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CATEGORIA PROFISSIONAL
Sumário
A categoria profissional afere-se não pela denominação ou pelo nomen júris atribuído pela entidade patronal ao trabalhador, mas sim pelas funções efectivamente exercidas por este, em conjugação com a norma ou convenção que, para a respectiva actividade, indique as funções próprias de cada uma, sendo elemento decisivo o núcleo funcional que caracteriza ou determina a categoria em questão. A categoria profissional do trabalhador é definida não apenas em função do nível retributivo que lhe respeita, mas fundamentalmente em função do nível das funções, das responsabilidades e do grau hierárquico que lhe correspondem dentro da empresa. Daí que seja legalmente inadmissível que a pretexto de uma reestruturação ou em nome de uma harmonização na integração das categorias profissionais, a Ré tenha “amalgamado” no mesmo conjunto profissional (o TET I) os ex-Assistentes (entre os quais o A.) e os ex-Eletricistas, que até então tinham sido seus inferiores hierárquicos, tendo este sido ultrapassado por alguns deles. Esta integração não preservou a posição hierárquica do A. e representa uma violação do art. 21º nº 1 al. d) da LCT, por corresponder a uma despromoção, não consentida por lei.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
(LM), instaurou acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra
Portugal Telecom, S. A.com sede na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º40, em Lisboa, pedindo que esta seja condenada:
a) a reclassificá-lo como Técnico Superior Especialista [TSE], desde a entrada em vigor do AE/90;
b) a colocá-lo, em termos de carreira profissional, na exacta situação que hoje existiria se houvesse sido integrado “ab initio” na categoria de TSE;
c) a pagar-lhe todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes, desde aquele momento até à data em que se verificar a sua plena integração na categoria TSE e, consequentemente, a reconstituir integralmente a sua carreira profissional até ao presente, pagando-lhe a Ré o valor bruto adequado (de forma) a que receba, no momento do respectivo e integral pagamento, valor líquido idêntico ao que teria recebido se aquele tivesse sido processado pela R. no momento adequado, tudo em montantes a liquidar em sede de execução de sentença, por não dispor nesse momento de todos os elementos que permitam a liquidação;
d) a pagar-lhe juros de mora, à taxa legal de 7% ao ano, desde a data dos respectivos vencimentos ou, no mínimo – caso, por hipótese académica assim se não considere – juros compensatórios (igualmente de 7%) pelo decurso do tempo e depreciação do valor da moeda e, em qualquer caso juros moratórios desde a data da citação até integral pagamento;
e) a pagar-lhe uma indemnização, não inferior a esc. 1.000.000$00, por danos não patrimoniais sofridos;
f) a pagar uma sanção pecuniária compulsória de esc. 8.000$00 diários, sendo 4.000$00 para o Estado e 4.000$00 para o A., por cada dia de incumprimento.
A Ré impugnou a acção, tendo concluído pela improcedência lide e pela sua absolvição do pedido.
No início do julgamento (cfr. acta de fls. 326-328 e a fls. 358), o A. veio alegar as remunerações que efectivamente auferiu até à data da propositura da acção e as que devia ter auferido, nesse período, se tivesse sido integrado na categoria de TSE, em 27/10/90, especificou as respectivas as diferenças salariais e concretizou o pedido que, de forma genérica, tinha formulado na alínea c) do artigo 149º da sua petição inicial.
Por despacho exarado a fls. 362, a Sra. juíza admitiu a requerida “especificação/ampliação do pedido”.
A Ré interpôs recurso de agravo desse despacho, tendo sintetizado a sua alegação nas seguintes conclusões:
1ª) - A douta petição inicial do A. não ofereceu, como era seu ónus, os factos essenciais para que o tribunal pudesse extrair a conclusão de ter havido diferenças salariais, no período em causa;
2ª) - Segundo o entendimento do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa “uma deficiente classificação profissional dum trabalhador não implica, necessariamente, a existência de diferenças salariais”;
3ª) - “Nem é regra geral haver diferenças salariais, por errada atribuição de categoria profissional a um trabalhador”;
4ª) - Não tendo o A. fornecido elementos que permitam a demonstração da existência de diferenças salariais e a respectiva quantificação, não pode pretender, com o agora requerido, a ampliação do pedido;
5ª) - Com efeito, não faz sentido requerer a ampliação de algo cuja existência se desconhece e cujo valor se ignora;
6ª) - O despacho recorrido ao deferir o requerimento em causa violou o disposto nos arts. 273º, n.º 2 e 508º, n.º 3, ambos do CPC, aplicável por força do art. 4º do CPT.
Terminou, pedindo a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que indefira o referido requerimento.
O A., na sua contra-alegação, pugnou pela confirmação do despacho e pelo indeferimento do recurso.
O recurso interposto foi admitido a fls. 377, como agravo, com subida diferida.
Julgada a causa, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente por não provada e absolveu a Ré do pedido.
Inconformado, o A. interpôs recurso de apelação da referida sentença, no qual formulou as seguintes conclusões:
1ª) - Se as funções de Assistente não tinham natureza executiva (ao invés do que sucedia com os Electrotécnicos que o A. chefiava), sempre seria errado concluir que a actividade nuclear do A. seria afinal ... de índole executiva?!
2ª) - Basta analisar os próprios factos dados como provados na própria sentença para se ter de concluir rigorosamente o oposto, ou seja, que o essencial das tarefas cometidas pela R. ao A. enquanto Assistente, não tinha natureza executiva, mas antes de direcção, orientação, planeamento, projecto, elaboração de relatórios, etc.
