Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
TELECOMUNICAÇÕES MÓVEIS
CRÉDITO
PRESCRIÇÃO
PRAZO
Sumário
I – A Lei nº 23/96, de 26.7, que prevê o regime jurídico de serviços públicos essenciais, foi aplicável ao serviço de telefone móvel até a Lei nº 5/2004, de 10.02, excluir o serviço de telefone do seu âmbito. II – O art.º 10º nº 1 da Lei nº 23/96 e o artº 9º nº 4 do Dec.-Lei nº 381-A/97, de 30.12 (aplicável à prestação do serviço de telecomunicações), prevêem a prescrição extintiva do direito ao pagamento do preço do serviço prestado. III – Nos termos do art.º 9º nº 4 do Dec.-Lei n º 381-A/97, o prazo de prescrição, de seis meses, será interrompido mediante a apresentação ao utente da factura respectiva, após o que começará a correr novo prazo prescricional de seis meses. IV – Revogado que foi o Dec.-Lei nº 81-A/97 pela Lei nº 5/2004, de 10.2, a prescrição do crédito dos prestadores de serviços telefónicos passou a reger-se pelo regime previsto no Código Civil, aplicando-se, nomeadamente, o prazo quinquenal previsto no art.º 310º, alínea g). (JL)
Texto Integral
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa
RELATÓRIO
Em 29 de Setembro de 2004 V – Comunicações Pessoais, S.A., intentou nos Juízos Cíveis de Lisboa, acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra V.
Alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade de exploração de serviços de telecomunicações móveis terrestres, celebrou com o Réu vários contratos de serviço telefónico móvel, os quais abrangiam vários números de telefone. A A. emitia facturas mensais em relação aos serviços utilizados pelo ora Réu, devendo este efectuar o pagamento do montante de que fosse devedor até ao 20º dia posterior à data da emissão da factura. Nos termos dos contratos o Réu comprometeu-se à manutenção em vigor dos serviços subscritos pelo prazo mínimo de 36 meses, e estava sujeito a uma cláusula penal, nos termos da qual, caso fosse denunciado ou extinto o contrato de serviço telefónico ajustado entre as partes antes do prazo mencionado, o ora Réu seria obrigado a proceder ao pagamento das facturas vencidas e não pagas e ainda à totalidade das mensalidades vincendas até ao termo do referido prazo. Nos termos acordados, no período de 26.12.2002 a 27.01.2004 a A. emitiu e enviou ao Réu facturas, das quais este apenas pagou uma pequena parte. Está assim em dívida, a título de capital, o montante de € 5 225,32, onde se inclui o valor de € 3 290,65 de penalidade por incumprimento do contrato de fidelização.
A A. terminou pedindo que o Réu fosse condenado no pagamento da quantia de € 5 598,11 (€ 5 225,32 de capital e € 372,79 de juros moratórios vencidos até 20.9.2004) e dos juros que se vencerem até efectivo e integral pagamento à taxa anual de 12%.
Citado em 24.11.2004, o Réu contestou, por impugnação e por excepção, tendo arguido, com relevo para o presente recurso, a prescrição do direito invocado pela A.
O R. concluiu pela sua absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador, no qual decidiu relegar-se para final a apreciação da excepção da prescrição, e procedeu-se à selecção da matéria de facto.
Realizada a audiência de discussão de julgamento e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente no que concerne à clausula penal e, no mais, improcedente, por prescrição do direito da A., proferindo-se o seguinte dispositivo:
“Face ao exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção e, consequentemente, decide-se: 1) Condenar o Réu V a pagar à Autora V - COMUNICAÇÕES PESSOAIS, SA, a quantia de € 2.765,25 (dois mil setecentos e sessenta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos até 2004/09/20 no valor de € 193,62 (cento e noventa e três euros e sessenta e dois cêntimos) e dos juros vincendo desde 2004/09/21 até efectivo e integral pagamento, calculados à taxa de 12% ao ano até 30/09/2004, à taxa de 9,01% ao ano no período compreendido entre 01/10/2004 e 31/12/2004, à taxa de 9,09% ao ano no 1°semestre de 2005, à taxa de 9,05% no 2°semestre de 1005, à taxa de 9,25% no 1°semestre de 2006, e às taxas que forem sendo semestralmente fixadas para os créditos de que sejam titulares empresas comerciais, até integral pagamento (Port. n°597/2005, de 19/07); 2) e absolver o Réu do restante pedido contra si formulado pela Autora. Custas pela Autora e pelo Réu na proporção de 48/100 e 52/100 respectivamente.”
A A. apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões:
1. Não assiste razão ao Ilustre julgador do Tribunal a quo, ao julgar a acção proposta pela Autora, ora Apelante contra a Ré, ora Apelada, parcialmente improcedente, absolvendo o Réu/Apelado, parcialmente do pedido.
2. Os fundamentos que o douto Tribunal invocou para tal decisão foi o facto de ter decorrido integralmente, à data da interposição da acção, o prazo de prescrição de 6 meses, previsto no artigo 10º/1 da Lei n° 23/90, considerada pelo Ilustre julgador aplicável ao direito de crédito da Autora.
3. As Facturas não pagas e cujo pagamento se peticiona venceram-se entre 16/12/2002 e 17/01/2004.
4. Ora, entende a Apelante que a Autora, sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços móveis terrestres, não presta qualquer serviço público essencial, não se aplicando, portanto o diploma supra referido.
5. A Lei n.º 23/96 de 26 de Julho consagra uma lista dos serviços que integram tal conceito, na qual não se pode encontrar o serviço móvel terrestre.
6. De facto, a actividade desenvolvida pela Autora insere-se numa lógica de mercado e de livre concorrência (apesar de sujeita ao poder regulador e a uma série de regras estreitas de actuação) bastante díspares das que disciplinam actualmente o serviço telefónico fixo (visado no aludido diploma).
7. Não esquecendo a importância crescente do tipo de serviço prestado pela Autora, não foi pretensão do legislador fazer abranger no Artigo 1.º, n.° 2, alínea d) do mencionado diploma legal, toda e qualquer forma de telecomunicações, mas somente as da rede fixa, pois apenas essas são um serviço público considerado essencial.
8. Resulta ainda de uma interpretação sistemática do Artigo 10.° da Lei.° 23/96, de 26 de Julho que o direito de exigir o pagamento exerce-se quando a factura é enviada nos 6 meses seguintes à prestação do serviço.
9. As Facturas em causa foram apresentadas a pagamento antes de decorrido tal prazo.
10. Tendo em consideração o exposto, o prazo de prescrição aplicável no caso sub judice não é o que consta da Lei n.° 23/96, de 26 de Julho, mas sim o prazo de prescrição extintiva de 5 anos, vertido no Artigo 310.° alínea g) do Código Civil.
