INSOLVÊNCIA
MANDATO
PROCURAÇÃO
CADUCIDADE
Sumário

I- O mandato conferido a advogado por procuração com poderes forenses gerais, que veio a ser utilizado pelo devedor se apresentar à insolvência, mostra-se estranho à massa insolvente (artigo 110.º/1 do C.I.R.E.) e, por conseguinte, não se deve considerar que caducou com a declaração de insolvência do mandante.
II- A declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente (artigo 81.º/1 do C.I.R.E.).
III- Esta situação de indisponibilidade relativa não priva o insolvente de actuar em defesa dos seus interesses e, por isso, a lei prescreve que a representação do devedor pelo administrador da insolvência não se estende à intervenção do devedor no âmbito do próprio processo de insolvência, seus incidentes e apensos, salvo expressa disposição em contrário (artigo 81.º/4 e 5 do C.I.R.E.).
IV- O devedor tem, assim, legitimidade para requerer o incidente de destituição do administrador da insolvência (artigo 56.º do C.I.R.E.) ou para impugnar a resolução de actos em benefício da massa insolvente (artigo 125.º do C.I.R.E.) ou para invocar de nulidade processual no âmbito do apenso de reclamação e verificação de créditos (artigos 201.º e 205.º do C.P.C.) ao abrigo de procuração junta aos autos.
(SC)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

Relatório do P. 1610/2008

1. V. […] Lda. apresentou-se à insolvência em 24-1-2007.

2. Os seus sócios V. e Z. constituíram seu procurador o advogado C. […] ( fls. 23)

3. A insolvência foi decretada por sentença de 24-1-2007 (fls. 92/93)

4. A insolvente por requerimento de 1-10-2007 (fls. 398) representada pelo referido advogado deduziu incidente de destituição de administrador da insolvência nos termos do artigo 56.º do C.I.R.E.

Relatório do P. 1629/2008

5. Estes autos respeitam ao apenso de reclamação de créditos.

6. Proferida sentença de verificação e graduação de créditos (fls. 16/18) V.M.M., representada pelo referido advogado, suscitou incidente de nulidade por falta de notificação do pedido de aclaração deduzido pela reclamante Auto […] SA (fls. 39) e do requerimento de interposição de recurso dos quais apenas teve conhecimento com a notificação da decisão que indeferiu o pedido de aclaração e admitiu o recurso interposto pelo Banco […]

Relatório do P. 1630/2008

7. V.M.M, representada pelo referido advogado (ver supra) deduziu, por apenso aos autos de insolvência, incidente de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente.

8. O incidente resulta de o Sr. administrador da insolvência ter notificado a sociedade J. […] Lda. para proceder à entrega de determinados bens de forma a proceder aos respectivos autos de arrolamento e apreensão.

9. Nesse incidente considera a requerente que o administrador de insolvência estava impedido de proceder nos termos referidos pois encontra-se pendente incidente de destituição que apenas lhe permite, na respectiva pendência, praticar actos urgentes e de mero expediente.

10. Mais alega que prescreveu o direito à resolução dos ditos negócios a favor da massa insolvente; impugna, nos termos do artigo 125.º do CIRE, a resolução em benefício da massa insolvente.

Decisão do Tribunal

11. O Tribunal proferiu decisão idêntica relativamente a todos os casos indicados.

12. Considerou-se nessa decisão (fls. 428/429 do ap. 1610, fls. 97/98 do ap. 1629, fls. 33 do ap. 1630) que, face ao disposto no artigo 110.º/1 do C.I.R.E., todos os contratos de mandato que não se mostrem estranhos à massa insolvente caducam com a declaração de insolvência do mandante.

13. Com a declaração de insolvência fica imediatamente privado o insolvente, por si ou por seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa os quais passam a competir ao administrador.

14. Assim sendo, não tem o mencionado advogado poderes para, em nome da insolvente, intentar o incidente de destituição do administrador apresentado a fls. 398/413, ou os requerimentos de fls. 62/67 e 69/73 no ap. 1629 ou o incidente de impugnação de resolução em benefício da massa insolvente.

