularidade e licitude do despedimento, o qual corria termos no Tribunal do Trabalho em Matosinhos um processo com n.º 478/10.4TTMTS, 2º Juízo;
18. Nessa mesma ocasião, o autor deu conhecimento ao réu do teor da notificação que recebeu;
19. O segundo réu não apresentou contestação, em nome do autor na referida acção de impugnação judicial de despedimento;
20. No mesmo processo, em 6 de Agosto de 2010, foi proferida a sentença cuja cópia está junta a fls. 47 e segs., com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido, que julgou a acção totalmente improcedente, e absolveu a empregadora do pedido contra ela formulado;
21. O autor foi notificado de tal sentença em por carta registada datada de 09 de Agosto de 2010;
22. O ora, o 2.º Réu é advogado com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados;
23. A Ordem dos Advogados contratou um seguro de responsabilidade civil profissional obrigatória de natureza colectiva com a 1.ª Ré através das apólices de seguro P/…../../. e DP/…../../., do qual beneficiam todos os advogados com inscrição em vigor, - cujas condições particulares, especiais e gerais estão juntas a fls. 109, com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido - sendo os limites indemnizatório máximos contratados para o seu período de vigência/ "período seguro" (de 01 de Janeiro a 31 de Dezembro de 2010) respectivamente fixados em € 50.000,0 0 e € 10 0.000,00;
24. Nos termos definidos nas Condições Especiais do Contrato, a primeira ré assumiu, perante o Tomador, a cobertura dos riscos inerentes ao exercício da actividade profissional desenvolvida pelos seus segurados, garantindo o eventual pagamento de indemnizações resultantes da responsabilização civil dos segurado, em decorrência de erros e/ou omissões profissionais incorridas no exercício da sua actividade;
25. Nos termos do artigo 2.º das Condições Especiais da Apólice de Seguro, o qual determina o "Objecto do Seguro", "A presente APÓLICE tem por objecto garantir ao SEGURADO as consequências económicas de qualquer RECLAMAÇÃO de Responsabilidade Civil que lhe seja legalmente imputável, formulada de acordo com a legislação vigente e pela primeira vez contra o SEGURADO durante o PERÍODO DE SEGURO, por Prejuízos Patrimoniais Primários causados a TERCEIROS, em consequência de ERRO ou FALTA PROFISSIONAL cometido pelo SEGURADO ou por pessoal por quem ele legalmente deva responder, no desempenho da actividade profissional descrita nas Condições Particulares.":
26. Nos termos da Cláusula 16.º do Artigo 1.º das Condições Especiais das Apólices e Artigo 7.º das mesmas Condições, às referidas quantias serão deduzidas as correspondentes franquias contratuais aplicáveis, igualmente previstas nas Condições Particulares da Apólice de Seguro principal (DP/…../../.), cujo valor ascenderá aos € 3.000,00 em caso de incumprimento de prazos e 1.500,00 nos restantes casos (por cada sinistro/segurado) e "será sempre suportado pelo SEGURADO, sendo o mesmo dedutível ao valor de indemnização que à SEGURADORA couber pagar,";
27. Em tal apólice foram indicados como segurados "todos os membros da Ordem dos Advogados de Portugal com inscrição em vigor, nos termos definidos nas condições especiais da apólice" cf. (condições particulares das apólices juntas como doc. 1 e 2) sendo definido como tal "cada membro da Ordem identificado nas Condições Particulares que, estando habilitado com formação adequada para exercer a actividade profissional descrita nas Condições Particulares desta Apólice, seja titular de Cédula Profissional emitida pela Ordem e com inscrição em vigor"; 28. Em 23-08-2010 o segundo réu accionou o seguro de responsabilidade profissional com o nº de Apólice DP/…../../.;
29. À relação laboral existente entre o A. e aquela empresa aplicava-se a CCT entre a AECOPS e a FETESE, publicada no BTE 48/1993, com as alterações constantes dos BTEs 08/1995, 13/1995, 15/1999, 15/2000, 16/2001, 15/2002, 15/2003, 13/2005, 25/2006, 24/2007, 20/2008 e 12/2009;
30. Era frequente o autor e seus colegas de trabalho utilizarem ferramentas próprias na realização de trabalhos por conta da sua entidade patronal;
