Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CONTRA-ORDENAÇÃO
EXPLORAÇÃO DE PEDREIRAS
Sumário
1.O Decreto-Lei nº 270/2001 de 6 de Outubro de 2001, do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território aprovou o regime jurídico da pesquisa e exploração de massas minerais-pedreiras, revogando o Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de Março o qual, por seu lado, estabelecera o regime jurídico em matéria de exploração de massas minerais-pedreiras, dando cumprimento ao mandato contido no Decreto-Lei n.º 90/90 e que estabeleceu o regime geral dos recursos geológicos, remetendo, no seu artigo 51.º, para legislação própria a fixação de disciplina específica aplicável a cada tipo de recurso. Desde então, o Decreto-Lei n.º 89/90 passou a ser a designada “ lei das pedreiras”, na qual se baseou a exploração desta importante actividade a nível nacional, face ao seu alto valor de exportação e directamente ligada ao aproveitamento de um recurso natural escasso.
2.Entre as mais importantes alterações legislativas coube ali salientar as relativas ao procedimento de atribuição de licença, de modo a tornar independente o regime jurídico relativo à licença de pesquisa e de exploração. Com a dita legislação sobre exploração de pedreiras pretendeu-se essencialmente garantir uma exploração de inertes sustentada, tendo em conta o elevado interesse económico de exportação e os valores ambientais e paisagísticos.
3.O simples agricultor, que tal como muitos, desde tempos imemoriais, trabalham a terra, para lhe dar proveito agrícola, “limpa” um terreno seu de “inertes”, vulgo pedra-pomes ou cascalho para aumento apenas de área agrícola útil, não pratica dessa forma, uma actividade de “ revelação”, “aproveitamento” e exploração de pedreira”, nem tal conduta é sancionável como contra-ordenação por não ser susceptível de exigência de apresentação de toda uma panóplia documental tendente à obtenção de licença para o efeito. O proveito agrícola, mesmo quando afirmável, é bem diferente de proveito económico relacionado e decorrente da exploração de inertes.
Texto Integral
I-RELATÓRIO
1.1- A Direcção Regional do Ambiente instaurou processo de contra-ordenação contra o arguido J… , nascido a 22/07/1952, na freguesia de S… , em V… , casado, agricultor pelos factos e fundamentos constantes do auto de notícia de fls. 04. Notificado o arguido, nos termos e para os efeitos do artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, alegou que não cometeu a contra-ordenação que lhe é inculcada, porquanto não procedeu à escavação de minérios, com vista à sua pesquisa e exploração, antes tendo procedido à escavação, tão só com o propósito de nivelar o terreno para exploração agrícola.
Por decisão administrativa da Direcção Regional do Ambiente, datada de 15 de Junho de 2007, foram considerados assentes os seguintes factos:
1-Pelas 16 horas, do dia 05 de Janeiro de 2007, o arguido J… fazia exploração de massas minerais na sua propriedade, mais precisamente, na encosta de um monte ali situado, no sítio conhecido por T … , freguesia de S…, concelho de V…, sem que para o efeito possuísse a respectiva licença administrativa.
2-Que o arguido é proprietário dos terrenos a que se alude em 1., os quais fazem parte da sua exploração agrícola.
3-Na zona alta do prédio, o arguido já teve vinha, a qual se encontra há alguns anos sem ser cultivada; a zona baixa do prédio está cultivada há alguns anos.
4-Em data não concretamente apurada mas situada próxima da data referida em 1, o arguido fez algumas movimentações de terra naquela zona do sopé do cabeço, com o objectivo de conseguir área útil arável, tendo aproveitado para nivelar o resto do terreno na zona mais baixa, o que lhe permitia operar melhor com as máquinas agrícolas.
5-Nestas operações, o arguido retirava a capa de terreno fértil para o lado, removendo o cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno; logo após, devolvia a capa de terreno fértil à anterior posição.
6-O arguido ofereceu o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha dos animais.
Concluiu a Direcção Regional do Ambiente que o arguido incorreu na prática da contra-ordenação p. e p. pelo artigo 59.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro, por violação expressa do preceituado nos n.º s 1 e 2 do artigo 10.º do mesmo diploma legal, ou seja, pelo facto de o arguido proceder à exploração de massas minerais, sem que fosse titular de licença que o habilitasse a tanto.
Com os fundamentos de facto e de direito supra, a Direcção Regional do Ambiente aplicou ao arguido coima no valor de € 2.493,99 (dois mil, quatrocentos e noventa e três euros e noventa e nove cêntimos), por infracção ao disposto no artigo 10.º, n.º s 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 6 de Outubro, o que constitui a contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 59.º, n.º 1, alínea a) do mesmo diploma legal.
