CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
Sumário


I- A cláusula que em contrato de adesão estipula num contrato válido por 6 anos que “ em caso de denúncia antecipada  pelo cliente, a […] terá direito a uma indemnização por danos  […] no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” é uma cláusula que impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente.
II- Uma tal cláusula inserida num contrato com alguma extensão, que foi formalizado já depois de iniciado, impunha que, antes do seu início, fosse pela ré comunicado previamente a sua inclusão no texto escrito.
III- A omissão de tal comunicação constitui violação do disposto no artigo 5.º/1, alíneas a) e b) do artigo 5.º do Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro a impor, nos termos do artigo 8.º,alínea a) do mesmo diploma, que se considere a cláusula excluída do contrato

(SC)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório

1. O. […] LDA. intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra o Condomínio do Edifício […] pedindo que o Réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 12.534,98, correspondente ao valor da cláusula de rescisão aplicada pela Autora, acrescida da quantia correspondente aos juros de mora, até efectivo e integral pagamento, sendo os vencidos, até 13.02.2004, no valor de € 1.067,36 (mil e sessenta e sete euros e trinta e seis cêntimos).

Para tanto alegou que:

- no âmbito da sua actividade comercial celebrou com o Réu, em 01.01.2002, um contrato de conservação de elevadores, tendo sempre cumprido a sua obrigação;
- sem qualquer motivo, o Réu pôs termo ao contrato, por escrito datado de 14.04.2003;
- perante a inexistência de justa causa para a rescisão do contrato, a Autora facturou a respectiva sanção contratual prevista na cláusula 5.7.4. do contrato, cujo montante reclama nestes autos;
- que o Réu, não obstante ter sido interpelado para o pagamento, nada liquidou.

2. Citado, o Réu veio contestar, alegando em síntese, que:

- a cláusula 5.7.4 do contrato é nula, porquanto não foi informado do seu teor, motivo porque a mesma deve ter-se por excluída;
- essa cláusula, também, é nula, quer por violação do artigo 21º, alínea f) do DL n.º 220/95, de 31.08, porquanto altera as regras da distribuição do risco e impõe um desequilíbrio entre as partes, quer por violação do disposto no artigo 19º, alínea c) do mesmo diploma, por consagrar uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir;
- a cláusula deve ser reduzida, nos termos do disposto no artigo 812º do Código Civil;
- a administração do prédio não teve qualquer intervenção no contrato, que foi celebrado com uma empresa que administrava o condomínio, nem na sua denúncia;
- o contrato foi denunciado porque a Autora violou os seus deveres de reparação dos elevadores, situação que durou meses, levando a que a dita empresa administradora do condomínio fizesse cessar os pagamentos da manutenção dos elevadores como forma de obrigar a Autora a cumprir o estipulado;
- a denúncia do contrato foi legítima.

