CONFLITO DE COMPETÊNCIA
EMBARGOS DE TERCEIRO
Sumário

1- Apensados à respectiva execução, a correr termos pelos juízos de execução de Lisboa, os autos de embargos de terceiro, em consonância com o disposto no art.º 353, n.º 1, do CPC, recebidos que foram, seguindo esses embargos a forma ordinária por força do disposto no art.º 357, n.º 1 do CPC, a tramitação dos embargos cabe ao juízo de execução sendo remetido às Varas Cíveis de Lisboa no momento e com vista ao julgamento de facto.

Texto Integral

A Magistrada do Ministério Publico junto deste Tribunal da Relação de Lisboa veio requerer a resolução do conflito negativo de competência suscitado entre a 10ª Vara Cível, 1ª secção, e o 2° Juízo de Execução, 1ª Secção, ambos da Comarca de Lisboa.
Os Magistrados afectos aos referidos Tribunais atribuem-se mutuamente competência, negando a própria, para conhecerem do processo de embargos de terceiro com o n.º1541/03.3YYLSB-B, que correrão por apenso a processo de execução que corre termos no 2.º juízo, 1.ª secção, cujas partes estão identificadas na certidão acompanha o mencionado requerimento.
As decisões em que assim se entendeu transitaram em julgado.
Observados os respectivos despachos em que apenas a Meritíssima juíza dos Juízos de execução se pronunciou sobre a sua incompetência, verifica-se que a 2.ºª Juízo de Execução da Comarca de Lisboa sustenta que:
“Dispõe ao art.º97, n.º 4 da Lei n.º 3/99 (LOTJ) que são remetidos às Varas Cíveis, para julgamento e ulterior devolução, os processos que não sejam originariamente da sua competência, nos casos em que a lei a preveja, em determinada fase da sua tramitação, a intervenção do Tribunal Colectivo.
Por sua vez, o art.º 106, alínea b) da mesma Lei refere expressamente que compete ao tribunal colectivo julgar as questões de facto nas acções de valor superior à alçada dos Tribunais da Relação e nos incidentes que sigam os termos do processo de declaração e excederem a referida alçada, sem prejuízo dos casos em que a lei do processo exclua a sua intervenção.
A Lei exclui a intervenção do Tribunal colectivo nos casos descritos no n.º 2 do art.º 646 do C.P.C. ou quando tal intervenção não tenha sido requerida pelas partes (art.º 646 n.º 1 do CPC).
Quando não tenha lugar a intervenção do colectivo, nos casos ora aludidos, o julgamento da matéria de facto e a prolação da sentença final incumbem ao juiz que a ele deveria presidir, se a sua intervenção tivesse tido lugar (art.º 646, n.º 5 do CPC).
Da conjugação destes normativos resulta que para os efeitos do art.º 97, n.º 4 da LOTJ, a lei prevê em abstracto a intervenção do Tribunal colectivo nas acções e incidentes que sigam a forma de processo ordinário, independentemente de em concreto poder não vir a ser requerida a intervenção do colectivo, o que apenas exclui a intervenção deste em concreto, não alterando a previsão abstracta da lei; até porque, caso não haja lugar à intervenção do tribunal colectivo, o julgamento é feito pelo senhor juiz que o presidiria, portanto um senhor juiz do Tribunal Colectivo (juiz de Círculo ou equiparado) – art.º 646, n.º 5 do CPC.
Não foi posto em causa por ninguém que, solicitada a intervenção do colectivo nestes autos, a competência do julgamento seria das Varas Cíveis de Lisboa, uma vez que os juízos de execução não funcionam em Tribunal Colectivo.
E terá que se entender, face ao disposto no art.º646, n.º 5, do C.P.C. que, não sendo suscitada a intervenção do Tribunal colectivo, o processo sempre teria de ser remetido às Varas Cíveis para que fosse um senhor Juiz dessas Varas ( o mesmo que presidiria ao julgamento colectivo se este ocorresse) a presidir ao julgamento.
Razão pela qual se determinou a remessa dos autos às Varas Cíveis, já que os juízes em funções nos juízos de Execução, ainda que não seja suscitada em concreto nos processos que seguem a forma ordinária (como é o caso do presente) a intervenção do Tribunal Colectivo não poderão assegurar o julgamento da causa, por não serem eles quem presidiria ao Tribunal Colectivo, se a intervenção tivesse lugar.”
Por sua vez, o senhor Juiz da 10.ª Vara Cível de Lisboa argumenta que :
(...) Os presentes embargos, atento o seu valor, seguirão agora, após a fase dos articulados, a forma do processo ordinário.
No entanto, nos processos que seguem aquela forma apenas haverá lugar à intervenção do Tribunal Colectivo na audiência de discussão e julgamento e se ambas as partes o tiverem requerido. É quanto prescreve o art.º 646, n.º 1, do CPC.
Ora os presentes autos não só não se encontram ainda na fase do julgamento – pois os seu saneamento tão pouco se verificou – como, por isso mesmo, não se saber sequer se será requerida a intervenção do Tribunal Colectivo, uma vez que o momento próprio para tanto ocorre no final do saneamento (cfr. art.ºs 508-A, n.º 2, alínea c) e 512, n.º 1, do CPC).
Significa isto que a remessa às Varas Cíveis é intempestiva, pois a mesma apenas deverá ocorrer para a fase do julgamento e apenas quando haja intervenção de Tribunal Colectivo, a qual, necessariamente, tem de ser requerida por ambas as partes. É Este, salvo o devido respeito, o conteúdo e alcance do disposto no n.º 4 do art.º 97 da LOTJ que claramente prevê a remessa às Varas Cíveis de processos que não sejam originariamente da sua competência, “(...) para julgamento(...) nos casos em que a lei preveja a intervenção do Tribunal Colectivo”, fase essa que não poderá ser outra que não a da audiência de discussão e julgamento, em clara sintonia com o disposto pelo art.º 646, n.º 1 do CPC.(...)”
Determinado o cumprimento do disposto no art. 119 do CPCivil, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de considerar competente a 6ª Vara Cível da Comarca de Lisboa.
… …
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquele – vd. arts. 684°, nº 3, 690°,nº3, 660°, nº2 e 713, nº2, do C. P. Civil – é questão proposta à resolução deste Tribunal a de saber se os embargos de terceiro com valor superior à alçada da Relação são, desde o princípio, da competência dos juízos de execução a cujo processo foram apensos nos termos do art.º 353, n.º 1 do CPC, como é o caso - ou se sendo inicialmente da competência dos juízos de execução, passando a seguir, então, a seguir os termos processo ordinário,em razão do valor (cfr. art.º 357, n.º 1 do CPC), eles passam logo a ser da competência das Varas Cíveis ou se só passam a ser da competência das Varas Cíveis se e quando for requerida a intervenção do Tribunal Colectivo.

