PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTE COMUM
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
OBRAS
AUTORIZAÇÃO
Sumário

1.Num prédio em regime de propriedade horizontal são partes comuns tanto a parede exterior como o muro que delimita o logradouro da rampa de acesso à garagem.
2.Qualquer obra que afecte parte comum carece de autorização da assembleia de condóminos.
3.O facto de a assembleia de condóminos de um prédio que essencialmente se destina a habitação negar a autorização para a realização de obras de adaptação de uma fracção a estabelecimento de Bingo não representa abuso de direito.
(A.S.A.G.)

Texto Integral

I – O CONDOMÍNIO do PRÉDIO URBANO sito na AV.ª da REPÚBLICA, n° ... em LISBOA
intentou acção declarativa de condenação, com processo ordinário,
contra
S.,
pedindo que:
- se condene a Ré a reconstruir o muro que separa o logradouro da casa da porteira do prédio da rampa e acesso à garagem do mesmo, repondo a configuração das obras que foram efectuadas em Agosto de 2004;
- se condene a reconstruir a parede do logradouro da casa porteira em que se situa a saída de emergência da fracção B, bem como a janela de iluminação em tijolo de vidro, repondo a mesma configuração;
- e que se condene a pagar ao condomínio a quantia de € 1.324,68, a título de danos patrimoniais decorrentes das despesas judiciais suportadas até esta data e do valor que, ao mesmo título, vier a ser liquidado.
Alegou o A. que o Regulamento do Condomínio não permite a qualquer condómino fazer obras nas partes comuns sem prévia autorização da assembleia de condóminos.

A R. apresentou contestação defendendo-se por impugnação, tendo concluído pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.

Foi apresentado articulado superveniente pelo R. que, no entanto, foi rejeitado.

Agravou a R. de tal despacho e concluiu que:

A. O articulado superveniente apresentado pela agravante, não obstante relatar factos ocorridos no âmbito de um processo administrativo, visa carrear para os autos uma circunstância fáctica nova relevante e decisiva à fundamentação da sua defesa, na medida em que inutiliza uma das teses que sustenta os pedidos do agravado;
B. O agravado alega nos autos que as obras efectuadas na fracção B tutelam única e exclusivamente o interesse particular da agravante e que não trazem qualquer benefício aos restantes condóminos; já a agravante sustenta que os trabalhos realizados protegem o interesse público de todos os condóminos, pois visam assegurar o cumprimento da legislação de segurança contra incêndios;
C. Sendo estas as teses que suportam, respectivamente, o direito invocado pela agravante e a defesa da agravada, cumpre necessariamente determinar qual das duas corresponde à realidade;
D. Aliás, muitas das questões que se colocam nos autos implicam necessariamente a determinação da natureza das obras executadas pela agravante, ou seja, saber se tais obras resultam forçosamente do normativo obrigatório de segurança contra incêndios;
E. Os factos alegados pela agravante no articulado superveniente permitem responder de forma satisfatória e indubitável às questões supra mencionadas, e, por conseguinte, esclarecer qual a posição que vinca, no que tange aos interesses tutelados e discutidos no âmbito da acção intentada pelo ora agravado;
F. As obras impostas ao agravado pela Câmara Municipal de Lisboa e as realizadas pela agravante na respectiva fracção visam cumprir a legislação de segurança contra incêndio e, por conseguinte, proteger o interesse público dos condóminos, a segurança de pessoas e bens;
G. O facto de os caminhos de evacuação da fracção B e da garagem do edifício coincidirem permite concluir que a obra realizada no logradouro pela agravante, nomeadamente a criação de um pequeno espaço de evacuação dos utentes da respectiva fracção autónoma, tornou desnecessária a realização de obras da mesma natureza, no mesmo local, entretanto, referentes à garagem do edifício;
H. Se este caminho não existisse ou fosse removido, na esteira da decisão CML sobre a realização coerciva de obras no prédio em causa, o agravado estaria obrigado a executar os trabalhos que assegurassem a criação de um caminho de evacuação, enquanto extensão da saída alternativa da garagem do prédio;
I. O agravado, ante a execução dos trabalhos pela agravante, viu o seu dever legal cumprido, ainda que de forma parcial, sem que para tanto tenha despendido qualquer valor;
J. A pertinência dos factos supervenientes para o caso em apreço é absolutamente manifesta e decisiva, havendo uma conexão imediata, quer pela identidade dos bens e interesses tutelados, quer pela natureza das obras, entre as construções feitas pela agravante e as impostas administrativamente ao agravado;
K. Por força dos arts. 506°, n° 1, e 663°, n° 1 e 2, do CPC, devem os factos articulados ser admitido e levados à matéria assente e/ou à base instrutória;
L. A rejeição dos factos supervenientes, factos de suma relevância para a determinação da existência ou não do direito do agravado, carece de fundamento legal e, por conseguinte, viola gravemente o princípio da discussão, do contraditório ou da verdade processual orientador do processo cível, bem como o princípio constitucionalmente consagrado a uma tutela jurídica efectiva.