3. Na contestação apresentada, o Réu requereu a intervenção acessória provocada de […] Administração de Condomínios Lda. invocando o direito de regresso.
4. A Autora respondeu, referindo que a cláusula 5.7.4. do contrato não é nula e opondo-se à intervenção requerida.
5. O chamamento foi admitido pelo despacho de fls.74/76.
6. Citado, a chamada nada disse.
7. Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixados os factos assentes e organizada a base instrutória.
8. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo-se respondido à matéria de facto quesitada por despacho de fls.127-130.
9. Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção e, consequentemente, condenou o Réu a pagar à Autora a “quantia de € 2.106,72 ( dois mil cento e seis euros e setenta e dois cêntimos ), + IVA, correspondente a 20% das prestações vincendas até ao termo do prazo do contrato firmado entre as partes, a que acrescem juros de mora vencidos e vincendos, às taxas legais supletivas sucessivamente em vigor, até efectivo e integral pagamento, contados desde a citação”.  
10. Inconformado com esta decisão, o Réu interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo, nas suas alegações de recurso, apresentado as seguintes (transcritas) conclusões:
1ª. – Resulta provado que o contrato de prestação de serviços foi assinado pelas partes em 23 e 30 de Agosto de 2002 mas teve a sua celebração efectiva em 1 de Janeiro de 2002, quando se iniciaram os seus efeitos.
2ª- Daqui decorre objectivamente que em 1 de Janeiro de 2002 não foi dado a conhecer ao recorrente as cláusulas contratuais gerais do contrato em questão, sendo irrelevante que, meses mais tarde, o contrato tenha sido assinado entre as partes com alguns dias de diferença entre cada assinatura.
3ª- Verificou-se violação do dever de informação que recai sobre a recorrida pelo que a cláusula 5.7.4 tem de ser declarada excluída do contrato.
4ª- Mas mesmo que assim se não entenda, o que não se concede, deveria a cláusula penal corresponder ao valor de três meses de facturação. Ou seja, 176,00+IVA x 3 meses, à semelhança do previsto para a recorrida caso a iniciativa da denúncia lhe pertença.
5ª. - Decidindo como decidiu violou o Tribunal recorrido o comando dos artºs. 5º, 6º e 8º do D.L. 446/85 de 25 de Outubro e art.º. 762º nº. 2 do Código Civil.
Conclui pela procedência do recurso.
11. A recorrida contra – alegou, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões:
1ª. - Como se retira da análise do contrato junto aos autos, verifica-se que, de facto, o mesmo foi assinado pelo representante do apelante em 23.08.2002, e pelo representante da apelada em 30.08.2002, considerando-se que o contrato foi celebrado com a segunda assinatura, ou seja, em 30.08.2002.
2ª. - O que sucede é que as partes voluntariamente acordaram em conferir efeitos retroactivos ao contrato, uma vez que a relação contratual já se vinha a desenvolver na prática há vários meses e a apelada já vinha a prestar os seus serviços de manutenção, tal como constam do contrato, muito antes da data de assinatura do mesmo.
3ª. - Confunde, no entanto, o apelante dois conceitos diferentes que não têm necessariamente de coincidir: a data de celebração de um contrato e a data de início de vigência e de produção de efeitos do mesmo.
4ª. - Ora, concluiu a meritíssima juiz a quo, e bem, segundo a apelada, que o facto de haver um espaço temporal entre a data de assinatura das partes implica necessariamente que o contrato foi facultado com alguns dias de antecedência ao apelante, e só posteriormente foi entregue à apelada para esta assinar também o mesmo.
5ª. - Tal facto significa que, no mínimo, o apelante teve o contrato em seu poder durante alguns dias, que o contrato não lhe foi assinado pelas partes na mesma data e que o contrato não foi entregue ao apelante para simples e mera assinatura, mas sim para que pudesse ser devidamente analisado durante algum tempo.
6ª. - Sucede, aliás, que da análise do documento e respectivas datas dele constantes, pode presumir-se, com segurança, que o contrato já se encontrava na posse da administração do apelante há largos meses e que aguardava apenas a respectiva formalização.
7ª. - Com referência à cláusula 5.7.4 e respectiva prestação de informação ao apelante pela apelada, todos os elementos constantes dos autos permitem concluir, como concluiu meritíssima juiz a quo, que este contrato não foi celebrado, como o apelante quer fazer crer, entre a apalada e um parte não esclarecida e sem oportunidade de compreender o conteúdo das cláusulas que subscreveu – muito pelo contrário.
8ª. - O apelante teve o contrato na sua posse, para análise detalhada, no mínimo, durante dias, senão mesmo meses, tendo em conta a data de início de vigência do contrato.
9ª. - Acresce que a empresa que representou o apelante, quer na data da celebração do contrato, quer na data de rescisão do mesmo – “[…]” – tem amplo conhecimento deste tipo de contratos e de todas cláusulas que dele constam.
10ª. - A linguagem dos contratos é clara e facilmente compreensível pelo comum dos destinatários, já nem se referindo novamente que a empresa que representava o apelante não se trata sequer de um destinatário comum, mas com conhecimentos específicos nesta matéria.
11ª. - Assim sendo, não ficou suficientemente provado (sendo que todos os elementos que indicam o contrário) que tenha havido qualquer omissão do dever de informação por parte da apelada e que o apelante não estivesse devidamente esclarecido do conteúdo e consequências práticas da cláusula penal.
12ª. - Não há, por fim, qualquer razão para que haja uma redução do valor peticionado pela apalada, mais gravosa do que aquela que já foi efectuada pelo tribunal de primeira instância.
13ª. - A apelada tem milhares de contratos em carteira e o apelante, com a apelada, apenas assinou um, sendo objectivo da cláusula 5.7.4 o de limitar o universo potencial de responsabilidade da apelante, caso, ao mesmo tempo, incumprisse todos os contratos, e impor às suas contrapartes uma sanção maior, de forma a evitar saídas de carteira imponderadas e injustificadas.
14ª. - Tivesse o apelante demonstrado que existiu justa causa para rescindir o contrato, e não pagaria essa factura, mas não foi o que sucedeu nos presentes autos.
15ª. - Sucede que a fórmula de cálculo encontrada pela apelada, no âmbito da referida cláusula 5.7.4, é perfeitamente justificável e explica-se da seguinte forma: em lugar de ter de alegar e provar, em cada caso, danos concretos, acorda com os seus clientes a criação dessa fórmula, que tem a grande vantagem de dar aos seus clientes a prévia noção da sanção em que incorrem se não houver justa causa para a rescisão.
16ª. - Não está em causa a reversão das prestações efectuadas, mas antes a indemnização da apelada pelos prejuízos decorrentes da não manutenção do contrato por todo o lapso de tempo previsto, correspondendo montante fixado na cláusula em causa à expectativa de lucro da apelada em caso de realização da empreitada acordada.
17ª. - Acresce que a cláusula penal não tem, apenas uma função indemnizatória, servindo apenas para ressarcir os prejuízos que, pelo incumprimento, uma das partes tenha causado à outra, mas tem também um fim cominatório, independentemente da indemnização dos danos, procurando constranger, atenta a importância das obrigações cujo cumprimento acautela, as partes a esse cumprimento, pelo que, não tem que corresponder matematicamente aos prejuízos causados pelo incumprimento.
18ª. - Ora, o apelante nada alegou em concreto quanto aos danos efectivamente sofridos que possa demonstrar a desproporção que concluiu existir.
19ª. - Não alega igualmente qualquer motivo que justifique uma redução superior àquela que já foi decidida pelo tribunal a quo, já suficientemente gravosa para a apelada.
20ª. - Como tal, não se vislumbra qualquer violação ou ilegalidade na sentença proferida, não havendo qualquer razão para a mesma ser revogada.
21ª. - Da matéria de facto considerada provada, não poderia o tribunal “a quo” ter tomado uma decisão mais favorável ao apelante daquela que tomou.
Conclui pela improcedência do recurso.
12. Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. Delimitação do objecto do recurso

