TRIBUNAL ARBITRAL
ORDEM PÚBLICA
Sumário

I – Convencionando as partes que as questões que entre elas viessem a ter lugar seriam necessária e exclusivamente decididas por um Tribunal Arbitral e que da decisão deste não cabia recurso para outra instância, vedada lhes estava a discussão por via de recurso do mérito da decisão final dos árbitros, dispondo, todavia, da possibilidade de anulação da sentença arbitral, atentos os fundamentos previstos no art. 27 da Lei 31/86, de 29-8.
II - O fundamento de anulação constante da alínea e) do nº1 do art. 27 tem correspondência com a previsão da alínea d) do nº 1 do art. 668 do CPC, podendo ser subdividido em dois: a pronúncia indevida e a omissão de pronúncia.
III - Quando se verifique a violação de uma regra de ordem pública, ocorrerá necessariamente a nulidade directa ou derivada da sentença arbitral - nulidade directa da sentença quando seja esta o acto violador da ordem pública, quando a contrariedade com a ordem pública estiver contida na própria sentença arbitral, tendo de ser paralisados os efeitos desta por recurso aos critérios gerais de direito.
IV - Só o caso de falta absoluta de motivação gera uma situação de nulidade da sentença arbitral, de acordo com o disposto nos artigos 27º, n.º 1, al. d) e 23.º, nº 2 da Lei n.º 31/86; sempre que a motivação seja deficiente não havendo lugar a anulação, essa deficiência será susceptível de impugnação através de recurso interposto contra a sentença arbitral, se houver lugar ao mesmo.
(M.J.M.)

Texto Integral

            Acordam Na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa:

                                                                       *
            I - «M, SA» intentou a presente acção declarativa com processo ordinário para anulação de acórdão arbitral contra «S SA, Sociedade Aberta, «T, SA», «S, SA» e «W».
            Pediu a A. que seja anulado o Acórdão Arbitral de 13 de Janeiro de 2003, documentado nos autos, por violação do disposto no art. 27, nº1, alíneas d) e e) da Lei 31/86, de 29-8 e por violação da ordem pública.
            Após contestação das RR. o processo prosseguiu vindo, a final, a ser proferido saneador-sentença que julgou a acção improcedente.
            Desta decisão apelou a A., concluindo pela seguinte forma a respectiva alegação de recurso:
1.º - As ora recorridas pediram inicialmente ao Tribunal Arbitral, cumulativamente, a satisfação do direito de opção de compra das acções da recorrente no capital social da O e a sua condenação no pagamento das demais penas convencionais - cfr. fls. 61.
2.º - Posteriormente, as recorridas declararam que, caso o Tribunal Arbitral entendesse que tais direitos - de satisfação dos direito de opção de compra e das demais penas convencionais - eram alternativos, como veio a suceder, optavam pela prevalência do exercício do direito de opção de compra da participação da recorrente no capital social da O - cfr. fls. 431 e ss.
3.º - Nada impedia as recorridas de tomarem esta iniciativa, uma vez que nos termos do art. 273.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil a redução do pedido é permitida em qualquer altura do processo e sem quaisquer limites, nada obstando a que a parte condicione tal redução a um determinado entendimento que venha a ser perfilhado pelo tribunal, ao invés do que afirma o despacho saneador recorrido.
4.º - Quando as recorridas optaram apenas pelo reconhecimento do seu direito de opção de compra da participação da recorrente no capital social da O, no caso do Tribunal Arbitral entender que as sanções contempladas no acordo parassocial eram alternativas, as recorridas desistiram do pedido inicial de condenação da recorrente nas demais penas convencionais previstas naquele acordo, desistência que extinguiu o direito inicial que aquelas pretendiam fazer valer
5.º - O reconhecimento do direito das recorridas de ver aplicadas as sanções contempladas no Acordo Parassocial apenas poderia ter lugar no caso do Tribunal Arbitral considerar os pedidos das recorridas cumulativos.
6.º - Ao reconhecer, ainda que de forma alternativa, o direito das recorridas ou à opção de compra da participação da recorrente no capital social da O ou à Cláusula Penal estabelecida no Acordo Parassocial e ao condenar a recorrente conforme a escolha que vier a ser feita pelas recorridas, o Acórdão Arbitral tomou conhecimento de questões que não podia tomar.
7.º - Ainda que se entenda que não houve desistência do pedido pelas recorridas, sempre haveria excesso de pronúncia, porquanto a condenação da recorrente no pagamento da cláusula penal dependeria da verificação de uma condição (o Tribunal entender que as sanções em causa eram cumulativas) que o Tribunal Arbitral nunca deu como verificada.
8.º - Resulta com indubitável clareza da sequência de actos processuais que tiveram lugar na acção arbitral que o objecto desta traçado pelas AA. (ora recorridas) na acção arbitral se modificou no decurso desta acção, exprimindo as AA. no requerimento de fls. 430-433 a sua vontade inequívoca no sentido de, caso o tribunal viesse a considerar não serem as suas pretensões cumulativas, mas alternativas, escolherem a prestação alternativa, assim redefinindo os contornos do objecto da acção arbitral.
9.º - E resulta também com indubitável clareza do Acórdão Arbitral, que este assim perspectivou aquele requerimento de fls. 430 a 433 em que as ali AA. procediam à escolha da prestação alternativa, qualificando-o em termos jurídico-processuais como uma redução do pedido em face do que estabelecem os arts. 272.º e 273.º do CPC.
10.º - Desta perspectiva deveria resultar, como necessária consequência, que considerando, como considerou, a alternatividade das sanções previstas no Acordo Parassocial, o Acórdão Arbitral condenasse a R. da acção arbitral (a ora recorrente) apenas a vender às ali AA. as acções da O acima indicadas pelo seu valor à data em que a opção de compra for exercida, não lhes conferindo, mais uma vez, o direito de escolher o que já haviam claramente escolhido.
11.º - Não o tendo feito, o tribunal arbitral ocupou-se de uma questão que, a partir do momento em que as ali AA. (ora recorridas) expressaram no processo a sua vontade no sentido da escolha da prestação alternativa, estava subtraída ao seu poder de cognição, proferindo uma pronúncia indevida, pelo que é patente a sua nulidade de acordo com o que estabelece o art. 27.º, n.º 1, al. e) da Lei Arbitral.
12.º - Não pode assim a recorrente sufragar o entendimento do Saneador Sentença de que não se verifica pronúncia indevida, entendimento que, salvo o devido respeito, abstrai da declaração de vontade expressa pelas AA. (ora recorridas) do processo arbitral no seu decurso, colide com a qualificação jurídica dessa declaração de vontade efectuada pelo próprio Acórdão Arbitral e contraria frontalmente o Princípio do Dispositivo consagrado nos arts. 3.º, 264.º, n.º1, 660.º, n.º 2 e 664.º, segunda parte do CPC, que no âmbito do processo arbitral tem um especial campo de incidência.
13.º - No momento em que as AA. da acção arbitral formularam claramente (já depois de se ter realizado o julgamento da matéria de facto), a sua opção pela compra em prejuízo da indemnização pecuniária, caso o tribunal arbitral entendesse que as identificadas sanções eram de aplicação alternativa, aquelas estavam perfeitamente conscientes de que existia uma forte probabilidade de obter vencimento a tese da alternatividade das sanções previstas no Acordo Parassocial.
