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VENDA JUDICIAL
ANULAÇÃO
Sumário
1 – Nos termos do artigo 908º CPC, o direito de anulação do acto da venda pode ser exercido pelo comprador, ainda que este seja o exequente ou outro credor, pelo adjudicatário, (que rigorosamente é ainda um comprador) e também pelo preferente e pelo remidor. 2 – Além do caso previsto no artigo 908º, a venda só fica sem efeito, se for anulado o acto da venda, nos termos do artigo 201º CPC, ou seja, quer por nulidade da própria venda, ou por nulidade de acto anterior de que ela dependa absolutamente. 3 – Pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens e não tendo sido sustada, quanto a estes, a execução em que a penhora tenha sido posterior, poderia ter ocorrido a anulação da venda, por actos anteriores ao respectivo acto da venda, actos esses de que ela dependia absolutamente. 4 – Tendo o Autor tido conhecimento da venda do direito em 25 de Julho de 2006, a nulidade ficou sanada, decorridos que foram dez dias sem que a mesma tivesse sido suscitada. G.F.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
Banco A demandou Banco B e outros, pretendendo que seja anulada a venda do direito através da escritura de compra e venda junta aos autos, dando-se a mesma sem efeito e ordenando-se ao exequente a devolução dos valores recebidos, nos termos do n.º 1, alínea c) do artigo 909º e n.º 1 do artigo 908º, ambos do Código de Processo Civil, por violação das supra citadas disposições legais, com o fundamento de que sobre o direito penhorado e vendido recaía já penhora anterior (registada) efectuada em acção executiva na qual era Exequente o Banco Comercial Português.
Considerando que a acção de anulação da venda apenas pode ser instaurada pelo adquirente, como resulta do disposto no artigo 908º do CPC, decidiu o Exc. mo Juiz indeferir liminarmente a presente acção, dada a ilegitimidade activa da ora demandante.
Mais acrescenta que, quanto às eventuais irregularidades ou nulidades cometidas – não efectivação do registo da penhora – é a própria Autora que alega ter tido conhecimento em Julho de 2006 de que o bem fora vendido nestes autos e que, consequentemente, o prazo para a arguição de tais nulidades – que deveria ter sido feito no próprio processo executivo de que estes autos são apenso – já se mostra ultrapassado pois deveria então ter vindo examinar ou consultar de imediato os autos, de modo a agir (artigos 201º e 153º CPC).
Inconformado, recorreu o Autor, formulando as seguintes conclusões:
1ª – O direito sobre o imóvel penhorado foi vendido sem que se tenha procedido ao seu registo na Conservatória do Registo Predial respectiva, a que estava obrigado, nos termos do artigo 862º, n.º 1 e 863º, ambos do Código de Processo Civil.
2ª – Após efectuada a penhora e nomeado fiel depositário, o direito nomeado não estava na disponibilidade do executado, não podendo ser vendido, por já estar penhorado noutro processo e na posse do referido fiel depositário, nos termos do artigo 840º do CPC.
3ª – Havendo registo de penhora mais antiga a incidir sobre o direito penhorado, deveria ter-se procedido à sustação da execução onde a penhora era mais recente, nos termos do artigo 871º do CPC, o que não foi feito, sendo os créditos reclamados no processo onde a penhora era mais antiga.
4ª – A venda do direito com penhora registada anteriormente não deveria ter sido efectuada, nos termos das supra citadas disposições legais.
5ª – Nos termos dos artigos 1º, 2º e 6º do Código de Registo Predial, o direito penhorado e registado não poderia ter sido vendido noutro processo que não aquele em que a penhora era mais antiga, por ordem de registo, o que não aconteceu.
6ª - Mais ainda quando o direito penhorado estava obrigado a registo na Conservatória do Registo Predial e estava já na posse do fiel depositário à ordem doutro Juízo, Secção e Processo, considerando-se tal venda como venda de bens alheios.
7ª – Ao não ser considerado parte legítima para propor a acção de anulação da venda, quando tinha penhora anterior, registada e em fase de venda, foram violadas as disposições legais supra referidas, nomeadamente os artigos 1º, 2º e 6º do CRP, os artigos 871º, 862º, 863º e 840º, todos do CPC e artigos 280º e 286º, ambos do Código Civil.
