EMPREITADA
CADUCIDADE
TRIBUNAL ARBITRAL
Sumário

1) Na conformação de um contrato de direito privado, as partes podem servir-se de instrumentos normativos de ordem pública.
2) Sendo omissa a vontade real das partes, a interpretação da declaração negocial obedece à regra objectiva prevista no n.º 1 do art. 236.º do CC.
3) O prazo de caducidade consignado no art. 226.º do RJEOP (DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro) pode ser aplicável no âmbito da empreitada de direito privado.
4) A simples existência de um litígio não constitui o reconhecimento do direito, à luz do n.º 2 do art. 331.º do CC.
5) O prazo de caducidade do art. 1255.º do CC começa a correr a partir do momento em que a coisa passa a estar na inteira disponibilidade do dono da obra.
O.G.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
R, S.A., com sede na Amadora, instaurou em 27 de Fevereiro de 2006, em Tribunal Arbitral, com sede em Lisboa, contra Cafés S.A., com sede na Amadora, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 1 430 662,40, acrescida ainda de certos juros vincendos.
Para tanto, alegou, em síntese, ter celebrado com a R., em 12 de Janeiro de 1998, um contrato de empreitada, tendo por objecto as obras de construção civil e de remodelação das instalações fabris da R., na Amadora, pelo preço global de 220 000 000$00, cujo prazo de execução era de seis meses, contados a partir de 19 de Janeiro de 1998; ter havido atraso na execução da empreitada, imputável à R., a qual, depois de várias vicissitudes, rescindiu o contrato de empreitada, em 26 de Janeiro de 1999, invocando atrasos, e impediu que o pessoal da A. acedesse à obra; e ser credora, por efeito da falta de pagamento de facturas e da indemnização emergente dos danos sofridos pelos atrasos, imputáveis à R., pela rescisão ilícita do contrato e pela retenção ilícita da garantia bancária.
Em 2 de Maio de 2006, contestou longamente a R., por excepção, alegando a caducidade, pelo decurso do prazo de 132 dias, previsto no art. 226.º do DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro, e a prescrição dos juros, e, por impugnação, devolveu a imputabilidade dos atrasos à A., alegando ainda que a rescisão do contrato fora justa e legítima.
Em reconvenção, pediu também que a Autora fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 1 046 434,00, acrescida de juros vincendos, invocando, para tal, defeitos na obra, despesas suportadas para a sua eliminação e conclusão da obra e quantias pagas a mais.
Replicou a A., também longamente, pugnando pela improcedência das excepções e, contestando a reconvenção, arguiu a caducidade do direito invocado pela R. e impugnou os respectivos factos. No mesmo articulado, reduziu o pedido para o valor de € 1 429 914,24.
Treplicou a R., no sentido da improcedência da matéria de excepção.
A A. apresentou ainda quadrúplica.
As partes juntaram pareceres dos Professores Doutores Romano Martinez e Almeida Costa.
Foi tentada, sem êxito, a conciliação das partes.

Seguiu-se, depois, a 8 de Maio de 2007, a prolação do acórdão de fls. 2956 a 3011 que, considerando procedentes as excepções da caducidade, julgou a acção e a reconvenção improcedentes e absolveu a Ré e a Autora dos respectivos pedidos.
Inconformada, com a decisão, recorreu a Autora, que, tendo alegado, formulou, no essencial, as seguintes conclusões:
a) O contrato de empreitada celebrado é de direito privado.
b) Na interpretação do contrato, releva também a posição assumida pelas partes na execução do negócio.
c) As partes não remeteram, in totum, a disciplina jurídica do contrato para o RJEOP, mas apenas no que diz respeito aos “aspectos técnicos”, sendo aplicável o regime constante do Código Civil.
d) Os direitos da recorrente não caducaram, nem prescreveram.
e) O litígio teria de ser julgado segundo critérios de equidade, não podendo conhecer-se da caducidade (art. 229.º, n.º 2, do RJEOP).
f) A caducidade nunca poderia operar, por força do n.º 2 do art. 331.º do Código Civil.

