CITAÇÃO
Sumário

1 - Apesar de na petição inicial ter sido indicado o executado com outro nome, não há erro de identidade do citado e nenhuma nulidade se verifica se for citado o verdadeiro executado.
2 - Enquanto o executado não for citado, nada impedirá o exequente de rectificar o erro cometido.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa


I - RELATÓRIO

Os executados (A) deduziram oposição à execução em que são exequentes (J) e outros, pedindo que sejam absolvidos do pedido executivo, por não serem partes no processo declarativo em que foram condenados.
Em síntese, alegaram que a acção sumária que serve de título à execução foi interposta contra outras pessoas que não os ora oponentes, ou seja, contra António e mulher Maria, residentes no Funchal. Os oponentes não foram citados para a acção declarativa, ocorrendo nulidade processual nos termos dos artigos 194º a) e 195º b) do C.P.Civil

A parte contrária contestou, pronunciou-se pela improcedência da pretensão dos oponentes, alegando não existir qualquer erro na identidade dos oponentes. O réu marido foi citado na acção declarativa e a ré foi citada editalmente de acordo com todas as formalidades legais. Os verdadeiros réus foram citados, apesar da insuficiência dos nomes.
Pede que a oposição seja julgada improcedente e que a execução prossiga os seus termos.

Foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição à execução.

Não se conformando com a sentença, dela recorreram os embargantes, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
1ª - Os recorrentes chamam-se António --- e Maria ---- e residem no --------- Funchal;
2ª - As citações e notificações foram sempre endereçadas a António ----e Maria -----ou Elizabete ----;
3ª - A recorrente Maria ----- nunca recebeu qualquer carta ou aviso proveniente do Tribunal e referentes a acção declarativa principal.
4ª - A falta de citação por erro de identidade do citado, constitui nulidade processual, nos termos
dos artigos 194° a) e 195° b) do CPC.
5ª - A sentença proferida no processo declarativo condena os réus António ---- e mulher
Elizabete ------
6ª - Os ora recorrentes António ---- e Maria ----não são partes nesse processo, nem a sentença tem força obrigatória em relação a eles.
7ª - Pelo que os ora recorrentes são parte ilegítima nos autos de execução supra referenciados.
8ª - Havendo frustração da citação por via postal, como efectivamente sucedeu, deve a secretaria promover oficiosamente a citação por contacto pessoal, nos termos do artigo 239° do CPC.
9ª - Tal facto não aconteceu, tendo sido ordenada indevidamente a citação edital.
10ª - Tendo como consequência a falta de citação, nos termos do artigo 195° c) CPC.
11ª - A falta de citação tem como efeitos a nulidade de todo o processado após a p.i. (artigos 194° a) e 197° a) CPC e é fundamento de oposição à execução baseada em sentença (artigo 813° d) CPC).

Concluem que os recorrentes não foram citados, pelo que deverá ser anulado todo o processado posterior à p.i. do processo declarativo, considerando-se ainda os recorrentes parte ilegítima nos autos de execução supra referenciados.

A parte contrária respondeu às alegações, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A- Fundamentação de facto
A primeira instância considerou assente a seguinte matéria de facto:
1º - Em 7.03.2002 deu entrada neste Tribunal uma acção sumária proposta por Alfredo ---- e Juvenal --- contra António ----e mulher Maria ----.
2º - Em 12.03.2002 foram expedidas cartas para citação das aludidas pessoas para a morada indicada: Beco -------, Funchal.
3º - Mostra-se junto A/R assinado por António ------, a fls. 22.
4º - A carta para citação de Maria -----foi devolvida, com menção "recusada nesta morada".
5º - Por requerimento datado de 20.05.2002 os autores vieram dizer que o nome correcto da ré mulher era Elizabete ------.
6º - Em 28.05.2002 foi remetida carta para citação para a dita Elizabete --------- para a morada acima indicada.
7º - Novamente veio a carta devolvida com a menção "não reside nesta morada".
8º - Por despacho de 9.07.2002 foi ordenada a notificação do réu para vir aos autos informar qual a morada exacta de Elizabete -------, bem como do seu n° de BI e de contribuinte.
9º - Foi expedida carta nesse sentido em 10.07.2002, nada tendo sido dito pelo réu.
10º - Em 14.10.2002 foi proferido despacho renovando o despacho anterior, agora sob cominação de condenação em multa, tendo sido enviada carta em 17.10.2002.
11º - Esta última carta foi recusada na morada.
12º - Por despacho de 13.11.2002 foi o réu condenado em multa por violação do dever de colaboração e foi ordenada a citação edital da ré.
13º - Decorrido o prazo dos éditos, não foi deduzida qualquer oposição, tendo sido citado o Ministério Público.
14º - Procedeu-se à realização de julgamento em 3.11.2003.
15º - Em 7.11.2003 foi proferida sentença julgando a acção totalmente procedente e condenando os RR. no pedido.