8ª – A nulidade é invocável a todo o tempo, por qualquer interessado, tendo a declaração da mesma efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado, não sendo reconhecidos os direitos de terceiro se a acção for proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio (artigos 289º, n.º 1 e 291º, n.º 2, ambos do Código Civil).
O Banco Santander Totta, S. A contra – alegou, defendendo a bondade da decisão recorrida.
O Exc. mo Juiz sustentou tabelarmente o despacho recorrido.
Cumpre apreciar:
2.
Com interesse para a decisão da causa, importam os seguintes factos alegados na petição inicial e na contestação:
1 º - O Banco A propôs, em Abril de 2004, acção executiva contra Manuel e outros, para lhe ser paga a quantia de 8.959.100$00, correspondentes actualmente a 44.687,80 €.
2º - A execução corre termos pela 2ª Secção da 15ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, com o n.º de Processo 471/1994.
3º - Na fase de nomeação de bens à penhora, o Banco Autor veio nomear à penhora, por seu requerimento de 20 de Novembro de 1997, o direito que em comum e sem determinação de parte ou direito a executada Amélia detinha nos prédios identificados:
a) – Rústico – Monte Velho, inscrito na matriz sob o artigo 7º, Secção EE, descrito na Conservatória do Registo Predial de Monchique sob a ficha n.º 02258, da Freguesia de Monchique;
b) – Misto – Picota, inscrito na matriz sob os artigos urbanos 889 e 2907 e rústico 38 da Secção CG, descrito na Conservatória do Registo Predial de Monchique sob a ficha 02257, da Freguesia de Monchique;
c) – Rústico – Picota, inscrito na matriz sob o artigo 36 da Secção CG, descrito na Conservatória do Registo Predial de Monchique, sob a ficha n.º 02256, da Freguesia de Monchique.
4º - No mesmo requerimento, foi requerida a notificação dos comproprietários inscritos, nos termos e para efeitos do artigo 862º do Código de Processo Civil, tendo os mesmos sido notificados da penhora do direito, em Fevereiro de 1998.
5º - O ali exequente, aqui Autora, viria a registar a penhora do direito da executada Amélia sobre os referidos bens na Conservatória do Registo Predial de Monchique pelas G-1-Ap. 02/980219, que ficou registada provisoriamente por natureza sobre todos os bens e que vieram a ser convertidas pela Ap. 01/000120.
6º - Em 17 de Janeiro de 2003, veio o Autor a ser notificado para a modalidade da Venda e o valor base dos bens, tendo sido designado os dias 20/05, 10/10, 12/11 e 12/12/2003, para venda do direito, conforme anúncios publicados.
7º - Em 25 de Julho de 2006, foi o Autor notificado, na pessoa do seu mandatário, do ofício da 2ª Vara, informando que o direito tinha sido vendido neste processo, por negociação particular, por 38.000,00 €, não constando dos autos qualquer certidão de ónus ou encargos.
8º - Em 12 de Fevereiro de 1998, o Banco B intentou contra Manuel e outra, Acção Executiva com processo ordinário, tendo por título executivo sentença proferida no processo 9574/1994 que correu os seus termos na 1ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa.
9º - A Execução tem o valor de 16.756.703$00, equivalendo a € 83.582,08.
10º - Foi nomeado à penhora na mencionada Execução o Direito e Acção, que a Executada Amélia e marido possuíam na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de José.
11º – Existiam ainda seis contitulares do referido direito, cuja notificação foi requerida nos termos do artigo 862º do Código de Processo Civil.
12º - Tendo o Banco B sido notificado de que P, uma das contitulares do direito nomeado à penhora, falecera e que os herdeiros da mesma eram os restantes contitulares, já identificados na execução, veio o Banco B requerer, em 19 de Outubro de 1998, que a requerida penhora do Direito e Acção que a Executada Amélia possuía na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de José, incidisse também sobre o Direito e Acção que a Executada Amélia possuía na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Perpétua da Conceição.
13º - O Banco B foi notificado em 28 de Maio de 1999 de que se encontrava devidamente efectuada a penhora do direito.
14º - Por requerimento datado de 8 de Julho de 1999, requereu o Banco B o prosseguimento dos autos, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 864º do Código de Processo Civil.