Houve contra-alegações.

No prosseguimento dos autos, foi julgada parcialmente procedente a acção e a R. condenada a reconstruir o muro que separa o logradouro da casa da porteira da rampa de acesso à garagem e a reconstruir a parede do logradouro da porteira em que se situa a saída de emergência da fracção B bem como a janela de iluminação em tijolo de vidro, repondo a configuração das obras efectuadas em Agosto de 2004.

Apelou a R. e concluiu que:

a) Atenta a factualidade dada como provada, deveria ter sido diversa a decisão do tribunal a quo quanto aos dois primeiros pedidos formulados pelo A. considerados procedentes na sentença recorrida;
b) Mediante uma mera leitura da decisão objecto de consideração parece consentâneo concluir-se não só a desatenção do tribunal recorrido mas, igualmente, a displicência com que se procedeu à apreciação e subsequente resolução do peticionado nos autos;
c) No caso concreto, o tribunal a quo limitou-se a pronunciar-se sobre o peticionado em último momento pelo A. quanto à indemnização a título de danos patrimoniais decorrentes das despesas judiciais suportadas pelo A.;
d) Além disso, na sentença não foram invocadas quaisquer normas jurídicas cuja aplicação à factualidade apurada viabilizasse o teor do decidido na mesma;
e) Verifica-se a total falta de fundamentação do decidido relativamente aos dois primeiros pedidos;
f) Deverá a Relação proceder à revogação da decisão recorrida, no que concerne à condenação da R. no peticionado primeiramente pelo A.;
g) No que diz respeito à condenação da R. na reconstrução do muro que separa o logradouro da porteira da rampa de acesso à garagem, repondo a configuração existente antes das obras efectuadas em Agosto de 2004, cumpre esclarecer que as obras realizadas pela R., não poderão ser consideradas inovações, para os efeitos previsto no art. 1425° do CC;
h) Assim que as obras em causa se encontrem concluídas, poderá concluir-se que não se verificou qualquer prejuízo para os condóminos, antes um benefício imputado não apenas na esfera jurídica do R., titular da fracção B, mas também na esfera jurídica de todos os condóminos em geral, tendo em conta que o prédio urbano passará a estar em conformidade com a legislação de segurança contra incêndios;
i) Os trabalhos executados são complementares dos trabalhos executados pelo anterior proprietário e dos agora executados no interior da mesma fracção: visaram exclusivamente cumprir as normas regulamentares de segurança contra incêndios, o regime legal sobre a poluição sonora, as medidas de segurança contra riscos de incêndio em estabelecimentos comerciais e o regime legal para projectos de instalação de ventilação e desenfumagem na fracção B;
j) Os trabalhos efectuados foram devidamente licenciados pelas entidades competentes e estavam programados, sendo do perfeito conhecimento da Administração do Condomínio antes de os mesmos se iniciarem, conforme o próprio A. reconhece na sua petição inicial;
k) Atento o disposto no n° 3 do art. 659° do CPC o facto de o documento 14º junto com a petição não se encontrar vertido na resposta do tribunal a quo não obsta à necessária consideração dos mesmos para efeito da boa resolução da causa;
l) Estava, portanto, a R. autorizada a derrubar parcialmente o muro do logradouro que delimita este espaço da entrada para a garagem, assim assegurando a saída de emergência, quer da garagem, quer da fracção B, razão pela qual esta se limitou a informar o A. que iria proceder a trabalhos de remodelação/alteração na sua fracção, realidade distinta de solicitar autorização para fazer obras nas partes comuns do edifício;
m) Tendo em consideração a ratio das obras realizadas e o facto de a fracção não poder ser usufruída sem que tais obras se encontrem concluídas mediante o bloqueio do direito da R. de proceder às mesmas estar-se-á a pôr em crise o próprio direito de propriedade, que ficaria esvaziado de uma parte significativa do seu conteúdo, sendo que a mudança de finalidade da fracção B, deliberada por unanimidade, e a consequente versão actual do título constitutivo ficariam desprovidas de qualquer conteúdo útil;
n) Saliente-se ainda que em 29-7-04, o condomínio manifestou, por unanimidade, estar na disposição de aplicar no edifício a legislação de segurança contra incêndios – conforme acta de condomínio de 29-7-04, junta como doc. n° 10 à oposição - deliberação que teve lugar em momento posterior à deliberação dos condóminos, tomada por maioria, no sentido de proibir as obras executadas pela R., facto que consubstancia uma actuação do A. em manifesto venire contra factum proprium;
o) No que se reporta à condenação da R. na reconstrução da parede do logradouro da porteira em que se situa a porta de saída de emergência da fracção B, bem como a janela de iluminação em tijolo de vidro, repondo a configuração existente antes das obras efectuadas em Agosto de 2004, importa reter o disposto na resposta ao quesito 5°;
p) Se, em conformidade com tal resposta, o tribunal considerou que a porta de saída de emergência da fracção B se encontrava situada no espaço destinado a esta fracção autónoma, impõe-se concluir que a mesma asserção deverá valer para a janela de iluminação em tijolo de vidro que, em função de uma premissa lógica, deverá considerar-se parte integrante da mesma parede, embora do quesito em causa não conste qualquer referência à mesma;
q) Não se compreende, portanto, a decisão do tribunal recorrido no sentido de condenar a R. no sobredito pedido, não se concebendo, em particular, a razão pela qual vem declarar que "A Ré [..] executou obras na fracção autónoma [...] demolindo [..] a parede do logradouro da porteira em que se situa a saída de emergência da fracção autónoma designada pela letra "B" [...], bem como a janela de iluminação em tijolo de vidro, as quais constituem partes comuns do edifício";
r) Ora, tendo em consideração a factualidade consagrada na sobredita resposta à matéria de facto, resulta evidente a aplicabilidade das disposições gerais referentes ao direito de propriedade, que possibilitam ao titular de uma qualquer fracção autónoma proceder à fruição da mesma conforme lhe aprouver designadamente, o disposto nos arts. 1305°, 1306° e 1420° do CC;
s) Não se consideram violadas as limitações enunciadas no art. 1422° do CC, designadamente, não se trata de obras que possam prejudicar a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
t) Ainda que o tribunal a quo, na sua resposta à matéria de facto, não tivesse considerado que as obras foram realizadas na fracção autónoma da R., dever-se-ia considerar aplicável tudo que ficou referido supra relativamente ao primeiro pedido deduzido pelo A., designadamente a inaplicabilidade do disposto no art. 1425° do CC, assim como a existência de autorização no sentido de consentir as referidas obras de reestruturação das saídas de emergência, quer indirectamente, mediante a aprovação da mudança de fim da fracção autónoma em causa, quer directamente, mediante a
Caixa de texto: 25 autorização dada ao anterior locatário, e mediante a posterior deliberação, por unanimidade, de aplicação ao prédio da legislação de segurança contra incêndios;
u) Dever-se-á considerar aplicável, também no que diz respeito a este segundo pedido, o exposto relativamente à violação, pelo A., das regras de boa-fé, consubstanciando o seu o aportamento uma actuação em manifesto venire contra factum proprium.