14.º - Não é pelo facto de a qualificação jurídica do comportamento assumido pelas ora recorridas como redução do pedido, ter sido feita no intitulado “Relatório” do Acórdão Arbitral que a mesma deixa de ser decisiva ou vinculativa, como também se refere no Saneador Sentença recorrido.
15.º - É compreensível que o acórdão arbitral tenha referenciado o dito requerimento e o tenha qualificado juridicamente como uma redução do pedido nos termos do disposto no art. 273.º do Cód. Proc. Civil antes de avançar para a fundamentação de facto e de direito que lhe competia fazer, já que se tratava de uma questão prévia essencial à delimitação dos contornos do objecto do pleito.
16.º - Quando o tribunal arbitral qualificou aquela declaração de vontade constante de fls. 430 a 433 como uma redução do pedido, invocando e aplicando os pertinentes preceitos da lei de processo civil, proferiu uma evidente qualificação de natureza jurídico-processual que naturalmente condicionava o ulterior raciocínio decisório do acórdão e que não podia ser sindicada pelo saneador-sentença recorrido.
17.º - Apesar de o Saneador Sentença recorrido admitir que o objecto da pretensão das AA. da acção arbitral se encontrava delimitado pelo pedido formulado na petição inicial, mas “com a explicação, concretização ou explicitação constante do requerimento de fls. 430 a 433 destes autos”, não confere o mesmo Saneador Sentença a esta “explicação, concretização ou explicitação” constante do requerimento de fls. 430 a 433 qualquer efeito delimitador do objecto do litígio.
18.º - Não podia pois o Acórdão Arbitral, atenta a extinção do direito à cláusula penal indemnizatória resultante da verificação da condição a que foi submetida a redução do pedido, reequacionar a questão da preferência das AA. por uma das sanções e condenar a R. segundo uma nova escolha que as AA. ulteriormente viessem a fazer.
19.º - O Acórdão Arbitral, ao considerar que as sanções previstas no Acordo Parassocial (cláusula penal indemnizatória e direito de opção na compra das acções) são alternativas, tornou verificada a condição a que as AA. da acção arbitral submeteram a sua desistência parcial do pedido,
20.º - Mas, ao condenar a ali R. segundo a escolha que posteriormente viesse a ser feita pelas ali AA., reconheceu-lhes afinal um direito que, por força da redução do pedido que anteriormente considerara efectuada, se encontrava então extinto, assim excedendo os seus poderes cognitivos e decisórios.
21.º - Nesta medida, o Acórdão Arbitral ocupou-se de questão de que não podia já tomar conhecimento, o que acarreta a sua nulidade nos termos da alínea e) do nº 1 do artº 27º da Lei nº 31/86.
CONTRARIEDADE À ORDEM PÚBLICA
22.º- A "sanção" estipulada Cláusula 16.4 do Acordo Parassocial não tem intuito "compulsório" nem carácter de "pena", mas tão só - e para os casos de incumprimento definitivo (tal como nela definido) de uma das obrigações nela previstas por uma das Partes no Acordo Parassocial - a determinação, com liquidação forfaitaire, do montante da indemnização exigível pelas Partes não faltosas;
23.º- Não há controvérsia, sendo aceite pelas partes e pelo Acórdão Arbitral, quanto à natureza puramente indemnizatória da cláusula penal convencionada em 16.4 do Acordo Parassocial;
24.º- Ficou provado no processo arbitral - cfr. resposta ao referido quesito 6º - que não resultaram para as ora recorridas quaisquer danos da mora - considerada incumprimento definitivo pelo Acórdão Arbitral - em que incorreu a ora recorrente ao não ter efectuado a prestação acessória que deveria efectuar até 28 de Dezembro de 1998 (mas que efectuou cerca de um mês depois, assim cumprindo a sua obrigação principal);
25.º- Como refere Pinto Monteiro, "...se as partes tiverem estipulado a cláusula penal a fim de fixarem antecipadamente o montante da indemnização, sem qualquer especial intuito compulsório, embora o credor, para exigir a pena, não careça de provar qualquer dano ou valor do mesmo - a indemnização coincide com a soma pré-fixada -, o devedor não está impedido de provar, contudo, a inexistência de um qualquer prejuízo, o que afastará o direito do credor;
26.º- É deste modo evidente que o Acórdão Arbitral ao condenar a ora recorrente no pagamento da Cláusula Penal, mesmo que reduzida a metade do seu valor, imputou efectivamente uma responsabilidade sem dano e violou normas imperativas e princípios da Ordem Pública, designadamente o disposto nos mencionados artigos 798º, 483º e 811ºnºs 1 e 3 do Código Civil, pelo que é nulo;
27.º-Assim não o entendendo, o Saneador Sentença recorrido, violou, por erro de interpretação e aplicação, este preceitos legais e aqueles princípios de Ordem Pública, falecendo, consequentemente, os argumentos em que se estribou para o efeito da posição nele sustentada, pelo que deve ser revogado.
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
28.º - No Acórdão Arbitral apenas são enunciados os fundamentos por que a Cláusula Penal do Acordo Parassocial foi considerada excessiva pelos árbitros.
29.º - Mas já quanto à fixação da indemnização no valor de Esc. 470.000$00 acrescido de juros, nada se diz no Acórdão Arbitral, de modo algum pode considerar-se fundamentada, em concreto, a inerente decisão, pois que nada é dito a tal propósito na fundamentação da decisão arbitral.
30.º - Lendo o Acórdão, a recorrente não encontra qualquer fundamentação, ainda que deficiente ou errada (caso em que o Acórdão não seria nulo, apenas se podendo atacar esse insuficiente, ou errado juízo, pela via recursória), que a elucide das razões que levaram o tribunal arbitral a considerar adequado aquele valor em concreto para a cláusula penal, em momento algum se ponderando os elementos necessários para fundamentar o inerente juízo de equidade.
31.º - A equidade é um juízo de Justiça do caso concreto e, como tal, tem que ser fundamentado, através da exposição das razões pelas quais a decisão em causa prossegue a almejada Justiça do caso concreto.
32.º - Para o juízo de equidade pressuposto na norma do art. 812.º do CC devem especificamente ponderar-se, além de outros factores que o julgador julgue relevantes: o interesse legítimo do credor na prestação e não apenas o seu interesse patrimonial, o grau de culpa do devedor, a situação patrimonial do devedor.
33.º - Nenhum destes factores, nem outros relevantes, o Acórdão ponderou, para fixar o concreto valor indemnizatório que alcançou, sendo certo que se apuraram no processo factos com inequívoco relevo nesta matéria, designadamente quanto à culpa do devedor, quanto à boa fé na execução dos contratos, quer do credor, quer do devedor e, essencialmente, quanto à inexistência de dano a ressarcir.
34.º - Com efeito, e em primeiro lugar, é indiscutivelmente de suma relevância para estes efeitos no caso “sub judice” o facto dado como provado no processo arbitral de que o atraso da ora recorrente nenhum dano provocou às outras partes no Acordo Parassocial, ou seja, às ora recorridas (resposta ao quesito 6.º da Base Instrutória).
35.º - Em segundo lugar, dos factos dados como provados no Acórdão Arbitral constantes das als. AB), AC) e AD) da Lista dos Factos Assentes [Especificação] - fls. 537 e 538) - resulta que a ora recorrente, para poder cumprir atempadamente as obrigações acessórias à O, pediu para dar em penhor acções à Banca, o que a O dificultou e uma das ora recorridas (contraparte no Acordo Parassocial) inviabilizou, factos este que o Acórdão deveria ter apreciado estes factos para fundar o montante da indemnização, ponderando a culpa e a boa fé das partes na execução dos contratos.