15º - Os anúncios para citação dos credores desconhecidos dos Executados foram publicados no Jornal “Correio da Manhã”, nas edições de 29 e 30 de Outubro de 1999.
16º - Foram apresentadas reclamações de créditos pelo Ministério Público em representação da Fazenda Nacional, a qual foi extinta por impossibilidade originária da lide.
17º - E pelo Centro Regional de Segurança Social de Lisboa e Vale do Tejo, tendo a respectiva reclamação de créditos sido rejeitada liminarmente.
18º - Em 11 de Fevereiro de 2000, requereu o Banco Santander a venda por negociação particular dos direitos penhorados.
19º - Em 19 de Fevereiro de 2002, o actual mandatário do Banco B juntou aos autos substabelecimento a seu favor.
20º - Em 17/09/2002, foi o Banco B notificado de que o perito indicado pelo Tribunal tinha avaliado o Direito e Acção, penhorados à Executada Amélia, no valor de € 44.800,00 (quarenta e quatro mil e oitocentos euros).
21º - Foi o Agravado informado, por notificação de 23/09/2004, de que o encarregado de venda do Direito e Acção penhorados tinha (apenas) uma proposta de aquisição no montante de € 38.000,00 (trinta e oito mil euros).
22º - Tendo aceite que o Direito e Acção penhorados fossem vendidos pelo referido valor.
23º - O depósito autónomo no valor de € 38.000,00 (trinta e oito mil euros) foi efectuado em 13/01/05.
24º - Cabendo ao Banco B, por liquidação do julgado, a quantia de € 28.852,18 (vinte e oito mil oitocentos e cinquenta e dois euros e dezoito cêntimos), sendo o remanescente (dos 38.000,00) destinado ao pagamento de custas.
3.
Em 5 de Dezembro de 2006, o Banco A, (ora agravante), veio intentar contra o Banco Totta e Açores, agora Banco B (ora agravado) e outros acção declarativa para anulação da venda, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 909º e do n.º 1 do artigo 908º do Código de Processo Civil, com o fundamento de que sobre o direito penhorado e vendido recaía já penhora anterior (registada) efectuada em acção executiva na qual era Exequente o Banco Comercial Português.
A acção foi liminarmente indeferida por duas ordens de razões:
1ª – A acção de anulação da venda só pode ser instaurada pelo adquirente (artigo 908º CPC), tornando-se, por isso, evidente a ilegitimidade activa do Banco A;
2ª – A terem sido cometidas eventuais irregularidades ou nulidades, as mesmas encontram-se sanadas.
Torna-se, pois, patente que as questões que importa dilucidar, consistem em saber se o Agravante tem ou não legitimidade para intentar a presente acção e, a ter havido irregularidades ou nulidades, se as mesmas se encontram sanadas.
Anote-se que às execuções em litígio se aplica o Código de Processo Civil na versão anterior à reforma introduzida pelo DL 38/2003, de 8 de Março, atento o disposto no artigo 21º deste diploma.
3.1 – DA ILEGITIMIDADE:
Dispõe o n.º 1 do artigo 908º do Código de Processo Civil que, “se, depois da venda, se reconhecer a existência de algum ónus ou limitação que não fosse tomada em consideração e que exceda os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria ou de erro sobre a coisa transmitida, por falta de conformidade com o que foi anunciado, o comprador pode pedir, no processo de execução, a anulação da venda e a indemnização a que tenha direito, (...).
O direito à anulação do acto da venda há-de ser exercido pelo comprador, ainda que este seja o exequente ou outro credor. O direito de anulação pode ser exercido, nos mesmos termos, pelo adjudicatário (artigo 875º) que, rigorosamente, é ainda um comprador. “Na expressão «comprador», estão também abrangidos o preferente e o remidor, os quais compradores são, afinal(1)”
Assim, é manifesto à luz deste artigo que a legitimidade activa para intentar acção de anulação da venda cabe apenas ao comprador/adquirente do bem vendido.
Ora, não tendo o Autor/Agravante essa qualidade é manifesta a ilegitimade activa do Banco A.
Por sua vez, a legitimidade das partes é um pressuposto processual necessário à propositura e prosseguimento da acção.