Entendeu a edilidade administrativa que o arguido tinha uma perfeita consciência da ilicitude dos factos, que actuou dolosamente e que não tirou qualquer benefício monetário imediato com a extracção ou exploração dos inertes. Mais aduz que o objectivo principal da movimentação era o de conquistar área arável para o terreno já cultivado, acrescentando-o, facto que, embora não quantificado, se traduz em evidente benefício económico para o arguido, pois, que, aumentando a área arável, aumenta também o valor comercial do seu terreno.
Quanto à situação económica do arguido, não foi efectuada prova da mesma, pelo que não se atendeu a tal factor na determinação concreta da medida da coima.
1.2- Notificado da decisão administrativa condenatória, o arguido impugnou-a judicialmente, através de recurso.
Alegou, para tanto e, em síntese, que:
-os factos imputados ao arguido não integram a exploração de pesquisa e massas minerais, porquanto a conduta do arguido cingiu-se tão-somente a nivelar o terreno;
-os inertes em causa são pedra-pomes ou púmice (vulgo, cascalho branco), que consiste em rocha vulcânica de baixa densidade, sem qualquer valor comercial;
-no caso concreto, não está em causa a pesquisa ou a exploração de massas minerais; quando muito, trata-se de uma acção de aterro ou escavação;
-a existir alguma violação seria a prevista na alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, caso tenham por objecto fins não exclusivamente agrícolas, pecuários, florestais ou mineiros ou à alínea b) do n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, onde é referido que carecem de licença da câmara municipal as acções de aterro ou escavação que conduzam à alteração do relevo natural e das camadas de solo arável;
-não são estes os factos e os ilícitos imputados ao arguido no auto de notícia, sendo certo que, para que tal condenação pudesse ocorrer a entidade autuante teria que ser a Câmara Municipal e o processo de contra-ordenação não poderia ser o presente;
-a considerar-se que a conduta do arguido integra a contra-ordenação pela qual lhe foi aplicada coima, o mesmo não actuou com consciência da ilicitude, pois seria necessário que existisse percepção do arguido de que poderia estar a extrair uma massa mineral com valor comercial e que precisava de licença de pesquisa e exploração para retirar a mesma, a fim de nivelar o terreno e que, se assim não procedesse, estaria a incorrer em infracção contra-ordenacional.
Concluiu o arguido, pugnando pela revogação da decisão condenatória e” pela sua substituição por outra, que absolva o recorrente da contra-ordenação que lhe é imputada ou, se assim não se entender, que aplique ao recorrente uma admoestação ou uma coima especialmente atenuada para metade do limite mínimo”.
1.3-Procedeu-se ao julgamento , na sequência do qual foi proferida a 6 de Novembro de 2007 a seguinte decisão (de absolvição) e que foi, então, objecto do presente recurso do MºPº para esta Relação :
“(…)
Factualidade provada:
Com relevo para a decisão da causa, em virtude da prova documental e testemunhal produzida, considero assente a seguinte factualidade:
1-No dia 05 de Janeiro de 2007, o arguido J… , extraiu pedra-pomes, vulgo cascalho-branco, da encosta de um monte, sito na T… , freguesia de S… , concelho de V… , sem que possuísse a respectiva licença administrativa.
2-O arguido é proprietário dos terrenos a que se alude em 1., os quais fazem parte da sua exploração agrícola.
3-Na zona alta do prédio, o arguido já teve vinha, a qual se encontra há alguns anos sem ser cultivada; a zona baixa do prédio está cultivada há alguns anos.
4-Em data não concretamente apurada, mas situada entre Outubro e Novembro de 2006, o arguido fez algumas movimentações de terra naquela zona do sopé do cabeço, com o objectivo de conseguir área útil arável, tendo aproveitado para nivelar o resto do terreno na zona mais baixa, o que lhe permitia operar melhor com as máquinas agrícolas, tendo obtido, por conseguinte, cerca de 1000 metros quadrados de terreno arável.
5-Nestas operações, o arguido retirou a capa de terreno fértil para o lado, removendo cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno; logo após, devolveu a capa de terreno fértil à anterior posição.
6-O arguido ofereceu o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha e nos currais dos animais.
7-Mais se provou que:
8-A pedra-pomes, vulgo cascalho -branco não tem valor comercial e é uma massa mineral.
9-O arguido nunca vendeu pedra-pomes.
10-Aufere mensalmente cerca de € 600,00 (seiscentos euros) resultantes da actividade da lavoura.