36.º - Em terceiro lugar, para além do relevo que têm os factos ora descritos, deve notar-se que outros factos se provaram na acção arbitral que deveriam ser ponderados na fundamentação da fixação da indemnização por serem manifestamente relevantes para um juízo de equidade e que, não só não foram efectivamente ponderados pelos árbitros, como, ainda, o texto do Acórdão dificulta a percepção deste vício pois que o elenco de factos dados como provados no Acórdão Arbitral, não constitui um relato fidedigno da decisão proferida pelo Tribunal Arbitral em sede de matéria de facto após o julgamento efectuado (como se verifica das respostas aos quesitos 11.º e 12.º e da errónea transcrição que das mesmas é efectuada no Acórdão Arbitral).
37.º - Não tendo havido qualquer fundamentação desta decisão, continua a recorrente sem saber porque é que, de acordo com a equidade, é condenada a pagar a quantia de 470 mil contos mais juros de mora contados desde 13 de Janeiro de 1999 sem ter causado dano.
38.º - O Tribunal Arbitral não invocou nenhum dos critérios que devem sempre estar presentes na fixação de uma indemnização por equidade, não aludiu a nenhum dos factos provados na acção susceptíveis de integrar os factores a ponderar para aquela fixação e limitou-se a, depois de adiantar as razões porque considerava excessiva a cláusula penal indemnizatória convencionada, fixar um valor sem adiantar quaisquer razões susceptíveis de levar os destinatários da sua decisão a compreender por que razão com a mesma se alcançava a Justiça do caso concreto.
39.º - A recorrente ficou efectivamente sem conhecer quais as razões que o tribunal arbitral ponderou e quais os juízos de equidade a que procedeu para considerar que com este valor indemnizatório alcançaria a efectivação da Justiça do caso concreto, pelo que existe uma total ausência de fundamentação.
40.º - Quanto a esta decisão que fixa o quantum da cláusula penal indemnizatória - e que tem uma óbvia autonomia - o Acórdão Arbitral constitui uma verdadeira “conclusão sem premissas”, padecendo de falta de fundamentação o que, nos termos do disposto nos referidos arts. 27.º, n.º 1, al. d) e  23.º, n.º 3 da Lei n.º 31/86 acarreta a nulidade do julgado. 
41.º - Ao julgar improcedente a presente acção de anulação o Saneador Sentença violou, assim, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos mesmos arts. 27.º, n.º 1, als. d) e e) e 23.º, n.º 3 da Lei n.º 31/86, com referência às demais disposições legais antes citadas com que devia conformar a sua decisão, pelo que deve ser revogado.
            As RR. contra alegaram nos termos de fls. 1411 e seguintes.
                                                                       *
            II - O Tribunal de 1ª instância considerou os seguintes factos:
1)         Em 31 de Agosto de 2000 as rés demandaram, em acção arbitral, a ora autora tendo, para tanto, apresentado a petição inicial e os documentos que a acompanhavam, cuja cópia se encontra de fls. 34 a 212 dos presentes autos;
2)         Na acção referida em 1) foi invocado pelas rés, como fundamento dos pedidos que formularam, a violação, pela ora autora, de um «Acordo Parassocial» - a que aquelas e esta, na qualidade de accionistas e detentoras da totalidade do capital da sociedade O, S.A. (doravante, O), originariamente denominada M, S.A., se encontravam vinculadas por contrato celebrado em 1 de Setembro de 1997, do qual se encontra cópia de fls. 100 a 153 dos presentes autos;
3)         As rés, autoras na acção referida em 1), pediam nessa acção, que o Tribunal Arbitral declarasse:
 «(...) i) que a M incorreu em incumprimento definitivo perante as AA., nos termos e para os efeitos do art. n° 4, do ACORDO PARASSOCIAL, da obrigação de realização tempestiva da prestação pecuniária acessória por ela devida à O, no montante de 470.000.000$00, e que, em consequência, esse incumprimento a constituiu na obrigação de pagamento às signatárias de uma penalidade equivalente ao dobro dessa prestação;
ii) que a M, ao não pagar a sobredita penalidade no prazo que para o efeito lhe foi concedido pelas AA., se sujeitou às consequências previstas no art. 16.º, n.° 5, do ACORDO PARASSOCIAL, tendo as AA. adquirido consequentemente o direito de exercerem uma opção de compra sobre as acções O na titularidade daquela;
iii) que as AA. exerceram validamente essa opção de compra,
Em consequência deve:
i) a M ser condenada a pagar às AA., na proporção dos direitos de voto por estas detidos no capital social da O, uma indemnização no montante de 940.000.000$00, acrescida de juros à taxa legal desde o momento da constituição em mora;
ii) O Tribunal substituir-se à M, declarando as acções detidas pela M no capital social da O transmitidas às AA., nas proporções constantes da interpelação de exercício da opção, contra o depósito de 70% do valor nominal dessas acções ou, subsidiariamente, contra o depósito de (i) 70% do valor nominal das acções detidas pela M até ao último aumento de capital e do (ii) valor de subscrição das acções resultantes do exercício dos direitos de subscrição no último aumento de capital da O. Ou,
iii) a transmitir para as AA., na proporção dos direitos de voto por estas detidos no capital social da O, as acções que detém no capital dessa SOCIEDADE, contra o pagamento de 70% do valor nominal dessas acções ou, subsidiariamente de (i) 70% da acções detidas pela M até ao último aumento de capital e do (ii) valor de subscrição das acções resultantes do exercício dos direitos de subscrição no último aumento de capital da O (...)”);
4)         A autora, ré na acção referida em 1), deduziu contestação e reconvenção, nos termos e com os fundamentos que constam do documento que se encontra de fls. 213 a 284 dos autos, alegando, nomeadamente, que a opção de compra instituída pela cláusula 16.5 era alternativa ao recebimento de quantia que à Parte não faltosa couber a título de penalidade, pelo que os pedidos das aí autoras - de satisfação do direito de opção de compra das acções e das demais penas convencionais - não eram cumuláveis devendo, em consequência, as aí autoras esclarecer qual deles preferiam, caso algum deles viesse a ser considerado aplicável;
5)         A autora, ré na acção referida em 1), apresentou nessa acção as alegações de Direito que constam do documento cuja cópia se encontra de fls. 285 a 429 dos autos, sustentando, nomeadamente, que o direito de opção de compra que a Cláusula 16.5 do Acordo Parassocial instituía a título de sanção não era cumulável, ao contrário do que as RR. advogavam, com outras penalidades de carácter pecuniário previstas na referida cláusula e na Cláusula anterior do mesmo acordo;
6) Na sequência do referido em 5), as rés apresentaram na acção referida em 1) o requerimento que consta, sob cópia, de fls. 430 a 433 dos autos, dele constando, designadamente, o seguinte: «(…) Em resposta ao alegado nos artigos 306. e 307. e na alínea ww) das conclusões constantes das alegações de direito apresentadas pela R., não se concedendo relativamente à aplicação cumulativa (i) da obrigação da R. de pagamento da sanção penal prevista na Cláusula 16.4 do ACORDO PARASSOCIAL no valor de ESC. 940.000.000$00 e (ii) do direito das AA. de exercício da opção de compra nos termos e condições estipuladas na Cláusula 16.5. do ACORDO PARASSOCIAL, vêm pelo presente as AA. explicitar que, caso o Tribunal entenda que as AA. apenas terão direito a uma indemnização no montante de ESC. 940.000.000$00 ou apenas terão direito ao exercício da opção de compra, o que apenas por extrema cautela de patrocínio se pondera, mantêm as AA. a posição de que deve ser dada preferência ao exercício pelas AA. do direito de opção de compra das acções detidas pela R. no capital social da O nos termos melhor explicitados nos pontos ii) e iii) do pedido formulado na p.i. (...)»;
