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IMPUGNAÇÃO
MATÉRIA DE FACTO
ABANDONO DE TRABALHO
Sumário
Apesar de ter ocorrido gravação dos depoimentos prestados em audiência, não é possível proceder à requerida reapreciação uma vez que o recorrente, nas conclusões do recurso, não especificou quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou da gravação nele realizada, não indicou as testemunhas nem especificou as concretas passagens dos seus depoimentos que foram mal interpretadas e que impunham decisão diversa da que foi tomada, nem indicou onde se localizam, nessa gravação, o início e termo de cada um desses depoimentos ou de cada uma das partes deles a reapreciar e que, em seu entender, impunham a alteração da decisão. Para haver abandono do trabalho é necessário que se verifiquem dois requisitos cumulativos: ausência do trabalhador ao serviço e um comportamento da parte deste do qual se possa deduzir com segurança de que não pretende retomá-lo. O ónus da prova destes requisitos cabe, em princípio, à entidade patronal; no entanto, o art. 450º nº 2 do Código do Trabalho estabelece que se presume abandono do trabalho a ausência do trabalhador ao serviço durante, pelo menos, dez dias úteis seguidos, sem que a entidade empregadora tenha recebido comunicação do motivo da ausência, invertendo-se, assim, do prova.
Texto Integral
I. RELATÓRIO
(A), divorciada, empregada de escritório, instaurou acção declarativa de condenação com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra
(B), Armazéns Militão, Quinta de Santo António, A-das Lebres, em Loures, pedindo que este seja condenado a reintegrá-la no seu posto de trabalho, bem como a pagar-lhe a quantia de € 10.894,56, a título do subsídio de desemprego que deixou de auferir e ainda as prestações pecuniárias que se vencerem até trânsito em julgado da decisão.
Alegou para tanto e em síntese o seguinte:
Foi admitida ao serviço do réu em 13 de Fevereiro de 1992, estando classificada como Escriturária Principal, auferindo mensalmente € 698,32;
Esteve na situação de baixa, desde 6 de Setembro de 2001 até Fevereiro de 2004;
Em 9.02.2004, contactou o Réu por telemóvel a informá-lo que no dia seguinte se iria apresentar ao serviço, tendo-lhe este respondido que escusava de retomar o trabalho pois estava despedida;
No dia seguinte apresentou-se no local de trabalho, tendo-a o Réu impedido de entrar nas instalações, dizendo-lhe que estava despedida.
O Réu procedeu ao seu despedimento sem justa causa e sem instauração de procedimento disciplinar, sendo nulo o seu despedimento, assistindo-lhe o direito a ser reintegrada.
Com a sua conduta, o réu impediu-a ainda de receber subsídio de desemprego.
O Réu contestou a acção, alegando em resumo o seguinte:
A autora não lhe comunicou a sua situação de alta médica, apenas tendo sabido dessa situação através da carta de 17/02/2004 que lhe foi remetida pelo seu Sindicato.
Não despediu a A., antes foi esta que fez cessar o contrato por abandono do trabalho.
Concluiu pela improcedência da lide e pela sua absolvição do pedido.
Julgada a causa, foi proferida sentença que declarou ilícito o despedimento da A. e condenou a Ré a pagar-lhe, a título de retribuições que deixou de auferir desde o 30º dia anterior à propositura da acção até à data da sentença, a quantia de € 5.586,56, bem como a importância de € 8.379,84 a título de indemnização por antiguidade, acrescidas das quantias que se vencerem, a esses títulos, até trânsito em julgado da decisão. Condenou ainda a Ré em juros de mora, à taxa legal, até integral e efectivo pagamento.