3ª) - A sentença apelada não considera minimamente a circunstância de, na solução por ela consagrada, o A. ficar amalgamado rigorosamente na mesma categoria profissional (TET-I) daquela que foi judicialmente reconhecida aos seus inferiores hierárquicos;
4ª) - E, na verdade, o A. e seus colegas ex-Assistentes ficariam nessas circunstâncias, colocados numa categoria inferior àquela que detinham, por se verem gravemente afectados na sua posição relativa, isto é, por verem a posição juridicamente tutelada, preferencial e superior, que detinham relativamente à categoria profissional ser violada pelo “amalgamento”, em TET I, com os seus antigos inferiores hierárquicos;
5ª) - Acresce que face às tarefas que, já no âmbito de aplicação do AE/90, o A. e seus colegas ex-Assistentes foram desempenhando, e analisado o descritivo funcional das diferentes categorias profissionais constantes daquele IRC, é incontornável a conclusão de que aquela que mais lhes corresponde é a de (Técnico Superior) Especialista;
6ª) - Quando assim, por absurdo, se não entendesse, e em caso de alguma dúvida, a integração teria sempre que ser feita pela categoria mais favorável ao trabalhador, ou seja, pela categoria superior, conforme sempre o tem consagrado a melhor jurisprudência;
7ª) - Acresce que também nenhum obstáculo existe, do ponto de vista das habilitações exigíveis, da retribuição ou outro qualquer, relativamente à atribuição ao A. da categoria de Especialista, sendo que o nível de remuneração de base desta é até inferior ao nível máximo de remuneração do Assistente;
8ª) - Sendo certo que a integração do A., enquanto Assistente, em TET II – conforme resulta do AE/90, o mesmo que integrara os Electrotécnicos em TET III – ou mesmo em TET I, consubstancia um abaixamento de categoria, proibido pelos arts. 21º, n.º 1, al. d) e 23º da LCT;
9ª) - O A. deve, de acordo com o art. 22º, n.º 1 da mesma LCT, ser classificado na categoria que mais se adeque às funções e responsabilidades por ele efectivamente assumidas, e essa é indiscutivelmente a de TSE;
10ª) - Tal como aliás já correctamente se reconheceu e consagrou em acórdão muito recente deste Tribunal da Relação de Lisboa (10/11/04), proferido no Recurso n.º 3.741/4/04;
11ª) - A sentença recorrida violou, pois, e multiplamente a lei, e designadamente, os já citados arts. 21º, 22º e 23º da LCT e bem assim o art. 13º da CRP.
Terminou pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que condene a Ré a reconhecer-lhe a categoria de TSE, desde 22/10/1990, bem como a pagar-lhe as correspondentes diferenças remuneratórias e respectivos juros de mora.
A Ré, na sua contra-alegação, pugnou pela confirmação da sentença recorrida e pelo não provimento do recurso.
Admitidos os recursos, na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a esta Relação onde, depois de colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
As questões que se suscitam nos recursos interpostos são as seguintes:
1. Saber se, no início do julgamento, o A. podia especificar ou concretizar as diferenças salariais, que em termos genéricos reclamou na alínea c) do artigo 149º da p.i. (recurso de agravo);
2. Saber se, aquando da publicação do AE/1990, o A. devia ter sido integrado na categoria de TSE e na, afirmativa, se tem direito às diferenças salariais reclamadas (recurso de apelação).
II. FUNDAMENTOS DE FACTO
A 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1. A Ré “Portugal Telecom, S. A., foi inicialmente uma empresa pública “TLP-EP” por sua vez decorrente da antiga “APT-Anglo Portuguese Telephone Company;
2. Muitos dos trabalhadores ainda em 1990 ao serviço dos TLP haviam iniciado a sua actividade ao serviço da APT;
3. E percorreram, até terem atingido a categoria profissional de “Assistentes” em que se encontravam em 1990, um longo percurso profissional;
4. O Autor, em Outubro de 1990 (data da entrada em vigor do A/E desse ano), tinha a categoria profissional de Assistente;
5. E, nessa data, na categoria imediatamente inferior à dos “Assistentes” encontravam-se os “Electrotécnicos” e na imediatamente inferior, os então denominados “Técnicos de Telecomunicações” (ex--Mecânicos);
6. O A., como Assistente, desempenhava, em Outubro de 1990, as seguintes tarefas: a) Coadjuvava o Chefe do Departamento nas funções que a estes competiam, substituindo-os nos seus impedimentos; b) dirigia, orientava e apoiava técnica e disciplinarmente um ou mais grupos de trabalhadores sob a sua responsabilidade; c) estabelecia o plano de execução dos trabalhos, respondendo tecnicamente pelo seu desenvolvimento e qualidade, até à sua conclusão, comparecendo nos locais de trabalho sempre que o julgasse necessário ou para tal fosse solicitado; d) elaborava e conferia projectos e orçamentos quando disso eram incumbidos; e) elaborava relatórios, estatísticas e informações de carácter geral e especializado; f) fiscalizava os trabalhos executados ou em execução, incluindo os adjudicados a terceiros; g) era responsável pelo equipamento instalado ou a instalar pelos trabalhadores sob a sua orientação; h) fazia ou verificava ensaios e medidas e trabalhava os respectivos resultados; i) colaborava com os projectistas em tarefas de planeamento; j) colaborava na formação profissional de outros trabalhadores; l) contactava com os projectistas em tarefas de planeamento;
