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OBJECTO
DESTRUIÇÃO DE OBJECTO COLOCADO SOB O PODER PÚBLICO
Sumário
1. Nos termos do art.º 262º CPP, o inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher provas em ordem à decisão sobre a acusação cabendo a sua direcção ao MºPº. Nesta fase processual, apenas relativamente a determinados actos, entre os quais se inclui a declaração de perdimento de objectos ou substâncias a favor do Estado (art.º 268º,n.º1 al. e) CPP), se prevê que sejam da competência exclusiva de um juiz. 2. Não existe similitude entre a declaração de perdimento a favor do Estado e a ordem de destruição de objectos ou substâncias apreendidos durante o inquérito. Por isso, se faz sentido que aquela só possa ser declarada pelo Juiz de Instrução, já se não compreende nem exige que esta não possa ser emitida pelo M. P. uma vez que não interfere com direitos de terceiros, nomeadamente o direito de propriedade.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
1.
No âmbito do processo n.º 1453/05.6 PBSXL do 1º Juízo Criminal do Seixal, após ter sido declarada perdida a favor do Estado uma nota de 10,00 euros, por ter servido para a prática de crime, sendo falsa, foi proferido despacho que indeferiu a promoção do MºPº no sentido de determinar a destruição da mesma por considerar que, não tendo o processo ultrapassado a fase de inquérito, não era da competência do JIC a definição do destino dos objectos apreendidos.
Interpôs recurso o MºPº pedindo a revogação do decidido com a substituição por despacho que ordene a destruição da nota apreendida e declarada perdida, alegando em síntese, que :
- não existe norma que atribua ao MºPº competência para a destruição de objectos apreendidos à ordem do inquérito e declarados perdidos a favor do Estado por tal acto implicar a extinção do direito de propriedade sobre os mesmos
- além de que a proximidade temporal dos dois actos e o facto de serem indissociáveis deveria ter levado à interpretação de que a declaração de perda contém implicitamente o acto de ordenar a destruição.
- o despacho recorrido violou a norma do art.º 268º, n.º1 al. e) CPP devendo ter feito aplicação das normas formalizadas no n.º 1 al. f) do art.º 268º e 109º, n.º3 CP, devendo interpretar-se este último no sentido de a competência para ser do JIC
Admitido o recurso com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo, não foi oferecida resposta ao mesmo.
Colhidos os vistos legais, procedeu-se a conferência.
2. O objecto do presente recurso consiste unicamente em averiguar quem detém competência no âmbito do inquérito para proceder a destruição de objecto já declarado perdido a favor do Estado.
3. A questão ora suscitada foi já apreciada decidida na presente Secção no âmbito do recurso n.º 6187/06, pelo acórdão de 26.9.2006, relatado pela Exm.ª Sr.ª Juíza Desembargadora Margarida Bacelar com o seguinte sumário :
1. A declaração de perdimento a favor do Estado de objectos ou substâncias apreendidos durante o inquérito, só pode resultar de uma decisão jurisdicional susceptível de fixar com trânsito em julgado a extinção do direito de propriedade do respectivo dono sobre os mesmos.
2. Já a ordem de destruição dos bens ou substâncias previamente declarados perdidos a favor do Estado, não interfere minimamente com quaisquer direitos de terceiros, nomeadamente o de propriedade. Efectivamente, se o Estado, a quem tais bens ou substâncias foram atribuídos em propriedade, não vê que outro destino lhes possa dar que não a destruição, mal se compreenderia que fosse necessária a intervenção do poder jurisdicional para o ordenar. Trata-se afinal do destino de bens que já entraram na sua esfera patrimonial, por força de uma decisão, essa sim de carácter jurisdicional.
3. Não existe qualquer analogia nem similitude entre a declaração de perdimento a favor do Estado e a ordem de destruição. Por isso, se faz sentido que aquela só possa ser declarada pelo Juiz de Instrução, já se não compreende nem exige que esta não possa ser emitida pelo M. P. que é quem representa o Estado nos Tribunais.
Afigura-se que a questão, pela sua natureza, não merece maior desenvolvimento argumentativo do que aquele que já resulta do dito acórdão, bastando-nos a remissão para o texto do acórdão que se mostra publicado em www.dgsi.pt.
Dele resulta, no essencial, que, nos termos do art.º 262º CPP, o inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher provas em ordem à decisão sobre a acusação cabendo a sua direcção ao MºPº. Apenas relativamente a determinados actos (art.º 268º CPP), entre os quais se inclui a declaração de perdimento de objectos ou substâncias a favor do Estado (art.º 268º,n.º1 al. e) CPP) se prevê que sejam da competência exclusiva de um juiz.
Assim, sendo o inquérito uma fase processual em que a regra é a da competência para os respectivos actos pertencer ao titular do direito da acção penal, não estando prevista na norma do art.º 268º CPP que prevê a competência específica e excepcional do juiz de instrução criminal a destruição dos objectos declarados perdidos a favor do Estado, não se vê que haja razão para lhe atribuir tal competência de forma exclusiva, pelas razões contidas no acórdão citado.
Se a norma do art.º 109º resolvesse a questão da competência para a destruição dos objectos na fase do inquérito, não se vê qual a utilidade e necessidade da norma do art.º 268º CPP, em que o legislador revelou especial preocupação ao conferir competência exclusiva ao JIC para a declaração de perda de objectos, mesmo na fase do inquérito.
Pensa-se que a norma do art.º 109º CP, nomeadamente atenta a sua localização, no Código Penal, se refere a situações relativas à fase processual de julgamento em que, embora a doutrina não atribua natureza de pena nem de efeito das penas à declaração de perda dos objectos, mas sim a de medida de segurança, se refere à aplicação da medida de segurança na fase judicial do processo, em que se compreende que se defira a competência para a mesma ao juiz de julgamento com o decorrente reconhecimento, no art.º 109º, n.º3 CP, da possibilidade de determinar a destruição dos objectos e com a natural competência do mesmo para a destruição dos objectos que, no referido contexto processual, já declarara perdidos a favor do Estado.
Apenas se espera que esta questão, de tão banal que é perante os interesses envolvidos e o seu significado para os intervenientes processuais, possa ficar esclarecida jurisprudencialmente perante os acórdãos proferidos sobre a mesma não justificando, assim o entendemos, os custos da actividade processual que desencadeiam, em que se incluem os custos que envolvem para a própria imagem da justiça.
4.
Pelo exposto, acordam os juízes em julgar improcedente o recurso.
Sem custas.
Elaborado, revisto e assinado pela relatora Filomena Lima e pelos Sr.s Juízes Desembargadores-Adjuntos Ana Sebastião e Simões de Carvalho .