7)         No âmbito da acção referida em 1) foi proferido, com data de 13 de Janeiro de 2003, o Acórdão Arbitral cuja cópia se encontra de fls. 434 a 516 dos presentes autos;
8)         No relatório do Acórdão Arbitral referido em 7), no ponto 9, com o título «Alegações finais das Partes», a fls. 21 do mesmo, refere-se, designadamente, o seguinte:
«(…) Na sequência desta interpretação do acordo parassocial defendida pela R., as AA. vieram, de imediato, apresentar a sua resposta, esclarecendo que mantêm o entendimento de que as sanções em causa, designadamente o direito à indemnização pecuniária prevista na cláusula 16.4 do acordo e o direito de opção instituído pela cláusula 16.5, podem ser exercidos, cumulativa e sucessivamente, pela Parte ou Partes não faltosas contra a Parte ou Partes faltosas, mas que, "caso o Tribunal entenda que tais direitos são alternativos, mantêm as AA. a posição desde sempre sufragada no sentido da prevalência do exercício do direito de opção de compra da participação da R. no capital social da O. No fundo, as AA. vieram dizer, fazendo-o embora sob condição (isto é, sob a condição de o Tribunal entender que as sanções em causa são alternativas), que reduzem o seu pedido ao reconhecimento do direito de opção de compra. Nada as impedia de tomarem esta iniciativa, pois a redução do pedido é permitida em qualquer altura (art. 273°, n° 2, do Cód. de Proc. Civil), importando ainda sublinhar que, no caso sub iudice, não há, quanto a este ponto, divergência entre os litigantes, o que permite aplicar também a regra do art. 272° do mesmo diploma legal, onde se estabelece que, havendo acordo das partes, o pedido e a causa de pedir podem ser sempre alterados, em 1ª ou 2ª instância, salvo se a alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão e julgamento do pleito (...)»;
8) No Acórdão Arbitral referido em 7) chamado a decidir, entre outras coisas, sobre o problema da aplicação cumulativa ou alternativa das sanções previstas nas cláusulas 16.4 e 16.5 do Acordo Parassocial e tendo este dado por assente que a A. incorreu, perante os demais accionistas da O em incumprimento, decidiu, em síntese, que:
«i) Ao incumprimento definitivo da A. eram aplicáveis as Cláusulas 16.4 e 16.5 do Acordo Parassocial cujos pressupostos de aplicação eram diferentes;
ii) A atribuição às partes não faltosas, pelo Acordo Parassocial, de um direito de opção de compra das acções pertencentes à parte faltosa era uma sanção muito pesada, pois afastava ou excluía da sociedade o accionista em incumprimento definitivo;
iii) A cumulação desta sanção com outras não tinha justificação plausível por ser pouco razoável que um sócio, além de ser compulsivamente afastado da sociedade, recebendo pela "expropriação" da sua participação societária um valor inferior ao valor real, tivesse ainda de pagar uma avultada indemnização às partes não faltosas;
iv) A interpretação que melhor se coadunava com a letra da cláusula 16.5 era a de que a alternativa, em matéria de sanções, para o caso de incumprimento definitivo de qualquer das obrigações, era entre a opção de compra das acções da O pertencentes ao accionista incumpridor e as sanções pecuniárias previstas nas Cláusulas 16.4 e 16.5.; e
v) A tese da alternatividade das sanções era a que conferia maior equilíbrio - ou menor desequilíbrio - ao regime convencionado no Acordo Parassocial até porque, na dúvida, deve sempre optar-se, na interpretação de um contrato oneroso, pelo sentido que conduza ao maior equilíbrio dos direitos e deveres contrapostos das Partes;
9)         Relativamente à apreciação das penalidades estabelecidas no Acordo Parassocial, com vista a decidir se estes deviam ou não ser reduzidas, as mesmas foram consideradas pelo Tribunal Arbitral como manifestamente excessivas entendendo que deveriam, nos termos do art. 812.°, n.° 1, do Código Civil, aplicável directamente ou por analogia, ser reduzidas de acordo com a equidade;
10) De fls. 71 a 74 do Acórdão Arbitral consta, designadamente, o seguinte:
«(...) Das várias penalidades ou sanções estabelecidas no acordo parassocial, porém, apenas interessa proceder à redução da que se consagra na cláusula 16.4 e da que permite exercer uma opção de compra, por setenta por cento do respectivo valor nominal, sobre as acções da O pertencentes à parte faltosa, pois as AA. não pediram que à R. fossem aplicadas, como consequência do não cumprimento em que incorreu, outras sanções punitivas.
Pelo que respeita à primeira sanção, que impõe à R. a obrigação de pagar às AA., a título de cláusula penal, o dobro da prestação acessória de 470.000 contos que devia ter realizado até 28 de Dezembro de 1998, tomando principalmente em consideração que a R. acabou por pagar, embora com atraso, aquela prestação, e ponderando, ainda, que o atraso da M nenhum prejuízo causou às demais partes do acordo parassocial, e que nenhuns danos causou também à O, para além da perda dos juros que poderia ter obtido através do depósito bancário do montante da prestação acessória, o Tribunal reduz o quantitativo da cláusula penal para metade, isto é, para 470.000 contos, acrescidos dos juros legais moratórias para créditos de empresas comerciais, desde 13 de Janeiro de 1999, isto é, desde o dia seguinte àquele em que a R. incorreu, quanto à obrigação que assumiu no acordo parassocial, de realizar pontualmente a mencionada prestação acessória, em incumprimento definitivo.
Pelo que respeita ao direito de opção de compra das acções da O pertencentes à M, tomando em linha de conta o que, sobre o valor da O (com base no qual se pode determinar, em termos aproximados, o valor das acções desta sociedade, detidas pela R.) se provou na resposta ao quesito 8°, o Tribunal entende que, se a opção de compra fosse permitida, nos termos da cláusula 16.5, por setenta por cento do valor nominal dos títulos, a sua aquisição coerciva traduzir-se-ia numa penalidade manifestamente excessiva ou exorbitante.
A redução ou moderação desta penalidade poderia, em princípio, operar-se tomando como base para a opção de compra o valor real das acções e permitindo que a compra se fizesse por certa percentagem desse valor. Se as acções, por exemplo, valessem 2 milhões de contos e se permitisse a opção por setenta por cento deste valor, a penalidade seria de 600.000 contos.
Como, porém, se não conseguiu apurar, de modo certo, o valor real dos títulos, é aleatório permitir a opção de compra por certa percentagem desse valor. Se se adoptasse este critério, a perda patrimonial sofrida pela M, em consequência da opção de compra, variaria em função do valor que viesse a ser atribuído às acções e tanto poderia traduzir-se numa sanção razoável, como numa sanção manifestamente excessiva...