15. Foi ordenado o desentranhamento dos requerimentos e condenada a apresentante em custas.

Recurso

16. Foi interposto recurso das decisões admitido e minutado como recurso de agravo. Está interposto pelo B. […] SA recurso de apelação da sentença de verificação e graduação de créditos cujo conhecimento está dependente do agravo interposto por V.M.M. da decisão que ordenou o desentranhamento do requerimento sobre o incidente de reclamação com fundamento em nulidade

17. Nas suas alegações (P. 1610) refere o recorrente que, com o incidente de destituição do administrador, tem-se em vista assegurar que a massa insolvente seja administrada de uma forma diligente, honesta e competente o que preenche a previsão constante do artigo 110.º/2, alínea a) do C.I.R.E., não se podendo interpretar o artigo 110.º/1 do C.I.R.E, sob pena de inconstitucionalidade, de tal modo que ficasse o devedor privado do direito à representação judicial. A própria lei, aliás, admite a representação do devedor no âmbito do processo de insolvência, seus incidentes e apensos, salvo expressa disposição em contrário, daí decorrendo a legitimidade do insolvente para deduzir o presente incidente. A circunstância da procuração não estar datada constitui irregularidade processualmente sanável.

18. Nas suas alegações (apenso 1629), para além do que já referira nas demais alegações, salientou o recorrente que seria inconcebível que a insolvente ficasse desprovida do direito de se representar em juízo, deduzindo os incidentes em que é parte interessada; se assim fosse, seria inconstitucional uma tal interpretação obtida a partir da declaração de caducidade do mandato.

19. Nas suas alegações (apenso 1630) sustenta o recorrente que as procurações atingidas pela caducidade não podem ser outras senão aquelas que dizem respeito ao património integrante da massa insolvente.

20. Ainda que assim se não entenda, sustenta o recorrente que a situação se encontra expressamente prevista no artigo 110.º/2, alínea a) do C.I.R.E. pois pretendendo-se evitar prejuízos previsíveis para a massa insolvente, cabe a tutela desta situação ao mandatário da insolvente visto que, a não ser assim, verificava-se conflito de interesses com o administrador pois a impugnação é deduzida contra a massa insolvente que está agora representada pelo administrador da insolvência, aquele de quem se espera que tome as providências a que alude aquele preceito.

21. A legitimidade activa para impugnar a resolução deduzida pelo administrador da insolvência compete ao próprio insolvente pois ninguém melhor do que ele sabe o destino dado aos seus bens. Ora, assim sendo, como poderia o devedor requerê-la em juízo se não pudesse estar representado por advogado por suposta caducidade do mandato. O devedor não fica, com a insolvência , privado de se fazer representar em juízo. O mandatário está a actuar em defesa do interesse do insolvente mas também dos seus representantes.

Apreciando:

22. A questão a apreciar nestes recursos é a de saber se caduca com a sentença que declara a insolvência o mandato conferido pelo próprio devedor que se apresentou à insolvência; suscita-se outra questão, saber se o devedor não pode actuar no âmbito do contencioso falimentar na defesa dos interesses próprios que tenha por prejudicados no exercício dos poderes de administração da massa insolvente cuja representação passou a caber ao administrador da insolvência (artigo 81.º/4).

23. Como resulta do artigo 81.º/ 1 do C.I.R.E. sem prejuízo do caso contemplado na lei em que a administração da massa insolvente continua a caber ao devedor, a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência.

24. Tem-se entendido, embora não unanimemente, que o falido/insolvente, com a perda do poder de administração e disposição dos bens integrantes da massa falida/insolvente, fica numa situação de indisponibilidade relativa, salvaguardando-se, assim, a massa insolvente dos actos que ele possa indevidamente praticar sobre o referido património autónomo.

25. Fora deste âmbito, o insolvente conserva a sua capacidade de exercício, pois a insolvência não se traduz, para o insolvente, numa incapacidade de exercício ( ver Ac. do S.T.J. de 18-3-2004 (Ferreira de Almeida) - P. 591/2004 - in www.dgsi.pt).

