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SEPARAÇÃO DE PROCESSOS
Sumário
Texto Integral
Acordam, em conferência, na Secção Criminal ( 9ª ) do Tribunal da Relação de Lisboa:
(...)
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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A questão que emerge no presente recurso radica em saber se não pode operar-se a separação de processos nos termos do art.º 30º, nº 1, al. a), do C.P.Penal, relativamente a um arguido condenado, antes de ter transitado o acórdão que o condenou bem como aos demais co-arguidos, com a finalidade daquele iniciar, de imediato, o cumprimento da pena que lhe foi aplicada.
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Resulta dos elementos que instruem os presentes autos de recurso que o arguido (V), por acórdão, não transitado, proferido no processo a que acima se faz referência, foi, como outros arguidos, condenado, tendo-o sido na pena de 3 anos e 3 meses de prisão pela prática de um crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 299º, nº 2, do Código Penal.
Posteriormente, veio ele requerer a separação de processos nos termos que acima se deixaram descritos, pretensão essa que mereceu deferimento por despacho de 6 de Março de 2003, também acima transcrito.
Manifestou-se no despacho recorrido o entendimento de que a separação de processos pode verificar-se a todo o tempo e nas circunstâncias descritas na norma processual, uma vez que a lei não distingue o momento em que pode operar-se a separação, sendo ainda que o processo não se encontra terminado, por o acórdão não haver transitado em julgado.
Com o que se insurge a Digna Magistrada do MºPº junto do tribunal “a quo” considerando que não podia ter sido determinada a separação de processos.
Vejamos.
Estatui o art.º 30º do C.P.P., com a epígrafe “Separação de processos”:
· «1. Oficiosamente, ou a requerimento do Ministério Público, do arguido, do assistente ou do lesado, o tribunal faz cessar a conexão e ordena a separação de algum ou alguns dos processos sempre que:
· a) Houver na separação um interesse ponderoso e atendível de qualquer arguido, nomeadamente no não prolongamento da prisão preventiva».
A questão que se coloca prende-se com a interpretação a dar ao disposto no citado artigo, maxime, se a separação de processos pode ocorrer a todo o tempo, contanto que verificado, para o que ora releva, o pressuposto legalmente estabelecido na sua alínea a).
“O princípio geral de que parte o CPP é o de que a cada crime corresponde um processo para o qual é competente o tribunal definido em função das regras da competência material, funcional e territorial (...).
A lei admite, porém, que a regra básica de que a cada crime corresponde um processo seja alterada, organizando-se um só processo para uma pluralidade de crimes, desde que entre eles exista uma ligação que torne conveniente para a melhor realização da justiça que todos sejam apreciados conjuntamente. A esta ligação entre os crimes, que determina excepções à regra de que a cada crime corresponde um processo e às regras de competência material, funcional e territorial definidas em função de um só crime, chama a lei conexão e consequentemente a chamada competência por conexão ( epígrafe da secção III, cap. II, liv. I ) representa um desvio às regras normais da competência em razão da organização de um único processo para uma pluralidade de crimes ou da apensação de vários processos que hão-de ser julgados conjuntamente.
A conexão de processos é determinada por conveniência da justiça. Há entre os crimes que hão-de ser julgados conjuntamente uma tal ligação que se presume que o esclarecimento de todos será mais fácil ou mais completo quando processados juntamente, evitando-se possíveis contradições de julgados e realizando-se consequentemente melhor justiça” ( vd. Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, I, 1993, pág. 138 ).
São basicamente objectivos de economia processual ( afastamento da repetição inútil de provas ) e de prevenção de contradição de julgados que constituem a razão de ser da conexão de processos.
E, como se observa no Acórdão desta Relação de 14-10-1998, CJ, Ano XXIII, tomo IV, 153, pode tirar-se a conclusão que, “quando se põe termo à conexão com a consequente separação de processos conexos, está a pôr-se em causa o interesse da economia processual, impõe-se a repetição de provas e corre-se o risco de julgados contraditórios”, constituindo a separação excepção à conexão.
E intui-se até pelas próprias razões determinantes ou em que se funda a conexão que a separação de processos só possa ocorrer até ao início da audiência de julgamento.
De resto, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01-10-97, proferido no Proc. nº 45963, entendeu-se que “o pedido de separação de processos deve ser formulado antes da efectivação do julgamento na primeira instância, como resulta da análise do preceituado no art.º 30º, do CPP” ( sumário ).
E um argumento que se retira da tradição do nosso ordenamento jurídico constitui elemento adjuvante no sentido de a separação de processos apenas ser possível em momento anterior ao julgamento.
Com efeito, com redacção quase idêntica à da alínea a) do nº1 do art.º 30º e visando a mesma finalidade, dispunha o art.º 56º, § único, do Código de Processo Penal de 1929, que “O juiz poderá, oficiosamente, a requerimento do MP, da parte acusadora ou dos réus, ordenar, em despacho fundamentado, o julgamento em separado, quando necessário para não prolongar a prisão preventiva de algum dos acusados ou por outro motivo atendível”.
Considera-se, pois, em função de tudo o que vem de ser expendido que do art.º 30º do C.P.P. não resulta que a separação de processos possa ocorrer a todo o tempo tal como entendimento manifestado na decisão recorrida, antes dele resultando, ao invés, que a separação de processos apenas pode efectuar-se até ao início do julgamento.
E, “a latere”, diga-se que não sendo possível “in casu” a separação de processos, tal não seria impeditivo de se considerar transitada a decisão quanto ao arguido (V), caso os recursos dos arguidos recorrentes se fundassem em motivos estritamente pessoais, o que não parece ser o caso.
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Por todo o exposto, acordam os Juízes desta Relação em conceder provimento ao recurso, revogando, em consequência, o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que indefira a requerida separação de processos.
Sem tributação.