Constituindo a ilegitimidade de alguma das partes uma excepção dilatória (artigo 494º, alínea e), a lei exige que em todas as acções o juiz conheça a legitimidade das partes (artigo 495º e 510º, n.º 1). Porque de excepção dilatória se trata, a ilegitimidade obsta a que se proceda à apreciação do mérito da causa (artigo 493º, n.º 2), conduzindo à absolvição da instância (artigo 493º, n.º 2), o que significa que a acção só prossegue se ambas as partes forem consideradas legítimas.
Nesta parte, nenhuma censura merece o despacho recorrido.
3.2.
O Agravante alega, seguidamente, que sobre o direito penhorado e vendido recaía já penhora anterior (registada) efectuada em acção executiva na qual era Exequente o Banco A, pelo que, ao não ser considerado parte legítima para propor a acção de anulação da venda, quando tinha penhora anterior, registada e em fase de venda, foi praticada uma nulidade, que podia ser invocada pelo ora Agravante, enquanto parte interessada, a todo o momento.
Dispõe o artigo 909º CPC que, “além do caso previsto no artigo 908º, a venda só fica sem efeito (...), se for anulado o acto da venda, nos termos do artigo 201º CPC”.
Nesse sentido, preceitua o citado artigo 201º, n.º 1 CPC, que, “fora dos casos previstos nos artigos anteriores(2), a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”.
A anulação do acto da venda, nos termos dos artigos 201º e seguintes, pode ocorrer, quer por nulidade da própria venda (artigo 201º, n.º 1), quer por nulidade de acto anterior de que ela dependa absolutamente (artigo 201º, n.º 2).
Reportando-nos aos autos, verifica-se que o Recorrente, na fase de nomeação de bens à penhora, nomeou à penhora, por requerimento de 20 de Novembro de 1997, o direito em comum e sem determinação de parte da executada Amélia sobre os imóveis identificados na petição inicial.
Partindo deste facto, considera o Agravante que, havendo registo de penhora mais antiga a incidir sobre o direito penhorado, deveria ter-se procedido à sustação da execução onde a penhora era mais recente, nos termos do artigo 871º do CPC, o que não foi feito, sendo os créditos reclamados no processo onde a penhora era mais antiga.
E conclui que a venda do direito com penhora registada anteriormente não deveria ter sido efectuada, nos termos das supra citadas disposições legais.
Será assim?
Os bens indivisos têm a sua titularidade compartilhada, que se traduz numa quota parte.
“Havendo um património autónomo colectivo, como é o caso da herança, cada um dos contitulares tem nele um quinhão, que constitui uma fracção do todo, não concretizada sobre as coisas que o integram, e só através da ulterior operação de partilha dos bens do património é que o direito de cada um passa a incidir sobre coisas determinadas, cessando a comunhão. Já no caso da compropriedade ou da contitularidade de outro direito real de gozo, o direito de cada consorte incide sobre a própria coisa, correspondendo, porém, ainda a uma quota ideal, que só através da subsequente divisão da coisa comum se concretiza sobre partes especificadas dela, cessando a indivisão(3)”.
Daí que, “sendo a acção executiva movida apenas contra um contitular do património comum ou contra um comproprietário, decorre naturalmente da sujeição dos bens do devedor à execução a penhorabilidade, respectivamente, do quinhão ou da quota – parte do devedor executado, enquanto que da não sujeição, em regra, dos bens de terceiro à execução decorre que a penhora não pode atingir o quinhão ou a quota dos restantes contitulares. Restringida a penhora ao quinhão, ela incide, em comunhão, sobre a globalidade do património, não incidindo sobre qualquer bem ou direito nele existente nem sobre uma quota – parte dele, ainda que proporcionalmente correspondente ao quinhão. Restringida a penhora à quota – parte, também ela incide, segundo essa quota ideal, sobre a totalidade do bem indiviso e não sobre uma parte dele.
Quando, ao invés, a execução é movida contra todos os contitulares, a restrição não existe e a penhora incide sobre a totalidade do património autónomo ou do bem indiviso, que são seguidamente transmitidos ao adquirente dos bens(4)”.