7. Os Electrotécnicos desempenhavam, em Outubro de 1990, as seguintes tarefas: a) executava as funções técnicas de telecomunicações de aparelhos que se revestissem de maior dificuldade e complexidade; b) colaborava na programação dos trabalhos; c) organizava a execução dos trabalhos que lhe eram atribuídos; d) organizava a execução de projectos, orçamentos, estatísticas e relatórios e elaboravam toda a informação relativa ao seu próprio serviço; e) era o responsável pela ferramenta colectiva necessária à execução dos trabalhos; f) inspeccionava, verificava e classificava os materiais e controlavam os respectivos registos; g) contactava com terceiros sobre assuntos relacionados com a sua actividade; h) colaborava na formação profissional de outros trabalhadores; i) fiscalizava os trabalhos em execução ou executados, inclusive, quando disso eram encarregados, ou adjudicando a terceiros; j) providenciava pelo pagamento de abonos e passagens ao pessoal sob a sua responsabilidade; l) dirigia e orientava (ou tinham que estar permanentemente disponíveis para dirigir e orientar) não só técnica como disciplinarmente grupos de trabalhadores;
8. Os TTA’s (Técnicos de telecomunicações de aparelhos) tinham funções eminentemente técnicas, nunca lhes competindo colaborar na programação dos trabalhos ou fiscalizar estes nem organizar a respectiva execução;
9. Nem muito menos fazer a direcção e orientação técnica e disciplinar de qualquer outro trabalhador, ou de um qualquer grupo de trabalhadores;
10. Aos Assistentes de Aparelhos competiam os níveis de retribuição M’; ao fim de 4 anos, por nomeação, o nível N’ e ao fim de 4 anos o nível P’;
11. Aos Electrotécnicos de Aparelhos competia os níveis de retribuição L’ e aos TTA’s competia os níveis “E”, “F6”, “H”, “I”, “2K”, “L”;
12. Com o AE 1990, todos os Electrotécnicos foram integrados em TET III; e mais tarde foram passados a TET II;
13. O autor foi integrado em TET II e mais tarde em TET I;
14. Os Electrotécnicos, com o AE 1990, foram inicialmente integrados em TET III e colocados no nível de remuneração J-5 ou J-6, enquanto viram os seus anteriores subordinados, os TTA’s serem integrados na mesma categoria (TET-III) inicialmente no nível J-4 para, logo de seguida, serem passados a TET-II, à frente do A. e, em alguns casos, por escolha ou nomeação da Ré, a TET-I e o nível N;
15. O Autor foi inicialmente igualado em TET-I pelos seus inferiores hierárquicos, os Electrotécnicos e Técnicos de Telecomunicações, tendo sido ultrapassado, por alguns deles, na promoção a TSE (Técnico Superior Electricista);
16. Fosse na carreira dos “Aparelhos”, na das “Linhas” ou na dos “Cabos”, os trabalhadores das Telecomunicações, depois de um período de “Aprendizes” tinham de passar sucessivamente pela categoria de “Mecânico” (nos Aparelhos) ou na de “Guarda Cabos” (nos Cabos) ou “Guarda Freios” (nas Linhas), de 2ªclasse, depois de 2ªclasse”, depois ainda “Especializado”;
17. Só ao fim destes “degraus” é que um trabalhador dos TLP ascendia à categoria de “Electrotécnico” e destes é que saíam os “Assistentes”, como saiu o Autor;
18. O “Electrotécnico” era o trabalhador que desempenhava o papel de charneira entre as chefias mais elevadas (chefe de departamento e o seu coadjuvante, o Assistente) e os grupos de trabalhadores das telecomunicações, dirigindo-os e orientando-os e tendo a responsabilidade total da respectiva actividade;
19. Os TLP-SA atribuíram aos “Electrotécnicos” a categoria de “Técnico de Equipamento de Telecomunicações III” [TET-III], e aos Assistentes, entre os quais o A., a de Técnico de Telecomunicações II, [TET.II];
20. A Ré acabou por passar a TET II os antigos Electrotécnicos e a TET-I os antigos Assistentes;
21. [1]
II. FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Comecemos, como determina o art. 710º, n.º 1 do CPC, por conhecer do recurso de agravo interposto pela Ré.
Neste, como vimos atrás, a questão que se suscita é a de saber se o A., no início do julgamento, depois de alegar os elementos de facto que alegou a fls. 326 e 327, podia concretizar o pedido genérico que formulou na alínea c) do artigo 149º da p.i.
Numa acção judicial, o pedido deve formular-se com precisão, nele deve determinar-se, de forma clara, tanto o objecto jurídico da acção (o efeito que pretende obter-se, a providência concreta que se solicita ao tribunal), como o seu objecto material e este deve estar suficientemente especificado e individualizado, com a indicação da quantia que o réu há-de pagar, da coisa que há-de entregar, da prestação de facto ou da conduta concreta que o demandado há-de praticar.
Só nos casos em que, no momento da instauração da acção, não haja elementos para fixar o objecto ou a quantidade do pedido, autor pode formular o pedido de forma genérica e relegar para execução de sentença a liquidação do seu crédito. A remissão para execução de sentença só pode fazer-se se os elementos de facto necessários não forem conhecidos ou se se encontrarem (ainda) em evolução no momento em que for instaurada a acção.
No artigo 149º da sua p.i. o A. pediu que a Ré seja condenada:
a) a reclassificá-lo como Técnico Superior Especialista [TSE], desde a entrada em vigor do AE/90;
b) colocá-lo, em termos de carreira profissional, na exacta situação que hoje existiria se houvesse sido integrado “ab initio” na categoria de TSE;
c) a pagar-lhe todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes, desde 27/10/1990 até à data em que se verificar a sua plena integração na categoria TSE e, consequentemente a reconstituir integralmente a sua carreira profissional até ao presente, pagando-lhe a Ré o valor bruto adequado por forma a que receba, no momento do respectivo e integral pagamento, valor líquido idêntico ao que teria recebido se aquele tivesse sido processado pela R. no momento adequado, tudo em montantes a liquidar em sede de execução de sentença, por o A. não dispor neste momento de todos os elementos que permitam a liquidação.