11. Esta situação veio a ser definitivamente esclarecida no Artigo 127.° n° 2, da Lei n.° 5/2004, de 10 de Fevereiro que diz expressamente que "o serviço de telefone é excluído do âmbito de aplicação da Lei n.° 23/96, de 26 de Julho, e do Decreto-Lei n.° 195/99, de 8 de Junho".
12. Sendo esta norma de natureza interpretativa, destinando-se a esclarecer o sentido real da lei anterior deve a lei interpretada ser aplicada com o sentido e alcance que lhe foram fixados pela lei interpretativa.
13. Há ainda que ter em consideração o disposto no DL 230/96, de 29 de Novembro que estabelece que o direito a facturação telefónica detalhada pode ser exigido até um ano depois da prestação do serviço, o que não se afigura congruente com a necessidade da entidade prestadora exigir em juízo os seus créditos no prazo de seis meses a contar da respectiva prestação.
14. O encurtamento deste prazo prejudicaria não só a entidade prestadora, como também, o próprio utente, uma vez que esta seria forçada a reagir judicialmente em situações que poderiam ser sanadas extra-judicialmente, como situações de esquecimento de pagamento, insuficiência económica pontual, ausência de domicílio e outras semelhantes.
15. Nestes termos, não se pode considerar como procedente a tese segundo a qual o prazo a aplicar nesta sede seria o prazo de 6 meses.
A apelante termina pedindo que seja concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença de absolvição parcial do Réu no pedido, ordenando-se a condenação do Réu no pedido.
Não houve contra-alegações.
Foram colhidos os vistos legais. FUNDAMENTAÇÃO
A única questão suscitada neste recurso é se o crédito da A. pelos serviços prestados ao Réu se encontra prescrito.
Pelo tribunal a quo foi fixada e este tribunal ad quem aceita, a seguinte Matéria de Facto
1. A Autora V - Comunicações Pessoais, SA, que anteriormente usava a denominação de «T Comunicações Pessoais, SA» é uma sociedade comercial que se dedica à exploração de serviços de telecomunicações móveis terrestres (alínea A) dos Factos Assentes).
2. Na data de 11/07/2000, o Réu V subscreveu o escrito particular denominado «Proposta de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre», cuja cópia consta de fls. 7 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido (Alínea B) dos Factos Assentes).
3. No escrito particular referido em 2, está consignado que: «... Alteração tarifário de Vitamina para Regular... N° de Conta T.. Proponho à T, Comunicações Pessoais, SA, a celebração de um acordo de prestação do Serviço Móvel Terrestre de acordo com as Condições Gerais de prestação do mesmo serviço e de acordo com o Tarifário em vigor, incluindo taxas, tarifas e períodos de utilização. Declaro que conheço e entendo integralmente as referidas Condições Gerais e Tarifário, bem como as normas de utilização do cartão SIM, no caso de a T aceitar esta proposta...» (alínea C) dos Factos Assentes).
4. Na data de 07/11/2000, o Réu subscreveu o escrito particular denominado «Proposta de Condições Particulares de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre da T», cuja cópia consta de fls. 8 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido (alínea D) dos Factos Assentes).
5. No escrito particular referido em 4, está consignado que: «O signatário... que subscreveu/pretende subscrever a Proposta de Subscrição do Serviço Móvel terrestre, tendo como na(s) de conta(s) 3842827, propõe à TELECEL um Aditamento a essa proposta nos termos seguintes: 1. Como contrapartida pelo acesso às condições comerciais descritas neste ponto, o signatário compromete-se a manter em vigor e em seu nome, o(s) serviço(s) constante(s) da lista abaixo apresentada por um prazo mínimo de 36 (trinta e seis) meses a contar da data de assinatura deste Aditamento. Não se contam para o decurso desse prazo os períodos de suspensão temporária do(s) respectivo(s) serviço(s). Condições Comerciais Descrição Quantidade Valor Unitário Pago (sem IVA)... Nokia 8850 01 6.000.00... Nokia 3210 02 6.000.00 NEXICEL GRUPO. Serviços TELECEL abrangidos... Tipo N° de Telefone/(nº de Conta) Plano de Tarifas/(Valor mensal actual s/iva) N° do Cartão SIM.... 4222297/3842827 Mais (7.700.00)... 8741504/3842827 Intrarede (2.100.00)... 8741505/3842827 Intrarede (2.100.00)... 2. Durante o período referido no ponto 1, o signatário compromete-se a não alterar o(s) plano(s) de tarifas indicado(s) para outro(s) do tipo pré-pago ou com um valor mensal inferior. 3. Se o signatário denunciar ou de qualquer modo fizer cessar a prestação do(s) serviços(s) antes de decorrido o prazo acordado, compromete-se a efectuar, de imediato, o pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo. Para este efeito considera-se o valor mensal do plano de tarifas associado ao(s) respectivo(s) serviço(s), de acordo com o indicado no ponto 1, tendo em conta as tarifas em vigor à data de assinatura deste aditamento. 4. Estas condições são complementadas pelas Condições Gerais da Proposta de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre...» (alínea E) dos Factos Assentes).
6. Na data de 20/06/2002, o Réu subscreveu o escrito particular denominado «Proposta de Condições Particulares de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre da Vodafone», cuja cópia consta de fls. 9 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido (alínea F) dos Factos Assentes).
7. No escrito particular referido em 6), está consignado que: «O signatário,.. que subscreveu/pretende subscrever a Proposta de Subscrição do Serviço Móvel terrestre, tendo como na(s) de conta(s) 3842827, propõe à VODAFONE um Aditamento a esse contrato nos termos seguintes: 1. Como contrapartida pelo acesso às condições comerciais descritas neste ponto, o signatário compromete-se a manter em vigor e em seu nome, o(s) serviço(s) constante(s) da lista abaixo apresentada por um prazo mínimo de 36 (trinta e seis) meses a contar da data de assinatura deste Aditamento. Não se contam para o decurso desse prazo os períodos de suspensão temporária do(s) respectivo(s) serviço(s). Condições Comerciais Descrição Quantidade Valor Unitário Pago (sem IVA)... Nokia 8310 01 € 20... Nokia 5210 02 € 20... Nokia 3310 01 € 20... Credit Serviço Vodafone € 60 s/IVA Pack Empresa 1000. Serviços VODAFONE abrangidos... Tipo N° de Telefone/(n° de Conta) Plano de Tarifas/(Valor mensal actual s/iva) N° do Cartão SIM.... 91234.../3842827 Pack Empresa 1000 e 20,50... 91234.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20,50... 91234.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20,50... 91234.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20,50... 91234.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20,50... Nota: O valor mensal actual do Pack Empresa 1000 é de € 205,00 sem IVA. 2. Durante o período referido no ponto 1, o signatário compromete-se a não alterar o(s) plano(s) de tarifas indicado(s) para outro(s) do tipo pré-pago ou com um valor mensal inferior. 3. Se o signatário denunciar ou de qualquer modo fizer cessar a prestação do(s) serviços(s) antes de decorrido o prazo acordado, compromete-se a efectuar, de imediato, o pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo. Para este efeito considera-se o valor mensal do plano de tarifas associado ao(s) respectivo(s) serviço(s), de acordo com o indicado no ponto 1,. tendo em conta as tarifas em vigor à data de assinatura deste aditamento. 4. Estas condições são complementadas pelas Condições Gerais da Proposta de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre...» (alínea G) dos Factos Assentes).