Depois do artigo 826º enunciar a limitação da penhora ao quinhão do executado no património autónomo e à sua quota – parte no direito de propriedade ou outro direito real de gozo sobre coisa comum, refere-se o artigo 862º, nos seus números 1 a 3, ao modo como se efectua penhora de direitos a bens indivisos prevista no artigo 826º, interessando-nos, agora, a penhora do direito a uma quota em coisa comum.
Esta penhora consiste unicamente na notificação do facto ao administrador dos bens, se o houver, e aos contitulares com a advertência expressa de que o direito do executado fica à ordem do tribunal de execução (artigo 862º, n.º 1).
“A penhora do direito à herança indivisa como a penhora do direito à meação nos bens comuns do casal não são registáveis, por serem direitos a partes indeterminadas de bens”.
Porém, nos termos do artigo 871º do CPC, pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, é sustada, quanto a estes, aquela em que a penhora tenha sido posterior, o que não aconteceu.
Temos, assim, que poderia ter ocorrido a anulação do acto da venda, por nulidade de actos anteriores de que ela dependia absolutamente (artigo 201º, n.º 2).
Nos termos do artigo 205º, n.º 1, exceptuadas as nulidades a que se referem os artigos 193º e 199º, as demais nulidades, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o acto não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
Nos termos do artigo 153º e 201º CPC, as nulidades de que só possa conhecer-se mediante reclamação dos interessadas consideram-se sanadas, decorrido o prazo de dez dias, se não tiver havido reclamação.
Como bem refere o Exc. mo Juiz do Tribunal “a quo”, é o próprio Autor, ora Agravante, que confessa ter tido conhecimento da venda do direito em 25 de Julho de 2006.
Na verdade, o Autor junta mesmo com a acção de anulação da venda (cfr. doc. 12), a notificação remetida em 30/06/2006 no âmbito do processo n.º 9574-A/1994, a correr os seus termos pela 1ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa, onde é exequente o Banco Santander, ora Agravado, ao processo 471/1994, a correr os seus termos pela 2ª Secção da 15ª Vara Cível de Lisboa, onde é exequente o Autor, aqui Agravante, comunicando assim formalmente a venda do direito penhorado.
Ora, o mandatário do Agravante teve então conhecimento, em 25/07/2006, com a referida notificação, da venda do direito penhorado.
Donde, o aqui Agravante teve conhecimento, por intermédio do seu mandatário, desde 25/07/2006 da venda do direito penhorado.
Sabendo o Agravante, desde 25/07/2006, que havia sido vendido o direito penhorado, deveria ter consultado imediatamente os autos onde corre a Execução a que a presente acção está apensa (Processo n.º 9574-A/1994, a correr os seus termos pela 1ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa).
Assim, caso o ora Agravante chegasse à conclusão de que existiriam eventuais irregularidades e/ou nulidades cometidas, deveria de imediato ter vindo arguir a respectiva nulidade.
A alegada nulidade cometida – não sustação da execução em que a penhora é posterior - deveria ter sido invocada pelo interessado com a observância do prescrito pelo n.º 1 do artigo 203º do Código de Processo Civil, no prazo de dez dias (artigo 153º).
Não tendo actuado, senão ao vir intentar a presente acção declarativa de anulação de venda, o Autor deixou passar cerca de seis meses sem nada fazer, pelo que a alegada nulidade encontra-se sanada.
4.
Pelo exposto, negando provimento ao agravo, confirma-se a decisão recorrida.
Custas pelo agravante.
Lisboa, 25 de Outubro de 2007.
Manuel F. Granja da Fonseca
Fernando Pereira Rodrigues (vencido)
Fernanda Isabel Pereira
******** Declaração de voto:
Concederia provimento ao recurso pelas razões que sucintamente se passam a descrever:
Entendo que o Banco recorrente (BCP), com a legitimidade que lhe assistia de ter sido prejudicado com a venda judicial do imóvel referido nos autos, efectuada contra o direito constituído, instaurou a acção própria (autónoma em relação ao processo executivo) e adequada para o efeito, no tempo devido (prazo de seis meses) após o conhecimento da dita venda, apenas não invocando correctamente o direito aplicável, ao fazer apelo às disposições legais dos art.s 908º/1 e 909º/1/c) do CPC, o que no entanto não podia relevar para se indeferir liminarmente a petição.
