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COMPETÊNCIA MATERIAL
VENDA
PARTILHA
MENOR
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL
Sumário
1 - Os pais, como representantes do filho, não podem alienar ou onerar bens, salvo tratando-se de alienação onerosa de coisas susceptíveis de perda ou deterioração, sem autorização do tribunal. 2 - Entretanto, sob o pretexto de tornar a justiça mais célere, o Decreto – Lei 272/2001 procedeu à transferência da competência decisória em processos cuja principal “ratio” é a tutela dos interesses dos incapazes ou ausentes, do tribunal para o Ministério Público, tornando-se, assim, da sua competência exclusiva as decisões relativas a pedidos de autorização para a prática de actos pelo representante legal do incapaz, quando legalmente exigida. 3 – Estando, porém, em causa autorização para outorga de partilha extrajudicial e o representante legal concorra à sucessão com o seu representado, retorna a competência ao Tribunal. 4 - Pretendendo o Requerente não só uma autorização para a venda do imóvel, mas também autorização para outorga de partilha extrajudicial, sendo certo que o representante legal concorre à sucessão com o seu representado, compete ao Tribunal a autorização para a venda da fracção e posterior partilha da mesma.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1.
R.C.A.R. veio requerer que lhe fosse concedida a necessária autorização, em conformidade com o artigo 1889º, n.º 1 do Código Civil, para proceder à venda de um imóvel que identifica no requerimento inicial.
Alegou, em síntese, que, em 13 de Agosto de 2003, faleceu a sua mulher, que deixou como herdeiros o requerente e o filho menor de ambos, F.S.R., constando do acervo hereditário a fracção autónoma individualizada, identificada no requerimento inicial.
Acrescenta que, não obstante ser intenção do requerente e na defesa do melhor interesse do menor conservar unido o património herdado, a nova vida pessoal do mesmo conduziu-o a mudar a sua residência para Setúbal, onde actualmente habita com o filho e com a sua nova companheira, pelo que pretende proceder à venda do referido bem, por ser incompatível sustentar duas casas e consequentes encargos bancários.
Depois de citados o Exc. mo Magistrado do Ministério Público e a avó materna do menor, a Exc. ma Juiz, considerando que a competência para o conhecimento e apreciação do pedido formulado pertence ao Digno Magistrado do Ministério Público, declarou o Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer o mérito destes autos e, em consequência, declarou a absolvição da instância.
Inconformado, agravou o Requerente, formulando as seguintes conclusões:
1ª – O Agravante tem o direito de ver o seu pedido de autorização de venda e posterior partilha ser julgado até final.
2ª – A especificação jurídica menos correcta da conclusão do pedido do Agravante não constitui motivo suficiente para que o Exc. mo Juiz a quo se julgue incompetente para apreciar o caso.
3ª – O Exc. mo Juiz a quo aceitou o requerimento, tendo ordenado inclusive a citação de interessados e do Ministério Público.
4ª – Atendendo ao princípio do dispositivo e ao teor global do requerimento que estava sujeito à sua decisão, o Exc. mo Juiz não estava impedido de decidir algo qualitativamente diferente do pedido final do Agravante.
5ª – A douta decisão em apreço violou o disposto nos artigos 1899º, n.º 1, alínea a) do CC e 664º do CPC.
Não houve contra – alegações.
A Exc. ma Juiz sustentou tabelarmente o despacho recorrido.
2.
Para além dos factos que constam do relatório, interessam os seguintes:
1 – Em 13 de Agosto de 2003, faleceu a mulher do Requerente, C. M.S.B.R..
2 – Esta deixou como herdeiros o Requerente e o filho menor de ambos, F.S.R..
3 – Do acervo hereditário consta uma fracção autónoma individualizada pela letra “D” que constitui o terceiro andar direito destinado exclusivamente a habitação do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, situado em Santa Engrácia, na Rua …, freguesia de Santa Engrácia, concelho de Lisboa, inscrito na respectiva matriz da freguesia da Graça, sob o artigo 337, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 521 D.
4 – Sobre o aludido imóvel impende uma hipoteca a favor da “Caixa Geral de Depósitos”, enquanto garantia de um empréstimo de 18.000.000$00, correspondendo à moeda legal em curso “Euro” à quantia de 89.783,62.
5 – A nova vida pessoal do Requerente conduziu-o a mudar a sua residência para Setúbal, onde actualmente habita com o filho e com a sua nova companheira.
6 – O Requerente pretende proceder à venda do aludido bem e, após a venda e liquidado o empréstimo, dividir o preço obtido, aplicando a parte do menor em fundos públicos ou privados.
3.
Pretende-se saber se a competência para o conhecimento e apreciação do pedido formulado pertence ao Digno Magistrado do Ministério Público ou ao Tribunal a quo.
Nos termos do artigo 1889, n.º 1, alínea a) do Código Civil, os pais, como representantes do filho, não podem alienar ou onerar bens, salvo tratando-se de alienação onerosa de coisas susceptíveis de perda ou deterioração, sem autorização do tribunal.
Entretanto, sob o pretexto de tornar a justiça mais célere, o Decreto – Lei 272/2001 veio desonerar os tribunais de processos que não consubstanciem verdadeiros litígios, permitindo uma concentração de esforços naqueles que correspondem efectivamente a uma reserva de intervenção judicial.
Nestes termos, procedeu este diploma à transferência da competência decisória em processos cuja principal “ratio” é a tutela dos interesses dos incapazes ou ausentes, do tribunal para o Ministério Público, estatutariamente vocacionado para a tutela deste tipo de interesses, sendo este o caso das acções de suprimento do consentimento dos representantes, de autorização para a prática de actos, bem como a confirmação de actos em caso de inexistência de autorização.
Tornaram-se, assim, da competência exclusiva do Ministério Público as decisões relativas a pedidos de autorização para a prática de actos pelo representante legal do incapaz, quando legalmente exigida (artigo 2º, n.º 1, alínea b) do DL 272/2001, de 13 de Outubro, tal como se exige na alínea a) do n.º 1 do artigo 1889º do Código Civil.
Retorna a competência ao Tribunal, quando esteja em causa autorização para outorgarem partilha extrajudicial e o representante legal concorra à sucessão com o seu representado, sendo necessário nomear curador especial (artigo 2º, n.º 2, alínea b) do DL 272/2001).
In casu, muito embora o requerente se tenha limitado a pedir autorização para a alienação do aludido imóvel, verifica-se através do seu requerimento que a sua pretensão se estende à partilha do produto pecuniário líquido com o seu filho, explicitando os termos e a finalidade do mesmo. Pretende vender para partilhar.
Ora, como é pacífico, a errada qualificação jurídica do pedido não impede o juiz de, observando o princípio do dispositivo, declarar pedido diferente, conforme ao artigo 661º CPC.
Concluindo:
Atendendo que, in casu, é pretendido pelo Requerente não só uma autorização para a venda do imóvel, mas também autorização para outorgarem partilha extrajudicial e o representante legal concorre à sucessão com o seu representado, sendo necessário nomear curador especial, a competência é do Tribunal a quo.
4.
Pelo exposto, concedendo provimento ao agravo, revoga-se o despacho recorrido, devendo os autos prosseguir no Tribunal a quo.
Sem custas.
Lisboa, 26 de Outubro de 2006.
Granja da Fonseca
Pereira Rodrigues
Fernanda Isabel