Pretende, com o seu provimento, a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que julgue a caducidade improcedente.
Subordinadamente, recorreu a Ré também, a qual, tendo alegado, rematou no essencial, com as seguintes conclusões:
a) Todos os prazos definidos no contrato de empreitada, no RJEOP e no Código Civil pressupõem a conclusão e entrega da obra.
b) Jamais começou a correr qualquer prazo de caducidade relativo aos direitos da A.
c) Não tendo havido recepção provisória da obra, nem entrega da obra, não se podia iniciar o prazo da garantia previsto no art. 1225.º do CC.
d) Á resolução do contrato aplica-se o disposto no art. 801.º do CC e a correspondente indemnização não está sujeita ao prazo do art. 1225.º do CC.
e) Foi interpretado e aplicado de forma menos acertada o disposto nos arts. 801.º, 1218.º e 1225.º do Código Civil, 198.º e 200.º do DL n.º 405/93 e na cláusula 13 do contrato de empreitada.

Contra-alegaram ambas as partes, cada uma no sentido de ser negado provimento ao recurso contrário.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Nos recursos interpostos, discute-se, essencialmente, a caducidade dos direitos invocados na acção por cada uma das partes, emergentes do contrato de empreitada.
II. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Estão provados os seguintes factos:
1. No dia 12 de Janeiro de 1998, a Autora e a Ré celebraram o contrato de empreitada de construção civil, instalações especiais e arranjos exteriores, pelo preço de 220 000 000$00, acrescido do IVA, nos termos constantes de fls. 106 a 128.
2. O objecto do contrato consistia na execução, por parte da A., de obras de construção civil e de remodelação das instalações fabris propriedade da R., sitas na Amadora.
3. Nesse contrato, no ponto 1.3., com a epígrafe “Disposições e regras de aplicação de documentos por que se rege a empreitada”, consignou-se: “1.3.1. Na execução dos trabalhos e fornecimentos abrangidos pela empreitada e na prestação de serviço que nela se incluem, observar-se-ão os seguintes documentos: 1.º O presente contrato; (…); 7.º A legislação em vigor, quando aplicável”.
4. No mesmo contrato, no ponto 1.8., subordinado à epígrafe “Regulamentos e especificações técnicas”, consignou-se: “1.8.1. Em geral, as normas e regulamentos a respeitar serão as indicadas no Projecto e neste Contrato, complementada com a legislação oficial em vigor camarária e aplicável a prestadores. 1.8.2. Em tudo o que esteja omisso no Contrato e no Projecto, aplicar-se-á o Regime Jurídico para as Empreitadas de Obras Públicas, constante do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de Dezembro de 1993 e/ou outra legislação complementar a esta”.
5. Também no mesmo contrato, no ponto 13.2, com a epígrafe “Garantias”, ficou estabelecido: “13.2.2. A garantia referida (…) tem o prazo de cinco anos a contar da data da recepção provisória da totalidade dos trabalhos a cargo do adjudicatário, nos termos do art. 1225.º do Código Civil”.
6. Estabeleceu-se ainda no contrato, no ponto 14.1., para resolverem todos os litígios, o recurso à “arbitragem, nos termos da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto”.
7. Em 18 de Agosto de 2004, as partes acordaram a convenção e regulamento da arbitragem, nos termos constantes de fls. 3 a 16.
8. Segundo o artigo 13.º do regulamento “os árbitros julgam segundo o direito constituído”.
9. Por carta registada datada de 26 de Janeiro de 1999, a R. declarou a intenção de rescisão do contrato de empreitada, nos termos de fls. 376 a 379, invocando a “não conclusão dos trabalhos no prazo contratual, acrescido de prorrogações”, o “incumprimento do plano de trabalhos” e o “não cumprimento de ordens do dono da obra e incumprimento de obrigações contratuais”.
10. No dia 5 de Fevereiro de 1999, a R. impediu a A. de aceder à obra, saindo esta então definitivamente da mesma.