Não houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – Quanto ao recurso de agravo:
1. Insurge-se a agravante contra o despacho de fls. 282 que não admitiu o articulado superveniente de fls. 211 e segs., considerando-o mero desenvolvimento daquilo que anteriormente foi alegado e concluindo que a competência para a apreciação de tais factos pertence à jurisdição administrativa.
Nos termos do art. 506º do CPC, admite-se a alegação superveniente de factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito.
A mera leitura do preceito permite resolver o caso.
Com efeito, a lei distingue bem os factos supervenientes (art. 506º) dos documentos supervenientes (art. 524º).
No caso, não estamos, em boa verdade, perante factos supervenientes susceptíveis de integrar alguma das referidas sub-espécies, antes em face de documentos susceptíveis de interessarem ao julgamento da matéria de facto anteriormente alegada e que, no segmento controvertido, passaram para a base instrutória.
Na verdade, os alegados factos novos não passam de elementos de natureza instrumental relativamente àquilo que de essencial já fora anteriormente alegado e que, constituindo matéria controvertida, integrava os arts. 5º, 6º e 8º da base instrutória.
Não é por tal articulado recolher parte de um processo de natureza administrativa que corre seus termos que impediria a sua inserção nos presentes autos. Mas não pode dispensar-se a verificação dos requisitos legais, ou seja, da confirmação da natureza superveniente dos factos com função constitutiva do direito da agravante ou com função impeditiva do direito do agravado.
Ora, como se disse, não estamos perante tal situação, mas apenas em face de uma peça processual que serviu para introduzir nos autos uma série de documentos.

Assim, acorda-se em negar provimento ao agravo, mantendo a decisão recorrida.

III – Quanto à apelação:
1. Por expressa indicação do A. formulada logo na petição inicial, o objecto da presente acção, que necessariamente delimita também o objecto do recurso, está circunscrito à legalidade das obras identificadas nos arts. 24º, 25º e 26º da petição, ou seja:
- A remoção de uma porta de emergência metálica que existia e a sua substituição por duas meias portas com o dobro da dimensão daquela, as quais ficaram recuadas cerca de um metro em relação à face da parede existente;
- O correspondente alargamento do vão necessário, com demolição de uma parte da parede em alvenaria e tijolos de vidro;
- E a reposição de cerca de 2 metros de um muro que separava o logradouro do prédio e a rampa de acesso à garagem comum.
Outras obras e outras vertentes do mesmo litígio que se estabeleceu entre o Condomínio Urbano e a Ré estão em discussão noutros processos judiciais, não sendo, por isso, aqui considerados.