26. Assim, a partir da declaração de insolvência, por força da indisponibilidade que atinge o devedor relativamente à administração e disposição dos bens integrantes da massa, pode ele vir a encontrar-se numa situação de conflito com a administração da massa: a indisponibilidade relativa que a insolvência origina não retira ao devedor interesse no acompanhamento e fiscalização do exercício da administração da massa insolvente por forma a assegurar-se de que, com a liquidação, ficam ressarcidos os credores com o melhor aproveitamento do activo patrimonial; de igual modo pode também ocorrer um conflito de interesses entre os próprios credores interessados no ressarcimento dos respectivos créditos que vêem no activo constituído pela massa insolvente “ apenas a contrapartida financeira para o ressarcimento dos créditos” e o interesse do devedor na “ obtenção de um lucro ou de qualquer outro propósito distinto do pagamento aos credores (pelo menos como um fim em si) (P. N.º E/1098 do Conselho Geral da Ordem dos Advogados relatado por José Miguel Júdice in R.O.A., Ano 58, Julho de 1998, pág. 1021/1030).

27. Não constituiria surpresa que a lei continuasse a reconhecer, com a declaração de insolvência, a subsistência dos mandatos outorgados pelo devedor, limitando-se, por força da indisponibilidade, a representação aos actos que o devedor não pode praticar por se encontrarem abrangidos no âmbito da administração e disposição de bens da massa insolvente subtraída ao insolvente, limitação que o C.P.C. qualificava de inibição (artigo 1189.º). Neste preceito, porém, o âmbito da inibição afigura-se mais amplo do que a indisponibilidade actual visto que prescrevia o n.º 3 que o “ administrador da falência fica a representar o falido para todos os efeitos, salvo quanto ao exercício dos seus direitos exclusivamente pessoais estranhos à falência”. Ainda assim, para além do controlo exercido pelo síndico da falência, o próprio falido gozava de legitimidade para reclamar de irregularidades da liquidação (artigo 1250.º do C.P.C.), podia recorrer da sentença de verificação e graduação (artigo 1236.º do C.P.C.)

28. Contrariamente ao disposto no artigo 167.º do C.P.E.R.E.F., o actual artigo 110.º do C.I.R.E. prescreve a regra da caducidade com a declaração de insolvência dos contratos de mandato, incluindo os de comissão, que não se mostre serem estranhos à massa insolvente, caducando as procurações que digam respeito ao património integrante da massa insolvente, fundamento de caducidade a acrescer aos que constam do artigo 1174.º do Código Civil.

29. O mandato conferido para apresentação à insolvência é estranho à massa insolvente porque prévio à sentença que declara a insolvência, tal como é estranha a procuração conferida.


30. Os artigos 110º e 112º do C.I.R.E. que se basearam no artigo 110.º do Anteprojecto seguem uma solução “ geral idêntica à que se acolhia naquele preceito do Anteprojecto” (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Quid Juris, 2005, pág. 420) segundo o qual, no n.º1, “ os contratos de mandato e de comissão, bem como as procurações que tenham por objecto bens da massa insolvente caducam com a declaração de insolvência do mandante ou comitente”. Não se vê que seja o caso de mandato conferido previamente à declaração de insolvência com atribuição de poderes forenses gerais. Voltaremos a este ponto.


31. A subsistência do mandato, pressupondo-se que o mandato caducou, é que não deve ser reconhecida pelo facto de se considerar in casu aplicável a excepção a que se refere o artigo 110.º/2, alínea a) do C.I.R.E segundo a qual o mandato se mantém ” caso seja necessária a prática de actos pelo mandatário para evitar prejuízos previsíveis para a massa insolvente, até que o administrador da insolvência tome as devidas providências”

32. Os prejuízos serão aqueles que resultam do facto de, por virtude da caducidade, não poder actuar o mandatário num momento em que o administrador designado ainda não poderia ou dificilmente poderia actuar para os evitar. São actos destinados a evitar prejuízos para a massa insolvente dado que, a partir da declaração de insolvência, o devedor perde a disponibilidade de praticar quaisquer actos relativos à massa insolvente.

33. No caso vertente estamos completamente fora do âmbito desta excepção, pois o devedor pretende a destituição do administrador por mau exercício das funções, impugna a resolução de actos que tem por praticados em prejuízo da massa insolvente e suscita nulidades processuais no âmbito do apenso de reclamação de créditos.

