PENA DE EXPULSÃO
Sumário

I - Tendo sido o arguido condenado pela prática de crime de tráfico de estupefacientes e detenção de arma ilegal em pena unitária de 4 anos e três meses de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 5 anos, é de manter tal condenação – pena de prisão naquela concreta medida - por ser proporcional à medida da culpa, bem como a pena acessória de expulsão.

II – No que a esta pena acessória respeita a mesma não merece censura por obedecer aos requisitos do artº 101º, nº 1 do DL 244/98, de 8/8, com as alterações introduzidas pela Lei nº 97/99, de 26/7, e DLs 4/01 de 10/1 e 34/03, de 25/2, ou seja, tratar-se cidadão estrangeiro não residente, condenado por crime doloso em pena de prisão superior a seis meses.

III – No caso vertente tal pena justificava-se ainda que o arguido fosse cidadão residente por se verificarem os requisitos dos nºs 2 e 4 daquele artº 101º - gravidade dos factos e dos bens jurídicos violados e não inserção na vida social.

Texto Integral

Acordam, em audiência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

Iº 1. No Processo Comum (Tribunal Colectivo) nº6/03.8PEBRR, do 2º Juízo Criminal do Barreiro, foram julgados, (A) e (B)
Condenados por acórdão de 29Março04, por crimes de tráfico de estupefacientes (art.21, do Dec. Lei nº15/93) e detenção ilegal de arma (art.6, nº1, da Lei nº22/97), respectivamente, cinco anos e seis meses de prisão e oito meses de prisão e, em cúmulo jurídico, cada um, na pena única de cinco anos e nove meses de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional, com interdição de entrada por cinco anos, o arguido (A) interpôs recurso, tendo sido proferido acórdão por este TRL (fls.583 e segs.), considerando que os factos praticados por este arguido integram o crime do art.25, al.a, do Dec. Lei nº15/93, anulando o acórdão proferido para que fosse cumprido art.358, nº3, do CPP.
Reaberta a audiência em 1ª instância e dado cumprimento ao ordenado pelo acórdão de fls.583 e segs., o Tribunal decidiu por acórdão de 22Out.04, além do mais, condenar o arguido (A), como autor material e em concurso real:
-de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art.25, al.a) do Dec.Lei nº15/93, na pena de quatro anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional, sendo-lhe vedada a entrada no mesmo pelo período de cinco anos;
-um crime de detenção ilegal de arma, p. e p. no art.6, n° 1 da Lei 22/97 na pena de oito meses de prisão;
-em cumulo jurídico, na pena única de quatro anos e três meses de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional, sendo-lhe vedada a entrada no mesmo pelo período de cinco anos;

2. Desta decisão recorre o arguido, (A), tendo apresentado motivações, das quais extraiu as seguintes conclusões:
2.1 O ora recorrente discorda da medida concreta da pena que lhe foi aplicada, a qual se afigura manifestamente exagerada e desproporcional;
2.2 O Douto Tribunal não valorou convenientemente todas as circunstâncias atenuantes que militam a favor do recorrente, nomeadamente não possuir antecedentes criminais e ter confessado integralmente e sem reservas todos os factos constantes da Douta Acusação Pública;
2.3 Perante esta evidência, deveria o Douto Tribunal aplicar o “quantum” da pena em três (3) anos de prisão, suspensos na sua execução por igual período de tempo;
2.4 Por último, discorda o ora recorrente da pena acessória de expulsão do Pais, com interdição de entrada por cinco anos, uma vez que o mesmo tem laços familiares e profissionais consistentes em Portugal, para alem de ter sido já titular de uma Autorização de Residência que caducou devido a sua situação de prisão preventiva;
2.5 Pelo que deve ser dado sem efeito a pena acessória de expulsão decretada pelo Tribunal “a quo”.    
Violou assim o Douto Tribunal, as normas constantes dos artigos 40º e 71º do C.P. e ainda as normas do artigo 101º n.º 1 do D.L. 244/98 de 08/08, na redacção dada pelo D.L. 4/01 de 10 de Janeiro;
Nestes termos e nos demais de Direito e com o sempre mui Douto Suprimento de V. Excias, atento tudo o supra exposto, deverá o presente recurso obter provimento e condenar-se o arguido pela prática do crime de tráfico de estupefacientes e da pratica de um crime de detenção de arma proibida  numa pena única  de três anos de prisão, suspensos na sua execução por igual período de tempo.   
Por outro lado V. Exciªs deverão dar sem efeito a pena acessória de expulsão do Território Nacional por um período de cinco anos que lhe foi imposta.