Conforme resulta do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o âmbito de intervenção do tribunal ad quem é delimitado em função do teor das conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida), só sendo lícito ao tribunal de recurso apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente.
Dentro dos preditos parâmetros, emerge das conclusões da alegação recursória apresentada que o objecto do presente recurso está circunscrito às seguintes questões:
- os deveres de comunicação e de informação (artigos 5º e 6º do Decreto – Lei nº446/85, de 25 de Agosto) e a sua violação no caso dos autos;
- a cláusula penal excessiva.


III. Fundamentação

1. Discriminação dos factos dados como provados na 1ª instância:

1.1. - A Autora celebrou com o Réu o contrato de fls. 11 e 12, que aqui se dá por reproduzido, o qual é válido por seis anos, com início em 01 de Janeiro de 2002 e conclusão em 31 de Dezembro de 2007 – cf. alínea A) dos Factos Assentes.
1.2. Ficou nele estabelecido que “em caso de denúncia antecipada (do mesmo) pelo cliente, a O. […] terá direito a uma indemnização por danos ... no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” – cf. alínea B) dos Factos Assentes.
1.3. Por escrito de fls. 15, que aqui se dá por reproduzido, datado de 04 de Abril de 2003, o Réu pôs termo ao especificado contrato – cf. alínea C) dos Factos Assentes.
1.4. Após a rescisão especificada em C), o Réu pagou à Autora os débitos em atraso relativos aos serviços de manutenção contratados – cf. alínea D) dos Factos Assentes.
1.5. Em consequência do especificado em B) e C), a Autora emitiu e remeteu ao Réu a factura de fls. 17 e 18, no valor de € 12.534,98 ( doze mil quinhentos e trinta e quatro euros e noventa e oito cêntimos ), com data limite de pagamento em 05.05.2003, documento que o Réu recebeu – cf. alínea E) dos Factos Assentes.
1.6. Apesar do contrato, a Autora, a partir de certa altura, deixou de proceder à reparação dos dois elevadores do Réu – cf. resposta positiva ao quesito 4º da Base Instrutória.
1.7. Um dos elevadores ficou sem funcionar durante prazo superior a nove meses – cf. resposta ao quesito 5º da Base Instrutória.
1.8. Durante esse período, o elevador mais pequeno esteve sempre parado – cf. resposta positiva ao quesito 6º da Base Instrutória.
1.9. O elevador maior avariava algumas vezes – cf. resposta ao quesito 7º da Base Instrutória.
1.10. O Réu não sugeriu qualquer alteração ao contrato especificado – cf. resposta ao quesito 15º da Base Instrutória.