Nesta alínea c), em vez de ter formulado o pedido genérico que formulou, o A. devia ter formulado um pedido devidamente especificado e individualizado, isto é, devia ter especificado a quantia concreta que pretende a título de diferenças salariais, pelo menos, até à data da propositura da acção, alegando previamente as remunerações que efectivamente auferiu, desde 27/10/1990 até à data da propositura da acção e as que devia ter auferido, nesse período, como TSE, pois todos os elementos de facto necessários para fazer essa especificação e essa liquidação do pedido já se tinham verificado.
Contudo, não o tendo feito na petição, nada o impedia de suprir essa omissão até ao início da audiência de julgamento, como efectivamente sucedeu. Se até à audiência de julgamento o juiz deve convidar as partes a completar os seus articulados, a suprir deficiências ou omissões (art. 27º, al. b) do CPT), se até à audiência de julgamento o autor pode deduzir contra o réu novos pedidos, mesmo que esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da acção (art. 28º, n.ºs 1 e 4 do CPT), desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial, por maioria de razão pode o A. fazer aquilo que fez no caso em apreço, ou seja, vir aos autos concretizar o pedido genérico que tinha formulado na alínea c) do artigo 149º da petição inicial, invocando como justificação que só após a contestação da Ré, passou a dispor dos elementos que lhe permitiram apurar as diferenças salariais até à data da propositura da acção e concretizar a quantia desse pedido (cfr. fls. 326-328 e 370-374).
Não se diga, como diz a recorrente, que o A. não forneceu elementos que permitam a demonstração da existência de diferenças salariais e a respectiva quantificação. Com efeito, o A., na sua petição inicial, alegou as razões de facto e de direito que, em sua opinião, impõem a sua integração na categoria profissional de TSE, desde 27/10/1990, e simultaneamente reclamou o direito às diferenças entre as remunerações que efectivamente auferiu e as que teria auferido, se naquela data, tivesse sido reclassificado como TSE. E a fls. 326, 327 e 358, veio discriminar as remunerações que auferiu e as remunerações que teria auferido como TSE, desde aquela data, e especificar as respectivas diferenças e indicar a quantia que, em sua opinião, lhe é devida, a esse título, até Setembro de 2000 (data da propositura da acção), não tendo a Ré impugnado essa matéria, nem os cálculos efectuados.
Improcedem, assim, as conclusões do agravo.
2. Debrucemo-nos, agora, sobre o recurso de apelação interposto pelo A.. A questão fulcral que nos cabe apreciar, neste recurso, consiste em saber se, aquando da publicação do AE/90, o A. devia ter sido integrado na categoria de TSE, e não, como foi, na de TET II e, mais tarde, na de TET I.
Dispõe o art. 22º, n.º 1 da LCT que o trabalhador deve, em princípio, exercer uma actividade correspondente à categoria para que foi contratado.
Esta norma é uma daquelas que a doutrina qualifica de imperativa mínima e, por isso, não admite modificações em sentido menos favorável ao trabalhador, mas permite todas as modificações num sentido mais favorável[2].
Assim se compreende que, com a sua entrada numa empresa, o trabalhador não permaneça estaticamente no lugar e na categoria para que foi contratado, mas seja promovido a lugares ou categorias superiores. A sua ascensão na carreira ou no trabalho constitui, aliás, o expoente da sua realização como trabalhador e o sinal da sua promoção humana e social. É uma forma de dar expressão à sua dignidade e de concretizar a sua realização individual; é um meio que traduz o seu desenvolvimento e a sua afirmação pessoal no mundo do trabalho, não podendo, de modo algum, em nome de um correcto e saudável desenvolvimento da relação laboral e dos demais elementares princípios e valores que a inspiram, ceder perante eventuais conveniências e caprichos do empregador.
A posição do trabalhador na organização empresarial em que se insere costuma definir-se pelo conjunto de serviços e tarefas que formam o objecto da sua prestação de trabalho, ao qual corresponde, normalmente, uma designação abreviada: “escriturário”, “electrotécnico”, “encarregado”, “técnico superior especialista”, “director de serviço”, etc.. Essa posição, assim estabelecida traduz a qualificação (ou, na terminologia legal, a “categoria”) do trabalhador e com base nela se dimensionam alguns dos seus direitos e garantias.
A categoria corresponde, em síntese, ao status do trabalhador na organização produtiva qualquer que seja a sua dimensão, determinada com base numa classificação normativa e em conformidade com a posição que o trabalhador nela realmente ocupa e, em princípio, não pode baixar, atento o disposto nos arts. 21º, n.º 1, al. d) e 23º da LCT[3].
Segundo a nossa jurisprudência, a categoria profissional afere-se não pela denominação ou pelo nomen juris atribuído pela entidade patronal ao trabalhador, mas sim pelas funções efectivamente exercidas por este, em conjugação com a norma ou convenção que, para a respectiva actividade, indique as funções próprias de cada uma, sendo elemento decisivo o núcleo funcional (o “núcleo duro” de funções) que caracteriza ou determina a categoria em questão.
Por exprimir a posição contratual do trabalhador na empresa, a categoria é objecto de protecção legal e convencional. Assim, nos termos do art. 21º, n.º 1, al. d) da LCT, o empregador não pode baixar a categoria dos seus trabalhadores; e se decidir reestruturar, alterar a organização do trabalho da empresa, ou proceder a uma harmonização (num qualquer processo de integração), deve fazê-losem sacrificar os direitos nem a categoriados trabalhadores ao seu serviço. Estes devem ser colocados em cargos equivalentes aos que vinham exercendo – atendendo-se para isso às tarefas nucleares de cada categoria – não sendo legalmente permitido que de uma reestruturação, reorganização do trabalho da empresa ou de uma harmonização (na integração das categorias profissionais) resulte para os trabalhadores uma desqualificação ou qualquer prejuízo para a sua carreira profissional.