8. Na data de 19/07/2002, o Réu subscreveu o escrito particular denominado «Proposta de Condições Particulares de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre da V», cuja cópia consta de fls. 10 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido (alínea H) dos Factos Assentes).
9. No escrito particular referido em 8, está consignado que: «O signatário,.. que subscreveu/pretende subscrever a Proposta de Subscrição do Serviço Móvel terrestre, tendo como na(s) de conta(s) 3842827, propõe à V um Aditamento a esse contrato nos termos seguintes: 1. Como contrapartida pelo acesso às condições comerciais descritas neste ponto, o signatário compromete-se a manter em vigor e em seu nome, o(s) serviço(s) constante(s) da lista abaixo apresentada por um prazo mínimo de 36 (trinta e seis) meses a contar da data de assinatura deste Aditamento. Não se contam para o decurso desse prazo os períodos de suspensão temporária do(s) respectivo(s) serviço(s). Condições Comerciais Descrição Quantidade Valor Unitário Pago (sem IVA)... Nokia 8310 01 € 20... Credito Serviço Vodafone € 20 s/IVA Pack Empresa 1000. Serviços VODAFONE abrangidos... Tipo N° de Telefone/(n° de Conta) Plano de Tarifas/(Valor mensal actual s/iva) Nº do Cartão SIM.... 91618.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20, 50... 91681.../3842827 Pack Empresa 1000 € 20, 50... Nota: O valor mensal actual do Pack Empresa 1000 é de € 205,00 sem IVA. 2. Durante o período referido no ponto 1, o signatário compromete-se a não alterar o(s) plano(s) de tarifas indicado(s) para outro(s) do tipo pré pago ou com um valor mensal inferior. 3. Se o signatário denunciar ou de qualquer modo fizer cessar a prestação do(s) serviços(s) antes de decorrido o prazo acordado, compromete-se a efectuar, de imediato, o pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo. Para este efeito considera-se o valor mensal do plano de tarifas associado ao(s) respectivo(s) serviço(s), de acordo com o indicado no ponto I, tendo em conta as tarifas em vigor à data de assinatura deste aditamento. 4. Estas condições são complementadas pelas Condições Gerais da Proposta de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre...» (alínea I) dos Factos Assentes).
10. No exercício da sua actividade, a Autora aceitou as propostas constantes dos escritos particulares referidos em 2 a 9, e na sequência prestou os seus serviços ao Réu (alínea J) dos Factos Assentes).
11. Autora e Réu acordaram que a prestação de serviços abrangia os números de telefone referidos em 3, 5, 7 e 9, e que todos eles estavam adstritos ao número de Conta (alínea K) dos Factos Assentes).
12. E mais acordaram que a Autora emitia facturas mensais em relação aos serviços utilizados pelo Réu, devendo este efectuar o pagamento do montante de que fosse devedor até ao 20° dia posterior à data da emissão da factura (alínea L) dos Factos Assentes).
13. Para pagamento de serviços que lhe foram prestados pela Autora, o Réu entregou a esta a quantia de € 955,20 em 19/04/2003, e a quantia de € 111,30 em 21/10/2003 (alínea M) dos Factos Assentes).
14. A Autora concedeu crédito ao Réu: no montante total de € 5.675,50 através da emissão da Factura n°, com data de emissão de 26/05/2003, com o período de Facturação 05/2003 de 23/04/2003 a 22/05/2003, sendo o valor de € 211,00 relativo ao «valor mensal», o valor de € 0,18 relativo a «comunicações«, o valor de € -4.980,50 relativo a «créd. contrato permanência», e o valor de € -906,18 relativo a «IVA»; e no montante total de € 4,34 através da emissão da Factura n°, com data de emissão de 26/06/2003, com o período de Facturação 06/2003 de 23/05/2003 a 22/06/2003, sendo o valor de € 211,00 relativo ao «valor mensal», o valor de € 4,00 relativo a «comunicações«, o valor de € -218,65 relativo a «comunicações nacionais», e o valor de € -0,69 relativo a «IVA» (alínea N) dos Factos Assentes).
15. Os serviços prestados pela Autora ao Réu na sequência do referida em 10 foram desactivados (alínea O) dos Factos Assentes).
16. Ao subscrever aos escritos particulares aludidos em 4, 6, e 8, o Réu adquiriu à Autora os oito telemóveis referidos em 5, 7, e 9 e pelos preços aí também referidos (alínea P) dos Factos Assentes).
17. Relativamente aos serviços por si prestados, a Autora emitiu e remeteu ao Réu, este recebeu:
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 27/01/2003, com o período de Facturação 01/2003 de 23/12/2002 a 22/01/2003, com data limite de pagamento em 21/02/2003, e no valor total de € 287,93;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 28/02/2003, com o período de Facturação 02/2003 de 23/01/2003 a 22/02/2003, com data limite de pagamento em 04/04/2003, e no valor total de € 421,61;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 16/05/2003, com o período de Facturação 03/2003 de 23/02/2003 a 22/03/2003, com data limite de pagamento em 16/05/2003, e no valor total de € 255,02;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 26/04/2003, com o período de Facturação 04/2003 de 23/03/2003 a 22/04/2003, com data limite de pagamento em 10/06/2003, e no valor total de € 536,61;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 26/07/2003, com o período de Facturação 07/2003 de 23/06/2003 a 22/07/2003, com data limite de pagamento em 21/08/2003, e no valor total de € 251,20;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 28/09/2003, com o período de Facturação 09/2003 de 23/08/2001 a 22/09/2003, com data limite de pagamento em 23/10/2003, e no valor total de € 253,26;
- a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 28/10/2003, com o período de Facturação 10/2003 de 23/09/2003 a 22/10/2003, com data limite de pagamento em 21/11/2003, e no valor total de € 251,84;
- e a Factura/Recibo n°, com data de emissão de 28/11/2003, com o período de Facturação 11/2003 de 23/10/2003 a 22/11/2003, com data limite de pagamento em 23/12/2003, e no valor total de € 251,09 (resposta ao Facto n°1 da Base Instrutória).