Inconformado, o Réu interpôs recurso de apelação da referida sentença, no qual formulou as seguintes conclusões:
1ª) - Vários pontos da matéria de facto que integravam a base instrutória elaborada na presente acção foram, no entendimento do recorrente, incorrectamente julgados pelo Mmo juiz “a quo”, pelo que pelo presente recurso se pretende impugnar tal decisão;
2ª) - A recorrida não logrou provar a sua alegada deslocação às instalações do recorrente, em A das Lebres, no dia 10 de Fevereiro de 2004, acompanhada de três testemunhas;
3ª) - Por não conseguirem estas quer localizar, quer descrever as instalações do recorrente;
4ª) - Em particular a sua nova localização nos “Armazéns Militão” e a existência de uma nova portaria, que não existia na altura em que a recorrida prestou efectivo serviço ao recorrente;
5ª) - E por as testemunhas apresentadas pelo recorrente terem demonstrado, cabalmente que, no dia 10 de Fevereiro de 2004, a recorrida não se deslocou às mesmas, quer só, quer acompanhada;
6ª) - Assim como que o recorrente, nesse dia, não se encontrava nas mesmas;
7ª) - Encontrando-se, isso sim, no armazém de Vialonga, juntamente com a testemunha (S), e ainda de acordo com o testemunho deste;
8ª) - Pelo que deverá ser alterada em conformidade a resposta aos quesitos 5º e 6º da mui douta base instrutória;
9ª) - Não se dando como provado o despedimento da recorrida;
10ª) - Sendo o recorrente absolvido do pedido formulado pela recorrida;
11ª) - Para mais, todos os actos praticados pela recorrida, após a data de 10 de Fevereiro de 2004, consubstanciam um abandono do trabalho;
12ª) - Com clara e inequívoca manifestação de não retomar o seu posto de trabalho;
13ª) - Não obstante o recorrente sempre ter mantido tal posto de trabalho à sua disposição.
Terminou pedindo a revogação da decisão sobre a matéria de facto contida na base instrutória, alterando as respostas dadas aos quesitos 5º e 6º, com fundamento nos depoimentos das testemunhas (C), (N), (S) e do recorrente e absolver-se este do pedido.
A A., na sua contra-alegação, pugnou pela confirmação da sentença recorrida e pela improcedência do recurso.
Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a esta Relação onde, depois de colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
São duas as questões que se suscitam neste recurso:
1. Saber se procede a impugnação das testemunhas arroladas pela A., bem como da decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida;
2. Saber se houve ou não rescisão do contrato de trabalho por abandono do trabalho por parte da apelada.
II. FUNDAMENTOS DE FACTO
Com interesse para a boa decisão da causa, a 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1. A autora trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização do réu desde 13 de Fevereiro de 1992.
2. Estava classificada como Escriturária Principal, auferindo o vencimento mensal de € 698,32.
3. A autora esteve ausente do serviço por doença desde 6 de Setembro de 2001 até 9 de Fevereiro de 2004.
4. No dia 9.02.04, pelas 12,58 horas a autora ligou para o telemóvel do réu.
5. No dia 10.02.04, a autora, fez-se acompanhar de 3 pessoas e deslocou-se às instalações do réu.
6. No parque de estacionamento dessas instalações, cerca das 9,45 horas, o réu disse à autora que estava despedida e que abandonasse aquele local.
7. No dia seguinte, 11.02.04, a autora endereçou ao réu em envelope registado com A/R, o Modelo 346da Imprensa Nacional.
8. O Sitese, Sindicato dos Trabalhadores de Escritório enviou ao réu a carta com o teor de fls. 16.
9. O réu respondeu ao Sindicato e à autora com as cartas, não assinadas, de fls. 19 a 22.
10. A autora endereçou ao réu a carta de fls. 30.
11. O Sindicato respondeu ao réu nos termos de fls. 24.
12. O réu respondeu ao Sindicato nos termos de fls. 27 e 29.
13. O réu teve durante alguns dias, e em certas horas do dia, as chamadas do seu telemóvel reencaminhadas para o telemóvel do seu empregado (AC)
14. No plano de tarifa Vitamina P da Vodafone, utilizado pela autora, as chamadas são sempre taxadas pelo mínimo de impulso de 60 segundos.
15. A autora instaurou acção contra o réu que correu termos no 1.º Juízo, 1.ª Secção, do Tribunal de Trabalho de Lisboa, tendo sido proferida Sentença, confirmada pelo tribunal da Relação.
III. FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Como vimos atrás, a 1ª questão a apreciar neste recurso é a de saber se procede a impugnação das testemunhas arroladas pela A., bem como da decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida.
