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EXECUÇÃO
AGENTE
HONORÁRIOS
Sumário
I- No novo regime da acção executiva, introduzido pelo D.L. nº 38/2003, de 8/3, o solicitador de execução não está obrigado a suportar, à cabeça, as despesas inerentes à realização da penhora, podendo exigir, a título de provisão, quantias por conta daquelas. II- As despesas efectuadas por esse solicitador são suportadas pelo autor ou exequente, mas integram as custas que ele tem direito a receber do réu ou do executado. III- Gozando o exequente do benefício do apoio judiciário, caberá ao Cofre Geral dos Tribunais adiantar o valor de tais despesas.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
VASYL GORAL veio instaurar, no 4º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente execução baseada em auto de conciliação, contra PROJEL ENGENHARIAS, SA, apresentando o requerimento inicial de fls. 55 a 62, onde nomeia bens à penhora.
Ordenada essa penhora, nos termos do despacho judicial de fls. 35, foi o exequente notificado pelo solicitador de execução para prestar provisão no valor de € 95,04.
Na sequência, veio o mesmo exequente apresentar requerimento, referindo gozar do benefício do apoio judiciário, nas modalidades de isenção total de taxas de justiça, custas e demais encargos (que, na sua opinião, englobam a referida provisão) e de pagamento de honorários a patrono escolhido, pelo que nada tem que pagar ao solicitador de execução, a título dessa provisão, que deverá ser adiantada pelo Cofre Geral dos Tribunais.
Sobre esse requerimento recaiu o despacho do Sr. Juiz certificado a fls. 39-41, onde, após se considerar que as remunerações pagas ao solicitador de execução configuram encargos da execução, que as quantias solicitadas a título de provisão têm de ser encaradas como encargos do processo executivo, e que o exequente, como beneficiário do apoio judiciário, não deve suportar previamente a mencionada previsão, se ordenou que a secção averiguasse e informasse da existência de verbas do C.G.T. para o efeito.
Foi, de seguida, lavrada informação no processo de que foi dito pelo Sr. Secretário que, naquele momento, não havia verba para se proceder a qualquer adiantamento.
Em 24 de Maio de 2004, foi apresentado, pela solicitadora de execução, requerimento (fls. 43) em que informa “que foi pedida ao mandatário em 31 de Março último a provisão a título de honorários, sendo que até esta data, ainda não tenho evidência do respectivo pagamento”.
Notificado deste último requerimento, o exequente veio aos autos requerer, após salientar que não está obrigado, dada a sua insuficiência económica, a pagar quaisquer encargos do processo e que o solicitador deve adiantar, do seu próprio bolso, as quantias necessárias para o prosseguimento da execução, esse prosseguimento dos autos com a efectivação da penhora dos bens que forem encontrados.
Sobre tal requerimento incidiu o despacho do Sr. Juiz certificado a fls. 48- 50, em que, considerando que o solicitador de execução não está obrigado a suportar, à cabeça, as despesas inerentes à realização da penhora, se decidiu indeferir o prosseguimento da execução nos moldes pretendidos pelo exequente.
O exequente, não se conformando com a aludida decisão, dela interpôs o presente recurso onde formulou as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto da decisão judicial que indeferiu o prosseguimento da presente acção executiva nos moldes requeridos pelo exequente, conforme se exporá adiante. II. É ilegal e por isso censurável o pedido de provisão a título de despesas pelo solicitador de execução quando o exequente goza de apoio judiciário na modalidade de isenção total do pagamento de taxas de justiça, custas e demais encargos com o processo. III. Uma vez que o recorrente requereu a concessão do apoio judiciário nas modalidades indicadas, tendo o mesmo sido deferido, aplica-se a Lei n° 30-E/2000 de 20/12, nomeadamente no que respeita às limitações remuneratórias de acordo com o estipulado no artº 10°. IV. Aos advogados, advogados estagiários e solicitadores que prestem serviços de protecção jurídica em qualquer das suas modalidades, é lhes vedado auferirem remuneração diversa da que tiverem direito nos termos da presente lei. V. O artº 10° da Lei do Apoio Judiciário tem que ser conjugado com o artº 48° da mesma Lei bem como com o artº 14°, n° 3 do Decreto-Lei n° 391/88, de 26/10. VI. Decorre do artº 48 da Lei do Apoio Judiciário que os causídicos têm direito, em qualquer caso de apoio judiciário, a receber honorários pelos serviços prestados, assim como a ser reembolsados das despesas que devidamente comprovem. VII. A referência a despesas a que se reporta este normativo tem a ver com dinheiro gasto em actos, devidamente materializados e directamente relacionados com o patrocínio e como se diz são as despesas reembolsadas. VIII. Nos presentes autos, o Mmo Juiz apenas afirma - em teoria - que a efectivação da penhora é susceptível de implicar despesas avultadas, pois que, in casu, e atento o valor do requerimento executivo não nos parece que tais despesas não sejam possíveis de