2. Nas alegações da Ré apelante suscitam-se fundamentalmente as seguintes questões:
a) Se a abertura de 2 metros que a R. fez no muro de separação entre o logradouro e a rampa de acesso à garagem pode ou não ser considerada inovação ilegítima; e se a parede onde foi aberta a porta faz parte integrante da fracção B;
b) Se as obras em geral acarretaram algum prejuízo para o condomínio ou, antes, um benefício que aproveita a todos os condóminos, no que concerne à protecção contra riscos de incêndio.
c) Se tais obras são complementares de outras que foram efectuadas pelo anterior proprietário (e referidas no doc. nº 14 junto com a petição inicial) e que foram autorizadas pela Assembleia de Condóminos;
d) Apreciar se o bloqueio do A. no que concerne à realização das obras põe em crise o direito da Ré sobre a fracção B, esvaziado, assim, de uma parte significativa do seu conteúdo, apesar de a Assembleia de Condóminos ter oportunamente aprovada a mudança de finalidade da referida fracção;
e) E, finalmente, se a oposição do A. consubstancia uma actuação em manifesto venire contra factum proprium.


3. Factos provados:

1.
O prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avª…, n° ..., encontra-se descrito na 8ª CRP de Lisboa sob o n°…, da freguesia … e compõe-se de 20 fracções autónomas, identificadas sob as letras A a U, sendo as duas primeiras destinadas a lojas e as restantes a habitação – A) e B);
2. Na reunião da Assembleia de Condóminos realizada no dia 25-5-87, foi aprovado o regulamento do condomínio, cujo art. 5° tem a seguinte redacção: "não é permitido a condómino algum executar trabalhos de obras ou modificações nas zonas consideradas comuns, sem prévia aprovação e autorização da Assembleia" – C);
3. Na 8ª CRP de Lisboa, sob a apresentação n.° 56 de 12/12/2000, sobre a fracção autónoma designada pela letra B, correspondente à loja no rés-do-chão direito do mesmo prédio urbano foi inscrito o seguinte facto:
"LOCAÇÃO FINANCEIRA
PRAZO: 10 ANOS
COM INÍCIO EM 2002/08/22
LOCADOR: R…, S.A., Avenida…, lote ….,
LOCATARIO: S." – D);
4. A casa de habitação da porteira, com o logradouro e a arrecadação na cave é comum a todas as fracções autónomas do dito prédio urbano– E);
5. Esse logradouro situa-se ao nível do rés-do-chão e encontra-se delimitado a poente, pelo próprio prédio urbano, a norte, por um muro em alvenaria de separação da rampa de acesso às garagens e a sul e a nascente, por empenas de suporte do terraço – F); 
6. O terraço está situado nas traseiras do prédio a nível do 1° andar e é, no essencial, uma lage de betão armado que constitui a cobertura, a nível do rés-do-chão, da rampa de acesso às garagens e de parte da fracção autónoma designada pela letra B correspondente à loja no rés-do-chão direito do mesmo prédio e, a nível da cave, das garagens – G);
7. O terraço é delimitado por muros de alvenaria, a ele se acedendo por uma escada de ferro ao ar livre que nasce no logradouro da casa da porteira e através de uma porta com ligação, por escada interior, com a fracção autónoma designada pela letra B correspondente à loja no rés-do-chão direito do mesmo prédio urbano – H);
8. Na parede do mesmo prédio urbano existe uma porta de acesso à casa da porteira e janelas da mesma casa; no muro do lado Norte existe um portão de ferro de ligação à rampa das garagens e na empena Nascente apoia-se uma escada de acesso ao terraço de cobertura e existia, até 26-8-04, à face da parede uma porta metálica de acesso directo à fracção autónoma designada pela letra B correspondente à loja no rés-do-chão direito, bem como uma janela de iluminação em tijolo de vidro e uma grelha de respiração - I);
9.
O terraço encontra-se totalmente isolado, sendo integralmente revestido com tela asfáltica com superfície xistosa e dotado de pequenos passadiços em pedra – J);
10. O terraço cobre a fracção autónoma designada pela letra B correspondente à loja no rés-do-chão direito do prédio e o acesso às garagens – 2º;
11. O caminho de evacuação da fracção autónoma designada pela letra B correspondente à loja no rés-do-chão está implantado no terraço, acedendo-se ao mesmo através de uma saída de emergência que tem origem nesta fracção autónoma e a continuação desta saída de emergência dá acesso às partes comuns – 3º;
12. As passadeiras existentes no terraço servem de guia ao caminho de evacuação à fracção B e de acesso aos equipamentos que aí se encontravam – 4º;
13. Em 20-5-04, a R. enviou ao A. a comunicação constante do instrumento de fls. 159, do qual consta, além do mais, o seguinte:
Vimos por este meio informar que vamos desenvolver trabalhos de alteração na fracção B, tanto no interior como no exterior.
(…)
Dentro de todos os projectos desenvolvidos, também foi previsto o projecto de segurança contra incêndios e informamos, como já tínhamos opinado anteriormente, que a entrada da garagem terá de ter uma porta de evacuação. Continuaremos a manter a saída de evacuação actual, que terá que ser redimensionada conforme previsto na legislação e exigência das autoridades" – L);
14. No dia 26-8-04, a R. ordenou a remoção da porta de emergência metálica e a sua substituição por duas meias portas recuada cerca de um metro relação à face da parede nascente do logradouro e com o dobro das dimensões da porta primitiva – M);
15. A R. procedeu ao alargamento do vão pré-existente, demolindo as partes laterais e superior da parede em alvenaria e parte dos tijolos de vidro – N);
16.
A R. demoliu cerca de 2 metros quadrados da extrema Nascente do muro de alvenaria que separa o logradouro da rampa de acesso às garagens e que, em 19-8-04, só tinha uma abertura e um portão em ferro, na sua extrema Poente, junto ao prédio urbano – O);
17. A porta emergência metálica é uma porta de emergência de saída da fracção B, situando-se no espaço destinado a esta fracção autónoma – 5º.