34. Refira-se, porém, que, ainda que se siga o entendimento de que a procuração e mandato conferidos pelo devedor caducam com a declaração de insolvência, isso não implica no que respeita às aludidas pretensões - o pedido de destituição do administrador da insolvência (artigo 56.º do C.I.R.E), a impugnação da resolução (artigo 125.º do C.I.R.E.), a invocação de nulidade processual (artigos 201.º e 205.º do C.P.C.) - que não devam elas chegar sequer a ser apreciadas, ordenando-se imediato desentranhamento dos requerimentos.

35. Se o insolvente apenas perde, com a declaração de insolvência, o poder de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente, o insolvente continua a poder exercer por si todos os demais actos que lhe importem designadamente no âmbito do contencioso falimentar. A lei expressamente refere no artigo 81.º/4 e 5 do C.I.R.E. que a representação do devedor pelo administrador da insolvência para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência não se estende à intervenção do devedor no âmbito do próprio processo de insolvência, seus incidentes e apensos, salvo expressa disposição em contrário.

36. Tal como se disse, se o devedor tem compreensível e justificado interesse em que a administração da massa insolvente não lhe seja prejudicial, não se vê que a lei retire ao devedor - bem pelo contrário, veja-se o n.º1 do artigo 56.º do C.I.R.E. - a possibilidade de requerer a destituição com justa causa do administrador da insolvência; de igual modo, na impugnação da resolução, está em causa um conjunto de actos praticados pelo devedor antes da declaração de insolvência cuja validade e não prejudicialidade para a massa insolvente ele tem todo o interesse em ver reconhecida: o conflito é directo nestes casos entre a massa insolvente representada pelo administrador e o devedor.

37. Como já referia o Conselheiro Pedro Macedo “ a legitimidade processual segue a legitimidade negocial. A legitimidade processual é entregue ao administrador pelas mesmas razões por que se transfere a legitimidade negocial, isto é, como consequência da substituição que resulta da ilegitimidade que sofre o falido” (Manual de Direito das Falências”, Pedro Macedo, Vol II, 1968, pág. 109; tenha-se em atenção que este autor qualifica de ilegitimidade a situação do falido, preferindo-se hoje maioritariamente qualificar-se a sua situação de indisponibilidade).

38. Não retirando a lei ao devedor o direito de praticar actos que não se traduzam em actos de administração ou disposição do património autónomo que, como se disse, é constituído pela massa insolvente e não lhe retirando em termos absolutos (veja-se, porém, o artigo 82.º/2 do C.I.R.E.) o direito à defesa dos interesses desse património, que é seu, em resultado de actos de terceiros que o lesem ou do próprio administrador, não pode deixar de se lhe reconhecer legitimidade processual de acordo com o princípio que resulta do artigo 2.º/2 do C.P.C.

39. A admitir-se que o mandato caducou, a situação que decorre de o devedor agir por intermédio de advogado sem procuração está contemplada no artigo 40.º do C.P.C.

40. Assim, o Tribunal, em vez de determinar o desentranhamento do requerimento, sempre deveria fixar prazo para suprimento do vício nos termos do artigo 40.º/2 do C.P.C.

41. Não parece, no entanto, coerente considerar-se que o insolvente pode continuar a agir por intermédio dos seus representantes no que respeita a actos que sejam alheios à administração e disposição da massa insolvente - veja-se que o artigo 82.º/1 do C.I.R.E. prescreve que os órgãos sociais do devedor mantêm-se em funcionamento após a declaração de insolvência - e ao mesmo tempo considerar-se que estão ipso facto caducadas as procurações e mandato outorgados. Estão, sem dúvida, caducadas se respeitarem ao património integrante da massa insolvente, não se mostrando estranhos à massa (artigos 110.º/1 e 112.º/1 do C.I.R.E.).

42. No caso em apreço a procuração junta aos autos confere poderes forenses gerais e, por isso, parece de entender que não se poder considerar caducado o mandato por ela conferido visto que tal procuração pode valer para todos os actos que não tenham por objecto bens da massa insolvente.