3. O Ministério Público respondeu, concluindo:
3.1 A ausência de antecedentes criminais e a confissão parcial dos factos pelo arguido são circunstâncias atenuantes gerais insuficientes para que a pena única englobada de dois crimes graves seja fixada em 3 anos de prisão.
3.2 A pena única de 4 anos e 3 meses de prisão mostra-se proporcional à medida da culpa do arguido, não tendo assim violado o douto acórdão recorrido o disposto nos artigos 40º e 71ºdo Código Penal.
3.3 O arguido encontra-se em situação ilegal no País desde Setembro de 2001, e não desde a data em que foi detido, e incorreu na prática de dois crimes graves.
3.4 A pena acessória de expulsão do território português pelo período de 5 anos tem o seu fundamento legal no disposto nos artigos 34º, nº1, do Decreto-Lei nº15/93, de 22 de Janeiro, e 101º, nº 1, do Decreto-Lei nº244/98, de 8 de Agosto, na redacção que lhe foi introduzida pela Decreto-Lei nº34/2003, de 25 de Fevereiro.
3.5 Pelas razões expostas, o recurso do arguido não merece provimento, devendo ser mantido o douto acórdão recorrido nos seus precisos termos por não merecer censura.

4. Neste Tribunal, o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto  apôs o seu visto.
5. Colhidos os vistos legais, realizou-se audiência.
6. O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, é o seguinte:
a) Medida da pena;
b) Suspensão da execução da pena;
c) Pena acessória de expulsão do território nacional;