Por constarem de documentos que não foram impugnados, importa ainda considerar os seguintes factos complementares:

18. Por escritura pública de 5-7-02, foi modificado o título constitutivo da propriedade horizontal, no sentido de a fracção B, que estava como “garagem”, passar a “loja” (fls. 13 e segs.);
19. Na reunião da assembleia de condóminos de 30-9-98 foi apreciado um pedido de autorização formulado pelo anterior condómino da fracção B relativo à realização de obras necessárias para o estabelecimento poder funcionar, tendo sido deliberado aprovar por unanimidade a realização das obras pretendidas, entre as quais:
 “abrir 2 portas de saída de emergência, uma para o terraço, no seguimento da escada existente da saída de emergência da garagem que tem de ficar salvaguardada e outra que acede ao terraço junto à casa da porteira e escada de acesso ao terraço superior”, sendo que as “saídas destinam-se única e exclusivamente a este fim (diga-se, para o caso de situação grave de incêndio, inundação ou cuja gravidade imponha evacuação rápida) ...” (fls. 46 e 47);
20. Na reunião da assembleia de condomínio de 29-7-04 foi apreciado o teor da carta de 20-5-04 remetida pela R. à Administração de Condomínio e cuja cópia consta de fls. 38, sob o seguinte ponto da ordem de trabalhos “pedido de autorização do condómino da fracção B para fazer obras nas partes comuns do edifício” (fls. 63 e 64), tendo ficado exarado na acta, além do mais, o seguinte:
 “porque a assembleia se considera suficientemente esclarecida, foi colocada à votação o pedido de autorização de obras inerentes às saídas de evacuação acima descritas, tendo-se registado votos a favor do condómino S., sem abstenções, e votos contra de todos os restantes condóminos presentes e representados num total de 745 por 1000, pelo que a proposta foi rejeitada por maioria” (fls. 73);
21. Na mesma reunião foi aprovado por unanimidade que:
 “o condomínio está na disposição de aplicar ao edifício a legislação de segurança contra incêndios” (fls. 74).

B. Decidindo:
1. A apelante imputa à sentença a nulidade por falta de fundamentação.
Toda e qualquer sentença carece de fundamentação, explicitando os motivos da conclusão final (art. 158º do CPC).
Todavia, ainda que a referida nulidade deva ser corrigida em sede de recurso, não pode confundir-se falta de fundamentação com fundamentação deficiente ou insuficiente.
No caso concreto, é esta a realidade que se verifica, em parte devido a uma errada opção do Mº juiz a quo de integrar a pretensão do A. no instituto da responsabilidade civil, em vez de recorrer prioritariamente às regras da propriedade horizontal e, a partir daí, encontrar apoio para a decretada reconstituição da situação existente antes das obras que foram realizadas pela apelante.
Com tal opção errada, a natureza dos locais onde foram realizadas as obras e o regime a que obedecem as obras realizadas em prédios submetidos ao regime da propriedade horizontal foram questões incompreensivelmente relegadas para uma simples nota de rodapé, com excessivo e despropositado destaque atribuído a aspectos relacionados com a responsabilidade civil extracontratual que nenhuma das partes suscitou e que nem sequer levantavam quaisquer dificuldades.
Importa, pois, colocar em evidência o regime legal em que deve integrar-se tanto a pretensão do A. como os meios de defesa deduzidos pela R.

