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PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO
PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO
PRINCÍPIO DA ECONOMIA E DA UTILIDADE PROCESSUAL
Sumário
I – O art. 664º do C.P.C. resulta a vinculação do tribunal à matéria de facto alegada e só a esta, mas não ao seu enquadramento jurídico. Por isso, se o tribunal entender que a solução jurídica do caso, em face dos concretos factos alegados e provados, é diferente da propugnada pelas partes, deve decidir conforme assim entender. II - Se a A. alegou os vários factos à luz dos quais formulou, a final, os diversos pedidos com que terminou a sua petição inicial, ainda que o Tribunal considere que o instituto do enriquecimento sem causa não tem aplicação ao caso, dado o seu caracter subsidiário, sempre deverá, exercitando o seu poder de livre aplicação das regras de direito, subsumir o caso aos institutos que considere aplicáveis. (F.G.)
Texto Integral
Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. RELATÓRIO:
1.1. Das partes:
1.2. Acção e processo:
Acção declarativa com processo ordinário.
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1.3. Objecto da apelação:
1. A sentença de fls. 67 a 68, pela qual a acção foi julgada improcedente.
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1.4. Enunciado sucinto das questões a decidir:
1. Da violação do disposto no art. 664º do C.P.C.
2. Da violação dos princípios da adequação, cooperação e economia.
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2. SANEAMENTO:
Foram colhidos os vistos.
Não se vislumbram obstáculos ao conhecimento do mérito do recurso, pelo que cumpre apreciar e decidir.
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3. FUNDAMENTOS: 3.1. De facto:
Factos que este Tribunal considera provados:
Os constantes de fls. 67 v. e 68, para os quais se remete, nos termos do art. 713º nº 6 do C.P.C., em virtude de não ter sido impugnada a matéria de facto.
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3.2. De direito:
1. Da violação do disposto no art. 664º do C.P.C.
2. A sentença recorrida fundou a sua decisão de absolver o R. dos pedidos contra si formulados pela A. no facto de esta ter invocado, como fundamento dos mesmos, o instituto do enriquecimento sem causa, quando dispunha, para o mesmo desiderato, de outros institutos jurídicos, sendo certo que aquele instituto tem natureza subsidiária, por força do disposto no art. 474º do C.Cv., o que impede a sua aplicação.
3. Em sede de recurso, a Recorrente invoca o comando do art. 664º do C.P.C., para dizer que, se o Tribunal entendia ser outro ou outros os institutos à luz dos quais deveria ter sido formulado o pedido, tinha liberdade de acção para tal, por não estar vinculado às alegações das partes no que toca à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
4. Quid juris?
5. A A. invocou uma série de factos fundadores dos diversos pedidos que, a final da sua petição inicial, formulou. E, no art. 17º da petição disse: “E porque o R. veio a beneficiar e a enriquecer à custa da A. e sem causa, de todos os pagamentos com dinheiro próprio feitos pelo A. (...), tem a A. direito, nos termos do art. 470º e sgts. do C.P.C. a exigir do R. o pagamento de metade de tudo o que pagou deduzindo a isso o que haja pago em benefício da A. e relativo à casa”.
6. A disposição invocada refere-se à cumulação de pedidos, nada tendo a ver com o enriquecimento sem causa. Mas, as primeiras expressões do artigo transcrito apontam para a figura do enriquecimento sem causa, como sendo o instituto jurídico à luz do qual a A. pretende ver satisfeitos os seus pedidos.
7. Por força dessa invocação, ficou o Tribunal recorrido vinculado a tal alegação?
8. Não, pois o citado art. 664º do C.P.C. diz que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no art. 264º.
9. Deste preceito resulta a vinculação do tribunal à matéria de facto alegada e só a esta, mas não ao seu enquadramento jurídico.
10. Por isso, se o tribunal entender que a solução jurídica do caso, em face dos concretos factos alegados e provados, é diferente da propugnada pelas partes deve, decidir conforme assim entender.
11. E com isto não se está a esquecer que o nosso ordenamento jurídico adoptou a teoria da substanciação, (conforme ensina o Prof. Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, p. 392/3), em que todas as acções se configuram por dois elementos: o pedido e a causa de pedir, sendo esta constituída pelos factos concretos porque se pede.
12. No caso dos autos, a A. alegou os vários factos à luz dos quais formulou, a final, os diversos pedidos com que terminou a sua petição inicial.
13. Por isso, ainda que o Tribunal considerasse que o instituto do enriquecimento sem causa não tinha aplicação ao caso, dado o seu caracter subsidiário, sempre deveria, exercitando o seu poder de livre aplicação das regras de direito, subsumir o caso aos institutos que considerasse aplicáveis.
14. Julga-se, por isso, procedente a posição da Recorrente, quanto a esta questão.
15. Da violação dos princípios da adequação, cooperação e economia.
16. Na segunda questão, invoca a Recorrente a violação dos princípios da adequação, cooperação e economia.
17. O princípio da adequação formal (como consta da epígrafe do art. 265º-A do CPC) não tem aplicação ao caso pois o mesmo prende-se com a inadequação da tramitação processual em face das especificidades da causa, o que não é manifestamente o caso destes autos.
18. Já o princípio da cooperação, consagrado no art. 266º do C.P.C., tem campo de aplicação ao caso dos autos, pois aí se diz, no seu nº 1, que os magistrados devem concorrer para se obter com a brevidade possível e eficácia, a justa composição do litígio, ao que o nº 2 acrescenta que o juiz pode convidar as partes a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes.
19. Ou seja, subjaz aos dispositivos deste preceito uma ideia de tentar ao máximo aproveitar as peças processuais produzidas pelas partes, admitindo-se a hipótese de ajustamentos em ordem a se obter a justa composição do litígio, breve e eficazmente.
20. Ora, se o Tribunal recorrido, ao apreciar a petição, considerou que os factos alegados e praticamente dados como assentes, dada a ausência de contestação, careciam de outro enquadramento jurídico, para o bom êxito da acção, podia e devia ter convidado a A. a corrigir a petição.
21. E no mesmo sentido aponta o princípio da economia processual: para quê obrigar a parte a intentar nova acção só para invocar outros institutos jurídicos à luz dos quais deveria formular os seus pedidos, quando o relevante é a alegação e prova dos factos porque se pede?
22. Julga-se, deste modo, procedente a posição da Recorrente, também, neste particular.
23. O R., na suas contra-alegações, pede a condenação da A. como litigante de má fé, mas sem qualquer razão, pois não se verificam os respectivos pressupostos (art. 456º do CPC).
24. Vai, por isso, indeferido o aludido pedido.
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4 DECISÃO:
1. Por tudo o exposto, concede-se provimento à apelação, e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, e, em substituição, decide-se que o Tribunal recorrido deverá dar cumprimento ao princípio da cooperação, convidando as partes a fornecer os esclarecimentos que entender necessários à justa composição do litígio, nos termos do art. 266º do C.P.C.
2. Custas, a final, pela parte vencida (art. 446º nº 2 CPC).
Lisboa, 12/12/2006
(Eduardo Folque de Sousa Magalhães)
(Eurico José Marques dos Reis)
(Ana Maria Fernandes Grácio)