suportar. IX. Acresce que, ao solicitador compete penhorar os bens que encontrar, e não havendo meios para os remover, apenas lhe caberá efectuar o auto de penhora nomeando o executado como fiel depositário se o exequente nada tiver a opor. X. Como nos termos do n° 2 do artº 10º da Portaria n° 708/2003, de 4/08 são excepcionadas do n° 1 as despesas de deslocação, o solicitador de execução podia, sempre, ter procedido à penhora dos bens do executado sem que para tal necessitasse de realizar "avultadas despesas." XI. E mesmo que assim não fosse, e o solicitador de execução estivesse sujeito a "avultadas despesas", consagra o artº 14°, n° 3 do Decreto-Lei n° 391/88 de 26/10, adiantamento ao patrono oficioso a título de provisão para despesas e honorários, estando tal adiantamento condicionado a requerimento e a processos que revistam complexidade. XII. O facto da Portaria n° 708/2003, de 04/08 estar em vigor, não obsta à aplicação do estabelecido na Lei do Apoio Judiciário e respectivo Regulamento. XIII. o que decorre da conjugação dos artºs 10° e 48° da Lei do Apoio Judiciário e artº 14°, n° 3 do Regulamento da Lei do Apoio Judiciário é que as despesas do processo são suportadas pelo patrono oficioso ou se o apoio judiciário for apenas concedido para taxas, custas e demais encargos com o processo, serão as despesas suportadas pelo Cofre Geral dos Tribunais, sendo os causídicos reembolsados nos termos da Lei. XIV. Acresce a tudo isto, como já se disse nas presentes alegações que, não permitir a prossecução dos presentes autos por se entender que não é exigível ao solicitador de execução que adiante dinheiro do seu próprio bolso atento o facto de o Cofre Geral dos Tribunais não dispor de verba, viola o direito de acesso ao direito e aos tribunais do recorrente, direito fundamental consagrado no artº 20°, nos 1 e 2 da CRP. XV. Importa concluir citando o Mmo Juiz a quo, do seu despacho a fls. 21, “Seria, pois, no mínimo estranho que (mesmo que em teoria) admitir que a parte que não teve condições económicas para suportar as despesas da acção declarativa, tivesse de arranjar meios para fazer valer o seu direito - após ter sido judicialmente declarado - no âmbito do processo executivo." XVI. Com a decisão proferida, o Mmo Juiz violou o artº 20°, n° 1 e 2 da CRP, artºs 10°, 15°, alínea a) e 48° da Lei n° 30-E/2000 de 20/12 e o artº 14°, n° 3 do Decreto-Lei n° 391/88 de 26/10. XVII. Nestes termos deve a decisão proferida ser revogada e substituída por outra que ordene a prossecução da acção executiva efectivando-se a penhora dos bens do executado, devendo o solicitador de execução adiantar as despesas que forem necessárias realizar.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Mº Juiz sustentou a sua decisão.
Foram colhidos os vistos legais.
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Cumpre apreciar e decidir, sendo que a única questão a apreciar (resultante das conclusões da alegação de recurso) é a de saber quem deve suportar, nesta fase dos autos, as despesas com a realização da penhora requerida e ordenada judicialmente.
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A matéria de facto a considerar é a que resulta do relatório acima descrito e dos factos que se irão enunciando, tudo documentado nos autos.
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O D.L. nº 38/2003, de 8/3, veio alterar, de forma significativa, o regime da acção executiva, visando, entre outros objectivos, combater os atrasos no processo de execução e libertar o juiz das tarefas processuais que não envolvem uma função jurisdicional e os funcionários judiciais de tarefas a praticar fora do tribunal- cfr. o preâmbulo de tal diploma.
Tal reforma executiva deixou intocável o regime estabelecido, no Código de Processo de Trabalho, para a execução baseada em sentença de condenação em quantia certa, previsto nos artºs 89º e ss desse diploma, regime esse extensível às execuções para pagamento de quantia certa baseadas em auto de conciliação efectuado em julgamento, que é a hipótese dos autos- nº 3 do artº 97º.
Como uma das duas figuras centrais desse novo regime de execução surge o agente de execução (solicitador de execução ou oficial de justiça, sendo este funcionário da secretaria de execução), chamado, em princípio, à condução de qualquer execução.
Nos termos do nº 1 do artº 808º do CPC, na redacção desse DL 38/2003, cabe “ao agente de execução, salvo quando a lei determine diversamente, efectuar todas as diligências do processo de execução, incluindo citações, notificações e publicações, sob controlo do juiz, nos termos do nº 1 do artigo seguinte”.
As funções de agente de execução são, por via de regra, desempenhadas por solicitador de execução designado pelo exequente ou pela secretaria, nos termos do nº 2 desse artigo 808º.
Segundo o disposto nos artºs 2º e 3º da Portaria nº 708/2003, de 4 de Agosto, o solicitador de execução tem direito a receber honorários pelos serviços prestados, bem como a ser reembolsado das despesas realizadas que devidamente comprove, podendo exigir, a título de provisão, quantias por conta daqueles e destas.
