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CONFISSÃO
CONFISSÃO JUDICIAL
REQUISITOS
Sumário
Para que determinada declaração feita nos autos por advogado não munido de poderes especiais para confessar pudesse ser considerada tacitamente confessória, teria que ter sido admitida por acordo, por não ter sido impugnada (como foi) e teria que ser clara e inequívoca, E mesmo que dela se pudesse extrair algum carácter confessório, importaria ter em atenção o princípio da indivisibilidade de confissão.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
(...)
III – Fundamentos de Direito
Como acima se referiu, a única questão a decidir no presente recurso é da saber se resultou ou não provado, nestes autos, que a ré pagou ao autor a gratificação de 1997 vencida em 1998 no valor de 2.000.000$00.
Para o efeito, alega o recorrente que o autor reconheceu expressamente através do seu mandatário que a gratificação de 1997 a pagar em 1998 não se encontrava em dívida, o que fez através do seu requerimento de fls. 226, no qual requereu a correcção do pedido formulado na al.B) da P.I., devendo passar a ler-se 1998 onde se lê 1997 .
Vejamos, então, o que se passou:
O autor formulou a sua petição inicial diversos pedidos entre os quais o referido na alínea B) pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 2.000.000$00, relativo ao montante da gratificação de 1997, acrescida dos respectivos juros de mora.
Posteriormente, no decurso da audiência de julgamento apresentou, através do seu mandatário, o requerimento de fls. 226, o referido pelo recorrente, onde veio efectivamente requerer a correcção dos art.s 24 e 104 da PI, nos seguintes termos : “ tendo só agora verificado que , por mero lapso, no pedido formulado no presente processo se requer a condenação da ré no pagamento da participação nos lucros referente a 1997, a pagar a 1998, vem pelo presente , muito respeitosamente, requerer a correcção dos art.s 24º e 104, passando a ler-se 1998 onde se lê 1997 e 1999 onde se lê 1998.”, concluindo pela correcção, em conformidade, do pedido formulado em B).
Sobre este requerimento o réu, em audiência, pronunciou-se pelo seu indeferimento - ver acta fls. 227 – o qual veio a ser indeferido nos seguintes termos “... julga- se não poder concluir que nos referidos artigos 24º e 104º e al.b) da PI houve uma manifesta divergência entre o que se pretendia declarar e aquilo que se declara , ou seja, não se nos afigura que de um modo claro e inequívoco ocorra um erro material cuja rectificação seja possível . Nessa conformidade indefere-se a requerida correcção .”
Deste despacho não foi interposto recurso, tendo de seguida o autor efectuado novo requerimento, a fls. 231, no qual veio requerer a alteração parcial do pedido por ampliação, alegando que : “por mero lapso aquando da elaboração do articulado, não foi peticionado juntamente com a prestação referente a 1997 a que seria devida em 1999, por referência a 1998 e de igual montante. Assim sendo , deve o pedido formulado sob a alínea B) do petitório ser ampliada de 2.000.000$00 para 4.000.000$00. “
Este ampliação do pedido foi indeferida, no despacho de fls. 247,em virtude de se ter considerado que a ampliação visada não constituía desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo.
Feito o périplo do sucedido processualmente, resulta que a decisão em questão, de saber se está provado ou não nos autos se o réu efectuou o pagamento da verba referente à gratificação de 1997 a pagar em 1998, passa por apreciar se daquele 1º requerimento, de fls. 226, se pode extrair a declaração confessória de que o autor considerava não estar em dívida a gratificação respeitante ao ano de 1997.
Nos termos do art. 352º do Ccivil, a confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária. E pode ser judicial ou extrajudicial – art.º 355 do CC : - a confissão judicial é aquela que é feita em juízo e só vale como judicial na acção correspondente ; - a confissão extrajudicial é a feita por algum modo diferente da confissão judicial.
Nos termos do art. 356º do mesmo diploma legal, “a confissão judicial espontânea pode ser feita nos articulados, seguindo as prescrições da lei processual ou , em qualquer outro acto do processo, firmado pela parte pessoalmente ou por procurador especialmente autorizado.”