O Réu, apesar de não ter deduzido qualquer incidente contra as testemunhas, no decurso da produção da prova e apesar não ter reclamado da decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida (art. 653º, n.º 4 do CPC), vem, agora, em sede de recurso, afirmar que das três testemunhas da A., em que o tribunal se baseou para dar como provada a matéria de facto descrita nos n.ºs 4, 5 e 6, uma é seu familiar directo, com interesse directo na causa, outra é seu senhorio, também eventualmente com interesse na causa, e a terceira é sua amiga, e que todas elas faltaram à verdade, pois não se deslocaram com a A., na data por ela referida nem depois, às instalações do recorrente, tal como resulta dos depoimentos das testemunhas (C) e (N) (testemunhas do Réu).
Esta reacção da apelante configura, em nossa opinião, uma impugnação das referidas testemunhas e dos seus depoimentos.
Afigura-se-nos, contudo, que tal reacção, além de extemporânea, não tem o menor cabimento neste momento e nesta sede.
Era na 1ª instância onde as testemunhas foram inquiridas, onde toda a prova foi produzida, que a apelante devia ter reagido, nos momentos próprios, utilizando os meios processuais previstos na lei. Se dispunha de elementos que lhe permitiam impugnar tais testemunhas ou abalar a credibilidade dos seus depoimentos, devia ter reagido no decurso da audiência, imediatamente antes da prestação dos depoimentos, através do incidente de impugnação (arts. 636º e 637º do CPC), ou imediatamente após essa prestação, através do incidente da contradita (arts. 640º e 641º do CPC), ou, havendo oposição directa entre os depoimentos das testemunhas da A. e os depoimentos das suas testemunhas, através do incidente de acareação (art. 642º e 643º), imediatamente após a sua prestação.
Se não o fez, nessa altura, tal como a lei determina, foi porque viu que o resultado desses incidentes não lhe seria favorável, foi porque viu que no confronto directo, cara a cara, olhos nos olhos, com as testemunhas em causa, sob a imediação do juiz que acompanhou toda a produção de prova (imediação essa que permitiria a captação, apreensão e interiorização de todas as reacções dos depoentes e de eventuais contradições), a imputação que fez às testemunhas não passaria.
Ao fazê-lo mais tarde, em sede de recurso, fora desse quadro, sem confronto directo e sem qualquer imediação, o recorrente sabia que referida imputação não podia ser sindicada por esta Relação, podendo, dessa forma, sem confronto, sem debate e sem qualquer suporte, sustentar, como fez na sua alegação de recurso, que as testemunhas da A., em cujos depoimentos o tribunal se baseou para dar como provada a matéria de facto descrita nos n.ºs 4, 5 e 6, tinham interesse directo na causa e faltaram à verdade, pois do depoimento das suas testemunhas (C) e (N), resulta que nem o recorrente nem a recorrida se deslocaram às instalações no dia 10/2/2004. Quer dizer, para o recorrente, as suas testemunhas (suas empregadas, dele dependentes jurídica e economicamente) foram idóneas e isentas e as da A. tinham interesse directo na causa e faltaram à verdade ... E, segundo ele, esta Relação teria que decidir a impugnação com base nestes dados por ele fornecidos na alegação de recurso, fora do quadro que atrás referimos.
Este procedimento, com o devido respeito, é totalmente inadmissível. Não reagiu na altura devida, utilizando os meios processuais legais que lhe permitiam a recolha de elementos sobre as referidas testemunhas e seus depoimentos (elementos esses que poderiam permitir a formulação de um juízo sobre a idoneidade, isenção, credibilidade das testemunhas e sobre a relevância dos seus depoimentos), furtou-se ao confronto e à imediação do juiz da causa, que presidiu a toda a produção de prova, imediação que permitiria a captação de todas aquelas reacções que atrás referimos e veio depois, em sede de recurso, requerer que este tribunal, altere a decisão da matéria de facto, com base nos depoimentos das suas testemunhas, como se o depoimento destas (dele dependentes jurídica e economicamente), fosse muito mais relevante que o depoimento das testemunhas da recorrida.