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IIº A decisão recorrida, no que diz respeito aos factos provados, não provados e respectiva fundamentação, é do seguinte teor:
A- Factos provados:
1. Desde o mês de Janeiro de 2003 que foram chegando ao conhecimento dos agentes da PSP-BIC do Barreiro informações no sentido de que o arguido (B), conhecido por "(BB)", residente algures na Vila Chã, procedia à venda de substâncias estupefacientes, normalmente heroína, no Bairro das Palmeiras, Barreiro;
2. As mesmas informações davam conta que o estupefaciente vendido nos moldes supra descritos era guardado na residência de um indivíduo conhecido pela alcunha de "(BY)", residente no próprio Bairro das Palmeiras e que se veio a apurar tratar-se do arguido (A);
3. Na sequência da captação de imagens vídeo, foi possível confirmar que o arguido (A), desde finais de Janeiro de 2003, no local em causa, Bairro das Palmeiras e com frequência, era abordado por diversos indivíduos que lhe adquiriram heroína, contra a entrega de dinheiro ou de objectos com valor venal, nomeadamente electrodomésticos de som e imagem;
4. Tendo sido emitidos mandados de busca domiciliária para a residência do arguido (A), cumpridos no dia 24.04.03, aí vieram a ser apreendidos, para além de outros objectos, descritos a fls. 79/80, que aqui se dão por integralmente reproduzi das, os seguintes:
a) um canto de saco plástico, onde se encontrava um pedaço de jornal que dissimulava no seu interior dois pequenos cantos de saco plástico, contendo um produto em pó com o peso líquido total de 0,166 gramas, que se apurou tratar-se de heroína;
b) uma pistola de alarme, de origem italiana, sem número, marca F.T., modelo GT 28, transformada para calibre 6,35 mm, através de um cano estriado com 60 mm de comprimento que lhe foi embutido, com o respectivo carregador e doze munições do mesmo calibre;
c) a quantia de € 407,22;
d) um aparelho leitor de vídeo, marca Worten, de cor cinzenta;
5. Após interrogatório judicial e tendo sido colocado em liberdade o arguido (A) e porque, pelo menos a partir de Junho de 2003, a actividade de venda de estupefacientes continuou a ser efectuada por este arguido no local inicialmente referido, vieram a ser emitidos novos mandados de busca domiciliária para a sua residência e respectivos anexos, os quais foram cumpridos no dia 13.10.03, aí tendo sido apreendidos, para além de outros objectos, descritos a fls.196/198, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, os seguintes:
a) a quantia de € 90, dissimulada no interior de um livro (Código da Estrada);
b) vários pedaços de saco plástico recortados em forma redonda, aptos ao acondicionamento de estupefaciente em pó, os quais estavam dissimulados no interior de uma peúga de cor azul;
c) vinte e um pequenos cantos de saco plástico, contendo um produto em pó com o peso líquido de 1,463 gramas, que se apurou tratar-se de heroína;
d) sete pequenos cantos de saco plástico, contendo um produto em pó com o peso líquido de 0,490 gramas, que se apurou tratar-se de cocaína;
6. Os pequenos cantos de saco plástico eram vendidos pelo arguido (A) pelo preço unitário de €5 os que continham heroína (correspondente a uma dose de consumo) e €10 os que continham cocaína (correspondente a duas doses de consumo);
7. Não obstante conhecedores das características estupefacientes dos produtos que tinha consigo e na sua residência, bem como de que não se encontrava legalmente autorizado para a posse dos mesmos, destinava-os o arguido à venda a terceiros que para esse efeito o procurassem, como efectivamente sucedeu nos períodos temporais supra referidos, guardando para si os proventos auferidos por esse actividade;
8. Tais proventos consistiam quer em dinheiro quer em electrodomésticos, nomeadamente vídeo-gravadores, rádios e leitores de CD, pois estes objectos eram aceites pelo arguido (A) como forma de pagamento do estupefaciente que vendia, a exemplo de todos aqueles que lhe foram apreendidos e que tiveram essa origem;
9. A arma de fogo apreendida ao arguido (A) encontrava-se em bom estado de funcionamento, podendo ser utilizada como objecto letal se usada adequadamente contra alguém para esse efeito;
10. Atenta a alteração das respectivas características, nos termos supra descritos, mostra-se aquela arma insusceptível de ser manifestada ou registada ou, por qualquer forma, legalizada;
11. Encontrava-se o arguido ciente das aludidas alterações introduzidas na arma, sabendo ser proibida a sua posse naquelas circunstâncias, sendo certo que não era titular de licença de uso e porte de arma de defesa;