18. A Autora emitiu e remeteu ao Réu, este recebeu, a Factura/Recibo n°, com data de emissão em 26/12/2002, como período de Facturação 12/2002 de 23/11/2002 a 22/12/2002, com data limite de pagamento em 20/01/2003, e no montante total de € 6.172,45, sendo o valor de € 205,00 relativo ao «valor mensal», o valor de € 1,43 relativo a «comunicações», o valor de € 4.980,50 relativo a «penalidade incumprimento contratual», e o valor de € 985,52 relativo a «IVA» (resposta ao Facto n°2 da Base Instrutória).
19. Até às datas limites de pagamento que delas constam, o Réu não pagou à Autora os valores constantes das facturas referidas em 17 e 18, e através das quantias aludidas em 13, foram pagos os dois valores de «€ 211,00» e os valores de «0,18» e de «€ 4,00» referidos em 14, foi pago o valor total da Factura/Recibo n° referida em 17, e foi pago o montante de € 285,96 do valor total da Factura/Recibo n° referida em 17 (respostas aos Factos n°s. 3 e 7 da Base Instrutória).
20. Foi na sequência desta falta de pagamento que a Autora efectivou a desactivação de serviços aludida em 15, a qual ocorreu em 03/12/2003 (resposta ao Facto n°4 da Base Instrutória).
21. Na sequência desta desactivação, a Autora emitiu e remeteu ao Réu, este recebeu, a Factura/Recibo n°, com data de emissão em 27/01/2004, com o período de Facturação 01/2002 de 23/12/2003 a 22/01/2004, com data limite de pagamento em 19/02/2004, e no montante total de € 3.290,65, sendo o valor de € 2.765,25 relativo a «quebra contrato permanência», e o valor de € 525,40 relativo a «IVA» (resposta ao Facto n°5 da 1 base Instrutória).
22. O Réu não pagou à Autora o valor constante da factura referida em 21 (resposta ao Facto n° 6 da Base Instrutória).
23. A aquisição referida em 16 foi feita a preços inferiores ao valor de mercado desses equipamentos (resposta ao Facto n°8 da Base Instrutória).
24. A obrigação do Réu manter o serviço durante 36 meses prevista na cláusula n° 1 dos escritos particulares aludidos em 4, 6 e 8 era a contrapartida, pelo menos, do referido em 23 (resposta ao Facto n° 9 da Base Instrutória).
Mais está provado, conforme consta nos autos, que:
25. A presente acção foi instaurada em 29 de Setembro de 2004.
26. O Réu foi citado no dia 24 de Novembro de 2004. O Direito
Provou-se que nos anos de 2000 e 2002 a A. e o R. celebraram contratos mediante os quais a A. obrigou-se a proporcionar ao R. a utilização de serviços de telefone móvel, mediante o pagamento do preço respectivo. Nesta acção estão em causa serviços prestados pela A. ao R. no período de Janeiro de 2003 a Novembro de 2003, que o R. não pagou à A..
O tribunal a quo entendeu que a tais serviços aplica-se o regime previsto na Lei nº23/96, de 26 de Julho e que, por força de tal regime, o direito invocado pela A. prescreveu. A apelante defende que o serviço de telefone móvel está excluído do âmbito de aplicação da referida lei e que mesmo que se siga entendimento contrário, o prazo de prescrição aplicável é o de cinco anos, previsto no art.º 310º, al. g), do Código Civil.
Quid juris?
A Lei nº 23/96, de 26.7, teve a sua origem na Proposta de Lei nº 20/VII a qual está publicada no Diário da Assembleia da República, II série-A, nº 33, de 4 de Abril de 1996. Na respectiva exposição de motivos, após se lembrar que “é tarefa do Estado prover à satisfação de necessidadesessenciais e contribuir para o bem-estar e a qualidade de vida de todos”, explicita-se que a lei tem em vista o regime jurídico de serviços públicos essenciais, “que exigem especial atenção, atenta a sua natureza e características”, “em ordem à protecção do utente dos mesmos”. São serviços que, constituindo “domínio tradicional do Estado, Regiões Autónomas, autarquias e empresas públicas”, embora “já hoje entregues também a empresas privadas”, “caracterizam-se tendencialmente pela sua universalidade, por serem prestados em regime de monopólio (local, regional ou até nacional) e por deverem atender aenvolventes especiais, que não a uma mera óptica puramente comercial ou economicista”. Tal implica, prossegue a exposição de motivos, “que a prestação de serviços públicos essenciais deve estar sujeita ao respeito por certos princípios fundamentais”, que serão os “princípios da universalidade, igualdade, continuidade, imparcialidade, adaptação às necessidades e bom funcionamento”.
Um dos sectores que tradicionalmente é considerado como de importância fundamental para a população e para a comunidade em geral é o das telecomunicações (cfr., v.g., Rodrigo Gouveia, “Os serviços de interesse geral em Portugal”, Coimbra Editora, 2001, pág. 17 e seguintes). Daí que, praticamente desde as suas origens (último quartel do século XIX), a exploração comercial das actividades integradas no sector das telecomunicações foi sujeita a um princípio de monopólio, atribuído a uma empresa privada (Estados Unidos da América) ou ao Estado, directamente ou sob a sua responsabilidade, por empresas públicas ou empresas privadas concessionárias (Europa) (cfr. Pedro Gonçalves, “Direito das Telecomunicações”, Almedina, Coimbra, 1999, pág. 29 e seguintes). A partir da década de 80 do século XX factores sobretudo de natureza político-ideológica e técnica abriram caminho para a liberalização do sector e para o desmantelamento do monopólio e do serviço público, movimento esse fortemente impulsionado pelas instituições comunitárias (Pedro Gonçalves, obra citada, pág. 32 e seguintes).