31. O despedimento do autor causou-lhe desgosto e abalo emocional.
*
Dos outros factos alegados pelas partes e que têm relevo para a decisão da causa não ficaram provados os seguintes:
a) Ao terminar a reunião supra referida em 16), o réu D… informou o autor de que, na sua opinião, o processo "não tinha pernas para andar", e que o despedimento efectuado pela sua entidade patronal iria ser, certamente, considerado ilícito, e que aquele iria receber uma indemnização pela cessação do contrato, bem como os salários que deixou de receber desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que considerar o despedimento ilícito;
b) E advertiu o autor que, em virtude da proximidade das férias judiciais, que decorrem de 15 de Julho a 31 de Agosto, só apresentaria a contestação em Setembro;
c) Posteriormente, o autor contactou com o 2.º Réu, exigindo-lhe explicações acerca do sucedido, tendo sido por este informado que tinha cometido um enorme lapso, pedindo-lhe desculpas pelo ocorrido, e que já não podia fazer mais nada, uma vez que não tinha qualquer hipótese de recurso;
d) Os factos nos quais se baseou a entidade patronal para proceder ao despedimento do autor eram falsos;
e) Era prática comum na empresa, porque previamente consentida pelo seu legal representante, os trabalhadores utilizarem, fora do local de trabalho, e em benefício próprio, as ferramentas da entidade patronal;
f) Em reunião ocorrida em 6/07/2010 o segundo réu informou o autor que não existiam razões para contestar, e que não iria contestar;
g) No decurso da reunião referida em 16), o segundo réu verificou então que corria um prazo de 15 para contestar a referida acção, o qual se tinha reiniciado com a sua nomeação;
h) Aquando da referida reunião, o autor informou o segundo réu que era verdade o que constava da nota de culpa e da motivação referida em 10) e que fez o que ali vinha descrito porque estava chateado com o patrão, pois este o tinha colocado a trabalhar na oficina, deixando de trabalhar nas obras que tinham em curso (no exterior), e que, de vingança, levava consigo os materiais que constam nos autos, e tinha escondido aquele outro no seu cacifo;
i) Explicou ainda que as testemunhas apresentadas pela sua entidade patronal nos referidos autos eram verdadeiras, e que corroboravam o que constava na Nota de Culpa, por terem presenciado o sucedido de facto;
j) O autor não apresentou ao segundo réu qualquer testemunha ou prova que contrariasse a licitude ou regularidade do seu despedimento; de sucesso
k) Por isso, após analisar os factos e fundamentos alegados na acção apresentada pela então entidade patronal do autor, verificando igualmente os depoimentos das testemunhas que testemunharam no âmbito daquele processo disciplinar, o segundo réu informou desde logo o autor que era sua posição/opção técnica, enquanto patrono oficioso do autor não contestar os referidos autos;
l) O autor assentiu com a opção do 2º réu, pedindo-lhe apenas para reanalisar o processo e para confirmar, se de facto, não havia nada a fazer quanto àquela questão do despedimento;
m) O 2º réu estudou e analisou pormenorizadamente a questão e manteve a sua opção de não contestar aquele processo e, por esses motivos, não deu entrada de qualquer contestação;
n) Após a notificação da sentença, em reunião agendada para explicar o sentido e alcance da sentença, o autor disse ao segundo réu compreender o que lhe foi explicado.
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Sendo esta a matéria de facto a considerar, cumpre pois apreciar a segunda das duas pretensões recursivas do autor/apelante.
Como antes já vimos, na tese do autor/apelante a sentença recorrida deve ser revogada pelas seguintes razões:
Porque perante os factos provados se impõe concluir que o autor/apelante foi lesado pelo réu Dr. D…, já que este incumpriu os deveres a que estava obrigado como seu advogado oficioso, já que ao não apresentar contestação na acção de impugnação judicial de despedimento inastaurada pela sua entidade patronal, pôs em crise a chance séria de ver vencer a sua tese na respectiva acção, o que sem mais e a tal título deve dar lugar nos presentes autos a uma indemnização por parte dos aqui réus, mandatário oficioso e seguradora.