2.2. Descritos os factos provados, com relevância para o conhecimento do mérito dos recursos interpostos, assim como a principal dinâmica processual, importa agora ponderar o seu objecto, delimitado pelas respectivas conclusões, e cuja questão jurídica emergente respeita, fundamentalmente, à caducidade do direito, invocado por ambas as partes, tendo como origem o contrato de empreitada, celebrado em 12 de Janeiro de 1998, no qual a A. figura como empreiteiro e a R. como dono da obra, contrato esse resolvido, por iniciativa da última, declarada por escrito, em 26 de Janeiro de 1999, com imputação do incumprimento à A.

O acórdão arbitral concluiu pela caducidade do direito da A., por aplicação do art. 226.º do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas, constante do DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro (RJEOP/93), como também pela caducidade do direito da R., por efeito do disposto no art. 1225.º do Código Civil (CC).
Desde logo, importa realçar que o acórdão em causa foi muito claro e objectivo na sua fundamentação, respondendo com total adequação, formal e substancial, às diversas questões aduzidas no âmbito da matéria da excepção arguida por cada uma das partes.
Nas alegações, porém, A. e R. repetem a argumentação jurídica já utilizada nos articulados, não trazendo algo de novo à discussão da matéria da caducidade.
Por isso, revelando-se a correcção do acórdão arbitral, à luz do direito aplicável, interessa apenas enfatizar alguns aspectos, que servirão para evidenciar o acerto da decisão impugnada.

Entre as partes, foi celebrado um contrato de empreitada, figurando a A. como empreiteiro e a R. como dono da obra.
Pela qualidade dos outorgantes, não se duvida que se trata de uma relação jurídica de direito privado.
Por efeito do princípio da autonomia privada, nos termos consagrados no art. 405.º do CC, podem as partes fixar livremente o conteúdo do contrato. Gozando amplamente da liberdade contratual, os outorgantes podem por isso escolher os termos em relação aos quais estão disponíveis a vincular-se reciprocamente.
Nessa conformação contratual, as partes podem servir-se, designadamente, de instrumentos normativos de natureza pública que se mostrem também aptos a regular os seus interesses particulares.
Foi o que sucedeu, no caso vertente, do contrato de empreitada, quando as partes remeteram para o RJEOP/93, “em tudo o que esteja omisso no contrato e no projecto” (1.8.2.), numa prática assaz frequente, resultante da regulamentação pormenorizada da empreitada de obras públicas e do seu efectivo conhecimento por partes dos empreiteiros.
Não estando em causa direitos indisponíveis, nomeadamente do empreiteiro, não se questiona a licitude de tal remissão, incluindo da caducidade (art. 330.º, n.º 1, do CC).
A discordância da A. manifesta-se, isso sim, quanto ao alcance da remissão, que, fazendo da mesma uma interpretação restritiva, exclui a caducidade, concretamente, o prazo de 132 dias, previsto no art. 226.º do RJEOP/93.
A interpretação da declaração negocial escrita, com efeito, deve obedecer às regras legais previstas nos arts. 236.º a 238.º, do CC.
Não é possível proceder, no caso, a uma interpretação subjectiva, como a consagrada no n.º 2 do art. 236.º do CC, na medida em que os autos são completamente omissos quanto à vontade real dos declarantes.
Por isso, a interpretação da declaração negocial tem de obedecer, necessariamente, à regra da interpretação objectiva contemplada no n.º 1 do art. 236.º do CC.
Neste contexto, sendo de presumir que as partes, quando negociaram e subscreveram o contrato de empreitada dos autos, actuaram com o zelo e a diligência exigíveis, que o elevado valor económico do negócio não podia dispensar, somos levar a concluir, pelos termos também usados e pelo sentido que um declaratário normal podia deduzir, que as partes quiseram consignar uma remissão genérica para o RJEOP/93.
A própria epígrafe do ponto 1.8. (“Regulamentos e especificações técnicas”) permite afirmar esse sentido mais vasto, com rejeição por isso da remissão limitada às especificações técnicas, não ganhando relevância, por outro lado, a referência feita no contrato, “a legislação em vigor, quando aplicável” (1.3.1.).
Encontrado o sentido da declaração negocial, fica afastado qualquer caso de dúvida sobre tal sentido, tornando assim dispensável a convocação da norma prevista no art. 237.º do CC.
Por outro lado, a invocação da caducidade pelo dono da obra, baseada no art. 226.º, n.º 1, do RJEOP/93, não excedendo, manifestamente, os limites impostos pelo princípio da boa fé, aplicável tanto na formação do contrato como na sua execução, não tipifica uma situação de abuso do direito, tal como este é definido no art. 334.º do CC.
Efectivamente, as negociações para a convenção e o regulamento da arbitragem, ainda que morosas, não permitem, legitimamente, supor que alguém fique salvo da invocação da caducidade. Com tais negociações, as partes apenas podem confiar, legitimamente, que o litígio envolvente seja resolvido através de um meio alternativo ao judicial. Não se afigura como razoável, em tais circunstâncias, esperar a renúncia a qualquer meio de defesa, como possa ser o da arguição da caducidade.
A argumentação da A., aliás, não deixa de suscitar alguma perplexidade, quando invocou, também, a mesma excepção peremptória da caducidade.
Neste contexto, não é possível surpreender uma clara e injusta violação do princípio da boa fé, com a arguição da caducidade ao direito pretendido fazer valer pela A.