Em 1996, ano da publicação da lei ora em análise, vigorava a Lei de Bases do estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações, Lei nº 88/89, de 11 de Setembro. Esta, após definir como telecomunicações públicas “as que visam satisfazer a necessidade colectiva genérica de transmitir e receber mensagens e informações” (art.º 2º, nº 2) e de atribuir ao Estado a tutela das telecomunicações, incluindo “a concessão, licenciamento e autorização do estabelecimento e exploração de redes e serviços de telecomunicações”, “fiscalização do cumprimento, por parte das empresas operadoras de telecomunicações, das disposições legais e regulamentares relativas à actividade, bem como a aplicação das respectivas sanções” e a “definição dos preços e tarifas dos serviços de telecomunicações, nos termos da legislação aplicável” (art.º 4º, nº 2, alíneas f), g) e h)), destrinça um “serviço público de telecomunicações”, que “pode ser explorado pelo Estado, por pessoa colectiva de direito privado, mediante contrato de concessão de serviço público”, a quem compete, nomeadamente, “a prestação dos serviços que sejam considerados como fundamentais” (art.º 8º, nº 2). Tais serviços fundamentais, acrescenta-se no nº 3 do art.º 8º da lei, “compreendem os serviços fixos de telefone e telex, bem como um serviço comutado de transmissão de dados”. O serviço móvel de telefone integrará, pois, o conjunto dos “serviços de telecomunicações complementares” cuja exploração, nos termos do nº 1 do artigo 10º, “pode ser feita pelos operadores do serviço público de telecomunicações ou por empresas de telecomunicações complementares, devidamente licenciadas para o efeito”.
O regime jurídico das telecomunicações complementares, incluindo os serviços de telecomunicações complementares móveis, foi desenvolvido pelo Decreto Lei nº 346/90, de 03.11. Em 23.3.1991 foi publicada a Portaria nº 240/91, que continha o Regulamento de Exploração do Serviço de Telecomunicações Complementares e Serviço Móvel Terrestre (SMT).
Em 1996 o serviço móvel terrestre (telefone móvel) era explorado, em Portugal, pela Telecel (antecessora da ora A.) e pela TMN, sob licença (cfr. licença nº ICP – 006/TCM e licença nº 011/TCM, consultáveis na internet, no sítio da ANACOM (www.anacom.pt). Por sua vez o serviço fixo de telefone ou “telefonia vocal” era explorado, com exclusividade, em regime de concessão, pela Portugal Telecom, S.A., ao abrigo do Dec.-Lei nº 40/95, de 15.02. À concessionária estavam atribuídas, no âmbito da prestação do serviço fixo de telefone, como obrigações específicas, as de garantir a igualdade de acesso ao serviço pelo público em geral, assegurar a prestação do serviço ao público em geral, incluindo os cidadãos com menores recursos económicos, garantir a satisfação da procura e características qualitativas da prestação do serviço (art.º 10º). Entre as obrigações genéricas da concessionária, o Decreto Lei nº 40/95 enumera, nomeadamente, “garantir a prestação dos serviços de telecomunicações de uso público concessionados em termos de serviço universal, em todo o território nacional (…)” (art.º 8º, nº 1, alínea a)).
A supra referida diferenciação entre o serviço telefónico fixo (e a respectiva operadora) e o serviço de telefone móvel (e respectivas operadoras) poderia fundamentar a exclusão deste último da categoria de “serviço público essencial” e, consequentemente, do regime previsto na Lei nº 23/96. No sentido dessa exclusão pronunciou-se parte da jurisprudência (cfr. ac. Rel. de Lisboa, de 09.7.1998, in Col. de Jur., ano XXIII, tomo IV, pág. 100; na internet, dgsi-itij, ac. Rel. Lisboa, 18.10.2001, processo 0085538; ac. da Rel. de Lisboa, 05.7.2001, processo 0061428; ac. da Rel. Porto, 29.6.2004, processo 0422728; ac. da Rel. de Lisboa, 03.11.2005, processo 9080/2005-8; ac. da Rel. de Lisboa, 23.3.2006, processo 972/2006-6; ac. da Rel. Porto, 27.02.2007, proc. 0720188) e da doutrina (cfr. Pedro Gonçalves, “Direito das Telecomunicações”, citado, páginas 188 e 192; António Pinto Monteiro, “A protecção do consumidor de serviços de telecomunicações”, in “As telecomunicações e o direito na sociedade de informação”, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1999, pág. 149; Menezes Cordeiro – numa 1ª fase de vigência da lei -, “Da prescrição do pagamento dos denominados serviços públicos essenciais”, in “O Direito”, ano 133, 2001, nº IV, páginas 806 e 807; cfr. também, perfilhando esta interpretação da lei, informação da ANACOM, “A exclusão do serviço fixo de telefone da Lei dos Serviços Públicos Essenciais (Lei nº 23/96)”, publicada no sítio da ANACOM na Internet, em http://www.anacom.pt/template15.jsp?categoryId=98619). Porém, a verdade é que, na sequência da intervenção de Calvão da Silva, na qualidade de deputado do PSD, a redacção do projecto de lei foi retocada, de forma que onde se dizia “serviço fixo de telefone”, passou a dizer-se “serviço de telefone”, tendo em vista, expressamente, incluir no âmbito de aplicação da lei o serviço de telefone móvel (cfr. acta do debate parlamentar que incidiu sobre o projecto de lei, publicada no D.A.R., I série, nº 56, de 12.04.1996, pág. 1784 e ss, e Calvão da Silva “Aplicação da Lei nº 23/96 e o Serviço Móvel de Telefone e natureza extintiva da prescrição referida no seu art.º 10º”, Rev. Leg. Jur., ano 132, nºs 3901 e 3902, pág. 138 a 143). Entendeu-se que o conceito de serviço público deveria aqui ser tido em consideração pelo ângulo objectivo, enquanto “actividade de utilidade pública ou de interesse geral, ao serviço do interesse público, ou do interesse do público, para satisfação de necessidades primárias, básicas e essenciais dos cidadãos” (Calvão da Silva, estudo citado, pág. 142) e que “serviço fixo e serviço móvel de telefone satisfazem ou permitem satisfazer as mesmas necessidades básicas e fundamentais dos cidadãos”, pelo que “o assinante de telefone, quer em sistema fixo quer em sistema móvel de acesso, merece igual protecção (Calvão da Silva, estudo citado, pág. 142). Aliás, os operadores de telefone móvel já estavam sujeitos a obrigações que tinham em consideração o especial interesse do público no exercício da respectiva actividade, como a de “garantir, em termos de igualdade, o acesso aos serviços prestados” (alínea f) do nº 2 do art.º 7º do Dec.-Lei nº 346/90, de 03.11 e alínea g) do art.º 5º do Regulamento aprovado pela Portaria nº 240/91, de 23.3), publicar de forma detalhada os vários componentes dos preços cobrados (al. f) do nº 1 do art.º 5º do referido Regulamento) e garantir a continuidade e a qualidade do serviço (alínea i) do nº 1 do art.º5º do Regulamento).
As licenças concedidas aos operadores do serviço móvel terrestre reiteram tais obrigações, e explicitam outras, destinadas a garantir a qualidade, extensão, transparência e continuidade do serviço (quanto à cobertura do serviço pela população, a Telecel/Vodafone ficou obrigada a abranger, até ao final do 1º ano da actividade, 90% da população e até ao final do 2º ano, 99% da mesma (cfr. licença nº ICP-006/TCM, supra referida).