B- Fundamentação de direito

A questão a decidir e que vem colocada nas conclusões das alegações dos agravantes resume-se à alegada falta de citação por erro quanto à identidade das pessoas citadas como réus na acção.
Ou então, como se refere na decisão recorrida, não se trata de erro de identidade dos citados, mas sim de um erro na identificação das partes.

Dispõe o artº 236º nº1, do C.P.Civil que a citação por via postal registada se faz por meio de carta registada com aviso de recepção, de modelos oficialmente aprovados, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artº 235º.
E o nº 3 desse preceito refere que, antes da assinatura do aviso de recepção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação.
Por seu turno, estabelece o artº 238º-A nº 1 que a citação por via postal registada efectuada ao abrigo do artigo 236º se considera feita no dia em que se mostrar assinado o aviso de recepção e tem-se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
No caso concreto, mostra-se provado que a citação do agravante António Teixeira de Sousa foi efectuada por via postal para a morada indicada: Beco --------, Funchal, tendo o aviso de recepção sido assinado por este.

A lei consagra quatro modalidades de citação: citação feita por contacto pessoal do funcionário (arts 239°); citação via postal registada (art. 236°); citação via postal simples ( artº 236º-A) e citação edital (art. 244º e 248°).

Ao sistema processual civil repugnam as decisões proferidas à revelia dos interessados, pela fácil constatação de que, em tais circunstâncias, os riscos de injustiça material são muito superiores aos que se conseguem através de processos com contraditório efectivo.

O artigo 195º menciona os casos em que deve ter-se como verificada a falta de citação.
A sua alínea c) refere-se ao emprego indevido da citação edital.
E o artº 198 nº 1 estipula que, sem prejuízo do disposto no artigo 195º é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.

No tocante à ré Maria -------- e face à matéria de facto provada, conclui-se que a mesma foi citada editalmente, em conformidade com o previsto nos artigos 244º e 248º do Código de Processo Civil.
Por conseguinte, estavam, pois, reunidos todos os pressupostos para a efectivação da citação edital, como se veio a concretizar. Consequentemente, existia total fundamento legal para tal modalidade de citação, sendo certo que foram praticadas todas as formalidades processuais para o efeito.
Por isso, não se pode concluir que foi empregada indevidamente a citação edital, em conformidade com o disposto no artigo 195º alª c) do C.P.Civil.

No entendimento dos agravantes ocorreu ainda falta de citação por erro de identidade do citado, que vem prevista no artigo 195º alª b).
O erro de identidade do citado ocorre quando, em vez de se citar o próprio réu, se cita uma pessoa diferente. No caso concreto foi citada quem devia sê-lo – a ré Maria ---------, esposa do réu António ------.
O entendimento da decisão recorrida, com o qual concordamos, consiste em estarmos na presença de um erro na identificação das partes e não perante um erro de identidade.
A decisão agravada louvou-se no acórdão da Relação de Lisboa de 1 de Março de 1978, in CJ 2/78. 392, assim sumariado:
“ Se acaba por ser citado o verdadeiro réu, apesar de na petição inicial ter sido indicado com outro nome, não há erro de identidade do citado e nenhuma nulidade se verifica.
Enquanto o réu não for citado, nada impedirá o autor de rectificar o erro cometido”.

O caso dos autos contempla esta hipótese que não é geradora de nulidade da citação tal com vem alegado pelos agravantes.
Por isso se confirma a decisão recorrida.


III - DECISÃO
Pelo exposto, nega-se provimento ao agravo, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelos agravantes.


Lisboa, 05 de Maio de 2005

Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais
Pires do Rio