Para além disso, também não se verificam razões suficientemente válidas para excluir a aplicação, ao caso, do disposto no art. 226.º do RJEOP/93. Desde logo, não se vislumbra um motivo relevante para considerar tal norma de natureza eminentemente pública. Tendo a mesma como destinatário o próprio empreiteiro, ao fixar-se um certo prazo, tido por razoável, para poder fazer valer, por acção, o direito emergente do contrato, tanto pode ser aplicada no âmbito de um contrato de empreitada de direito público como de direito privado, desde que, neste caso, e aproveitando a liberdade contratual, integre a respectiva regulação normativa. Sobre o conteúdo normativo do art. 226.º do RJEOP/93, que se manteve apesar da alteração legislativa no contrato de empreitada de obras públicas, veja-se JORGE ANDRADE DA SILVA, Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas, 7.ª edição, pág. 642.
Também, com o mesmo alcance, não faz qualquer sentido a distinção entre a acção judicial e a acção arbitral, não se justificando um tratamento diferenciado relativo ao prazo da caducidade.
Este prazo, por outro lado, e operando à adaptação da norma do art. 226.º do RJEOP/93, ao contrato de empreitada de direito privado, começa a correr a partir do momento em que o empreiteiro, por efeito da resolução do respectivo contrato, fica impedido de realizar, na íntegra, a sua prestação. É, nessa oportunidade, que ao empreiteiro é negado o seu direito ou a pretensão, podendo, a partir daí, fazê-los valer jurisdicionalmente.
Assim, levando em conta o momento a partir do qual a resolução do contrato se tornou eficaz e o da dedução da pretensão jurisdicional, é manifesta a caducidade.
Por sua vez, e ao contrário do defendido pela A., o art. 229.º, n.º 2, do RJEOP/93, não se aplica no caso vertente, pela simples razão das partes terem previsto, especificamente no contrato, o recurso à arbitragem, nos termos da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto (14.1.).
Ora, nos termos do art. 22.º deste diploma legal, os árbitros julgam segundo o direito constituído, a menos que as partes, sob certas condições, os autorizem a julgar segundo a equidade.
Sendo assim, e porque no caso os árbitros não foram autorizados a julgar em termos de equidade, como resulta do regulamento aprovado, que igualmente remeteu para o julgamento segundo o direito constituído, não podia o acórdão arbitral deixar de se pronunciar, nos termos dele constantes, sobre a invocada caducidade.

Alega ainda também a A. que a negociação e constituição do tribunal arbitral funciona, à luz do n.º 2 do art. 331.º do CC, como reconhecimento impeditivo da caducidade.
O facto mencionado apenas permite extrair a conclusão que as partes reconhecem a existência entre si de um litígio, que emerge do contrato de empreitada celebrado. Contudo, a existência do litígio, sem mais, não constitui qualquer reconhecimento do direito da outra parte, designadamente do direito de crédito.
Por outro lado, o reconhecimento do direito deve ser feito de forma clara, concreta e precisa, sem ambiguidades ou dúvidas, da mesma forma que uma sentença [acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de Junho de 2006 (Processo n.º 06A1450), acessível em www.dgsi.pt, PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 2.ª edição, pág. 274].
Ora, a própria alegação denuncia, por si só, a omissão do reconhecimento do direito, manifestado de forma clara, concreta e precisa, tendo até já sido decidido que a regra constante do n.º 2 do art. 331.º do CC não se aplica aos casos da empreitada [acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Maio de 1992 (Processo n.º 081983), acessível em www.dgsi.pt].
Neste contexto, não se verifica a alegada causa impeditiva da caducidade.