Realce-se que os “serviços de telecomunicações avançadas”, aos quais a Lei nº 23/96 deveria ser estendida mediante decreto-lei no prazo de 120 dias, conforme estipulado no art.º 13º, nº 2, são serviços como internet e televisão por cabo (cfr. Carlos Ferreira de Almeida, “Serviços públicos, contratos privados”, in “Estudos em homenagem à Prof. Dra Isabel de Magalhães Collaço”, vol. II, Almedina, Nov. 2002, pág. 119).
Conclui-se, pois, que a Lei nº 23/96 veio beneficiar também os utilizadores do serviço de telefone móvel (o qual, diga-se a título de curiosidade, e segundo informação contida no sítio da ANACOM na internet, em 31.12.1996 atingia o número de 663 700 assinantes - http:/anacom.pt/template12.jsp?categoryId=38428). Neste sentido se pronunciou parte da jurisprudência (cf., na internet, dgsi-itij, v.g., Rel. do Porto, 28.6.2004, processo 0453758; Rel. do Porto, 21.12.2004, processo 0426253; Rel. de Lisboa, 20.6.2006, processo 4914/2006-7; STJ, 05.6.2003, processo 03B1032; Porto, 09.11.2006, processo 0635834) e da doutrina (além de Calvão da Silva, citado, Carlos Ferreira de Almeida, estudo citado, pág. 140, nota 81; Mário Frota, “A tutela do consumidor de produtos e serviços públicos essenciais na Europa”, Revista Portuguesa de Direito de Consumo”, Junho de 1998, nº 14, pág. 14).
É certo que a Lei nº 5/2004, de 10.2, que entrou em vigor no dia seguinte à data da sua publicação (art.º 128º, nº 1), estatuiu que “o serviço de telefone é excluído do âmbito de aplicação da Lei nº 23/96, de 26.7” (art.º 127º, nº 2). Mas tal exclusão não é aplicável aos contratos sub judice, cuja celebração e execução ocorreu à luz do regime anterior (art.º 12º nº 1 do Código Civil).
Sob a epígrafe “prescrição e caducidade”, o art.º 10º da Lei nº 23/96 estipula, nos seus nºs 1 e 2, o seguinte:
“1 – O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação. 2 – Se, por erro do prestador do serviço, foi paga importância inferior à que corresponde ao consumo efectuado, o direito ao recebimento da diferença de preço caduca dentro de seis meses após aquele pagamento.”
No que concerne ao nº 1 do aludido artigo, parte da jurisprudência e parte da doutrina, impressionadas pela curta duração do referido prazo, pronunciaram-se no sentido de que aí se previa uma prescrição presuntiva, ou seja, assente na presunção, ilidível, do cumprimento da obrigação (artigos 312º e 313º do Código Civil; cfr, na jurisprudência, ac. da Rel. do Porto, 28.6.1999, processo 9950735 e ac. da Rel. do Porto, de 30.10.2000, processo 0051000, ambos na internet, dgsi-itij; na doutrina, Menezes Cordeiro, estudo citado, páginas 807 a 809; Carlos Ferreira de Almeida, estudo citado, pág. 139). Porém, a verdade é que, no nosso direito, em regra o cumprimento da obrigação não se presume, a sua alegação e prova constituem um ónus que, como excepção peremptória que é, recai sobre o devedor (art.º 342º, nº 2, do Código Civil). Uma solução jurídica que inverta esse estado de coisas deverá ser claramente consagrada na lei, conforme ocorre nas prescrições presuntivas previstas nos artigos 316º e 317º do Código Civil. Ora, nem nos trabalhos preparatórios da Lei nº 23/96 nem no texto desta se encontram sinais de tal desiderato. Pelo contrário, como diploma que visa proteger os utentes dos referidos serviços, a curta duração do aludido prazo mostra-se compatível com o carácter dos serviços em causa, que em virtude da sua essencialidade e continuidade podem, a breve trecho, originar dívidas de valores elevados, criando sérias e até inesperadas dificuldades de solvabilidade aos respectivos utentes, maxime os de menores recursos. Conforme expende António Pinto Monteiro (“A protecção do consumidor de serviços de telecomunicações”, estudo citado, pág. 154), “os prazos muito curtos de que dispõe o prestador do serviço devem-se a razões ligadas à protecção do utente: impedir a acumulação de dívidas, o que se afigura muito importante numa época em que o sobreendividamento (…) é uma preocupação bem premente; reagir contra a incúria do prestador do serviço, que deixa arrastar-se a situação e prolonga a insegurança do consumidor; e facilitar a posição deste também no tocante ao domínio da prova.”
Entendemos, pois, que o artigo 10º nº 1 da Lei nº 23/96 prevê uma prescrição de tipo extintivo (neste sentido, na jurisprudência, cfr., v.g., Rel. do Porto, 20.3.2000, Col. de Jur., tomo II, pág. 207; na internet, dgsi-itij, Rel. do Porto, 06.5.2003, processo 0321544; STJ, 05.6.2003, processo 03B1032; STJ, 13.5.2004, processo 04A1323, STJ, 06.02.2003, processo 02B4580; Rel. de Coimbra, 02.10.2001, processo 1531/2001; Rel. do Porto, 06.02.2003, processo 0233188; Rel. do Porto, 20.11.2000, processo 0050753; na doutrina, além de António Pinto Monteiro, citado, Calvão da Silva, estudo citado, pág. 143 e seguintes; Mário Frota, estudo citado, pág. 26).
Em 01.8.1997 foi publicada a Lei nº 91/97, que revogou a Lei nº 88/89, substituindo-se-lhe como lei das bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de redes, telecomunicações e a prestação de serviços de telecomunicações. A Lei nº 91/97 deu mais alguns passos no sentido da liberalização total do sector das telecomunicações, princípio esse que enunciou expressamente no artigo 7º e que, de acordo com o artigo 20º, se aplicaria à prestação do serviço fixo bem como à instalação, estabelecimento e exploração das redes de telecomunicações que o suportem, a partir de Janeiro de 2000.
Em desenvolvimento desta nova Lei de Bases das Telecomunicações, foi publicado o Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30.12, o qual regula o regime de acesso à actividade de operador de redes públicas de telecomunicações e de prestador de serviço de telecomunicações de uso público (o serviço de telecomunicações de uso público é definido, na Lei de Bases, como “as destinadas ao público em geral”, em contraposição às “telecomunicações privativas”, que são “as destinadas ao uso próprio ou a um número restrito de utilizadores” – art.º 2º da Lei nº 91/97).