A remuneração devida ao solicitador de execução e o reembolso das despesas por ele efectuadas são suportadas pelo autor ou exequente, mas integram as custas que ele tem direito a receber do réu ou do executado- artºs 454º, nº 3, do C.P.C. e 5º, nº 2, da Portaria nº 708/2003.
Disto resulta que é inatacável a afirmação do Sr. Juiz, contida no despacho certificado a fls. 39-41, de que as remunerações pagas ao solicitador de execução configuram encargos da execução e de que as quantias solicitadas a título de provisão têm de ser encaradas como encargos do processo executivo.
Acontece, todavia, que ao exequente foi concedido, já no âmbito do processo declarativo, apoio judiciário nas modalidades de isenção total de taxas de justiça, custas e demais encargos e de pagamento de honorários a patrono escolhido, e, posteriormente, já no decurso da execução, foi proferido despacho pelo CDSS Lisboa, de deferimento do pedido na modalidade de “pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente” (fls. 28), que tem de ser entendido, dado os termos em que o pedido foi formulado (fls. 25), que se refere ao pagamento da remuneração ao solicitador de execução- cfr. a al. d) do artº 15º da Lei nº 30-E/2000, na redacção dada pelo artº 19º do DL nº 38/2003.
Com base neste benefício, argumenta o recorrente com o disposto no artº 14º, nº 3, do DL nº 391/88, que condiciona o adiantamento ao patrono oficioso a título de provisão para despesas e honorários aos casos de processos que revistam complexidade e em que o mesmo para tanto apresente o correspondente requerimento.
Se é certo que tal disposição se mantém em vigor, não se pode olvidar que a sua aplicação tem como destinatário o patrono oficiosamente nomeado (advogado ou solicitador), com vista a assegurar a protecção jurídica do respectivo patrocinado, de forma a que a que ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência dos meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos (artº 1º, nº 1, da Lei 30-E/2000), revestindo essa protecção jurídica as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário (artºs 6º e 15º do mesmo diploma).
Dai que nos pareça que, salvo melhor opinião, os requisitos de tal artº 14º, nº 3, do DL 391/88 (complexidade da causa e condicionamento à apresentação de requerimento) para o adiantamento de despesas não deve ser aplicado ao solicitador de execução nomeado no âmbito do apoio judiciário, dado que, e como se salienta no despacho sob recurso, o solicitador, enquanto agente da execução, actua num misto de profissional liberal e funcionário público, detendo um estatuto de auxiliar da justiça e poderes de autoridade no processo executivo, situação que, obviamente, não foi prevista pelo legislador do DL 391/88.
Entendemos, pois, que bem se decidiu no despacho sob recurso ao considerar que não pode ser exigido ao solicitador de execução que suporte, à cabeça, as despesas inerentes à efectivação da penhora.
O que não quer dizer que se deva manter o mesmo despacho.
É que o Sr. Juiz, ao limitar-se a indeferir o prosseguimento da execução nos moldes pretendidos pelo exequente, acabou por conduzir o processo a uma verdadeira situação de impasse, dado que nada decidiu no que respeita ao prosseguimento da mesma execução, como podia e devia ter feito.
Considerou, e bem, que:
- era legítimo ao solicitador de execução pedir o adiantamento das despesas de efectivação da penhora;
- dada o benefício de apoio judiciário de que goza, não está o exequente obrigado a efectuar esse adiantamento;
- por forma a assegurar o acesso ao direito do exequente, o CGT devia adiantar o valor em apreço.
Inexplicavelmente, porém, e perante a informação de que, de momento, não existia verba para o efeito, nada ordenou em conformidade, não ordenando o prosseguimento do processo.
O que não pode, obviamente, acontecer.
Nos termos do artº 146º do CCJ, em cada serviço judicial há uma delegação do Cofre Geral dos Tribunais, por intermédio da qual são arrecadadas as receitas e efectuadas as despesas.
Por seu turno, resulta do disposto na al. a) do artº 147º do mesmo diploma que o pagamento de quaisquer encargos que devessem ser realizados por entidades isentas ou dispensadas de pagamento de custas cabe ao referido Cofre, sendo o mesmo reembolsado posteriormente, se for o caso.
E se no orçamento do Tribunal não existir verba para esse pagamento, deverá o secretário judicial pedir o correspondente reforço orçamental, pelas vias competentes, após tal pagamento ter sido ordenado pelo juiz.
Como tal, não deveria o Sr. Juiz ter aceite pacificamente a informação da inexistência de verbas para pagamento da provisão pretendida pela solicitadora de execução, antes deveria ter determinado esse pagamento.
Assim procedendo, nesta estrita medida, as conclusões do recurso.
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Decisão:
Pelo exposto, acorda-se em revogar o despacho sob recurso, que deverá ser substituído por outro que ordene a efectivação da penhora e o pagamento, através do Cofre Geral dos Tribunais, à Sr.ª Solicitadora da execução, da quantia pedida como provisão para efectivação da penhora, devendo, caso ainda não exista verba para o efeito, o Sr. Secretário Judicial solicitar o correspondente reforço orçamental.
Sem custas o agravo.
Lisboa, 20/04/05