11-Vive com a esposa e tem três filhos, dois deles já casados; o outro tem vinte anos e trabalha com o arguido.
12-Vive em casa própria, não pagando qualquer renda.
13-Efectua mensalmente despesas com máquinas agrícolas em quantia não apurada.
14-A esposa é doméstica.
15-Como habilitações literárias tem a 4.ª classe.
*
Factos não provados:
Inexistem, com relevo para a decisão da causa.
*
Da motivação da matéria de facto:
A convicção do tribunal baseou-se na análise crítica da prova documental produzida, designadamente, no auto de notícia de fls. 4 e 4 verso, em conjugação com as fotografias de fls. 6 e com as declarações prestadas pelo arguido, de forma clara, idónea, objectiva e regular, pelo que foram merecedoras de credibilidade ao tribunal.
Confirmou, no essencial, que, em meados de Outubro ou Novembro de 2006, fez uma movimentação de terrenos na encosta de um monte, sito na T… , o qual lhe pertencia.
Referiu que o fez para tornar o terreno mais arável e, por conseguinte, conseguir ganhar mais área de cultivo, o que concretizou, pois ganhou cerca de 1000 metros de área arável.
Disse que a pedra-pomes, também conhecida por cascalho branco, não serve para nada, pois não tem qualquer valor comercial; referiu que nunca vendeu pedra-pomes e que, tanto quanto sabe ninguém a comercializa, pois a única finalidade que tem é a de ser espalhada nas zonas de ordenha e nos currais dos animais, nem sequer servindo para a construção civil.
Disse que removeu cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco, estando em crer que não precisava de licenciamento para a remoção dos minerais, pois o único fito com que agiu foi o de nivelar o terreno para conseguir área útil para a actividade agrícola, tendo o arguido referido que não pesquisou nem explorou massas minerais, não as vendeu, nem desenvolve ou vive da sua extracção considerada enquanto actividade.
O tribunal teve, igualmente, em consideração o depoimento da testemunha A… , vigilante da natureza, que foi quem redigiu o auto de notícia junto aos autos, a qual depôs de forma clara, isenta e objectiva.
A testemunha verificou a existência de uma movimentação de terrenos na encosta de um monte, sito na T… e que dali haviam sido extraído inertes, mais precisamente pedra-pomes.
Confirmou que a pedra-pomes é uma massa mineral que não serve para a construção civil e que é utilizada pelos agricultores para efectuar lameiras, ou seja, para utilizar nos currais das vacas. Disse não conhecer ninguém que efectue a exploração comercial de pedra-pomes nesta Ilha, o que também foi corroborado pelas testemunhas E… e G... , tendo estes referido que a pedra-pomes não tem valor comercial.
E… e G… , conhecidos do arguido, confirmaram, de forma isenta, idónea e objectiva, que o arguido nunca vendeu pedra-pomes e que apenas lhes ofereceu alguma, nos finais do ano passado, por a ter retirado do seu terreno da T… , o que fez para ganhar terreno arável; as testemunhas referiram que utilizaram a pedra-pomes nos currais das vacas, única finalidade que conhecem ao inerte.
Analisado o teor do auto de notícia de fls. 4, verificou-se que o vigilante da natureza, seu subscritor, nele apôs que «o senhor J… se encontrava a fazer exploração de massas minerais na sua propriedade (…)».
Perguntado ao vigilante da natureza, A… o que queria dizer com “fazer exploração de massas minerais”, atendendo a que tal expressão reveste natureza conclusiva, o mesmo concretizou que apôs no auto que a situação era de “exploração” porque viu que estavam a ser retiradas massas minerais.
Disse, contudo, que não sabe que fim foi dado pelo arguido à referida pedra-pomes extraída do local nem tão pouco sabe se o arguido comercializa ou não este inerte,
Inexistem elementos probatórios que infirmem os supra referidos.
*
Do direito:
O arguido J… foi condenado pela infracção ao disposto no artigo 10.º, n.º s 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro, o que constitui a contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 59.º, n.º 1, alínea a) do mesmo diploma legal.
Estatui o artigo 10.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro que «a pesquisa e a exploração de massas minerais só podem ser conduzidas ao abrigo de licença de pesquisa ou de exploração, conforme for o caso, carecendo a sua atribuição de pedido do interessado que seja proprietário do prédio ou tenha, com este, celebrado contrato, nos termos do presente diploma.
Adita o n.º 2 do mesmo comando normativo que «As licenças definirão o tipo de massas minerais e os limites da área a que respeitam.»