Sob a epígrafe “protecção dos utentes”, o art.º 9 do Dec.-Lei nº 381-A/97 estipula, no nº 4, que “o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.” O nº 5 do mesmo artigo acrescenta que “para os efeitos do número anterior, tem-se por exigido o pagamento com a apresentação de cada factura.” Estes dois números estão reproduzidos nos números 2 e 3 do artigo 16º do mesmo diploma, sob a epígrafe “sistemas de preços”.
Pese embora o teor do nº 5 do citado artigo 9º e do nº 3 do citado artigo 16º, parte da jurisprudência, no seguimento da posição defendida por Calvão da Silva (estudo citado, páginas 155 a 157), entende que nos contratos abrangidos por este diploma a apresentação da factura não interrompe nem suspende a prescrição; para evitar a prescrição, cujo prazo começa a contar no termo de cada período mensal de prestação do serviço telefónico, é necessária a citação ou notificação judicial, ou qualquer outro meio judicial equiparado, designadamente a notificação judicial avulsa do devedor (art.º 323º, nºs 1 e 4, do Código Civil) – cfr., na jurisprudência, Rel. de Évora, 15.3.2001, CJ XXVI, tomo 2, pág. 250; na internet, dgsi-itij, Rel. de Lisboa, 19.9.2006, processo 5182/2006-1; Rel. de Lisboa, 19.9.2006, processo 2737/2006-7; STJ, 06.7.2006, processo 06B1755; na doutrina, além de Calvão da Silva, cfr., muito sinteticamente, Mário Frota, in “Carta de protecção do consumidor de produtos e serviços essenciais”, in Vida Judiciária, nº 36, Maio 2000, páginas 25 e 26).
Como se viu supra, para Menezes Cordeiro a prescrição prevista no nº 1 do art.º 10º da Lei nº 23/96 é presuntiva. Por outro lado, para este jurisconsulto, em boa técnica jurídica, se a prescrição se reportasse ao crédito correspondente ao preço do serviço, o legislador teria dito “o direito ao preço do serviço prestado prescreve”, em vez de enunciar a prescrição do “direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado”. Daí Menezes Cordeiro retira a conclusão de que o direito de exigir o pagamento a que se refere o artigo 10º nº 1 da Lei nº 23/96 “é, simplesmente, o direito de enviar uma factura” (estudo citado, pág. 809). “Enviada a factura no prazo de seis meses: o direito de exigir o pagamento foi tempestivamente exercido. A partir daí, caímos na prestação [no original – ter-se-á querido escrever “prescrição”] essa sim, extintiva –do artigo 310º, g) do Código Civil: cinco anos” (estudo citado, pág. 810).
Esta tese tem tido forte acolhimento na jurisprudência (embora não necessariamente quanto à natureza presuntiva da prescrição de seis meses), a qual vê na redacção do nº 5 do art.º 9º do Dec.-Lei nº 381-A/97 a confirmação de que o direito a que o nº 1 do art.º 10 da Lei nº 23/96 (e o nº 4 do art.º 9º do Dec.-Lei nº 381-A/97, que reproduz aquele) se refere é o direito de reclamar o pagamento do preço do serviço apresentando a respectiva factura. Decorrido o referido prazo de seis meses após a prestação do serviço, sem que o operador tenha apresentado a factura respectiva, prescreve o direito ao pagamento do preço. Se as facturas forem emitidas no aludido prazo de seis meses, o fornecedor do serviço só deixará de poder exigir o pagamento do preço se entretanto tiver decorrido o prazo de cinco anos contado do fornecimento (cfr. STJ, 23.01.2007, processo 06A4010, também na Col. de Jur. do STJ, ano XV, tomo I, pág. 41 e ss; Rel. Porto, 27.02.2007, processo 0720188; Rel. Lisboa, 21.9.2006, processo 6338/2006-2; Rel. Porto, 28.6.2004, processo 0453758; Rel. Lisboa, 23.3.2006, processo 972/2006-6; Rel. Porto, 02.10.2006, processo 0456896; Rel. Porto, 25.3.2004, processo 0431335; Rel. Lisboa, 20.6.2006, processo 4914/2006-7; Rel. Lisboa, 25.01.2007, processo 10626/2006-6).
Esta tese releva da dificuldade, sentida por parte da doutrina e da jurisprudência, em aceitar a imposição de um prazo prescricional tão curto para o exercício do direito ao pagamento do preço nestes fornecimentos. Tal solução legal, conquanto feita em nome dos interesses dos utentes, correria o risco de submeter estes “a uma espiral de litigiosidade” (Menezes Cordeiro, estudo citado, pág. 810).
Afigura-se-nos, porém, que as razões invocadas em abono da tese ora em análise não procedem.
Quanto aos inconvenientes advenientes da curta duração do prazo, em especial o alegado aumento da litigiosidade judicial, afigura-se-nos que o efeito da solução legal poderá ser o contrário: por um lado, a perspectiva de enfrentar os custos de uma acção judicial tornará o prestador dos serviços mais diligente no exercício da sua actividade, assegurando-se de que não reclama do utente mais do que aquilo a que tem direito; por outro lado, um prazo de prescrição curto compelirá o fornecedor a não deixar arrastarem-se eventuais situações de incumprimento, interpelando rápida e incisivamente o utente, de molde a que este não só esteja ainda em condições de satisfazer os seus compromissos, como de poder constatar da razoabilidade ou da improcedência do que lhe for reclamado. Por outro lado, face à ameaça de uma rápida interpelação judicial, o consumidor tenderá a cumprir mais diligentemente a respectiva obrigação de pagamento do preço.
No que concerne ao suposto destaque, pelo legislador, de um “direito do fornecedor reclamar o pagamento mediante a apresentação de uma factura”, não é consentâneo com a natureza da interpelação, que não é um direito mas um ónus do credor tendo em vista, nomeadamente, o vencimento da obrigação (art.º 805º do Código Civil; cfr. Inocêncio Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, 7ª edição, 1997, Coimbra Editora, pág. 251 e seguintes), em particular na área da prestação de serviços públicos essenciais, em que a apresentação de factura com determinados requisitos, é uma obrigação do fornecedor (cfr. art.º 9º da Lei nº 23/96, Dec.-Lei nº 230/96, de 29.11 – direito do utente do serviço telefónico a facturação detalhada - e art.º 9º, nº 3, do Dec.-Lei nº 381-A/97) e não um direito (neste sentido, Calvão da Silva, estudo citado, pág. 156). O direito que releva, no contrato de prestação de serviços públicos essenciais (bem como de quaisquer outros serviços), por parte do fornecedor, é o direito ao pagamento do respectivo preço. E é certamente este que o legislador teve em vista ao fixar o prazo previsto no art.º 10º, nº 1, da Lei nº 23/96 e no art.º 9º, nº 4, do Dec.-Lei nº 381-A/97. A redacção utilizada aproxima-se da técnica da caducidade, sendo porém aplicáveis as regras da prescrição, que é expressamente referida na lei (art.º 298º nº 2 do Código Civil).