12. O arguido (A) encontrava-se em situação irregular em Portugal desde o mês de Setembro de 2001, data em que caducou a sua autorização de residência temporária no nosso país;
13. Agiu o arguido (A) livre e conscientemente, sabendo ser proibida a sua conduta;
14. O arguido (A) confessou parcialmente os factos, admitindo ter procedido a algumas vendas de heroína e cocaína, bem como ter adquirido e deter a pistola que lhe foi apreendida;
15. Adquiriu a arma que lhe foi apreendida por € 200,00, cerca de 5/6 meses antes da data em que lhe foi apreendida;
16. Durante o tempo que esteve em Portugal chegou a trabalhar na construção civil, estando sem trabalhar há pelo menos dois meses na data dos factos;
17. À data dos factos vivia em casa arrendada, por cerca de € 125,00 mensais;
18. O arguido (A) é pai de quatro filhos, com as idades de 10, 12, 14 e 16 anos, que vivem em Cabo Verde com a mãe, aí tendo também os seus pais a viver;
19. O arguido (A) tem como habilitações literárias a 4ª classe e não tem antecedentes criminais registados em Portugal.
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B-FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provaram os restantes factos articulados na acusação, que sejam incompatíveis com os atrás dados como provados, nomeadamente que:
1. Os proventos auferidos pelo arguido (A) consistiam em objectos de ourivesaria (nomeadamente os anéis, fios, pulseiras, medalhas e libras em ouro que lhe foram apreendidos) e em telemóveis;
2. Todos estes objectos eram aceites pelo arguido como forma de pagamento do estupefaciente que vendiam e todos os objectos desta natureza que lhe foram apreendido tiveram essa origem.
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C- PROVA
Serviram de base para formar a convicção do Tribunal a análise critica e conjugada dos elementos de prova abaixo discriminados, apreciados segundo as regras de experiência comum e a livre convicção do julgador, nos termos do art.127, do Cód. de Proc. Penal, à excepção do exame pericial, que beneficia da presunção prevista no art.163 do mesmo diploma legal:
1. Quanto aos factos da acusação: os autos de apreensão de fls.38, 42, 79/80 e 196/8; os relatórios de vigilância de fls.21/2 e 50/1 confirmados pelos seus autores em audiência; o relatório de imagens vídeo de fls.376/7, confirmado pelas filmagens constantes do CD apenso; as fotografias de fls.14, 82, 199/205 e 270; os exames periciais do LPC de fls.252, 256/7 e 325 e os exames periciais de fls.123/7, 238/241, 246, 258/262 e 359; o depoimento das testemunhas VP, MN e JS, agentes da PSP, os quais depuseram de forma isenta, credível, coerente entre si e revelando razão de ciência, sobre os actos de investigação realizados, nomeadamente as vigilâncias realizadas aos arguidos, os comportamentos dos mesmos com as pessoas (indivíduos consumidores de estupefacientes, alguns deles conhecidos como tal pelos agentes da PSP) que os abordavam e as suas reacções nos dias das operações policiais; o depoimento das testemunhas P, J, F, H, AS, RF, L, FA, AJ, MF, FR, FL, PR e JG, os quais depuseram de forma credível sobre as circunstâncias em que conheceram o arguido (A) e as compras de heroína ou cocaína que lhe realizaram para o consumo pessoal de cada um deles.
O Tribunal não deixou de valorar a negativa do arguido em relação a factos que não assumiu, mas tal negativa é desprovida de credibilidade, no conjunto da apreciação global da prova produzida.
Saliente-se que a negativa do arguido (A), de não ser seu o estupefaciente que foi apreendido no dia 13.10.03, nuns anexos à sua residência, tal versão não tem qualquer credibilidade em confronto com o depoimento da testemunha VP, o qual, em vigilâncias realizadas, chegou a ver o arguido ir para o interior do pátio e aparecer com um saco plástico, com as características do que veio a ser apreendido, do qual retirava as embalagens de estupefaciente que entregava às pessoas que o abordavam, e que tinham todo o aspecto de consumidores de estupefacientes, em troca de dinheiro.
2. Relativamente às condições pessoais, sociais e económicas do arguido: as suas declarações e o doc. de fls. 75/6;
3. No tocante aos antecedentes criminais: o CRC de fls. 248;
4. Quanto aos factos não provados: a circunstância de não se ter feito prova suficiente de tais factos, não tendo o Tribunal adquirido convicção suficiente da ocorrência dos mesmos.    
Atente-se, neste aspecto, que o arguido negou tais factos, os depoimentos das testemunhas, agentes da PSP, não permitem concluir que visionaram trocas de estupefacientes por objectos de ouro ou telemóveis e os depoimentos da restantes testemunhas, consumidores e adquirentes de estupefacientes, também não permitem concluir que tenham adquirido heroína e cocaína a não ser por dinheiro.