Estabelecendo o acordo parassocial, na cláusula 16.5, conforme se concluiu já, sanções alternativas para a mesma infracção, deve entender-se que os subscritores do acordo tiveram em vista sanções de valor equivalente. Com efeito, se as sanções fossem de valor desigual, a alternatividade prevista e querida pelas partes seria apenas formal ou aparente, pois a escolha de uma das sanções, pela parte ou partes não faltosas, recairia sempre, obviamente, naquela que fosse mais pesada para o infractor e, correspectivamente, mais vantajosa para o contratante ou contratantes que dela beneficiassem...
Para que as duas penalidades estabelecidas em alternativa – pagamento de 470.000 contos e respectivos juros moratórios, nos termos da redução já operada pelo Tribunal, ou sujeição da R. à opção de compra, exercida pela AA., das acções que detiver no capital da O – se traduzam em sanções economicamente equivalentes, de tal modo que a escolha de uma ou da outra causará à M uma perda patrimonial sensivelmente idêntica, a solução mais adequada será a de permitir a opção de compra pelo valor real das acções pertencentes à M, mas deduzindo ao preço assim apurado uma importância igual à da cláusula pecuniária alternativa (470.000 contos acrescidos dos juros legais moratórios que forem devidos pela M).
Fixando, pela via da respectiva redução, as duas penalidades alternativas nos termos que acabam de referir-se, o resultado será o de que, quer as AA. optem pelo pagamento da importância de 470.000 contos (acrescida dos juros legais moratórios), quer optem pela compra das acções, pelo seu valor real menos a importância de 470.000 contos (acrescida igualmente dos juros legais moratórios), a sanção que a M sofrerá será, em termos económicos, sensivelmente idêntica: em qualquer dos casos, ela suportará uma diminuição patrimonial de 470.000 contos, mais os juros legais desta importância contados desde 13 de Janeiro de 1999, até à data do cumprimento da sentença (...)»;
11) No Acórdão Arbitral referido consta, sob a epígrafe «DECISÃO», designadamente, o seguinte:
«Tudo ponderado e com base nas razões anteriormente expostas, o Tribunal decide o seguinte:
a) Reconhece às Autoras, na proporção dos direitos de voto correspondentes às participações no capital social da O (...), o direito ao pagamento pela Ré, a título de cláusula penal, da quantia, em Euros, correspondente a 470.000 contos (acrescidos dos juros legais moratórios relativos a créditos de empresas comerciais, contados desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do pagamento), ou, em alternativa, e na mesma proporção, o direito de opção de compra das acções da O pertencentes à M na presente data, acrescidas das que, em virtude da respectiva titularidade, a M porventura venha a adquirir em aumentos de capital da O, pelo seu valor real à data do exercício dessa opção, menos a importância, em Euros, correspondente a 470.000 contos (acrescida igualmente de juros legais moratórios desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do exercício da opção);
b) Condena a Ré, conforme a escolha que vier a ser feita pelas Autoras, a pagar a estas, na proporção atrás referida, a importância de 470.000 contos (acrescidos de juros legais moratórios desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do pagamento), ou a vender-lhes as acções da O acima indicadas, pelo seu valor real à data em que a opção de compra for exercida, diminuído da importância, em Euros, correspondente a 470.000 contos, mais os juros legais moratórios desta importância relativos ao período compreendido entre 13 de Janeiro de 1999 e a data do exercício da opção de compra;
c) Julga improcedentes os pedidos reconvencionais deduzidos pela Ré (...)».
                                                                       *
            III - Face ao teor das conclusões das alegações da apelante - conclusões que definem o objecto do recurso, consoante decorre dos arts. 684, nº 3 e 690, nº 1 do CPC – verificamos que as questões que se colocam nos presentes autos são as seguintes:
- se atentas a opção manifestada nos autos pelas apeladas no que concerne à alternativa valor correspondente à cláusula penal/opção de compra das acções e a condenação proferida pelo Tribunal Arbitral este conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento;
- se o acórdão arbitral ao condenar a apelante no pagamento da quantia prevista como cláusula penal no Acordo Parassocial, embora reduzida a metade do seu valor (ou seja, 470.000 contos), consoante escolha a ser feita pelas apeladas e em alternativa à venda das acções, violou princípios de ordem pública;
- se o acórdão arbitral padece do vício de falta de fundamentação.
                                                                       *
            IV – 1 - As partes convencionaram na cl. 18ª do Acordo Parassocial entre elas celebrado – documentado a fls. 100 e seguintes – que as questões que entre elas viessem a ter lugar seriam necessária e exclusivamente decididas por um Tribunal Arbitral e que da decisão deste não cabia recurso para outra instância.
            Vedada lhes está, pois, a discussão por via de recurso do mérito da decisão final dos árbitros, dispondo, todavia, da possibilidade de anulação da sentença arbitral, atentos os fundamentos previstos no art. 27 da Lei 31/86, de 29-8, que os enumera de forma taxativa ([1]).
            Efectivamente, prescreve-se no mencionado art. 27, nº 1, alíneas, d) e e): «A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal judicial por algum dos seguintes fundamentos: …
d) Ter havido violação do art. 23, nºs 1, alínea f), 2 e 3;
e) Ter o tribunal conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento, ou ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar».
Atentemos, antes de mais, ao fundamento enunciado nesta alínea ultimamente referida.
O fundamento de anulação constante da alínea e) do nº1 do art. 27 tem correspondência com a previsão da alínea d) do nº 1 do art. 668 do CPC, podendo, na realidade, ser subdividido em dois: a pronúncia indevida e a omissão de pronúncia. É no âmbito daquela primeira possibilidade que nos situamos, uma vez que é a situação relativa que a apelante defende verificar-se.
No regime previsto no CPC, atento o nº 2 do seu art. 660, na sentença, devendo o juiz resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. É em conformidade que o nº 1 – d) do art. 668 do CPC, dispõe ser nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de excepções na exclusiva disponibilidade das partes é nula a sentença em que o faça; se o juiz conheceu de questão que nenhuma das partes lhe submeteu, procedendo assim apesar de nem a lei processual nem a lei substantiva lhe permitirem o poder de apreciação oficiosa, cometeu aquela nulidade, exercendo actividade exorbitante ou excessiva. Quando o art. 660 diz que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação e só essas o seu alcance reconduz-se a dever a sentença incidir sobre tudo o que for pedido e só sobre isso, sendo que para caracterizar e limitar as questões postas pelas partes – aqui, fundamentalmente, numa perspectiva das questões colocadas pelo autor - além dos pedidos propriamente ditos há que ter em conta a causa de pedir, importando para o efeito o juiz reportar-se ao estado da causa no momento em que se encerra a discussão final, já que até essa ocasião o litígio pode sofrer modificações, cumprindo-lhe resolver todas as questões pendentes nesse momento e só essas ([2]).
Muito embora no processo arbitral não exista norma expressa que imponha o respeito pelo princípio do dispositivo, não se referindo, também, de forma inequívoca, quais as questões de que os árbitros devem conhecer, entende-se deverem tornar-se extensivas ao processo arbitral as considerações tecidas a propósito da pronúncia indevida em processo judicial. Como refere Paula Costa Silva ([3]) «não faria sentido afirmar que o processo arbitral se não encontrasse sujeito ao princípio do dispositivo, quando é certo que é neste tipo de processos que a autonomia da vontade assume maior relevância», acrescentando que «estaremos perante uma situação de pronúncia indevida sempre que o árbitro conheça de questões cuja apreciação não lhe foi requerida pelas partes».