Tudo isto porque de acordo com a jurisprudência que mais recentemente emitiu o Supremo Tribunal Superior qualquer perda de chance é significativa e consubstancia um dano
Em suma, neste seu recurso o autor/apelante pretende ver revogada a decisão recorrida, sugerindo que esta seja substituída por outra na qual se julgue totalmente procedente por provado o pedido que formulou nos autos.
Mas como mais adiante se verificará, não tem de todo razão nesta sua pretensão.
Senão, vejamos:
Todos sabemos que tem sido profusa a jurisprudência que sobre esta matéria tem vindo a ser proferida nos nossos Tribunais Superiores e mais concretamente no Supremo Tribunal de Justiça e nesta Relação do Porto, todos em www.dgsi.pt.
Assim e tratando de questões em tudo semelhantes àquela que aqui temos em mãos, os seguintes (e recentes) acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça:
De 30.04.2015, processo 338/11.1TBCVL.C1.S1; de 05.05.2015, processo 614/06.05TVLSB.L1.S1; de 26.05.2015, processo 231/10.5TBSAT.C1S1 e de 09.07.2015, processo 5105/12.2TBXL.L1.S1.
Também os seguintes acórdãos desta Relação do Porto:
De 09.02.2015, processo 5500/10.1TBVNG.P1; de 01.06.2015, processo 1960/11.1TBSTS.P1; de 12.05.2015, processo 2368/13.0T2AVR.P1 e de 23.06.2015, processo 591/14.9TBVLG.P1.
Também na doutrina a avaliação do ”dano perda de chance” como dano autónomo não tem merecido inteira unanimidade.
Assim e para Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual Coimbra, Almedina, 2005, a pág. 125-126, estamos perante um dano presente, que consiste na perda da probabilidade de obter uma futura vantagem, sendo, contudo, a perda de chance uma realidade atual e não futura.
E mais, quando refere que tal dano reporta-se ao valor da oportunidade perdida (estatisticamente comprovável) e não ao benefício esperado e defendendo que o dano deve deve ser avaliado em termos de verosimilhança, e não segundo critérios matemáticos, sendo o quantum indemnizatório fixado atendendo às probabilidades de o lesado obter o benefício que poderia resultar da chance perdida.
Já segundo Carneiro da Frada, Direito Civil Responsabilidade Civil – O Método do Caso, Almedina, Junho 2006, a pág.63, 103 e 104, o problema deve ser resolvido considerando a perda de oportunidade como um dano em si, como que antecipando o prejuízo relevante em relação ao dano para cuja ocorrência se não pode asseverar um nexo causal suficiente, afigurando-se indispensável na quantificação do dano, e nos problemas que daí advirão, um juízo de probabilidade.
Na opinião de Júlio Manuel Vieira Gomes, ainda sobre a figura do dano da perda de oportunidade ou perda de chance, Cadernos de Direito Privado II, Seminário dos Cadernos de Direito Privado “Responsabilidade Civil” Número Especial 02/Dezembro 2012, pág. 25 e seguintes, a lei estabelece limites normativos ao domínio do indemnizável circunscrevendo a responsabilidade, mesmo em sede de responsabilidade contratual, aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. Por outro lado, “não visando a responsabilidade civil primordialmente uma função punitiva”, o que está em jogo é colocar o lesado na situação em que provavelmente estaria se não fosse a lesão.
Centrando-se na conduta do advogado que não intenta a acção ou que interpõe um recurso fora de prazo, o mesmo ilustre autor considera que o dano não pode ser superior à perda do direito originário, pelo que se este direito originário não tiver qualquer consistência, ou não existir sequer, não há qualquer dano.
No entanto, não deixa de admitir a autonomização do dano, quando a chnace ou oportunidade se tenha “densificado” e fosse mais provável a sua realização do que a sua não verificação, se considere existir já um lucro cessante ou suficientemente “certo” para que a fixação do seu montante possa ser feita pelo tribunal recorrendo à equidade.