É ponto assente que o Banco recorrente, em execução que moveu, penhorou e registou o direito dos executados sobre os imóveis aludidos nos autos e que posteriormente o Banco Santander em execução que também moveu aos mesmos executados veio a penhorar o mesmo direito, que veio a ser vendido nesta última execução, sem que esta fosse sustada para o respectivo crédito exequendo ser reclamado na primeira, ficando o Banco recorrente sem possibilidade de ver satisfeito o seu crédito.
No douto despacho recorrido defendeu-se que a acção de anulação de venda só podia ser instaurada pelo adquirente do bem ao abrigo do disposto no art. 908º do CPC, qualidade que o recorrente não detinha, pelo que era parte ilegítima. (Note-se a falta de rigor, já que o preceito não se reporta a qualquer acção, mas a simples incidente deduzido no âmbito da própria execução)
Por outro lado, entendeu-se que no mesmo despacho que as eventuais irregularidades ou nulidades cometidas na venda do bem se encontravam sanadas, face ao disposto nos art.s 909º/1/c) e 201 do CPC, por o Banco recorrente não as ter arguido no prazo de 10 dias após o seu conhecimento.
Ora, com o devido respeito, as disposições citadas não são aplicáveis à situação em apreço, porque se reportam à prática de actos no processo de execução que não podem ser levados a efeito por terceiros estranhos à mesma execução, por não terem legitimidade para intervir.
Assim, o Banco recorrente não podia dirigir-se à segunda execução onde não era parte, quer ao abrigo do art. 908º, que aliás apenas se reporta à anulação da venda a pedido do comprador, qualidade que não possuía, nem podia fazê-lo ao abrigo do art. 909º, designadamente arguindo a irregularidade da venda, precisamente por não ser parte no processo, ou seja, por ser terceiro e não estar habilitado à intervenção por meio de adequado incidente.
Mas então será legítimo perguntar se, não podendo o Recorrente pedir a anulação da venda ao abrigo dos art.s 908º e 909º do CPC e se estes parecem estipular taxativamente os casos em que a venda pode ser dada sem efeito, como é que o Banco recorrente poderá reagir contra uma venda ilegal e que o prejudica?
A resposta é encontrada no direito substantivo e não no direito processual.
Como afirma E. Lopes-Cardoso (Manual da Acção Executiva, pg. 633), “a taxatividade dos art.s 908º e 909º, não obsta a que a venda fique sem efeito, quando a lei substantiva declara a sua nulidade”. No mesmo sentido pode ver-se Anselmo de Castro (A Acção Executiva, Singular, Comum e Especial, 3.ª pg. 254).
Quer dizer, a lei processual prevê os casos em que segundo a mesma lei a venda pode ser dada sem efeito, designadamente devido a irregularidades de natureza meramente processual, mas isso não invalida que a venda, enquanto negócio jurídico, possa ser declarada sem efeito devido a nulidade que afecte tal negócio.
Ora, em meu entender, o que se verifica no caso dos autos é o de uma venda feita contra disposições legais que a impediam, já que o bem já estava anteriormente penhorado à ordem da execução movida pelo Banco recorrente e era à ordem desta execução que devia ser vendido, com as consequências daí decorrentes.
Nos termos dos art.s 280º/1 e 286º do CC é nulo o negócio jurídico contrário à lei, sendo que a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal.
Entendo, assim, que o Banco recorrente instaurou a acção própria com vista à declaração da nulidade da venda e fê-lo tempestivamente, sendo insubsistentes os fundamentos invocados para o indeferimento liminar, pelo que deveria ser aceite para prosseguir seus termos.
Note-se que, no essencial, é nesse sentido que são formuladas as conclusões do recurso, o que mostra que o Banco recorrente não tendo invocado correctamente o direito na petição vem agora fazê-lo nas alegações de recurso, com a pertinência de não se poder ignorar da razão que, em meu entender, lhe assiste.
Mandaria prosseguir a acção, pois não vejo de que outro adequado meio poderia o Recorrente lançar mão para que uma venda judicial feita contra a lei venha ser dada sem o efeito que não podia ter produzido.
________________
1 - Eurico Lopes Cardoso, Acção Executiva, 3ª Edição, 593.
2 - Inaplicáveis ao caso presente.
3 - Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume III, 371.
4 - Autor e obra citada, 372.