No que concerne ao serviço telefónico, para amenizar a posição do respectivo fornecedor, certamente tendo em vista a plena liberalização e privatização perspectivada para todo o sector, o legislador passou a permitir, por força do disposto no Dec.-Lei nº 381-A/97, que o prazo de prescrição de seis meses seja interrompido mediante a apresentação da factura respectiva, após o que se iniciará o decurso de novo prazo de seis meses (artigo 326º do Código Civil). O Dec.-Lei nº 381-A/97 prevê, pois, um desvio à regra geral, contida no art.º 323º nº 1 do Código Civil, segundo a qual a prescrição interrompe-se por meio de interpelação judicial (neste sentido, cfr. STJ, 06.02.2003, processo 02B1032; Rel. Porto, 20.6.2002, processo 0230589; STJ, 05.6.2003, processo 03B1032; Rel. Porto, 09.11.2006, processo 0635834; Rel. Porto, 03.11.2005, processo 0534575; Rel. Porto, 26.01.2006, 0537124; Rel. Lisboa, 12.5.2005, processo nº 3821/2005-6, todos na internet, dgsi-itij).
O Dec.-Lei nº 381-A/97 foi revogado pela Lei nº 5/2004, de 10.02, lei que estabelece o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações electrónicas e aos recursos e serviços conexos. As supra referidas normas atinentes à prescrição do crédito dos prestadores de serviços telefónicos não foram substituídas nesse diploma por quaisquer outras, pelo que há que concluir que a estes créditos voltou a ser aplicável o regime previsto no Código Civil, maxime o prazo quinquenal previsto no art.º 310º, alínea g). Segundo a opinião manifestada pela ANACOM na informação supra citada (“A exclusão do serviço fixo de telefone da Lei dos Serviços Públicos Essenciais (Lei nº 23/96)”), na sequência da entrada em vigor da Lei nº 5/2004, quanto ao prazo de prescrição passaram a vigorar as regras estabelecidas na lei geral “uma vez que face a todos os mecanismos de protecção dos consumidores dos serviços de comunicações electrónicas estabelecidos no REGICOM [Lei das Comunicações Electrónicas], e em especial dos utilizadores do SU [Serviço Universal], se entendeu que não se justificava um desvio relativamente ao fixado na lei geral”.
Tal como a exclusão da aplicabilidade da Lei nº 23/96 aos serviços de telefone, operada pela Lei nº 5/2004, não se repercute no caso sub judice, face ao princípio da não retroactividade das leis, também a revogação do Dec.-Lei nº 318-A/97 não afecta o tratamento jurídico a dar ao presente litígio.
Contrariamente ao alegado pela apelante, o artigo 127º, nº 2, da Lei nº 5/2004, ao dizer que o serviço de telefone é excluído do âmbito de aplicação da Lei nº 23/96, não tem natureza interpretativa, não vem confirmar o entendimento já expresso pela jurisprudência de que o art.º 10º nº 1 da Lei nº 23/96, de 26.07, não era aplicável ao serviço móvel terrestre. Se assim fosse, tal exclusão só se reportaria ao serviço de telefone móvel e não, como ocorre, ao serviço de telefone em geral, incluindo o telefone fixo. O que se passa é que o legislador, porventura fruto da total liberalização e privatização que se operou no sector das telecomunicações, mudou de orientação, optando por aplicar a esta área da prestação de serviços essenciais o regime geral (neste sentido, cfr. acórdão da Relação de Lisboa, de 20.6.2006, internet, dgsi-itij, processo 4914/2006-7, já supra citado).
A apelante invoca ainda o estipulado no Dec.-Lei nº 230/96, de 29.11. Segundo a apelante, este diploma estabelece que o utente pode, por escrito, exigir facturação detalhada até um ano depois da prestação do serviço. Tal não seria congruente com a prescrição, no prazo de seis meses a contar da prestação, do direito da prestadora a exigir em juízo os seus créditos.
A isto responder-se-á que, por um lado, o direito à facturação detalhada pode ser exercido independentemente do pagamento atempado das facturas e, por outro, que o que aquele diploma estabelece é o direito do utente do serviço telefónico, pessoa singular considerada consumidor nos termos da Lei nº 24/96, de 31 de Julho, ao fornecimento de facturação detalhada sem qualquer encargo, nos seguintes casos: sempre que uma factura não detalhada seja objecto de reclamação; mediante pedido escrito do utente, válido pelo período de um ano. Neste último caso, pois, está consignado que, sem necessidade da reiteração de pedido escrito, o utente terá direito a facturação detalhada, sem encargos, durante um ano. Essa facturação será emitida mês a mês, após a prestação do serviço, nos termos habituais. Aliás, nos termos do Dec.-Lei nº 240/97, de 18.9, que aprovou o Regulamento de Exploração de Serviço Fixo de Telefone, tendo em vista, nomeadamente, a sua adaptação à Lei nº 23/96, o operador só “é obrigado a manter em registo o detalhe da informação relativa à facturação dos últimos três meses, por forma a viabilizar eventuais esclarecimentos da factura apresentada ao assinante” (art.º 36º nº 1) (de notar que este diploma foi revogado pelo Decreto Lei nº 474/99, de 08.11, que aprova o novo Regulamento de Exploração do Serviço Fixo de Telefone, o qual reitera a existência do direito a facturação detalhada, embora agora sem indicação de prazos: artigos 38º e 39º; nos mesmos termos, consagrando o direito a facturação detalhada, sem imposição de prazos, artigos 39º, nº 2, alínea b) e 94º, da Lei nº 5/2004).
Revertamos à situação fáctica provada nos autos. O último período de prestação de serviços terminou em 22.11.2003. Assim, o prazo de prescrição do direito ao preço respectivo terminava em 22.05.2004. Provou-se que foi emitida a correspondente factura em 28.11.2003, que o Réu recebeu (com data limite de pagamento em 23.12.2003). Assim, não tendo a apelante alegado nem provado que a data da interrupção da prescrição foi ulterior (art.º 342º nº 1 do Código Civil), tem-se como interrompida a prescrição no dia 28.11.2003. Reiniciada a contagem do prazo de prescrição, este completou-se em 28 de Maio de 2004. Isto é, quando a acção foi proposta (em 29.9.2004), o direito da apelante já havia prescrito.
Em conclusão, o recurso é improcedente. DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e consequentemente mantém-se a decisão recorrida.
Lisboa, 27.9.2007
Jorge Leal
Nelson Borges Carneiro
Américo Marcelino