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IIIº 1. O recurso tem como objecto, em primeiro lugar, a medida da pena concreta fixada pelo tribunal recorrido para o crime de tráfico de menor gravidade, p.p., pelo art.25, al.a, do Dec. Lei nº15/93, de 22-1, assente que está, na sequência do acórdão deste TRL de fls.583 e segs., já transitado em julgado, que a conduta do recorrente (A) integra esse tipo criminal.
Dispõe o art.40, do Código Penal que a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente (nº1) e que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (nº2).
A função primordial da pena consiste na protecção de bens jurídicos, ou seja, consiste na prevenção dos comportamentos danosos dos bens jurídicos, sem prejuízo da prevenção especial positiva e, sempre, com o limite imposto pelo princípio da culpa- nulla pena sine culpa.
Quanto à determinação da pena concreta, o art.71, nº1, do Código Penal, estabelece que a mesma se faz, dentro dos limites da lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo atender-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, nomeadamente o grau de ilicitude do facto, modo de execução deste, gravidade das suas consequências, grau de violação dos deveres impostos ao agente, intensidade do dolo ou da negligência, sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram, condições pessoais do agente e a sua situação económica, conduta anterior ao facto e a posterior a este, falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto (nº2, als.a, a f, da mencionada disposição legal).
A moldura penal, correspondente ao crime aqui em causa, é de um a cinco anos de prisão.
O grau do ilícito, considerando a conduta global do agente é elevado (procedeu a actos de venda de heroína desde finais de Jan.03 até 24Abr.03, após interrogatório judicial e tendo sido colocado em liberdade, pelo menos a partir de Jun.03 continuou essa actividade de venda até 13Out.03, tendo nesta data lhe sido apreendido 1,463gr. de heroína e 0,49gr. de cocaína)[1]. Na verdade, a conduta prolongou-se ao longo do tempo, o que eleva significativamente o grau do ilícito (considerando o grau do ilícito médio subjacente ao art.25), apesar do reduzido quantitativo do produto que veio a ser apreendido[2].
O grau da culpa, tendo em conta a conduta global, é também elevado, para essa conclusão sendo particularmente significativo o facto do arguido ter continuado a exercer o tráfico após ter sido submetido a interrogatório judicial neste processo, altura em que foi indiciado por crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade e lhe foi aplicada como medida de coacção a obrigação de apresentação semanal em posto policial (fls.103).
O modo de execução, como refere a decisão recorrida, é primário e pouco sofisticado, típico do último passo do percurso que leva o produto até ao consumidor.
As consequências são bastante negativas, para a saúde dos consumidores, mas também para a sociedade em geral, como é do conhecimento comum.
O grau de violação dos deveres impostos ao agente, como refere a decisão recorrida, é elevado, atenta a sua condição de estrangeiro, que o devia levar a um maior respeito pelos valores vigentes na país onde se encontra acolhido.
Os sentimentos manifestados, de indiferença para com os malefícios causados à saúde dos consumidores.
Os fins ou motivos, relacionados com intenção de obtenção de lucro fácil e rápido.
A favor do arguido, a sua confissão parcial e a sua primariedade, sendo que essa confissão parcial não merece grande relevância, dada a evidência das outras provas (além da prova testemunhal, autos de apreensão, relatórios de vigilância e de imagens vídeo).
Perante este quadro, de que se destacam os graus elevados da culpa e do ilícito, a graduação da pena concreta terá de ser feita acima do ponto médio entre os limites mínimo e máximo da pena abstracta, apresentando-se adequada a sua graduação entre os pontos médio e máximo (quatro anos), como foi feito pelo tribunal recorrido.
Na verdade, pena de três anos, como pretende o recorrente, apresentar-se-ia insuficiente para a protecção dos bens jurídicos e desproporcional ao elevado grau da culpa, já que só pena adequada a essa culpa poderá conduzir à interiorização do desvalor da conduta e à reintegração do agente.