Revertamos para o caso que nos ocupa.
Como vimos, as apeladas (AA. na acção arbitral) concluíram pela seguinte forma o respectivo articulado inicial:
            «Nestes termos, deve ser declarado pelo Tribunal Arbitral:
 i) que a M incorreu em incumprimento definitivo perante as AA., nos termos e para os efeitos do art. n° 4, do ACORDO PARASSOCIAL, da obrigação de realização tempestiva da prestação pecuniária acessória por ela devida à O, no montante de 470.000.000$00, e que, em consequência, esse incumprimento a constituiu na obrigação de pagamento às signatárias de uma penalidade equivalente ao dobro dessa prestação;
ii) que a M, ao não pagar a sobredita penalidade no prazo que para o efeito lhe foi concedido pelas AA., se sujeitou às consequências previstas no art. 16.º, n.° 5, do ACORDO PARASSOCIAL, tendo as AA. adquirido consequentemente o direito de exercerem uma opção de compra sobre as acções O na titularidade daquela;
iii) que as AA. exerceram validamente essa opção de compra,
Em consequência deve:
i) a M ser condenada a pagar às AA., na proporção dos direitos de voto por estas detidas no capital social da O, uma indemnização no montante de 940.000.000$00, acrescida de juros à taxa legal desde o momento da constituição em mora;
ii) O Tribunal substituir-se à M, declarando as acções detidas pela M no capital social da O transmitidas às AA., nas proporções constantes da interpelação de exercício da opção, contra o depósito de 70% do valor nominal dessas acções ou, subsidiariamente, contra o depósito de (i) 70% do valor nominal das acções detidas pela M até ao último aumento de capital e do (ii) valor de subscrição das acções resultantes do exercício dos direitos de subscrição no último aumento de capital da O. Ou,
iii) a transmitir para as AA., na proporção dos direitos de voto por estas detidos no capital social da O, as acções que detém no capital dessa SOCIEDADE, contra o pagamento de 70% do valor nominal dessas acções ou, subsidiariamente de (i) 70% da acções detidas pela M até ao último aumento de capital e do (ii) valor de subscrição das acções resultantes do exercício dos direitos de subscrição no último aumento de capital da O.»
            Posteriormente, nas alegações finais, vieram as apeladas declarar naquele processo:
«… não se concedendo relativamente à aplicação cumulativa (i) da obrigação da R. de pagamento da sanção penal prevista na Cláusula 16.4 do ACORDO PARASSOCIAL no valor de ESC. 940.000.000$00 e (ii) do direito das AA. de exercício da opção de compra nos termos e condições estipuladas na Cláusula 16.5. do ACORDO PARASSOCIAL, vêm pelo presente as AA. explicitar que, caso o Tribunal entenda que as AA. apenas terão direito a uma indemnização no montante de ESC. 940.000.000$00 ou apenas terão direito ao exercício da opção de compra, o que apenas por extrema cautela de patrocínio se pondera, mantêm as AA. a posição de que deve ser dada preferência ao exercício pelas AA. do direito de opção de compra das acções detidas pela R. no capital social da O nos termos melhor explicitados nos pontos ii) e iii) do pedido formulado na p.i….».
A final, o Tribunal arbitral proferiu decisão nos seguintes termos:
«a) Reconhece às Autoras, na proporção dos direitos de voto correspondentes às participações no capital social da O (...), o direito ao pagamento pela Ré, a título de cláusula penal, da quantia, em Euros, correspondente a 470.000 contos (acrescidos dos juros legais moratórios relativos a créditos de empresas comerciais, contados desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do pagamento), ou, em alternativa, e na mesma proporção, o direito de opção de compra das acções da O pertencentes à M na presente data, acrescidas das que, em virtude da respectiva titularidade, a M porventura venha a adquirir em aumentos de capital da O, pelo seu valor real à data do exercício dessa opção, menos a importância, em Euros, correspondente a 470.000 contos (acrescida igualmente de juros legais moratórios desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do exercício da opção);
b) Condena a Ré, conforme a escolha que vier a ser feita pelas Autoras, a pagar a estas, na proporção atrás referida, a importância 470.000 contos (acrescidos de juros legais moratórios desde 13 de Janeiro de 1999 até à data do pagamento), ou a vender-lhes as acções da O acima indicadas, pelo seu valor real à data em que a opção de compra for exercida, diminuído da importância, em Euros, correspondente a 470.000 contos, mais os juros legais moratórios desta importância relativos ao período compreendido entre 13 de Janeiro de 1999 e a data do exercício da opção de compra.»
Sendo que, na fundamentação do acórdão arbitral foi expressamente referido, a propósito das alegações finais das apeladas:
«No fundo, as AA. vieram dizer, fazendo-o embora sob condição (isto é, sob a condição de o Tribunal entender que as sanções em causa são alternativas) que reduzem o seu pedido ao reconhecimento do direito de opção de compra. Nada as impedia de tomarem esta iniciativa, pois a redução do pedido é permitida em qualquer altura (art. 273, nº 2, do Cod. de Proc. Civil), importando ainda sublinhar que, no caso sub iudice, não há quanto a este ponto divergência entre os litigantes, o que permite aplicar também a regra do art. 272º do mesmo diploma legal, onde se estabelece que, havendo acordo das partes, o pedido e a causa de pedir podem sempre ser alterados, em 1ª ou 2ª instância, salvo se a alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão e julgamento do pleito» (fls. 454-455 destes autos).
E, mais adiante, mencionou-se a propósito:
«Importa ainda ponderar que as AA., conforme se referiu já, vieram ao processo declarar, após a entrega das alegações finais da R., que se o Tribunal entender que a penalidade prevista na cláusula 16.4 e a opção de compra permitida pela cláusula 16.5 não são cumuláveis, tratando-se antes de sanções alternativas, escolhem a opção de compra e prescindem, portanto, da sanção pecuniária.
Esta escolha, porém, foi feita pelas AA. no pressuposto de que poderiam efectuar a compra das acções, nos termos da citada cláusula, por setenta por cento do respectivo valor nominal.
Ora, nada garante que se as AA. soubessem que teriam de fazer a compra pelo valor real dos títulos (menos a importância de 470.000 contos e respectivos juros legais moratórios), elas continuariam a preferir a compra das acções.
O Tribunal deve, por isso, interpretando o pedido, limitar-se a reconhecer às AA. o direito de escolherem uma das duas sanções alternativas» (fls. 507 destes autos).
            O Tribunal Arbitral aludiu, pois, concretamente à questão que agora nos é colocada, não se tratando, obviamente, de caso em que inadvertidamente se tenham ultrapassado os mencionados limites referentes às questões de que se poderia ocupar, antes tendo sido perspectivada e defendida uma determinada interpretação e solução.
            Antes de mais saliente-se que o Tribunal Arbitral equacionou a situação como conformando uma redução condicional dos pedidos inicialmente formulados pelas AA. no processo arbitral  (aqui apeladas).