Este procedimento, legalmente inadmissível, não é próprio de quem preza a lisura de procedimentos e de quem não teme a verdade, mas sim de quem faz dos meios processuais um uso manifestamente reprovável com o único intuito de pôr em causa o que lhe é desfavorável e de entorpecer a acção da justiça.
O apelante veio também impugnar a decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida, pedindo que esta Relação altere a resposta dada aos quesitos 5º e 6º da base instrutória e considere como não provados os referidos quesitos. Mas só por lapso se terá referido aos quesitos 5º e 6º da base instrutória, já que por despacho exarado a fls. 73 foi dispensada a base instrutória”. Pensamos que terá querido referir-se à matéria de facto provada nos n.ºs 5 e 6 do despacho exarado a fls. 104 a 106 dos autos.
A decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto apenas pode ser alterada pela Relação nas situações descritas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do art. 712º do CPC, prevendo-se expressamente na alínea a) a situação em que tenha ocorrido gravação dos depoimentos prestados e em que a decisão com base neles proferida, tenha sido impugnada, nos termos do art. 690º-A, n.ºs 1 e 2 do CPC.
Para tal, impõe-se, sob pena de rejeição, que o recorrente especifique: a) quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. E quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar as passagens dos depoimentos em que se funda, bem como onde se iniciam e onde terminam, na gravação efectuada, os referidos depoimentos.
No caso em apreço, ocorreu gravação dos depoimentos prestados em audiência, tendo os depoimentos das testemunhas da A. incidido sobre toda a matéria da petição inicial e os depoimentos das testemunhas do Réu incidido sobre toda a matéria da contestação, com excepção da última cujo depoimento incidiu apenas sobre a matéria dos artigos 8º e 9º da contestação (cfr. actas de fls. 95 a 98 e de fls. 101 a 103)
No entanto, apesar de ter ocorrido gravação dos depoimentos prestados em audiência, não é possível proceder à requerida reapreciação, uma vez que o recorrente, nas conclusões do recurso, não especificou quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou da gravação nele realizada, não indicou as testemunhas nem especificou as concretas passagens concretas dos seus depoimentos que foram mal interpretados e que, em sua opinião, impunham, em relação aos concretos pontos de facto impugnados, uma decisão diferente da que foi tomada,nem indicou onde se localizam, nessa gravação, o início e o termo de cada desses depoimentos ou de cada uma das partes desses depoimentos a reapreciar e que, em seu entender, impunham a alteração da referida decisão.
Não tendo o recorrente dado integral cumprimento ao disposto nos arts. 690º-A , n.ºs 1 e 2 e 522º do CPC (com a redacção introduzida pelo DL 183/2000, de 10/8), não pode esta Relação proceder a reapreciação da prova produzida na audiência de julgamento, devendo a decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida, manter-se inalterada, tal como foi decidida pela 1ª instância.
De qualquer forma sempre se dirá que, depois de ouvirmos toda a gravação, verificámos que os depoimentos das testemunhas que acompanharam a A., são coerentes e unânimes, descrevem o que constataram no parque de estacionamento onde viram e ouviram o Réu dizer à A. que estava despedida e que abandonasse aquele local, não se podendo afirmar, como afirma, de forma tão categórica, o Recorrente, que existe contradição entre os seus depoimentos e os depoimentos das testemunhas (C) e (N) (testemunhas do Réu), uma vez que sendo estas suas funcionárias, e encontrando-se as mesmas a trabalhar, não terão certamente reparado, isto é, visto e ouvido o que se terá passado, cerca das 9.45 horas, no parque de estacionamento, não se descortinando, nessa gravação, quaisquer elementos que nos permitam em consciência e com o mínimo de segurança, alterar qualquer ponto da decisão proferida pela Mma juíza a quo, sob cuja imediação se produziu toda a prova, imediação essa que lhe permitiu a ela (e só a ela) a captação das reacções, gestos e sentimentos manifestados pelas testemunhas, elementos que não têm qualquer tradução audio e que terão também contribuído de forma relevante para a sua convicção.
2. Vejamos, agora, se se verificou ou não rescisão do contrato de trabalho por abandono do trabalho por parte da apelada?