2. Considera a apelante que a demolição de um segmento da parede que confina com o logradouro do edifício, junto à casa da porteira, para efeitos de alargar a porta de emergência, não estava sujeita a qualquer condicionamento pelo facto de se considerar efectuada exclusivamente na sua fracção autónoma.
Outra é a conclusão que resulta da lei.
Com efeito, não há qualquer dúvida de que se trata de uma parede exterior do edifício que dá para o referido logradouro.
Deste modo, independentemente da sua função no campo da resistência às cargas do edifício, deve ser considerada parede mestra, integrando a categoria das partes imperativamente comuns, nos termos do art. 1421º, nº 1, al. a), do CC.
É, aliás, esta a qualificação que lhe é explicitamente atribuída no Ac. do STJ, de 18-5-99, CJSTJ, tomo II, pág. 99, segundo o qual são paredes mestras também as que delimitam o perímetro da construção.
No mesmo sentido se inclina Sandra Passinhas quando refere que devem ser consideradas partes comuns as paredes exteriores que delimitam o edifício ou paredes perimetrais, mesmo quando apenas se destinem a delinear o perfil arquitectónico do edifício (A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pág. 31).
Sem pretensões de esgotar as múltiplas referências doutrinárias e jurisprudenciais, a mesma conclusão é assumida por Aragão Seia, Propriedade Horizontal, pág. 70, nos Acs. da Rel. de Coimbra, de 28-4-87, CJ, tomo II, pág. 95, e de 20-10-98, CJ, tomo IV, pág. 39, e no Ac. da Rel. de Évora, de 31-10-02, CJ, tomo IV, pág. 246).
Por tal motivo, não faz sentido invocar a apelante a exclusividade do direito de propriedade sobre a fracção para afirmar a total liberdade quanto à realização de obras daquela natureza ou congéneres.
A integração da fracção de que é locatária financeira num prédio constituído em propriedade horizontal sofre limites e condicionamentos que não se quedam por aspectos de natureza administrativa mas que são decorrentes da necessidade de assegurar, com o menor grau de conflitualidade, os diversos interesses: os de cada condómino e os do condomínio urbano em geral, como entidade que, aliás, ultrapassa a mera soma dos interesses individuais.

A tal regime obedece também a outra obra que consistiu na abertura feita no muro se separação entre o logradouro e a rampa de acesso à garagem.
O muro que separa o logradouro da rampa de acesso à garagem é indubitavelmente uma parte comum, motivo por que qualquer intervenção nele deve sujeitar-se a regras que sobrepassam os meros interesses particulares da Ré ou de qualquer outro condómino.

Relativamente a qualquer das referidas obras, ao interesse particular da Ré no que concerne à satisfação de requisitos que se mostrem necessários para o exercício de uma determinada actividade na sua fracção sobrepõe-se o interesse colectivo representado pela generalidade dos condóminos, agindo segundo as regras específicas da propriedade horizontal, sem que o colectivo tenha de ficar subordinado aos interesses particulares da Ré.
Para o efeito, nem sequer se trata de aplicar ao caso o disposto no art. 1425º do CC, norma que visa regular a responsabilidade pelas inovações que se pretendam introduzir. Mais correcta é a inserção da concreta situação no regime da compropriedade, o que nos remete para o disposto no art. 1405º, nº 1, do CC, segundo o qual são exercidos em conjunto os direitos em regime de compropriedade, como se verifica relativamente às partes comuns de um condomínio (art. 1420º, nº 1)
Nesta linha, refere Aragão Seia, ob. cit., pág. 132, que “nas partes comuns estão vedadas ao condómino quaisquer simples «inovações» ou alterações …”. E, noutro local (pág. 135), acrescenta que qualquer alteração que um condómino pretenda introduzir nas partes comuns para benefício da sua fracção terá de obter a aprovação das entidades legais respectivas e o acordo de todos os condóminos.
Mais incisiva ainda, Sandra Passinhas (ob. cit., pág. 32) conclui que a abertura de janelas ou de outro género nas paredes comuns carece de autorização dos condóminos.

Em conclusão:
Em vez do mero anúncio da intenção de realizar obras em partes comuns do condomínio e, mais do que isso, em vez do mero confronto do condomínio urbano com o facto já consumado, exigia-se da Ré uma linha de conduta semelhante à adoptada pelo anterior proprietário da fracção quando pretendeu abrir uma saída de emergência para o logradouro, submetendo a pretensão à necessária deliberação da Assembleia de Condóminos, a qual nisso consentiu.
No caso concreto, a R. para além de não ter pedido autorização para a execução das obras, viu contra si tomada uma deliberação negativa, no seguimento da discussão de um dos pontos da ordem de trabalhos da assembleia que precisamente tinha por conteúdo “pedido de autorização do condómino da fracção B para fazer obras nas partes comuns” (fls. 63 e 64).
Motivos bastantes para se concluir pela ilicitude da sua actuação e pela necessidade de ser reposta a situação que anteriormente se verificava.