Os juízos de execução criados são os de Lisboa, Porto, Guimarães, Loures, Maia, Oeiras e Sintra (Decreto-Lei nº 148/2004, de 21 de Junho, artigo 3º/1)

Os artigos 64º/2, 77º, alínea c) 96º,alínea g), 97º, alínea b) 102º-A, 103º e 121º-A da L.O.F.T.J. foram introduzidos pelo Decreto-Lei nº 38/2003, de 8 de Março que procedeu à reforma da acção executiva.

No que respeita ao artigo 64º/2 este passou a prescrever que os tribunais de competência específica conhecem de matérias determinadas pela espécie da acção ou pela forma de processo aplicável quando a redacção anterior prescrevia que “ os tribunais de competência específica conhecem de matérias determinadas em função da forma de processo aplicável”.

Assim, por exemplo, nos termos da redacção anterior (artigo 101º), os juízos de pequena instância cível tinham competência para preparar e julgar causas cíveis (competência delimitada, portanto, em razão da matéria, às causas cíveis) tanto as previstas no Código de Processo Civil como as não previstas no Código de Processo Civil delimitadas pela forma de processo: processo sumaríssimo quanto às causas previstas no CPC, processo especial quanto às causas cíveis não previstas no CPC.


Que tribunais de competência específica conhecem de matérias determinadas pela espécie de acção (artigo 64º/2 da LOFTJ)?

No que respeita à espécie, as acções são declarativas ou executivas (artigo 4º/1 do CPC).

No que respeita à espécie acção executiva (delimitação em razão da matéria) o artigo 96º/1g) admitiu a criação de juízos de execução.

E prescreve o artigo 102º-A que compete aos juízos de execução exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil.

As execuções fundam-se em sentenças e noutros títulos.