Por seu turno, o 59.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro, estatui que «Constitui contra-ordenação punível com coima de € 2.493,99 a e 44.891,81, a exploração de massas minerais sem licença».
O artigo 2.º, alínea k) do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro, define como massas minerais, as rochas e ocorrências minerais não qualificadas legalmente como depósito mineral.
Efectuado o julgamento, apurou-se que o arguido extraiu pedra-pomes, vulgo cascalho branco, que é uma massa mineral, da encosta de um monte, sito na T… , freguesia de S. .., concelho de V…. , sem que para o efeito possuísse a respectiva licença administrativa.
O arguido é proprietário destes terrenos, os quais fazem parte da sua exploração agrícola.
Com vista a nivelar o terreno, o arguido fez algumas movimentações de terra naquela zona do sopé do cabeço, com o objectivo de conseguir área útil arável, tendo aproveitado para nivelar o resto do terreno na zona mais baixa, o que lhe permitia operar melhor com as máquinas agrícolas, tendo obtido, por conseguinte, cerca de 1000 metros quadrados de terreno arável.
Nestas operações, o arguido retirou a capa de terreno fértil para o lado, removendo cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno; logo após, devolveu a capa de terreno fértil à anterior posição.
O arguido ofereceu o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha e nos currais dos animais, não tendo obtido qualquer proveito comercial, pois não vendeu a pedra-pomes nem nunca se dedicou a qualquer actividade económica que tivesse por pilar a extracção de minérios.
A pedra-pomes extraída teve por único fito o de nivelar o terreno com vista à obtenção de uma maior área que pudesse ser aproveitada para a agricultura. Sempre diremos que o arguido tirou benefício da extracção das massas minerais, embora não fosse um lucro comercial. O benefício obtido foi o de ganhar maior área de cultivo.
O artigo 10.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro estabelece a necessidade de licenciamento para as actividades de pesquisa e exploração de minérios.
No artigo 2.º, alínea l) do mesmo diploma legal, define-se como pesquisa «o conjunto de estudos e trabalhos, anteriores à fase de exploração, que têm por fim o dimensionamento, a determinação das características e a avaliação do interesse económico do aproveitamento de massas minerais, nela se compreendendo os trabalhos de campo indicados no anexo I deste diploma».
Todavia, não definiu o legislador o que se deve entender por actividade de exploração de massas minerais, para efeitos de obtenção de licenciamento, pelo que, nos teremos de socorrer de uma interpretação sistemática, atendendo, designadamente, ao elemento literal, à ratio legis, ao espírito do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro e ao bem jurídico por ele protegido.
Pegando no Preâmbulo de tal diploma legal, podemos ver que o bem jurídico protegido é o ambiente.
O direito ao ambiente e à qualidade de vida são valores constitucionalmente tutelados (artigo 66.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa).
A Lei Fundamental garante, ainda, dignidade constitucional à protecção e fomento do desenvolvimento sustentável -artigo 66.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, estabelecendo na alínea d), que é incumbência do Estado a promoção do aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio de solidariedade entre gerações.
Por seu turno, a Lei de Bases do ambiente – Lei n.º 11/87, de 07 de Abril, define o solo vivo e o subsolo como uma componente ambiental natural, impondo a defesa e valorização do solo como recurso natural, através da adopção de medidas conducentes à sua racional utilização, ao evitar da sua degradação e à promoção da sua fertilidade e regeneração e estabilidade ecológica (artigos 6.º, alínea d) e 13.º, n.º 1, ambos da LBA).
Numa linha de proporcionalidade há que assegurar, por um lado, a protecção do meio ambiente e, por outro, a protecção ao desenvolvimento económico. «O princípio constitucional do desenvolvimento sustentável obriga assim à “fundamentação ecológica” das decisões jurídicas de desenvolvimento económico, estabelecendo a necessidade de ponderar tanto os benefícios de natureza económica como os prejuízos de natureza ecológica de uma determinada medida, afastando por inconstitucionalidade a tomada de decisões insuportavelmente gravosas para o ambiente.» (VASCO PEREIRA DE SILVA, Verde cor de direito, Almedina).
Concretizando o conceito de “exploração” e partindo de juízos de normalidade, das regras da experiência comum e do conceito comummente utilizado pelo homem médio, diríamos que, por “exploração” se entende «pesquisa, sondagem, desenvolvimento de negócio para fins especulativos» (vide in Dicionário Enciclopédico da Língua Portuguesa, Publicações Alfa), «acto ou efeito de explorar; investigação; especulação; empresa; conjunto de bens que constituem o suporte da actividade da empresa e que se tornam líquidos através de operações de compra e venda» (in Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, 6.ª Edição).