Voltando à jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça quando nesta é tratada a concreta questão de facto que também aqui se coloca, ou seja, a da não apresentação em prazo, da contestação, podemos encontrar três posições fundamentais:
A do Acórdão de 28.09.2010, no processo 171/2002.S1 onde se autonomiza o dano, como tal, escrevendo o seguinte: “(…) sabendo-se que a obrigação da 1ª Ré, como advogado da A. é uma obrigação de meios, o dano emergente do cumprimento defeituoso do mandato corresponderá à prestação devida, que o advogado não efectuou, com o que fez perder à A. A sorte ou “chance” de evitar um prejuízo, no caso, de evitar a condenação na ação laboral.
Segundo esta tese, resulta evidente que a verificação do ilícito contém já em si o dano a indemnizar.
No acórdão de 28.10.2012, processo 5817/09.8TVLSB.L1.S1, “para que um advogado possa ser responsabilizado pelos danos resultantes da perda de uma ação judicial, torna-se necessária a alegação e prova do nexo causal entre a sua censurável conduta (culposa) e os invocados prejuízos. Não bastando, para tal, a simples alegação e prova de que a contestação apresentada numa determinada acção judicial foi desentranhada por culpa do advogado, ficando provados os factos pelo aí autor alegados, com a consequente condenação do aí réu”.
E mais quando diz que “a doutrina da perda de chance não tem apoio expresso na nossa lei civil, não tendo, em geral, virtualidade para fundamentar uma pretensão indemnizatória, pelo que só em situações pontuais poderá ser atendida”.
No mesmo sentido vai o acórdão de 29.05.2012, no processo 8972/06.5TBBRG.G1.S1, no qual se defendeu o seguinte: “I. Os danos futuros só são indemnizáveis quando forem previsíveis. II. A doutrina da perda de chance ou de oportunidade, em geral, não tem apoio na nossa lei civil. III. Os danos decorrentes de uma conduta negligente de um advogado no desempenho de um mandato forense ou no exercício de apoio judiciário concedido a uma parte processual, para serem ressarcíveis exigem que se prove que sem essa conduta negligente os lesados teriam uma vantagem ou evitariam uma desvantagem que se consubstancia nos danos peticionados”.
Mas na jurisprudência do nosso Tribunal Superior a “perda de chance ou de oportunidade” associada à privação do direito de defesa em ação judicial, por acto ilícito de terceiro (advogado/patrono oficioso) surge identificada como um dano autónomo e dano emergente, cuja verificação depende de certos pressupostos: a possibilidade real de se alcançar um determinado resultado positivo, mas de verificação incerta; e um comportamento de terceiro, susceptível de gerar a sua responsabilidade, que elimine de forma definitiva a possibilidade de esse resultado se vir a produzir.
Na esteira deste entendimento vai entre outros o acórdão de 06.03.2014, 23/05.3TBGRD.C1.S1, segundo o qual: “(e)sta problemática coloca-se em situações em que "um sujeito se encontra num estado que lhe propicia a possibilidade – a chance – de alcançar um determinado resultado favorável, e em que, em virtude de um comportamento de um terceiro, essa possibilidade fica irremediavelmente perdida".
Ali se defende também que a ressarcibilidade desse dano depende de determinados pressupostos e que são os seguntes:
A existência de um determinado resultado positivo – a obtenção de uma vantagem ou a não concretização de uma desvantagem – que pode vir a verificar-se, mas cuja verificação não se apresenta certa;
Apesar desta incerteza, a necessidade que a pessoa se encontre numa situação de poder vir a alcançar esse resultado ou seja, a pessoa terá de estar investida de uma chance real de consecução da finalidade esperada;
É indispensável que se verifique um comportamento de terceiro, susceptível de gerar a sua responsabilidade, e que elimine de forma definitiva as (ou algumas das) existentes possibilidades de o resultado se vir a produzir”.
No mais recente acórdão de 30.04.2015, processo 338/11.1TBCVL.C1.S1, considerou-se que a perda de oportunidade só poderia fundamentar uma indemnização se, para além da verificação dos demais pressupostos da responsabilidade civil, pudesse reconhecer-se uma elevada probabilidade de vir a ser declarada a caducidade do direito à reparação dos defeitos.