E se, em alguma dessas situações, se verificar que o trabalhador exerce funções previstas (ou que passaram a estar previstas) em duas ou mais categorias institucionalizadas, o mesmo deve ser integrado na categoria que, tendo em conta as tarefas nucleares de cada uma delas, mais se aproxime das funções efectivamente exercidas e que respeite o seu nível hierárquico relativamente aos (até então) seus subordinados.
Em caso de dúvida, a atracção deve fazer-se sempre para a categoria profissional mais favorável ao trabalhador - quer no caso de as funções efectivamente desempenhadas corresponderem a mais de uma categoria profissional, quer no de não serem executadas todas as tarefas de uma determinada categoria - pois o “princípio da justiça social de protecção ao economicamente mais débil, impõe que o enquadramento se faça na categoria mais favorável e não naquela que o prejudique[4].
No caso em apreço, o A. pretende ser reclassificado, com efeitos a partir de 27/10/1990 (data da entrada em vigor do AE, publicado no BTE 39/90), na categoria profissional de Técnico Superior Especialista [TSE], integrada no quadro de Pessoal Técnico Superior.
Nos termos do n.º 4 da cláusula 20ª o Pessoal Técnico Superior agrupa os trabalhadores oriundos das carreiras executivas, licenciados, bacharéis e outros técnicos com habilitação adequada que respondem a diversos níveis pela realização de estudos de natureza técnica e ou científica respeitante às diferentes actividades da empresa.
No AE publicado no BTE 2/86 o quadro que lhes correspondia era o de pessoal especialista, definido como aquele que agrupa os trabalhadores que nos assuntos da sua especialidade assessoram a administração e o pessoal de chefia (cláusula 12ª, n.º 4). E de acordo com a cláusula n.º 15ª, n.º 1 deste AE, as carreiras de pessoal especialista destinam-se a trabalhadores de carreira, a licenciados e a bacharéis ou a outros técnicos com habilitação adequada que se ocupem da aplicação das ciências e tecnologia respeitante aos diferentes campos de actividade exercidos na empresa, tais como: investigação, planeamento, programação, estudo, organização, coordenação, metodologia, formação e auditoria, com o fim de apoiar a administração e pessoal directivo e de chefia.
O quadro de pessoal executivo, em que se insere o pessoal de telecomunicações, agrupa os trabalhadores a quem cabe responder pela execução das tarefas necessárias à consecução dos fins a atingir pelos departamentos em que estão integrados (cláusula 20ª, n.º 5 do AE/90 e cláusula 12ª, n.º 5 do AE/86) e nele se integram as categorias de Técnico de Equipamento de Telecomunicações I, II e III [TET I, II, III], criadas pelo AE/90, como nele se integravam no AE/86 as categorias de Assistentes de Telecomunicações [ATA], Electrotécnico [ETA] e Técnico de Telecomunicações [TTA].
De acordo com o Anexo III do AE/90, de 27/10, o especialista/bacharel/licenciado é aquele que participa, orienta e ou realiza estudos, pareceres, análises e projectos de natureza técnica e ou científica, atendendo às suas implicações e à política global da empresa; participa na elaboração e ou é responsável por planos de trabalho, propostas e programas de estudo, com definições das linhas de orientação e desenvolvimento, podendo coordenar e avaliar trabalhos efectuados por equipas especializadas; dirige e ou participa na definição e ou controle da política e objectivos globais da empresa e na determinação das medidas para a sua aplicação.
Desta descrição ressalta que o trabalho do especialista é um trabalho intelectual de exigência técnica e ou científica, pautado pela realização da política global da empresa e de controle dos objectivos traçados. Pode consistir na participação, realização ou orientação de estudos, análises, pareceres, projectos, planos de trabalho, propostas, programas de estudo respeitantes às diferentes actividades da empresa, mas também na coordenação e avaliação dos trabalhos efectuados. Enquanto no AE/86 se caracterizava por estar essencialmente virado para a assessoria ou coadjuvação à administração e pessoal directivo e de chefia, essa característica mostra-se atenuada no AE/90. Os estudos de natureza técnica ou científica que lhes incumbe efectuar respeitam às diversas actividades da empresa.
Aquando da publicação do AE/90, em 27/10/90, o A. estava classificado como Assistente e, nessa qualidade, coadjuvava o Chefe do Departamento nas funções que a este competia, substituía-o nas suas faltas e impedimentos; dirigia, orientava e apoiava técnica e disciplinarmente um ou mais grupos de trabalhadores sob a sua responsabilidade; estabelecia o plano de execução dos trabalhos, respondendo tecnicamente pelo seu desenvolvimento e qualidade, até à sua conclusão, comparecendo nos locais de trabalho sempre que o julgasse necessário ou para tal fosse solicitado; elaborava e conferia projectos e orçamentos quando disso era incumbido; elaborava relatórios, estatísticas e informações de carácter geral e especializado; fiscalizava os trabalhos executados ou em execução, incluindo os adjudicados a terceiros; era responsável pelo equipamento instalado ou a instalar pelos trabalhadores sob a sua orientação; fazia ouverificava ensaios e medidas e trabalhava os respectivos resultados; colaborava com os projectistas em tarefas de planeamento; colaborava na formação profissional de outros trabalhadores; contactava com os projectistas em tarefas de planeamento.
Por seu turno, os Electrotécnicos, inferiores hierárquicos dos Assistentes desempenhavam, aquando da publicação do AE/90, as funções técnicas de telecomunicações de aparelhos que se revestissem de maior dificuldade e complexidade; colaboravam na programação dos trabalhos; organizavam a execução dos trabalhos que lhe eram atribuídos; organizavam a execução de projectos, orçamentos, estatísticas e relatórios e elaboravam toda a informação relativa ao seu próprio serviço; eram os responsáveis pela ferramenta colectiva necessária à execução dos trabalhos; inspeccionavam, verificavam e classificavam os materiais e controlavam os respectivos registos; contactavam com terceiros sobre assuntos relacionados com a sua actividade; colaboravam na formação profissional de outros trabalhadores; fiscalizavam os trabalhos em execução ou executados, inclusive, quando disso eram encarregados, ou adjudicando a terceiros; providenciavam pelo pagamento de abonos e passagens ao pessoal sob a sua responsabilidade; dirigiam e orientavam (ou tinham que estar permanentemente disponíveis para dirigir e orientar) não só técnica como disciplinarmente grupos de trabalhadores.