            Alberto dos Reis ([4]) defendia que a redução do pedido tinha o mesmo efeito que a desistência parcial, extinguindo o direito que se pretendia fazer valer, sendo unicamente de forma a diferença entre a redução do pedido e a desistência parcial, uma vez que na essência os dois actos teriam o mesmo alcance e o mesmo sentido, produzindo o mesmo efeito, importando a redução a extinção do direito respectivo. Concretizava, então: «Quem desiste de parte do pedido significa, com o seu acto, que não se julga com direito à parte abrangida pela desistência; quem reduz o pedido significa igualmente que considera exorbitante o pedido inicial e só reputa justo o pedido na parte remanescente após a redução».
            O mesmo entendimento transparece em Lebre de Freitas ([5]), referindo, por seu turno, Antunes Varela ([6]) que «a redução tem de considerar-se equivalente à desistência parcial do pedido, para a qual procede, com a acomodação necessária, a doutrina do artigo 295.º, nº 1».
            Temos, pois, que, pelo menos em termos substanciais, de conteúdo, a redução do pedido é equiparável à desistência parcial, produzindo o mesmo efeito – a extinção do direito na parte reduzida.
            Afigura-se duvidoso que as apeladas, no caso que nos ocupa, tenham pretendido propriamente extinguir o direito respectivo na parte dita “reduzida”. Aquelas, salientando embora manter o seu ponto de vista - «não se concedendo» - explicitaram que, caso o Tribunal entendesse «que as AA. apenas terão direito a uma indemnização no montante de ESC. 940.000.000$00 ou apenas terão direito ao exercício da opção de compra, o que apenas por extrema cautela de patrocínio se pondera, mantêm as AA. a posição de que deve ser dada preferência ao exercício pelas AA. do direito de opção de compra das acções detidas pela R. no capital social da O nos termos melhor explicitados nos pontos ii) e iii) do pedido formulado na p.i….».
O que sucede é que as apeladas, verificando-se aquele circunstancialismo a que aludem (e só no caso de ele se verificar) optaram pelo direito ao exercício da opção de compra das acções – em detrimento da sanção pecuniária – isto no pressuposto de que a mesma ocorreria pelo valor correspondente a 70% do respectivo valor (como por elas referido, «nos termos melhor explicitados nos pontos ii) e iii) do pedido formulado na p.i.») e não pelo respectivo valor real, como veio a ser considerado na decisão arbitral.
            Não se tendo verificado o pressuposto em que as apeladas fundaram a sua escolha justifica-se a solução a que se chegou na decisão arbitral – como, aliás, pelo próprio Tribunal Arbitral foi realçado - entendendo-se que, face ao condicionalismo verificado, não foi infringido o princípio do dispositivo não ocorrendo o conhecimento pelo Tribunal Arbitral de uma questão de que não podia conhecer.
                                                                       *
            IV – 2 - Defende a apelante que tendo ficado provado no processo arbitral, consoante a resposta ao quesito 6º, que as apeladas não sofreram quaisquer danos, o acórdão arbitral ao condenar a apelante no pagamento da quantia prevista como cláusula penal no Acordo Parassocial, embora reduzida a metade do seu valor, imputou uma responsabilidade sem dano, violando princípios de ordem pública.
            Muito embora refira a taxatividade dos fundamentos de anulação previstos no art. 27 da Lei 31/86, Paula Costa e Silva ([7]) entende que «…sempre que se verifique a violação de uma regra de ordem pública, concluir-se-á, necessariamente, pela nulidade directa ou derivada da sentença arbitral», explicando que se falará em nulidade directa da sentença quando seja esta o acto violador da ordem pública e que se, ao invés, a violação se verificar em acto diverso da sentença, essa violação reflectir-se-á numa nulidade da sentença, falando-se então em nulidade derivada. Concretizando, então, que se a contrariedade com a ordem pública estiver contida na própria sentença arbitral – verificando-se essa situação se a sentença reconhecer como causa legítima de cessação de um contrato de prestação de serviço a raça, a religião ou a convicção política de determinada pessoa – terão se ser paralisados os efeitos daquela por recurso aos critérios gerais de direito.
            Aderindo a este ponto de vista – tendo em conta que, obviamente, não poderia vingar uma decisão arbitral que violasse directamente a ordem pública, nos termos aludidos - atentemos ao caso dos autos. Será que o acórdão arbitral a que nos reportamos violou princípios de ordem pública, como pretendido pela apelante?
            Menezes Cordeiro ([8]) refere que a ordem pública constitui um factor sistemático de limitação da autonomia privada; sendo esta limitada por normas jurídicas imperativas, o sistema abrange, também, princípios a construir pela Ciência Jurídica, correspondentes a vectores não expressamente legislados, mas de funcionamento importante, podendo ser injuntivos. Exemplifica como sendo contrários à ordem pública contratos que exijam esforços desmesurados ao devedor ou que restrinjam demasiado a sua liberdade pessoal ou económica, também sendo contrários à ordem pública negócios que atinjam valores constitucionais importantes ou dados estruturantes do sistema.
            A propósito do objecto dos negócios jurídicos Mota Pinto ([9]) define a ordem pública como «o conjunto dos princípios fundamentais, subjacentes ao sistema jurídico, que o Estado e a sociedade estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem prevalecer sobre as convenções privadas», princípios esses que não são susceptíveis de uma catalogação exaustiva, até porque a ordem pública é variável com os tempos.
            E Manuel de Andrade ([10]) reconduz a ordem pública «aos interesses fundamentais que o nosso sistema jurídico procura tutelar e aos princípios correspondentes que constituem como que um substrato desse sistema».
Tendo em conta este enquadramento, vejamos então.
Estipularam as partes no ponto 16.4 do já referido Acordo Parassocial: «O incumprimento definitivo – sendo havido como tal a mora superior a quinze dias – relativamente a qualquer das obrigações de entrada ou de reforço de entrada… faz incorrer a parte faltosa no dever de pagar às partes não faltosas uma indemnização que, a título de cláusula penal, sem prejuízo da ressarcibilidade dos danos excedentes, se fixa no valor correspondente ao dobro da quantia com a qual deveria de entrar para a Sociedade».
O acórdão arbitral considerou que ocorrendo uma situação de mora com duração superior a 15 dias se verificara aquele incumprimento definitivo, desencadeador da sanção prevista, ou seja, do pagamento da indemnização ali considerada a título de cláusula penal.
É na divisão referente à fixação contratual dos direitos do credor, nos seus arts. 810 a 812, que o CC alude á cláusula penal.
Pinto Monteiro ([11]) considera haver que distinguir a cláusula penal em sentido estrito, a cláusula penal enquanto fixação antecipada do montante da indemnização e a cláusula penal puramente compulsória e que sendo a segunda aquela que o nº 1 do art. 810 define não é só essa a espécie que haverá de considerar-se permitida, sendo o princípio da liberdade contratual fundamento bastante para legitimar as demais espécies de cláusulas penais. A cláusula penal compulsória não visaria reparar o credor, o dano do incumprimento não seria considerado pelas partes ao ser estabelecido o seu montante, destinando-se, tão só, a pressionar o devedor ao cumprimento e não a substituir a indemnização a que houvesse direito. Já a pena em sentido estrito visaria compelir o devedor ao cumprimento e substituir a indemnização, não acrescendo a esta nem à execução específica da indemnização. Refere, ainda, aquele autor tratar-se de simples modalidades, tipos ou espécies de cláusulas penais, sendo de apurar o título a que a cláusula penal é estipulada, a função que visa prosseguir, de acordo com ela se definindo a sua natureza jurídica – indemnizatória ou sancionatória – e o seu regime. Conclui, no seguimento, que se as partes tiverem estipulado a cláusula penal a fim de fixarem antecipadamente o montante da indemnização, sem qualquer especial intuito compulsório, o devedor não está impedido de provar a inexistência de qualquer prejuízo, o que afastará o direito do credor; que se a cláusula penal for estipulada a título puramente compulsório o credor já terá direito à pena mesmo que o devedor faça prova da inexistência de qualquer dano; e que, também, a cláusula penal em sentido estrito abstrai do dano, tanto da sua existência como do seu montante, sendo irrelevante, por isso, a prova da inexistência do mesmo.