Como ali se afirma, a autonomização do dano “perda de chance ou oportunidade”, configura-se como a possibilidade real de alcançar um determinado resultado positivo, ainda que de verificação incerta e que por intervenção de um terceiro foi impossível obter.
Assim, a indemnização não visa a perda do resultado querido, mas a oportunidade que se perdeu.
Contudo, vem sendo sistematicamente reforçada a ideia segundo a qual, apenas a omissão ou acção do terceiro que contendeu com um sério, real e muito provável desfecho favorável ao lesado pode configurar o dano.
Deste modo, o dano está associado à possibilidade real do êxito que se frustrou, mas não está desligado do nexo de causalidade.
Por isso a causalidade, atenta a particularidade do dano, deve ser analisada considerando que o lesado tinha uma chance, uma probabilidade, séria, real, de não fora a atuação que frustrou essa chance, obter uma vantagem que probabilisticamente era razoável supor que almejasse e/ou que a atuação omitida se o não tivesse sido, poderia ter minorado a chnace de ter tido um resultado não tão danoso como o que ocorreu.
Em suma, há perda de chance quando se perde um proveito futuro, ou não se evita uma desvantagem por actuação imputável a terceiro.
Como também se observa no Acórdão de 01.07.2014, processo 824/06.5TVLSB.L2.S1: “estando em causa uma obrigação de meios e não de resultado, a omissão da diligência postulada por essa obrigação evidencia, de forma mais clara, que a perda de chance de deve colocar mais no campo da causalidade e não do dano, devendo ponderar-se se a omissão das leges artis foi determinante para a perda de chance sendo esta real, séria e não uma mera eventualidade, suposição ou desejo, provavelmente capaz de proporcionar a vantagem que o lesado prosseguia”.
De todo o modo, é fundamnetal não esquecer que em sede de responsabilidade contratual, recai sobre o lesado o ónus da prova dos danos (cf.o art.º 342º, nº1 do Código Civil).
Assim, a presunção de culpa prevista no art.º 799º do mesmo código não se estende aos danos e a obrigação de indemnizar neste domínio rege-se de igual forma pelo critério previsto nos artigos 562º a 566º, o que impõe a alegação e prova dos concretos factos reveladores do dano sofrido.
Regressando aos autos o que temos é o seguinte:
Em 1983, o autor celebrou um contrato de trabalho sem termo com a sociedade E…, Lda., que se dedica à construção civil de obras públicas e particulares.
A partir dessa data, passou a exercer a sua actividade profissional remunerada, por conta, sob autoridade, fiscalização e direcção de tal empresa com a categoria profissional de 1.º Oficial de Carpinteiro.
O contrato de trabalho supra referido terminou por iniciativa daquela empresa em 12/04/2010, mediante despedimento, com fundamento nos factos constantes da motivação junta ao processo de impugnação de despedimento cuja cópia está junta a fls. 33 e segs., com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido.
Por requerimento datado de 21 de Abril de 2004, o autor impugnou judicialmente tal despedimento no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, sendo que tal impugnação deu origem ao processo n.º478/10.4TTMTS, que correu termos no 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
No âmbito desse processo foi marcada audiência de partes para o dia 07/05/2010, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
Naquela audiência de partes, as partes não lograram chegar a acordo, pelo que o processo prosseguiu os seus termos, tendo a entidade patronal apresentado, no dia 17 de Maio de 2010, o articulado para motivar o despedimento junto a fls. 33 e segs, com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido.
O aqui autor foi notificado, através de carta registada expedida em 19 de Maio de 2010, para contestar a acção no prazo de 15 dias.
O autor requereu junto dos serviços da Segurança Social que lhe fosse nomeado um Advogado para o representar no indicado processo judicial.
Após comunicação do aqui autor de que tinha requerido apoio judiciário na modalidade de nomeação de Advogado, foi ali proferido despacho judicial declarou interrompido o prazo para contestar ao abrigo do disposto no art.º 24, n.º 4 da lei n.º 47/2007 de 28/08, informando que tal prazo se iniciaria a partir da notificação ao patrono nomeado da designação ou da notificação ao trabalhador da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono nos termos do n.º 5 do citado preceito legal.