O anterior artigo 103º da LOFTJ prescrevia que os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para executar as respectivas decisões. Actualmente, dada a sua nova redacção, tal só se passará nas circunscrições não abrangidas pela competência dos juízos de execução. Este preceito não se limita, porém, a declarar que nas circunscrições não abrangidas pela competência dos juízos de execução, os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para executar as respectivas decisões, mantendo-se, portanto, redacção igual à do texto anterior.

Introduz-se agora uma nova expressão que é esta: “são competentes para exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil”. Esta expressão é igual à que consta do referido artigo 102º-A e do artigo 77º/1c).

Fundando-se a execução em sentença, a acção executiva correria no tribunal que tinha sido o competente para julgar a causa a que respeita a sentença exequenda.

Fundando-se a execução noutro título, impunha-se analisar se, para a execução, seria competente tribunal de competência especializada; não sendo nenhum tribunal de competência especializada competente para a execução fundada noutro título que não a sentença, então impor-se-ia verificar se a competência para a execução pertenceria a algum tribunal de competência específica (vara, juízo cível, juízo de pequena instância cível; juízo criminal ou juízo de pequena instância criminal) ou, na sua falta, a tribunal de competência genérica (artigo 77º).

Assim, por exemplo, no caso de o título executivo respeitar a questão do foro laboral, há-de correr a execução em regra no tribunal de trabalho (artigo 85º/n da L.O.F.T.J. e 97º do CPT).

Daqui decorre que nem todas as execuções correm nos juízos de execução entretanto criados ainda que sejam os competentes territorialmente; pode efectivamente um título executivo, à luz das regras de competência territorial, levar a que a execução seja instaurada em comarca que dispõe de um juízo de execução e, no entanto, a competência deste juízo de execução ficar afastada por dever o título ser executado em tribunal de competência especializada.

É o que se passa com as execuções fundadas nas decisões dos tribunais de trabalho ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais (ver já referido artigo 85ºn da L.O.F.T.J.); é também o que se passa com as execuções por alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges que são da competência do tribunal de família (artigo 81º/f, 82º/1e) da LOFTJ)

E se, como vimos, nem todas as execuções correm nos juízos de execução entretanto criados, de igual modo nem todas as execuções cíveis previstas no Código de Processo Civil hão-de correr nos juízos de execução.

Continuam válidas as palavras de Alberto dos Reis: “daqui vem que o problema da competência em razão da matéria põe-se e resolve-se nos mesmos termos, quer se trate de acções, quer se trate de execuções. Quando se pretenda promover uma execução, há-de averiguar-se, em primeiro lugar, se alguma disposição de lei manda instaurar essa execução perante tribunal especial; adquirida a certeza de que tal execução não é atribuída por lei a nenhuma jurisdição especial, o problema está resolvido: sabe-se, sem mais hesitações, que há-de levar-se a execução para o tribunal civil” (Processo de Execução, Vol. 1º, pág. 414).

A lei fala, ao longo de várias disposições, tratando-se de competência no âmbito do processo de execução, na sua delimitação tendo em vista “ as competências previstas no Código de Processo Civil”. Assim, no artigo 77º/1c) da L.O.F.T.J. diz-se que compete aos tribunais de competência genérica exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil, onde não houver juízos de execução; as varas cíveis exercem, nas acções executivas fundadas em título que não seja decisão judicial, de valor superior à alçada dos tribunais da relação, as competências previstas no Código de Processo Civil, em circunscrições não abrangidas pela competências dos juízos de execução (artigo 97º/1b); nas circunscrições não abrangidas pela competência dos juízos de execução, os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil, quanto às decisões que hajam proferido (artigo 103º).

Assim, tratando-se de execução de sentença ordinária, se esta foi proferida em tribunal de competência genérica, nele corre a execução (artigo 77ºc); se a decisão foi proferida numa vara cível e não há juízo de execução criado, a execução da sentença corre na vara cível(artigo 103º); se há juízo de execução, nele corre a execução (artigo 102º-A).

E se o título executivo não for decisão judicial de valor superior à alçada dos tribunais da Relação?

Ou há juízo de execução e nele corre (artigo 103º); ou não há juízo de execução e, então, a execução corre ou no tribunal de competência genérica (artigo 77º/1c) ou no tribunal de competência específica competente - juízo cível (artigo 99º).

A lei fala em competências previstas no Código de Processo Civil.