Tendo as partes acordado que da decisão do Tribunal Arbitral não cabia recurso para outra instância, saliente-se, novamente, que não nos cumpre ponderar sobre o mérito da decisão proferida por aquele Tribunal bem como sobre o acerto dos entendimentos adoptados, mas, apenas, sobre se aquela decisão viola princípios de ordem pública.
Não nos cumprirá assim, no âmbito do mérito da decisão, avaliar sobre a modalidade, tipo ou espécie de cláusula penal convencionada e se o Tribunal Arbitral decidiu correctamente sobre a condenação da apelante no valor ali considerado a título de cláusula penal, atentas as respostas anteriormente dadas aos quesitos, mais concretamente aos quesitos 6º e 7º.
Sem dúvida que as estipulações das partes constantes do ponto 16.4 do Acordo Parassocial são manifestações do princípio da liberdade contratual, no âmbito da autonomia privada, nesse contexto tendo sido valoradas e extraídas as respectivas consequências na decisão arbitral. Ora, tendo em conta, aliás, o que acima se mencionou sobre a natureza e regime da cláusula penal, cuja amplitude é deveras abrangente e em que (in)existência do dano é diversamente valorável, não poderemos afirmar que aquela decisão violou princípios da ordem pública, correspondentes aos interesses fundamentais que o nosso sistema jurídico procura tutelar, princípios fundamentais subjacentes àquele sistema jurídico que devam prevalecer sobre as convenções privadas uma vez que tutelam interesses superiores da comunidade, naquela hipótese avançada de, no caso concreto, terem inexistido danos.
Pelo que, também nesta parte, não procedem as conclusões da apelante.
                                                              *
IV – 3 - Como vimos, o art. 27, nº 1, alíneas, d) da lei 31/86, de 29-8, prevê entre os fundamentos de anulação da sentença arbitral, ter havido violação do art. 23, nº 3, da mesma lei o qual determina que a decisão arbitral deve ser fundamentada.
Refere Paula Costa Silva ([12]) que a exigência de fundamentação se poderá explicar através da vontade legislativa de afastar toda a arbitrariedade do processo arbitral, impondo-se aos árbitros que demonstrem que a solução dada ao caso é legal e justa, sendo a emanação correcta da vontade da lei, mas que a fundamentação é, ainda, necessária na medida em que confere inteligibilidade à sentença. Referindo poder dizer-se, genericamente, que uma sentença é provida de fundamentos sempre que seja possível compreender a motivação do árbitro, acrescenta que «mesmo que tal motivação seja deficiente, medíocre ou errada, estaremos perante uma sentença motivada, devendo as deficiências da sua fundamentação, que não geram nulidade, ser arguidas em via de recurso. Só a falta absoluta de motivação implicará uma nulidade da sentença arbitral, invocável através de acção de anulação. Sempre que a motivação seja deficiente não havendo lugar a anulação, deve essa deficiência ser suprida através de recurso interposto contra a sentença arbitral». Para concluir que «só no caso de falta absoluta de motivação se gera uma situação de nulidade da sentença arbitral, de acordo com o disposto nos artigos 27º, n.º 1, al. d) e 23.º, nº 2 da Lei n.º 31/86».
Atentemos ao caso dos autos.
A sentença arbitral enunciou os factos provados (fls. 455-485 destes autos), definiu quais as questões jurídicas suscitadas (fls. 485-486), após o que as analisou em pormenor (fls. 487-514), referindo disposições legais julgadas aplicáveis, interpretando os factos provados e com aquelas os relacionando, aludindo a conceitos considerados relevantes e operando as respectivas conclusões.
Não estamos, pois, em face de uma decisão que careça em absoluto de fundamentação, quer de facto quer de direito – só essa, como vimos, sendo causa de anulação.
Concretamente no que respeita á redução para 470.000$00 (acrescidos dos respectivos juros) da penalidade que havia sido estabelecida no Acordo Parassocial é referido na decisão arbitral que «o Tribunal considera estas penalidades manifestamente excessivas e entende, por isso, que elas devem, nos termos do art. 812º, nº 1, do Código Civil, aplicável directamente ou por analogia, ser reduzidas de acordo com a equidade» e que no que respeita á sanção que impõe à R. a obrigação de pagar às AA. a título de cláusula penal, «o dobro da prestação acessória de 470.000 contos … tomando principalmente em consideração que a R. acabou por pagar, embora com atraso, aquela prestação, e ponderando, ainda, que o atraso da M nenhum prejuízo causou às demais partes do acordo parassocial, e que nenhuns danos causou também à O, para além da perda dos juros que poderia ter obtido através do depósito bancário do montante da prestação acessória, o Tribunal reduz o quantitativo da cláusula penal para metade, isto é, para 470.000 contos, acrescidos dos juros legais moratórios…»
Existe, pois, fundamentação no que a esta específica questão respeita – a apelante poderá, eventualmente, reputá-la de insuficiente e pouco convincente, mas de forma alguma poderemos afirmar que há falta absoluta de motivação.
Compreende-se o esforço da apelante, espartilhada como está pela taxatividade dos fundamentos de anulação da decisão arbitral, em reconduzir a algum daqueles a sua discordância da decisão arbitral, uma vez que oportunamente as partes haviam renunciado aos recursos, não podendo assim, por esse meio, ver revogada ou alterada aquela decisão.
Em nosso entender, todavia, esse esforço não permite alcançar o desfecho pretendido, improcedendo deste modo todas as conclusões da apelante.
                                                           *
V - Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
                                                           *


Lisboa, 29 de Novembro de 2007
 
Maria José Mouro
Neto Neves
Isabel Canadas

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[1]              Sem prejuízo do que adiante se exporá sob o ponto IV- 2).
[2]              Ver Lebre de Freitas e outros, «Código de Processo Civil Anotado», II vol., pag. 670 e Alberto dos Reis, «Código de Processo Civil Anotado», vol. V, pags. 52-55.
[3]              Em «Anulação e Recursos da Decisão Arbitral», Revista da Ordem dos Advogados, ano 52, Dezembro de 1992, pag. 943-944.
[4]              «Comentário», vol. III, pag. 96.
[5]              Lebre de Freitas e outros, obra citada, vol. I, pag. 485.
[6]              Antunes Varela, J. Bezerra e S. Nora, «Manual de Processo Civil», pag. 356.
[7]              Local citado, pags. 944-945.
[8]              «Tratado de Direito Civil Português», I, Parte Geral, Tomo I, pags. 507-508.
[9]              «Teoria Geral do Direito Civil», pag. 434.
[10]             «Teoria Geral da Relação Jurídica», vol. II, pags. 334-335.
[11]             «Cláusula Penal e Indemnização», pags. 601-607, 671-675 e 686-687.
[12]             Obra citada, pags. 938-939.