Para haver abandono do trabalho é necessário que se verifiquem dois requisitos cumulativos: ausência do trabalhador ao serviço e um comportamento da parte deste do qual se possa deduzir com segurança, de que não pretende retomá-lo.
O que é necessário para se verificar abandono do trabalho é que o trabalhador assuma um comportamento concludente, inequívoco, no sentido de evidenciar que, de facto, quis pôr termo ao contrato de trabalho, sem se dar sequer ao incómodo de proceder a uma declaração expressa nesse sentido junto da entidade patronal.
O ónus da prova destes elementos cabe, em princípio, à entidade patronal (art. 342º, n.º 1 do Cód. Civil); no entanto, tendo em conta as naturais dificuldades de prova de tais elementos, o art. 450º, n.º 2 do Código do Trabalho estabelece que se presume abandono do trabalho a ausência do trabalhador ao serviço durante, pelo menos, dez dias úteis seguidos, sem que a entidade empregadora tenha recebido comunicação do motivo da ausência, invertendo-se assim o ónus da prova, face ao estatuído no art. 344º do Cód. Civil.
Assim, se a ausência do trabalhador ao serviço se prolongar durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem que o empregador receba comunicação do motivo da ausência, presume-se haver intenção do trabalhador em não retomar o serviço. E quem tem a seu favor uma presunção legal escusa de provar o facto que a ela conduz (art. 350º, n.º 1 do Cód. Civil). Para beneficiar da referida presunção legal, a entidade patronal tem apenas de alegar e provar que o trabalhador faltou ao serviço durante 10 dias úteis seguidos, sem apresentar justificação, cabendo ao trabalhador provar que lhe comunicou o motivo dessa ausência ou que, por motivo de força maior, esteve impedido de o fazer, ilidindo, assim, a referida presunção. Se não provar que lhe foi de todo impossível fazer essa comunicação, a cessação do contrato consolida-se por abandono do trabalho (cfr. Abílio Neto, Contrato de Trabalho, Notas Práticas, 16ª edição, pág. 1067).
No caso em apreço, o apelante sustenta que todos os actos praticados pela apelada, após a data de 10/2/2004, consubstanciam abandono do trabalho, com clara e inequívoca manifestação de não retomar o seu posto de trabalho. Mas também aqui o apelante não nos indicou quais foram os actos praticados pela recorrida que consubstanciam o alegado abandono, nem nós descortinamos na matéria de facto provada qualquer elemento que indicie sequer tal situação.
Com efeito ficou provado que, no período compreendido entre 6/9/2001 e 9/2/2004, a apelada esteve ausente do serviço por se encontrar em situação de baixa médica, situação que o apelante conhecia e a que faz referência nas suas cartas de fls. 19, 20 e 22, aí mencionando, por várias vezes, essa situação, bem como o envio dos correspondentes comprovativos por parte da autora. Quanto a esse período, não existem, assim, quaisquer factos, que nos permitam concluir por uma situação de abandono, já que, como se afirmou, a autora estava ausente do serviço, por motivo justificado, conhecido do réu. Também não se provou qualquer situação que configure abandono do trabalho, a partir de 10/02/2004, por parte da A., uma vez que se provou que esta, nesse mesmo dia, se deslocou às instalações do réu, com quem se encontrou, cerca das 9.45 horas, no parque de estacionamento junto dessas instalações, tendo o mesmo, ali, lhe comunicado que estava despedida e ordenado à A. que abandonasse aquele local.
Ao contrário do que se refere na alegação de recurso, o que os autos nos mostram, de forma clara e inequívoca, é uma situação completamente oposta à alegada pelo recorrente: não foi a recorrida quem rescindiu o contrato por abandono do trabalho, mas sim o próprio recorrente quem a despediu e expressamente lhe determinou que abandonasse o trabalho.
Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso, devendo manter-se integralmente a sentença recorrida.
IV. DECISÃO
Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.
Custas, em ambas as instâncias, pelo recorrente.
Lisboa, 8 de Junho de 2005
Ferreira Marques
Maria João Romba
Paula Sá Fernandes