2. Apreciação do mérito da apelação.

2.1. Os deveres de comunicação e de informação (artigos 5º e 6º do Decreto – Lei nº446/85, de 25 de Agosto) e a sua violação no caso dos autos.

Prescreve o artigo 5º do Decreto – Lei nº446/85, de 25 de Outubro que:
“1. As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou aceitá-las.
2. A Comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.”
3. O ónus da provas da comunicada adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.”
E no artigo 6º do mesmo diploma refere-se que:
“1. O contraente que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
2. Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados.”

O STJ tem julgado uniformemente que o dever de comunicação existe para “possibilitar ao aderente o conhecimento antecipado da existência de cláusulas contratuais gerais que irão integrar o contrato singular, bem como o conhecimento do seu conteúdo, exigindo-lhe, para esse efeito, também a ele um comportamento diligente”

- Ac. do STJ, de 2 de Novembro de 2004, in CJ/STJ, 2004, Tomo II, pág.104 –
Almeno de Sá refere que ser “possível detectar, neste pressuposto aparentemente unitário, duas exigências analiticamente decomponíveis: a comunicação integral das cláusulas e a necessidade de proporcionar á contraparte a possibilidade de uma exigível tomada de conhecimento do respectivo conteúdo “(in Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva sobre Cláusulas Abusivas, pág.190).

Trata-se de, e ainda na fase de negociação, ou pré-contratual, comunicar quais as cláusulas a inserir no negócio mas, e também, prestar todos os esclarecimentos necessários, designadamente informando o aderente do seu significado e implicações.

Nas cláusulas contratuais gerais, por constarem de modelos pré-elaborados, a adesão faz-se na emissão da proposta e na aceitação do modelo.

Só que para uma perfeita formação da vontade negocial há que garantir ao aderente um conhecimento exacto do clausulado, com a comunicação integral, perceptível e clara, do projecto negocial.
 
Certo que, e como nota o Prof. Almeida Costa “o dever de comunicação é uma obrigação de meios: não se trata de fazer com que o aderente conheça efectivamente as cláusulas, mas apenas de desenvolver, para tanto, uma actividade razoável. Nesta linha o nº2 esclarece que o dever de comunicação varia, no modo da sua realização, e na sua antecedência, consoante a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas. Como bitola, refere-se a lei à possibilidade do conhecimento completo e efectivo das cláusulas por quem use de comum diligência. Encontra-se aqui uma afloração do critério geral de apreciação das condutas em abstracto e não em concreto.” … ” e “além de comunicar o respectivo conteúdo, informar o aderente do seu significado e as suas implicações”.
 (in Cláusulas Contratuais Gerais, pág.25).

Assim, esse dever de comunicação tem duas vertentes: por um lado, o proponente deve comunicar na íntegra à outra parte as cláusulas contratuais gerais de que se sirva (artigo 5º, nº1), por outro lado, ao efectuar essa comunicação, deve realizá-la de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência (artigo 5º, nº2).

O artigo 8º, alínea a) do citado Decreto – Lei considera excluídas as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º.

O nº3 do artigo 5º refere que o ónus da prova da comunicação cabe ao contraente que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais, podendo-se afirmar que se pretendeu que o proponente cumprisse bem esse dever.
Contudo, ao outro contraente compete invocar, em sede de alegação, que os deveres de comunicação e informação não foram cumpridos.

No caso dos autos, o Réu/Recorrente alegou que a Autora não a informou sobre o significado e conteúdo da cláusula, que se limitou a subscrever o contrato e jamais o faria se lhe tivesse sido explicado o teor da cláusula.

A Autora/Apelada referiu que foi explicado ao Réu todo o conteúdo do contrato e o Réu não sugeriu qualquer alteração.

Da audiência de discussão e julgamento resultou provado, no que concerne a esta questão, que o Réu não sugeriu qualquer alteração ao contrato especificado (ponto 1.10. dos factos provados e atrás referidos).
Na decisão sob recurso entendeu-se que não se terá verificado o incumprimento do dever de informação, porque:

- o contrato foi subscrito pelo Réu em 23.08.2002 e pela Autora em 30.08.2002, o que significaria que o contrato foi facultado ao Réu com alguns dias de antecedência e só posteriormente entregue à Autora;
- a pessoa que vinculou o Réu, foi uma pessoa colectiva vocacionada para a administração de condomínios;
- a linguagem da cláusula é simples, clara, objectiva e não suscitava qualquer dúvida interpretativa, pelo que bastava uma leitura básica para apreender o seu conteúdo.