O ora segundo réu foi nomeado Patrono ao aqui autor, para contestar a acção que correu termos no 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos sob o Proc. 478/10.4TTMTS.
Tal nomeação foi notificada ao 2º Réu por e-mail datado de 01 de Julho de 2010.
Por carta registada expedida em 2 de Julho de 2010, o 2.º Réu convocou o Autor para uma reunião no seu escritório, informando-o que tinha sido nomeado Defensor Oficioso, designando o dia 7 de Julho de 2010, pelas 10:30 horas, para realização de tal reunião.
Na data designada para a reunião o beneficiário compareceu no escritório do exponente, tendo informado o mesmo que a sua entidade patronal o havia despedido e ainda que, como não concordava com o seu despedimento, levou a questão para tribunal dando origem a um processo de impugnação Judicial de regularidade e licitude do despedimento, o qual corria termos no Tribunal do Trabalho em Matosinhos um processo com n.º 478/10.4TTMTS, 2º Juízo.
Nessa mesma ocasião, o autor deu conhecimento ao réu do teor da notificação que recebeu.
O aqui segundo réu não apresentou contestação, em nome do ali também autor na referida acção de impugnação judicial de despedimento.
No mesmo processo, agora em 6 de Agosto de 2010, foi proferida a sentença cuja cópia está junta a fls. 47 e segs., com o teor que aqui se dá por integralmente reproduzido, que julgou a acção totalmente improcedente, e absolveu a empregadora do pedido contra ela formulado.
Perante o acbado de referir o que ressalta é que o réu Dr. D…, e apesar de ter sido notificado para o efeito, não contestou em nome do autor, a acção que correu termos no 2º Juízo do Tribunal de Trabalho de Matosinhos, sob o nº478/10.4TTMTS, permitindo que na mesma fosse proferida sentença na qual a acão foi julgada totalmente improcedente por não provada e assim absolvida a entidade patronal do mesmo autor do pedido de impugnação judicial da regularidade e ilicitude do seu despedimento.
Ora, como antes já deixamos aflorado, o réu, ora apelado Dr. D…, ao assumir o patrocínio do autor e por força do contrato de mandato que do mesmo decorre, ficou obrigado a desenvolver, com adequada diligência e perícia uma determinada actividade jurídica, ficando também adstrito à prática de todos os actos materiais instrumentais necessários à execução do mesmo contrato.
Em face deste elementos pode pois afirmar-se que o devedor (o aqui 2º réu) deixou de realizar a prestação a que estava adstrito no momento e nos demais circunstancialismos em que estava obrigado a realizá-la.
E com essa conduta resulta manifesto que violou o direito do credor (o aqui autor), praticando por isso um acto ilícito.
Mas como todos sabemos, tal circunstancialismo não é suficiente para responsabilizar o mesmo réu nos termos aqui propostos.
Isto porque a simples privação do exercício do direito de defesa não consubstancia o dano.
Ou seja, o dano apenas ocorre perante a forte probabilidade de, não fora o acto de terceiro, os autores se encontrarem em condições de poder evitar a condenação no pedido, ou seja, se tal omissão do advogado contendeu com um sério, real e muito provável desfecho da acção favorável ao ali também autor.
Como ante já vimos, trata-se, assim, de apurar da possibilidade real de se alcançar um determinado resultado positivo, mas de verificação incerta.
Neste domínio, a doutrina e jurisprudência vêm defendendo que está em causa ”um juízo dentro do juízo ou de prognose” (cf. entre outros o acórdão do STJ de 30.09.2014, proc. 739/09.5TVLSB.L2-A.DS1, www.dgsi.pt).
A ser assim, cabe apurar se no caso concreto da referida ação e perante os dados objectivos que temos aqui ao nosso dispor, seria expectável que o aqui autor configurasse a “chance” de provar a ilicitude do despedimento de que foi objecto por parte da sua entidade patronal.