43. Dir-se-á que a letra da lei, no que ao mandato respeita, exige para a sua subsistência que se mostre serem os contratos de mandato estranhos à massa insolvente e, por conseguinte, desde logo por força das regras do ónus da prova, o mandato não deveria ser tido por subsistente.

44. No caso de procuração com poderes gerais o mandato deve considerar-se subsistente, nos termos da lei, quanto àqueles actos de que o devedor não esteja privado de exercício, ou seja, quanto a todos aqueles actos em que não esteja cometida, por lei, a representação ao administrador da insolvência. Se foi conferida pelo devedor procuração com poderes forenses gerais a um mandatário, se é reconhecido ao devedor, do ponto de vista substantivo, legitimidade para a prática de determinados actos, a que título se vai considerar caducado o mandato? Não seria, nesta linha de pensamento, um contra-senso considerar-se o mandato caducado e, depois, reconhecer-se que o devedor pode outorgar mandato para a prática de actos ao abrigo dos quais já lhe fora conferida procuração, fixando-se, como se referiu anteriormente, prazo para junção de procuração que sempre está junta aos autos?

45. Por outras palavras: se reconhecemos que o devedor tem legitimidade substantiva para praticar actos que não sejam daqueles que, respeitantes à massa insolvente, de natureza patrimonial, têm a representação cometida ao administrador da insolvência, então não podemos deixar de considerar subsistente o mandato e a procuração conferidos ao mandatário salvo se, de um e de outra, resultar que têm por objecto actos não estranhos à massa insolvente.

46. Ora, demonstrando-se que a procuração foi outorgada com poderes forenses gerais, então não pode deixar de se considerar provado que ela subsiste relativamente a todos os actos que sejam estranhos à massa insolvente e são estranhos à massa insolvente os actos em que o devedor pretende exercer direitos que são alheios á administração e disposição da massa ou que não estejam cometidos ao administrador da insolvência, tal o caso dos actos acima indicados.

47. Isto não quer dizer, como é evidente, que as pretensões em si sejam atendíveis tanto por razões de ordem substantiva como processual.

48. Por isso, afigura-se-nos que o Tribunal agiu bem quando, no decurso dos autos de insolvência e apensos, foi notificando o devedor das sucessivas ocorrências processuais.

49. O conhecimento do recurso de apelação interposto pelo Banco B. […] SA não pode ser apreciado enquanto não se decidir o incidente de nulidade de fls. 62 a 65 do ap. 1629

Concluindo:

I- O mandato conferido a advogado por procuração com poderes forenses gerais, que veio a ser utilizado pelo devedor se apresentar à insolvência, mostra-se estranho à massa insolvente (artigo 110.º/1 do C.I.R.E.) e, por conseguinte, não se deve considerar que caducou com a declaração de insolvência do mandante.
II- A declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente (artigo 81.º/1 do C.I.R.E.).
III- Esta situação de indisponibilidade relativa não priva o insolvente de actuar em defesa dos seus interesses e, por isso, a lei prescreve que a representação do devedor pelo administrador da insolvência não se estende à intervenção do devedor no âmbito do próprio processo de insolvência, seus incidentes e apensos, salvo expressa disposição em contrário (artigo 81.º/4 e 5 do C.I.R.E.).
IV- O devedor tem, assim, legitimidade para requerer o incidente de destituição do administrador da insolvência (artigo 56.º do C.I.R.E.) ou para impugnar a resolução de actos em benefício da massa insolvente (artigo 125.º do C.I.R.E.) ou para invocar de nulidade processual no âmbito do apenso de reclamação e verificação de créditos (artigos 201.º e 205.º do C.P.C.) ao abrigo de procuração junta aos autos.


Decisão: concede-se provimento a todos os recursos de agravo e, consequentemente, revogando-se a decisão proferida, considera-se que subsiste o mandato conferido ao mandatário pela procuração com poderes forenses gerais junta aos autos, impondo-se ao Tribunal apreciar os requerimentos apresentados ficando, deste modo, prejudicado o conhecimento da apelação.

Sem custas


Lisboa, 6 de Março de 2008

(Salazar Casanova)

(Silva Santos)

(Bruto da Costa)