2.3. Passando à apreciação do recurso subordinado, está também em causa a caducidade do direito invocado, na reconvenção, pelo dono da obra.
Também nesta parte os outorgantes previram um prazo de caducidade, em favor do dono da obra, quando fixaram que “a garantia referida (…) tem o prazo de cinco anos a contar da data da recepção provisória da totalidade dos trabalhos a cargo do adjudicatário, nos termos do art. 1225.º do Código Civil” (13.2.2.).
Trata-se, com efeito, de uma remissão expressa para o disposto no art. 1225.º do CC, que, desse modo, prevalece sobre qualquer regra do RJEOP/93.
Face aos termos específicos do contrato, não pode deixar de se entender que o respectivo prazo de caducidade começa a correr a partir do momento em que a coisa passou a estar na inteira disponibilidade do dono da obra. Desde esse momento que a dona da obra fica em condições de poder exercer os direitos que lhe são facultados.
Não há razão plausível, no caso presente, para que o termo inicial do prazo da caducidade fosse diverso. Tanto importa que a obra tivesse, ou não, sido concluída, porquanto, em qualquer das situações, o dono da obra está em condições de poder exercer eficazmente os seus direitos no prazo de cinco anos.
Por contrário à segurança jurídica, seria indesejável que o prazo da caducidade, depois de recuperada a obra pelo dono, não corresse desde logo. De outro modo, podia assistir-se a uma situação de insegurança excessiva e injustificadamente prolongada no tempo.
Neste contexto, o prazo de caducidade, para o dono da obra, começou a correr a partir do momento em que a obra, ainda que incompleta, ficou na sua inteira disponibilidade.
Tendo essa circunstância ocorrido em 5 de Fevereiro de 1999 (facto n.º 10.) e vindo o direito a ser exigido em 2 de Maio de 2006 (fls. 693), é manifesta a caducidade do direito do dono da obra.
Como bem se esclarece no acórdão arbitral (fls. 3000, 3005 e 3006), a caducidade abrange todas as pretensões invocadas pela R., por provirem da mesma causa de pedir.

2.4. Em conclusão, pode retirar-se de mais relevante:
1) Na conformação de um contrato de direito privado, as partes podem servir-se de instrumentos normativos de ordem pública.
2) Sendo omissa a vontade real das partes, a interpretação da declaração negocial obedece à regra objectiva prevista no n.º 1 do art. 236.º do CC.
3) O prazo de caducidade consignado no art. 226.º do RJEOP (DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro) pode ser aplicável no âmbito da empreitada de direito privado.
4) A simples existência de um litígio não constitui o reconhecimento do direito, à luz do n.º 2 do art. 331.º do CC.
5) O prazo de caducidade do art. 1255.º do CC começa a correr a partir do momento em que a coisa passa a estar na inteira disponibilidade do dono da obra.

Nestas condições, improcedendo ambos os recursos, é caso para se confirmar o acórdão arbitral recorrido, que interpretou e aplicou correctamente o respectivo direito.
2.5. As partes, ao ficarem vencidas por decaimento, são responsáveis pelo pagamento das respectivas custas, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art. 446.º, n.º s 1 e 2, do Código de Processo Civil.
III. DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
1) Negar provimento ao recurso principal da A. e ao recurso subordinado da R., confirmando o acórdão arbitral recorrido.
2) Condenar A. e R. no pagamento das respectivas custas.

Lisboa, 25 de Outubro de 2007
(Olindo dos Santos Geraldes)
(Fátima Galante)
(Ferreira Lopes)