Deste quadro resulta que as funções do Electrotécnico [a quem foi reconhecido pela Ré o direito à integração em TET-I] têm ainda uma dimensão executiva que as (funções nucleares) do Assistente não têm, na medida em que o Electrotécnico também executava as tarefas indicadas nas funções de TTA, em particular as de maior responsabilidade, enquanto as funções nucleares do Assistente não nos parecem ser, de modo algum, de índole executiva.
Na verdade, em Outubro de 1990, o A. como Assistente, entre outras tarefas e responsabilidades, coadjuvava o Chefe de Departamento nas funções que a este competiam, assumia as tarefas e responsabilidades deste, nas suas faltas e impedimentos; dirigia, orientava e apoiava técnica e disciplinarmente grupos de trabalhadores; planeava a execução dos trabalhos, sendo o responsável máximo pelo respectivo desenvolvimento e qualidade; elaborava relatórios, estatísticas e informações de carácter geral e especializado; trabalhava os resultados de ensaios e medidas
Não tem, pois, qualquer fundamento afirmar, como afirma a apelada, que estas tarefas tinham um carácter “acessório” ou que estariam subordinadas à actividade nuclear que seria de índole executiva. Como não se podem confundir, nunca, ex-Assistentes com ex-Electrotécnicos, esta sim uma categoria de “charneira” que estabelecia a ligação entre os trabalhadores de secretária (ligados a tarefas de direcção e planeamento) e os trabalhadores exclusivamente executivos (como era o caso dos Técnicos de Telecomunicações, directamente chefiados pelos Electrotécnicos).
Em bom rigor, como sustenta o apelante, a teoria da “índole executiva” da actividade nuclear nem sequer a esses mesmos Electrotécnicos era aplicável, como aliás resulta do próprio descritivo funcional e como tão correcta e tão criteriosamente foi salientado no Ac. do STJ, de 20/11/96, Revista 29/96 – 4ª Secção, no qual se afirma que o “essencial”, o “nuclear” das funções dos Electrotécnicos (autores naquele processo) era dirigir fiscalizar, orientar e exercer o poder disciplinar.
Em que categoria deveria então o A. ser integrado, naquela data? Na TET II e mais tarde na TET I, como fez a apelada ou - como sustenta o apelante - na de TSE?
Nós pensamos que o apelante, devia ser integrado na categoria de TSE, a partir de 27/10/1990, atentas as funções que desempenhava nessa data.
A empresa, como diz a apelada, pode reestruturar-se, alterar a sua organização de trabalho, como e quando entender, de forma a adequar-se às mutações das necessidades do mercado, à evolução e às transformações tecnológicas. Tem é de fazê-losem sacrificar direitos e sem pôr em causa a dignidade dos trabalhadores ao seu serviço. Se, na sequência de uma qualquer reestruturação ou reorganização do trabalho da empresa, a categoria do trabalhador for extinta, este deve ser colocado numa categoria ou cargo equivalente ao que vinha exercendo – atendendo-se para isso às tarefas nucleares que anteriormente desempenhava – não sendo legalmente permitido que dessa reestruturação resulte uma desqualificação ou qualquer prejuízo na sua carreira profissional.
Por outro lado, “a pretexto de operar uma harmonização na integração das categorias, encontra-se vedado à entidade patronal gerar, através da reclassificação dos trabalhadores, desigualdades que redundem em prejuízo para alguns deles, posicionando-os abaixo de trabalhadores que detinham idêntico e inferior desempenho funcional.”[5]
Não se pode olvidar que a categoria profissional do trabalhador é definida não apenas em função do nível retributivo que lhe respeita, mas fundamentalmente em função do nível de funções, das responsabilidades e do grau hierárquico que lhe correspondem dentro da empresa; ou, como sustenta Pedro Soares Martinez, a protecção legal da “categoria profissional existe não só para tutela do trabalhador no que respeita à actividade a desenvolver e ao nível salarial (...), mas também para a salvaguarda da posição do trabalhador na hierarquia da empresa”[6] (sublinhado nosso).
Daí que se nos afigure legalmente inadmissível que a pretexto de uma reestruturação ou em nome de uma harmonização na integração das categorias profissionais, a Ré tenha “amalgamado” no mesmo conjunto profissional (o de TET I) os ex-Assistentes (entre os quais se encontrava o A.) e os ex-Electrotécnicos, que até então tinham sido seus inferiores hierárquicos e que, na sequência dessa reestruturação ou em nome dessa harmonização, o A. tenha até sido ultrapassado, por alguns dos que até então tinham sido seus inferiores hierárquicos, na promoção a TSE. Essa integração não preservou a posição hierárquica do A. na empresa e representa, em nossa opinião, uma violação da garantia estabelecida no art. 21º, n.º 1, al. d) da LCT. Corresponde na prática a uma despromoção, não consentida por lei.
Nessa medida a norma contida no art. 1º do Anexo III do AE, publicado no BTE 39/90 que reclassifica os trabalhadores que tinham atribuída a categoria de ATA em TET II ou mesmo em TET I, tem de ser considerada nula, por violar norma legal imperativa.