Em relação à pena única de quatro anos e três meses de prisão, aplicada em cúmulo jurídico das penas parcelares correspondentes aos crimes de tráfico e de detenção de arma proibida, a mesma foi fixada dentro dos limites do nº2, do art.77, do Código Penal, apresentando-se adequada aos critérios previstos no nº1 do mesmo preceito, o que, aliás, o recorrente não pôs em causa.
2. O recorrente peticiona a suspensão da execução da pena. Contudo, ultrapassando a mesma o limite previsto no art.50, nº1, do Código Penal, não pode essa sua pretensão proceder, desde logo porque a lei não o admite em relação a penas de prisão superiores a três anos.
3. O recorrente foi condenado, ainda, em pena acessória de expulsão do território nacional, com interdição de entrada por cinco anos.
Para o efeito, ponderou o tribunal recorrido o facto do arguido ser condenado em pena de prisão efectiva superior a seis meses, por crime doloso, além de não se encontrar enquadrado em Portugal, quer familiar quer socialmente.
O recorrente, por seu lado, insurge-se contra aquela pena acessória, alegando que tem laços familiares e profissionais consistentes em Portugal, para além de ter sido já titular de uma autorização de residência que caducou devido à sua situação de prisão preventiva.
De acordo com o art.34, nº1, do Dec. Lei nº15/93, de 22-1, em caso de condenação por crime previsto neste diploma, se o arguido for estrangeiro, o tribunal pode ordenar a sua expulsão do País por período não superior a dez anos.
As condições de expulsão de cidadão estrangeiro do território nacional estão reguladas no Dec. Lei nº244/98, de 8-8, com as alterações introduzidas pela Lei nº97/99, de 26-7, pelo Dec. Lei nº4/01, de 10-1 e Dec. Lei nº34/03, de 25-2.
No caso, foi considerado assente que a autorização de residência temporária no nosso país do arguido caducou em Set.01, o que está conforme o documento de fls.75, não tendo fundamento a sua alegação de a mesma ter caducado devido à situação de prisão preventiva, pois esta só foi decretada em Out.03.
Assim, na altura em que praticou os factos, o arguido não era cidadão residente, atenta a definição de cidadão residente que nos é dada pelo art.3, do citado Dec. Lei nº244/98.
O art.101, nº1, do mesmo regime legal, admite a aplicação da pena acessória a cidadão estrangeiro não residente, condenado por crime doloso em pena de prisão superior a seis meses, como é o caso dos presentes autos.
Contudo, mesmo que o arguido fosse cidadão residente, justificava-se aquela pena acessória, nos termos do nº2, do mesmo preceito. Na verdade, os factos praticados pelo arguido são graves, tendo sido violados bens jurídicos relacionados com a saúde pública, com efeitos altamente perniciosos na comunidade, não se encontrando o mesmo inserido na vida social (não trabalhava na altura da detenção e os familiares próximos não residem em Portugal). Por outro lado, não se verifica qualquer das situações previstas nas várias alíneas do nº4, do mesmo preceito legal (não nasceu em Portugal, não se encontra aqui desde idade inferior aos dez anos, tendo declarado aquando do primeiro interrogatório judicial que se encontrava desde quatro anos antes e os seus filhos menores residem em Cabo Verde).
Deste modo, a necessidade de defesa da ordem e segurança públicas, pondo em evidência os efeitos criminógenos associados ao tráfico de drogas, aliada ao facto de em relação ao arguido não ocorrerem razões de natureza familiar ou pessoal que justifiquem a sua permanência no país, impõem a condenação do mesmo em pena acessória de expulsão do país, como foi decidido pelo tribunal recorrido, não merecendo a decisão recorrida qualquer censura.
IVº DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os juizes do Tribunal da Relação de Lisboa, após audiência, em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
Condena-se o recorrente nas custas, com 8 UC de taxa de justiça;

Lisboa, 2 de Fevereiro 2005

Presidente da Secção: Celestino Nogueira;
Relator: Vieira Lamim;
1º Adjunto: Ricardo Cardoso;
2º Adjunto: Filipa Macedo;
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[1] Como decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, Ac. de 18Jun.98, na C.J. Acs. do STJ ano VI, tomo 3, pág.166 “O crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, no sentido de que a condenação pela sua prática durante determinado período de tempo corresponde a uma apreciação global da sua actividade durante esse período...”.
[2] Como refere o Ac. do S.T.J. de 10Jan.93, no B.M.J. nº423, pág.194, em relação a este tipo de crime “... a ilicitude não se mede apenas pela porção de droga apreendida, acrescendo àquela ... toda a que vinha sendo traficada...”, no mesmo sentido, ainda, Ac. do S.T.J. de 24Fev.93, na C.J. Acs. do STJ ano I, tomo 1, pág.206.