E para responder a tal questão, valem as razões expendidas pelo Sr. Juiz “a quo” na sentença recorrida.
Vejamos, pois.
Na acção a que aqui nos reportamos, o autor B…, pretendia questionar o fundamento do despedimento de que foi alvo por parte da sua entidade patronal, essencialmente através da impugnação do comportamento que lhe foi imputado e que a mesma traduziu no facto de ter guardados no seu cacifo ferramentas àquela pertencentes.
Segundo a sua versão dos factos, pretendia também trazer a juízo naquela acção, novos factos que justificariam a sua actuação e afastavam a ilicitude da sua conduta laboral, como seria a existência na empresa de uma autorização genérica que permitia a utilização pelos seus trabalhadores em proveito pessoal de ferramentas e materiais pertencentes à entidade patronal.
Como já todos vimos, foram estes os argumentos que nesta acção de que este recurso também faz parte, que o mesmo autor e ora apelante aqui veio trazer.
No entanto e apesar de todos os esforços processuais que realizou para o efeito, também aqui não logrou descredibilizar a versão dos factos na qual a sua entidade patronal ali fundou o seu despedimento.
A ser assim, tem inteira razão o Tribunal “a quo” quando considera que perante a factualidade que então ficou provada e mesmo por via recursiva, não se dislumbra a existência de uma chance substancial de procedência da acção de impugnação do despedimento intentada pelo autor e aqui apelante B….
Tudo isto sem deixar de aludir à orientação jurisprudencial que maioritariamente vem sendo adoptada em casos como o dos autos e segundo a qual, “a diminuição de confiança resultante de condutas consubstanciadoras da violação do dever de lealdade do trabalhador para com a sua entidade patronal não depende necessariamente da verificação de prejuízos graves ou avultados para a entidade empregadora, ou sequer da existência de prejuízos”, razão pela qual nestes casos se deve concluir que o dever absoluto de honestidade, subjacente ao dever de lealdade, subvaloriza o valor concreto da apropriação.
Impõe-se pois dizer, que mesmo que fosse junta aos aludidos autos a contestação que o aqui 2º réu não elaborou, continuaria a ser improvável que o autor B… visse ter êxito o pedido de impugnação judicial de despedimento que a seu tempo formulou contra a sua entidade patronal.
Em suma, não estão assim reunidos os pressupostos em que assenta o dano “perda de chance”, porquanto o autor/apelante não logrou demonstrar a possibilidade certa, real e séria de se alcançar um determinado resultado positivo ou favorável à respetiva pretensão no âmbito do aludido processo, razão pela qual não lhe assiste o direito à indemnização peticionada.
Improcede assim, a segunda e última das pretensões recursivas aqui formuladas pelo apelante.
Impõe-se por isso a confirmação integral do que em 1ª instância ficou decidido.
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Sumário (cf. art.º663º, nº7 do NCPC):
1. O dano da “perda de chance ou oportunidade” consiste na possibilidade real de alcançar um determinado resultado positivo, ainda que de verificação incerta e que por intervenção de um terceiro foi impossível obter, razão pela qual a indemnização a conceder não visa a perda do resultado querido, mas a oportunidade que se perdeu.
2. Assim, apenas a omissão ou acção do terceiro que contendeu com um sério, real e muito provável desfecho favorável ao lesado pode configurar o dano, já que o dano está associado à possibilidade real do êxito que se frustrou.
3. Tal não ocorre quando não obstante a conduta omissiva do patrono oficioso do autor alegadamente lesado, traduzida na não apresentação de articulado no qual iriam ser vertidas as razões nas quais o mesmo impugnaria a regularidade e a licitude do seu despedimento, se conclui perante os elementos de facto disponíveis, que tal pretensão não teria reais e razoáveis probabilidades de obter provimento.
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III.Decisão:
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso de apelação, razão pela qual se confirma integralmente a sentença recorrida.
*
As custas do presente recurso são a cargo do autor/apelante (cf. o art.º527º, nºs 1 e 2 do NCPC).
*
Notifique.

Porto, 3 de Dezembro de 2015
Carlos Portela
Pedro Lima Costa
Pedro Martins