Assim, afirma-se que presumindo-se que Réu foi diligente – como o seria qualquer homem médio colocado na mesma situação – terá lido o contrato, tomando conhecimento da referida cláusula.

Ora, importa dizer que dos factos provados não se pode concluir que a Autora deu conhecimento ao Réu das cláusulas do contrato, e competia à Autora efectuar essa prova nos termos do disposto no artigo 5º, nº3 do Decreto – Lei nº446/85, de 25 de Outubro.

Se, por um lado, se pode afirmar que a cláusula em causa é simples e clara e é facilmente apreendida por uma pessoa normal e o Réu se mostrava representado por uma entidade que está vocacionada para a administração de condomínio (cuidando, portanto, de questões como aquelas com que contactou a Autora).

Por outro lado, não se pode afirmar, como se faz na decisão sob recurso, que o facto de o contrato ter sido assinado primeiro pelo Réu e sete dias depois pela Autora era demonstrativo de que o contrato foi facultado ao Réu com alguns dias de antecedência e só posteriormente entre à Autora para que também o assinasse (pois o contrato poderia ter sido assinado nesse dia por ter sido apresentado para que o assinasse de imediato e a Autora, apesar de, desde 23/08/2002, ter o documento em seu poder só o assinou sete dias depois).

Não existe qualquer facto provado que nos permita concluir que o documento foi entregue dias antes ao da assinatura, ou que o Réu teve o documento em seu poder durante vários dias ou, pelo menos, um dia.
Relativamente à simplicidade da cláusula “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da OTIS, em caso de denúncia antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a OTIS terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” (cláusula 5.7.4. do contrato): como é manifesto a cláusula é simples, mas não se pode olvidar que essa cláusula não se mostra isolada, estando inserida num articulado com alguma extensão (cfr. documento de fls.11 a 12 vº).
 
Assim, atendendo à natureza da representante do Réu, e o próprio conteúdo do contrato, se estivesse demonstrado que, de alguma forma, esse representante do Réu teve em seu poder o documento e o pôde analisar (nem que o tivesse tido em seu poder somente por um dia, ou se a Autora tivesse tido a preocupação de afirmar que o entregou ou remeteu em data anterior ao da assinatura do contrato por parte do representante do Réu) sempre se diria que tinha sido cumpridos os deveres dos artigos 5º e 6º citados, pois se tinha possibilitado o conhecimento antecipado da existência da cláusula.

E, importa, também, ter em consideração que o contrato foi subscrito pelo Réu em 23/08/2002, mas que o mesmo teve o seu início em 1/01/2002 (como se mostra provados nos autos), isto é, a formalização do contrato, só o poderia ser se corporizasse o conjunto de regras estabelecidos entre as partes – se não seria outro contrato -, ocorreu muitos meses depois do seu início, pelo que o que se mostrava relevante, pois estamos em presença de condições em fase negocial, era que a Autora tivesse comunicado essas cláusulas antes de 1/01/2002.

Perante este facto, poderia o Réu subscrever o documento sem o ler, por confiar que estariam contidas nesse documento as regras de que se vinham regulando.

Desta forma, não tendo a Autora provado, como lhe competia, que tinha efectuado a comunicação, deve ter-se por excluída essa cláusula nos termos do disposto na alínea a) do artigo 8º do Decreto – Lei nº446/85, de 25 de Outubro.

Assim, estando excluída do contrato a cláusula invocada pela Autora para responsabilizar o Réu como peticionado, a acção terá de improceder.
 - Fica prejudicado o conhecimento da outra questão suscitada pelo Apelante, no que respeita à cláusula penal, como cláusula abusiva -.

Desta forma, a sentença sob recurso não pode manter-se.

IV. Decisão

Posto o que precede, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso e, consequentemente, revogar a sentença sob recurso, absolvendo o Réu do pedido.

Custas pela recorrida.


Lisboa, 15 de Novembro de 2007
(Processado e integralmente revisto pelo relator, que assina e rubrica as demais folhas)

(A. P. Lima Gonçalves)
(Ana Luísa Geraldes)
(António Valente)