3. Considera, porém, a apelante que a legitimidade da realização das obras encontra justificação no facto de representarem para o condomínio um benefício, pois que, quando forem concluídas, ficará assegurado o cumprimento da legislação contra riscos de incêndio do prédio.
Trata-se de um argumento falacioso.
A apelante pretende atribuir às obras que realizou, sem autorização e contra a vontade da maioria dos condóminos, para cumprimento de exigências administrativas alegadamente impostas à actividade que pretende exercer na fracção, uma finalidade altruísta, substituindo-a à vontade geral que foi manifestada na Assembleia de Condóminos.
Não podem confundir-se os planos, ou seja, o modo como a interessada na fracção B deverá cumprir exigências administrativamente impostas a determinado licenciamento, com outras que eventualmente possam ser impostas ao condomínio e relativamente às quais apenas terá sido despoletado um processo administrativo por requerimentos que foram apresentados pela própria apelante.
Não é legítimo à apelante impor ao Condomínio uma determinada obra só porque, em seu entender (e contra o entendimento de todos os restantes condóminos), a mesma cumprirá também uma exigência de ordem administrativa a que o Condomínio alegadamente se encontra vinculado.
Ainda que ressalte de alguma documentação junta aos autos uma situação de desconformidade do Condomínio Urbano relativamente ao projecto de construção que foi licenciado nos anos sessenta, no que especificamente respeita à protecção contra incêndios, nada permite concluir que o cumprimento de tais exigências passe, como a apelante pretende, pela realização das obras que por sua iniciativa exclusiva realizou.
De modo algum resulta evidente dos autos que a alegada situação de desconformidade em matéria de protecção contra incêndios imputável ao Condomínio possa ser resolvida, no todo ou em parte, através das obras que a apelante levou a cabo e que tiveram como único objectivo procurar ultrapassar exigências que lhe foram colocadas ao seu pretendido licenciamento de uma actividade de Bingo.
Ainda que porventura se pudesse asseverar a necessidade de o Condomínio realizar obras de protecção contra incêndios ou de outra qualquer natureza, jamais pode permitir-se que essa questão saia do campo onde deve ser apreciada, ou seja, da Assembleia de Condóminos, fazendo prevalecer sobre a vontade geral os interesses particulares de um determinado condómino que porventura veja dificultado o exercício de uma determinada actividade.
É da natureza da propriedade horizontal a sujeição dos interesses particulares aos interesses de ordem geral. A necessidade de compatibilizar direitos de propriedade exclusiva, com direitos de compropriedade e com condicionantes próprias do condomínio urbano impõe que cada assunto seja discutido na esfera adequada, sem que a qualquer condómino seja legítimo impor ao colectivo factos consumados, com justificações de pendor formal ou pretensamente altruístas como aquelas que agora foram trazidas pela apelante.
Em suma, além de não estar perfeitamente clarificada a exigência e a natureza das obras que o condomínio deverá realizar, a eventual realização de obras espontâneas ou coercivas deve sempre passar pela Assembleia de Condóminos respondendo esta, se e quando for oportuno ou necessário, às exigências que concretamente forem dirigidas ao Condomínio Urbano pelas entidades competentes, ou sujeitando à sua aprovação o projecto que seja considerado mais adequado.
Por certo que nessa eventualidade nada impede que exista uma compatibilização de interesses, ou seja, que a realização de obras pelo condomínio se conjugue com exigências impostas à apelante para o licenciamento de determinada actividade.
Mas estamos no campo das faculdades, bem diverso da situação de sujeição que a apelante invoca relativamente ao Condomínio Urbano.

4. Conclui ainda a apelante que as obras se devem considerar abarcadas pela autorização que foi dada ao anterior proprietário da fracção, sendo meramente complementares e destinando-se também a cumprir normas regulamentares de segurança contra incêndios ou outras.
Os factos provados não permitem dar uma resposta positiva a este argumento.
Com efeito, o referido proprietário solicitou e obteve autorização para, além do mais, abrir uma porta de emergência para o logradouro, a qual tinha determinadas dimensões.
Não pode considerar-se abarcada em tal autorização toda e qualquer obra só porque a apelante a integra nesse objectivo geral de cumprir exigências de natureza administrativa.
Não pode extrair-se de uma deliberação em que foi autorizada a implantação de uma porta que apenas acede ao logradouro junto à casa da porteira e à escada de acesso ao terraço superior a autorização expressa ou tácita para a implantação, pelo mesmo ou por outro qualquer interessado, de uma porta de maiores dimensões e que, além disso, ficou recuada cerca de um metro em relação à face da parede exterior.
Muito menos se pode considerar englobada em tal autorização a abertura que foi efectuada no muro de separação do logradouro da rampa da garagem.