Como alega o apelante, numa análise apressada do problema, até poderia parecer que nesta questão a resposta seria a oposta. Dir-se-ia então que se verificara aqui uma mera integração do Assistente de Aparelhos na nova categoria, entretanto criada, de Técnico de Equipamento de Telecomunicações II (ou na TET-I) e que tal integração, porque a ela corresponde um nível salarial não inferior àquele que os trabalhadores tinham até então e porque operada através de um AE (que na sua cláusula 130ª declara ficarem “revogadas todas as disposições anteriores constantes do instrumento de regulamentação colectiva, regulamentação interna ou simples prática às agora acordadas pelas partes e estabelecidas neste AE, globalmente mais favorável, sendo estas aplicáveis a todos os trabalhadores ao serviço), seria inteiramente legal.
Simplesmente tal conclusão afigura-se-nos errada e relevaria apenas de uma análise pouco cuidada das diferentes facetas deste problema e nomeadamente das relações de hierarquia normativa que se estabelecem no nosso ordenamento jurídico-laboral entre a lei e os instrumentos de regulamentação colectiva não sendo, sequer, compreensível e defensável que trabalhadores (Assistentes, Electrotécnicos de Telecomunicações de Aparelhos e Técnicos de Telecomunicações de Aparelhos) que sempre estiveram hierarquizados entre si, pudessem agora ser “amalgamados” numa única nova categoria. Seguramente, ninguém duvida, que se verifica aqui uma patente baixa de categoria, mesmo que o vencimento se mantenha no mesmo quantitativo. Desde logo, em termos de remuneração, não em termos “absolutos”, ou seja, sob a perspectiva da expressão numérica de um dado quantitativo, mas seguramente em termos “relativos”, isto é, em comparação com o grau de progressão dos outros profissionais da empresa e designadamente dos outros profissionais da mesma carreira. Acresce que o princípio constitucional da igualdade de tratamento, consagrado genericamente no art. 13º da CRP, impõe que sejam tratados igualmente os que se encontrem em situações iguais, e desigualmente os que se encontrem em situações desiguais, de maneira a não se criarem situações arbitrárias. E, no caso em apreço, é manifesto que colocar o A., como Assistente, ao mesmo nível daqueles outros trabalhadores que ele sempre chefiara, a quem ensinara e cujo trabalho sempre orientara e fiscalizara, constituiria tratar, agora, de modo formalmente igual aqueles que estavam, e estão, em situação desigual, criando-se o arbítrio total. Daqui resulta claro também que existe nesta actuação da Ré uma clara e inadmissível desvalorização do nível de funções e de responsabilidades e do grau hierárquico dos trabalhadores que detinham à entrada em vigor do novo AE a categoria de Assistentes (à semelhança, aliás, do que a Ré já fizera com os Electrotécnicos, tendo sido obrigada, por decisões judiciais consecutivas, a repôr a legalidade e a pôr cobro a tal “amalgamento”, naquele caso dos Electrotécnicos com os Técnicos de Telecomunicações). E isto porquanto eles, os Assistentes ficam colocados agora em absoluta e total paridade precisamente com aqueles outros trabalhadores que, dentro da mesma carreira, se encontravam exactamente na posição hierarquicamente inferior!
Seria absurdo sustentar que não existiu discriminação quanto aos Assistentes, porquanto eles foram, todos, discriminados “por igual” (isto é, em bloco), e não entre si, quando a verdade é que o foram relativamente àqueles que não só técnica como disciplinarmente lhe eram subordinados e, logo, relativamente a estes, o A., como Assistente, viu de facto a posição juridicamente tutelada, preferencial e superior, que detinha relativamente à categoria profissional, ser violada, sendo, agora, integrado, em pé de igualdade com “antigos” Electrotécnicos.
A integração dos A. na categoria de TET II, ou na de TET I afigura--se-nos, assim, ilegal.
Como dissemos atrás, o A. deve ser qualificado não de acordo com a categoria que a entidade patronal arbitrariamente lhe atribuiu, mas sim de acordo com a categoria cuja definição de funções mais se aproxime do seu estatuto profissional e que respeite, simultaneamente, a posição (hierárquica) superior que o mesmo anteriormente detinha em relação aos seus subordinados (os Electrotécnicos), sendo irrelevantes, pelas razões já apontadas, as “retiradas de funções” ocorridas com o novo AE[7].
Ora essa categoria – como decorre da definição de funções constantes do Anexo II daquele AE - só pode ser a de TSE. Isto, porque, por um lado, como a Ré acabou também por reconhecer, as tarefas desempenhadas pelos Electrotécnicos - que o A. chefiava – são aquelas que melhor se inscrevem na categoria de TET-I, designadamente, as de executar “as tarefas de maior complexidade e responsabilidade inerentes às funções dos trabalhadores sob a sua supervisão”, bem como as de “coordenar técnica e disciplinarmente a actividade de um ou mais grupos de trabalhadores da sua carreira, sendo responsável pela execução das tarefas cometidas a estes no que respeita à qualidade, quantidade e prazos”, enquanto as tarefas do A., em Outubro de 1990, se identificam ou estão mais próximas das de TSE, designadamente, nas de coadjuvar o Chefe de Departamento nas funções que a este competiam, na assunção das tarefas e responsabilidades deste, nas suas faltas e impedimentos, nas de participar e/ou realizar estudos, pareceres, análises e projectos de natureza técnica, bem como de participar na elaboração e/ou ser responsável por planos de trabalho, propostas e programas de estudo, com definição das linhas de orientação e desenvolvimento, podendo coordenar e avaliar – como efectivamente o A. coordenava e avaliava – trabalho efectuado por equipas especializadas e bem assim dirigir e/ou participar na difusão e/ou controle das políticas e objectivos globais da Empresa e na determinação das medidas para a sua situação (cfr. Anexo II ao AE/90, publicado no BTE, 1ª Série, n.º 39, de 22/10/90).