Esta expressão é ambígua.

No Código de Processo Civil prevêem-se “competências” várias: competência internacional, competência interna em razão da matéria, em razão da hierarquia, competência territorial.

No que toca à competência em razão da matéria, o CPC no artigo 66º define a competência regra dos tribunais judiciais: são da sua competência as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

Assim, por exemplo, se os tribunais administrativos tiverem competência para executar as suas próprias decisões - e têm-na - não correm tais execuções nos tribunais judiciais.

Se os tribunais administrativos não dispusessem de tal competência, então as execuções seriam da competência dos tribunais judiciais.

Se assim sucedesse, uma vez assente a competência dos tribunais judiciais em razão da matéria, teríamos de considerar quais os tribunais judiciais competentes para a execução em concreto.

No artigo 67º do CPC remete-se para as leis de organização judiciária. De acordo com estas pode dar-se o caso de uma execução, que é da competência material dos tribunais judiciais, ser da competência material de um tribunal judicial dotado de competência especializada. É o que sucede com as execuções laborais, como vimos.

Assim, quando a lei fala em competências previstas no Código de Processo Civil não está a considerar a competência em razão da matéria que em rigor não está prevista no Código de Processo Civil, mas nas leis de organização judiciária.

A expressão “as competências previstas no Código de Processo Civil não equivale à expressão “as execuções previstas no Código de Processo Civil”. Um tal entendimento não faria sentido. Há, desde logo, execuções previstas no CPC que não correm em juízos de execução (execução especial por alimentos: artigos 118º e seguintes); há execuções não previstas no CPC (execuções por custas judiciais) que vão correr nos juízos de execução (artigos 90º/3b e 92º do CPC).

Assim, o facto de um procedimento executivo não estar previsto no CPC ( é o que acontece com a acção executiva por dívida de custas e multa: artigos 116º a 123º do CCJ ou com a execução da pena de multa prevista nos artigos 489º a 491º do CPP) não significa que não seja para ele competente o juízo de execução criado.

A verdade, porém, é que, afastada tal norma, a competência-regra passou para os juízos de execução. De facto, se os tribunais de competência específica conhecem de matérias determinadas pela espécie de acção ou pela forma de processo aplicável (artigo 64º/2 da L.O.F.T.J.), os juízos de execução conhecem de matérias determinadas tão somente pela espécie de acção que é a execução (artigo 4º/1 do CPC). Trata-se, pois, de uma competência-regra que está sujeita a excepções (v.g. execuções que correm em tribunais de competência especializada).

A lei não distingue, já o dissemos, para tal efeito, a proveniência da execução, cível, criminal, laboral, contra-ordenacional, ou outra ainda.

Aproveitando a lição de Alberto dos Reis, o que importa verificar é se a competência material para a execução da multa (penal) ou contra-ordenacional ou laboral pertence ou não pertence a tribunal de competência especializada ou a tribunal de competência específica ou se tal execução está atribuída a tribunal de outra ordem judiciária.

Significa isto que a expressão “ competências previstas no Código de Processo Civil” tem em vista as competências sobre execuções em razão do território.

Ou seja, competências que já pressupõem a competência material.

Face ao desaparecimento da regra anterior segundo a qual os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para executar as respectivas decisões (artigo 103º da L.O.F.T.J. redacção primitiva), a lei, ressalvados os casos em que atribui competência executiva a tribunais de competência especializada ou a tribunais de outra ordem jurisdicional, passou a dividir a competência executiva-regra ou pelos juízos de execução ou pelos tribunais de competência genérica: ver artigos 77º/1a) e c) e 103º da L.O.F.T.J.)