5. Assevera a apelante que, tendo em consideração a ratio das obras realizadas e o facto de a fracção não poder ser usufruída sem que tais obras se encontrem concluídas, o bloqueio por parte do A. põe em crise o próprio direito da apelante, que ficaria esvaziado de uma parte significativa do seu conteúdo, sendo que a mudança de finalidade da fracção "B", deliberada por unanimidade, e a versão actual do título constitutivo ficariam desprovidas de qualquer conteúdo útil.
Trata-se de uma questão que também não encontra na matéria de facto qualquer sustentação.
Consta do título da propriedade horizontal, depois de ter sido alterado por escritura pública, na sequência de oportuna deliberação da Assembleia de Condóminos, que a fracção B se destina a “loja”.
Todavia, essa modificação não permite concluir que, a partir de então, o Condomínio Urbano tenha de se sujeitar, sem qualquer margem de liberdade, a toda e qualquer actividade que o proprietário da fracção B pretenda exercer no local, sem poder reagir de modo algum contra qualquer obra realizada pela apelante no sentido de ser obtido o licenciamento de uma determinada actividade e com total submissão aos interesses da apelante ou de qualquer outro titular da mesma fracção.
Por certo que os condóminos, depois de terem consentido na alteração do destino da fracção B (até então “garagem”), terão de aceitar que nela se exerçam actividades comerciais que se insiram na expressão “loja”, desde que devidamente licenciadas.
Mas com tal sujeição, que encontra eco no regime da propriedade horizontal, não pode confundir-se a vinculação da generalidade dos condóminos a uma atitude de mera passividade ou, mais do que isso, a uma conduta que se traduza numa total subordinação aos interesses particulares da apelante.
Cumpre mais uma vez acentuar o facto de a fracção onde a apelante pretende exercer uma certa actividade se inserir num edifício constituído em regime de propriedade horizontal, o que necessariamente a sujeita às condicionantes impostas por tal regime, sem que lhe seja legítimo impor aos demais condóminos os seus interesses que agora passam por uma actividade de Bingo, ma que amanhã podem porventura derivar para uma actividade de supermercado, de restaurante ou de estabelecimento de diversão nocturna.
A faculdade de ser exercida uma determinada actividade na fracção não coloca os demais condóminos perante uma atitude de sujeição a todas e quaisquer modificações nas partes comuns que se mostrem necessárias para aquele exercício.
Como bem o retratam as actas das reuniões da Assembleia de Condóminos, a maioria destes está convicta de que a destinação da fracção B à actividade de jogo de Bingo acarretará prejuízos para o condomínio.
Sem necessidade de fazer futurologia e partindo apenas com base em dados revelados pela experiência, o exercício de uma tal actividade na fracção B não deixará de se repercutir no condomínio urbano em geral e também nas condições em que vêm sendo usadas as demais fracções.
Sem dúvida que a actividade de jogo de Bingo, desde que licenciada, é legítima. Mas essa legitimidade não livra os demais condóminos de uma série de incómodos, devendo reconhecer-se-lhes também legitimidade para defenderem, pelos meios legítimos, os seus interesses, sem que tenham, só por isso, de abdicar do conjunto de regras que integram o estatuto da propriedade horizontal.
Se acaso não dispõem de dispositivos que lhes permitam vedar em absoluto o exercício daquela actividade, não existe qualquer base legal para que seja imposta à maioria dos condóminos uma atitude de incondicional colaboração com as alterações que a apelante, no seu exclusivo interesse, pretende realizar.

6. A resposta à questão anterior praticamente pode aproveitar-se para responder a uma outra de que o A. estaria a agir contra factum proprium.
À natureza absoluta do direito de propriedade que também abarca, ainda que mais moderadamente, a propriedade horizontal não são alheios comportamentos que se integrem em manifestações de abuso de direito que devam reputar-se ilegítimos.
Mas naturalmente que o condicionalismo de que dependem as restrições a tais direitos deve aqui ser sumamente ponderado, fazendo-o depender de um conjunto de factos ou de circunstâncias que revelem um uso manifestamente ilegítimo das faculdades conferidas aos condóminos.[1]
Neste campo não se vêem motivos para considerar ilegítima a actuação do Condomínio, sustentada numa larguíssima maioria do capital investido, quando recusou a autorização para a realização das obras.
A apelante pretende exercer na fracção B a actividade de Bingo.
Ora, sem embargo das afirmações em sentido diverso feitas pela apelante, são legítimas e compreensíveis as objecções dos condóminos, tendo em conta a perturbação que a actividade de Bingo é susceptível de provocar no uso das fracções e das partes comuns.
Se a maioria dos condóminos não vê em tal actividade os benefícios que a apelante apregoa e se, ao invés, existe a percepção, ainda que subjectiva, de que sairá prejudicado o sossego que porventura existe ou a segurança, trata-se de uma reacção que deve ser compreendida sem lhe assacar de imediato as consequências que a apelante pretende retirar e que na prática se revelariam através da sobreposição dos seus interesses individuais aos interesses colectivos.

7. Em conclusão, uma vez que as obras que nestes autos se discutem foram levadas a cabo pela Ré, sem ter obtido a necessária autorização dos condóminos, a mesma fica obrigada a repor a situação (Aragão Seia, ob. cit., pág. 137).
Nem o facto de alegadamente terem sido licenciadas pela CML interfere nessa consequência, pois que o plano de intervenção administrativa não se confunde nem se sobrepõe aos direitos dos condóminos exercidos no âmbito do regime da propriedade horizontal.

IV – Em conclusão:
Face do exposto, acorda-se em:
a) Negar provimento ao agravo, mantendo a decisão agravada;
b) Julgar improcedente a apelação, confirmando, ainda que com outra fundamentação, a sentença apelada.
Custas do agravo e da apelação a cargo da R.
Notifique.
Lisboa, 8-1-08


António Santos Abrantes Geraldes


Manuel Tomé Soares Gomes


Maria do Rosário Oliveira Morgado

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[1] Ac. do STJ, de 25-5-99, CJSTJ, tomo II, pág. 116, Ac. da Rel. de Guimarães, de 2-10-02, CJ, tomo IV, pág. 278.