Assim, a confissão judicial espontânea pode ter lugar em qualquer acto do processo como num simples requerimento junto aos autos.
Mas, as declarações confessórias feitas pelo advogado, oralmente ou por escrito, com simples procuração ad litem, não valem como confissão, ficando porém salva a confissão tácita resultante dos articulados, conforme dispôem os n.º1 e 2 do art. 490 n.º1 e 2 do CPC ou a confissão expressa feita nos termos do art.º 567 n.º 2 do CPC- Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela , Código Ccivil Anotado ,pág 293 .
Dispõe, ainda, o n.º1 do art. 357º do CC, que : “a declaração confessória deve ser inequívoca, salvo se a lei o dispensar.”
E, resulta, também, do art. 360º do CC, que a declaração confessória é indivisível e, como tal, tem de ser aceite na íntegra, salvo provando-se a inexactidão dos factos que transcendem a declaração estritamente confessória.
Recordado o regime legal da confissão, chegamos facilmente à conclusão de que do aludido requerimento de fls. 226, apresentado pelo advogado do autor, não se pode extrair a declaração confessória por parte deste de que o réu não lhe deve a importância relativa à gratificação respeitante ao ano de 1997, e vejamos três razões para este entendimento:
- A rectificação requerida no aludido requerimento, de fls. 226, foi subscrito pelo advogado do autor sem contudo estar munido de poderes especiais para confessar, pelo que se da mesma se pudesse extrair alguma confissão, apenas, poderia ser um confissão tácita, nos termos do art. 490 nº1 do CPC, ou seja, admitida por acordo porque não impugnada; só que tal não se verificou, pois que, como acima se referiu, o réu pronunciou-se, expressamente, pelo seu indeferimento, o que veio a acontecer por despacho transitado em julgado .
- Por outro lado, como correctamente é referido no despacho que a indeferiu, a correcção do pedido formulado na al. B) não era clara e inequívoca, pois resulta que o autor, por diversas vezes, na seu articulado inicial referiu que os pagamentos das gratificações foram efectuados até 1996 – art. 16, 18 e 33 da PI ; no art. 49 da contestação o réu invocou o seu pagamento e o autor na resposta, oferecida em articulado, produziu declarações referentes ao não pagamento da quantia em causa, reportada ao ano de 1997 (art. 103 e 107 da resposta à contestação), pelo que não se podia concluir por uma manifesta divergência entre o que se pretendia declarar e aquilo que se declarou, não resultando assim inequívoca a declaração confessória que o réu agora pretende fazer valer, de que o autor não considerava em dívida a quantia referente à gratificação respeitante ao ano de 1997.
- Por fim, diga-se ainda que, de acordo com o princípio da indivisibilidade da confissão, consagrado no art. 360º do CC, mesmo que se pudesse extrair alguma declaração confessória do constante no requerimento em causa, teria então e se aceitar que o réu estaria em divida com a verba vencida em 1999, referente ao ano de 1998, cujo pagamento a ré também não logrou provar, pois a indivisibilidade da confissão impõe que numa confissão complexa, como seria o caso, ela seja aceite na íntegra (a ré não deve a verba respeitante ao ano de 1997 mas deve a respeitante ao ano de 1998).
Por tudo o exposto, não se pode extrair do requerimento de fls. 226 a declaração confessória pretendida pelo recorrente de que a ré não devia ao autor a gratificação referente ao ano de 1997. E, não tendo o réu logrado provar o seu pagamento, como lhe competia, nos termos do art. 342 do Ccivil, não se pode julgar procedente o recurso interposto pelo réu, no sentido de que pagou ao autor a quantia de 2.000.000$00, referente à gratificação de 1997.
Confirmando-se a decisão sobre recurso, nos termos do art. 710 nº1 do CPC, nãos se aprecia o agravo que havia sido interposto pelo apelado.
IV - Em Decisão
Face ao exposto, julga-se improcedente o recurso de apelação interposto pelo réu e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pelo apelante
Lisboa, 22 de Outubro 2003
Paula Sá Fernandes
Filomena Carvalho
Guilherme Pires