O núcleo essencial das tarefas e responsabilidades do A. tanto antes do AE/90 (como Assistente), como após a entrada em vigor deste AE (como TET II e como TET I) respeitava fundamentalmente à participação, orientação ou realização de tarefas de estudos, análises e projectos, ao estabelecimento e/ou elaboração de planos de trabalho, à coordenação de equipas de técnicos especializados, à elaboração de relatórios e informações de carácter quer geral, quer especializada. E este núcleo de funções coincide ou, pelo menos, corresponde, naquilo que é mais essencial, com o descritivo funcional de Especialista.
A integração do A. – como trabalhador anteriormente qualificado como “Assistente de Aparelhos” – na actual categoria de “Técnico de Equipamento de Telecomunicações I”, afigura-se-nos, assim, ilegal por consubstanciar uma verdadeira descida de categoria e, logo, uma violação das normas imperativas constantes dos arts. 21º, n.º 1, al. d) e 23º da LCT.
De acordo com o art. 22º, n.º 1 da LCT, o A., a partir de 27/10/90, devia ser integrado numa categoria que respeitasse o seu nível hierárquico em relação aos seus subordinados – os até então denominados Electrotécnicos e Técnicos de Telecomunicações de Aparelhos - e que mais se adequasse às funções e responsabilidades por ele efectivamente assumidas, e essa categoria, como vimos, só pode ser a de TSE.
Mesmo que dúvidas houvesse a esse respeito, quer por(que) as funções que o A. efectivamente desempenhava como Assistente terem passado a corresponder a mais de uma categoria profissional (TET I e TSE), quer por não desempenhar todas as tarefas correspondentes à categoria de TSE, a atracção devia fazer-se sempre para cima e nunca para baixo, isto é, a atracção devia fazer-se sempre para a categoria profissional mais favorável ao trabalhador, uma vez que o “princípio da justiça social de protecção ao economicamente mais débil, impõe que o enquadramento se faça na categoria mais favorável e não naquela que o prejudique.
Deve, portanto, a sentença recorrida ser revogada, nesta parte, e a Ré/recorrida ser condenada a reconhecer ao A. a categoria profissional de Técnico Superior Especialista, a partir de 27/10/90, colocando-o, em consequência, em termos de carreira profissional, na situação em que se encontraria se tivesse sido integrado nessa categoria logo naquela data, bem como a pagar-lhe as correspondentes diferenças remuneratórias.
As diferenças salariais vencidas até à data da propositura da acção, ou melhor, até 30/9/2000, são aquelas que o A. liquidou a fls. 326-329 e 358 dos autos, no montante de € 30.586,00, uma vez que não tendo os elementos de facto ali alegados e os cálculos ali efectuados sido impugnados, devem tais diferenças considerar-se admitidas por acordo das partes.
A liquidação das diferenças retributivas que se venceram desde 1/10/2000 e que se vencerem até à data em que Ré coloque o A., em termos de carreira profissional, na exacta situação em que estaria se tivesse sido integrado ab initio na categoria profissional de TSE, relega-se, por falta de elementos, para execução de sentença.
As diferenças salariais já liquidadas, por constituírem obrigações de prazo certo, vencem juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das prestações que as integram até efectivo e integral pagamento (arts. 804º, n.º 1, 805º, n.º 2, al. a) e 806º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Civil).
Procedem, assim, as conclusões da apelação.
IV. DECISÃO
Em conformidade com os fundamentos expostos, concede-se provimento à apelação e, em consequência, decide-se:
1. Revogar a sentença recorrida;
2. Condenar a Ré a reclassificar o A. como TSE, desde a entrada em vigor do AE/90, e a colocá-lo em termos de carreira profissional na exacta situação em que estaria se tivesse sido integrado ab initio nessa categoria, nessa data;
3. Condenar a Ré a pagar ao A. a quantia de € 30.586,00, a título de diferenças salariais vencidas desde 27/10/1990 até 30/9/2000, acrescida de juros de mora, à taxa legal, que se venceram desde a data do vencimento de cada uma das prestações que integram essas diferenças e que se vencerem até efectivo e integral pagamento;
4. Condenar a Ré a pagar ao A. as diferenças salariais que se venceram desde 1/10/2000 e que se vencerem até à data em que aquela o coloque, em termos de carreira profissional, na exacta situação em que estaria se tivesse sido integrado ab initio na categoria profissional de TSE, cuja liquidação se relega para execução de sentença.
3. Condenar a apelada nas custas do recurso.
Lisboa, 22 de Junho de 2005
Ferreira Marques
Maria João Romba
Paula Sá Fernandes
__________________________________________________ [1] A matéria deste número foi eliminada, nos termos do art. 646º, n.º 4 do CPC, por ser constituída exclusivamente por matéria de direito. [2] Acs. do STJ de 21/2/87; Recurso n.º 1557 e de 14/10/87, BMJ 370º, 445 Barros Moura, Notas para a Introdução do Direito do Trabalho, págs. 365/366 [3]. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, I Vol. 6ª edição, págs. 110 a 111; B. Lobo Xavier, Revista de Estudos Sociais e Corporativos,10/18 e Pedro Soares Martinez, Direito do Trabalho, II vol. Contrato de Trabalho, 1º Tomo, pág. 216).
[4]. Acs. do STJ, de 15/11/95, AD 414º, 756; de 6/3/96, CJ/STJ/1996, 1º, pág. 266; de 14/1/69, BMJ 182º, 233; de 17/5/85, BMJ 347º, 264; de 9/6/98, CJ/STJ/1998, 2º, pág. 287; de 9/7/98, BMJ 479º, 333 e Ac. da RE, de 24/5/1994, BMJ 437º, 607.
[5]. http://www.cidade virtual.pt/stj/jurisp/bol49social.html [6]. Direito do Trabalho, II vol. Contrato de Trabalho, 1º Tomo, pág. 221. [7]. Vide Ac. do STJ de 17/5/85, BMJ 347º, 264.