Aquelas considerações normativas tecidas inicialmente têm por objectivo permitir que nos situemos quanto à competência original dos Juízos de Execução em Lisboa. Não vem posta em causa, não é discutido sequer que o 2.º Juízo de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa tenha a competência original para a execução, pelo contrário ele é originalmente o Tribunal material e territorialmente competente para a execução. Por outro lado, ainda, ninguém discute que os embargos de terceiro que foram deduzidos e para cujo processamento ulterior se discute a competência, foram correctamente e, por força do disposto no art.º 353, n.º 1, do CPC, processados por apenso à execução, processo no qual se praticou o acto visado nos embargos. Ora, este critério de competência (o de apensação) escapa à definição de competência relativa prevista no art.º 108 do CPC; a ilustre magistrada do 2.º juízo de execução da Comarca de Lisboa, estriba-se, contudo nos n.º 4 do art.º 108, 357, n.º 1, 462, 110, n.ºs 2 e 4 do CPC e 94, n.º 4 e 97, n.º 1, alínea a) e n.º 4 da LOFTJ para daí concluir que sendo a competência para o julgamento do Tribunal Colectivo que não do juiz singular porque o juiz de execução apenas julga em singular, as Varas Cíveis serão as competentes para a tramitação posterior dos embargos de terceiro.
O n.º 1 do art.º 357 do CPC dispõe efectivamente que recebidos os embargos de terceiro (o que ocorreu no 2.º juízo de execução), são notificadas as partes primitivas para contestar, seguindo-se os ulteriores termos do processo ordinário (forma adequada aos embargos em análise em razão do valor)
A circunstância de a partir da recepção dos embargos se passar a tramitar os embargos de terceiro segundo as regras próprias do processo ordinário não faz cessar aquela regra de apensação, já que nada na lei o diz; por outro lado, ainda, a aplicação das regras do processo ordinário a partir do momento da recepção dos embargos de terceiro não implica, forçosamente, que o julgamento dos autos de embargo de terceiro se venha a efectuar pelo Tribunal Colectivo e o art.º 110, n.º 4 do CPC refere-se à incompetência do juiz singular em virtude de o julgamento pertencer ao Tribunal Colectivo. Ora os autos ainda não estão na fase de julgamento e, por força do n.º 1 do art.º 646 do CPC a “discussão e o julgamento da causa são feitos com intervenção do Tribunal Colectivo se ambas as partes o tiverem requerido.” Traz a ilustre Juíza do 2.º juízo de execução o argumento de que a competência para tramitar os embargos de terceiro passou a ser, por força do n.º 5 do art.º 646 do CPC conjugado com o n.º 4 do art.º 97 da Lei n.º 3/99 (LOFTJ), da competência das Varas Cíveis já que, para tanto, basta que a lei preveja em abstracto a intervenção do Tribunal Colectivo.
No âmbito da actual lei orgânica, a competência em função da forma de processo não é um critério determinativo da competência jurisdicional.
Ora a remessa a que alude o n.º 4 do art.º 97 da LOTJ é para julgamento e tal conjuga-se perfeitamente com o n.º 5 do art.º 646 do CPC: aquando do julgamento da matéria de facto e apenas para esse fim, os embargos de terceiro serão remetidos às Varas cíveis.
Nesta fase processual não se coloca um conflito de competência territorial. Tão-pouco se pode falar de um conflito de competência absoluta tal como resulta do art.º 101, antes parece tratar-se de um conflito de outra natureza (saber a quem incumbe a função da tramitação dos embargos de terceiro de valor superior à alçada da Relação) a resolver segundo as regras do conflito de jurisdição e competência previstas nos art.ºs 117 a 120 do CPC por força do art.º 121 do CPC.
A regra do processamento por apenso, estabelecida no Código de Processo Civil, sobreleva, em princípio, às relativas à distribuição de competência em razão do valor da causa, não havendo, em princípio, que atender ao regime do art.º 97, n.º 1 alíneas a) e b) da LOTJ. E diz-se em princípio porque o legislador no art.º 97, n.º 4 da LOTJ prevê a hipótese de remessa à vara cível para julgamento dos embargos de terceiro à execução que não são, como aí se diz, originariamente da competência das varas cíveis (são-no caso concreto do 2.º juiz o de execução por força da regras da apensação), por a lei muito justamente prever a hipótese (abstracta que é quanto basta) da intervenção do Tribunal Colectivo.
Até lá, toda a preparação dos autos de embargo de terceiro sob o n.º 1541/03.3YYLSB-B cabe ao 2.º Juízo 1.ª secção do Juízos de Execução de Lisboa .
… …
Decisão
Pelo exposto, acordam os juizes em decidir o conflito declarando-se competente para preparar os mencionados embargos de terceiro nos termos acima referidos, o 2ª Juízo de Execução da Comarca de Lisboa.
Sem custas, por nenhuma das partes ter dado causa ao conflito nem dele ter tirado proveito.

Lxa. 12/7/06
João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Manuel Leitão Leal
Américo Joaquim Marcelino