E por «explorar» entende-se o acto de «tratar de descobrir, pesquisar, observar, tirar proveito de, especular, cultivar, abusar de outrem para auferir algum benefício; desfrutar; perscrutar.» -in Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, 6.ª Edição.
O Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro, surgiu da necessidade de rever o Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de Março – a chamada lei das pedreiras, dizendo-se no preâmbulo que a mesma se baseou «na exploração desta importante actividade a nível nacional, com alto valor de exportação e directamente ligada ao aproveitamento de um recurso natural que, como todos, é escasso.
As limitações da chamada “lei das pedreiras”, assim como a crescente importância dos aspectos ambientais na actividade económica levou à formulação de políticas integradoras que importava traduzir no enquadramento legislativo do sector.»
Parece, pois, que se procurou, com este diploma, a ponte do equilíbrio entre o desenvolvimento económico sustentável e a adequada protecção, valorização e promoção da utilização de recursos naturais limitados. Ao se aludir, no preâmbulo, à importância da actividade nacional da exploração de pedreiras, ao alto valor da exportação e ao aproveitamento de um recurso natural escasso, o legislador reportou-se à exploração no sentido empresarial, estruturado e organizado, orientada para a obtenção de lucro empresarial e económico.
Tal actividade, exercida maciçamente e com significativo índice de exportação, carece de ser limitada e equilibrada com a necessidade de protecção dos recursos naturais escassos e esgotáveis.
Recorrendo, ainda, à interpretação sistemática e à ratio legis do diploma, atentemos, mais uma vez, no artigo 2.º, alínea l), no que se refere à definição de «pesquisa» de minerais, onde se diz que esta é a fase anterior à da exploração, que tem por fito, entre o mais, a avaliação do interesse económico do aproveitamento de massas minerais. Ou seja, importa, pois, considerar a avaliação do impacto e do interesse económico que possa ser extraído da actividade de exploração.
Outrossim, o artigo 8.º do mesmo diploma legal faz alusão às condições que tornam a exploração de uma pedreira economicamente inviável.
Ora, da interpretação sistemática do diploma resulta uma preocupação em concertar a protecção dos recursos naturais esgotáveis, in casu, o solo, enquanto componente ambiental, com o desenvolvimento económico potenciado pela exploração de massas minerais.
Portanto, tendo em conta a interpretação sistemática, a ratio legis do diploma e o bem jurídico protegido, somos em crer que a exigência de licenciamento para a exploração de massas minerais tem por base uma “exploração” no sentido de actividade reiterada, estabilizada, estruturada e organizada empresarialmente, com o fito de dela tirar proveito e lucro económico. Porquê? Justamente para cercear o aproveitamento, de forma anárquica e injustificada, dos inertes como recursos naturais esgotáveis.
Ora, do exposto, concluímos que o arguido não possuía nenhuma actividade de exploração de massas minerais. Não visou extrair os inertes com vista a deles tirar um proveito económico.
Efectivamente, acabou por beneficiar da extracção de inertes, porquanto nivelou o seu terreno, logrando obter maior área de solo arável, profícuo para a agricultura. Mas tal benefício adveio de uma situação estanque e ocasional e não do desenvolvimento, do tirar partido, da actividade de extracção de inertes.
O benefício retirado não ocorreu no âmbito da exploração de massas minerais, porquanto o arguido não tira aproveitamento económico da extracção de inertes, não fazendo pesquisa ou exploração de minerais de forma estruturada e organizada e não faz dessa actividade um modus vivendi como parece ser exigido pelo espírito do diploma, actividade essa, economicamente orientada para a obtenção de lucro.
Para além de não ter valor comercial, a única finalidade da pedra-pomes é a de ser utilizada em currais de vacas, pelo que o arguido acabou por oferecer os inertes extraídos aos lavradores, sem nada lucrar.
Nunca vendeu este tipo de inertes, não tendo, por conseguinte, tirado partido ou desfrutado desta actividade, com um consequente aproveitamento económico,
Aliás, fê-lo por uma única vez, entre Outubro e Novembro do ano 2006, com o estrito fim de nivelar o solo dos seus terrenos para a agricultura.
Explorar uma actividade pressupõe continuidade, reiteração, no sentido de essa actividade puder ser economicamente rentável e lucrativa no tempo.
Perante todo o exposto, não nos resta senão concluir que o arguido não explorava minerais, pois apenas os extraiu num único momento com vista a nivelar o seu terreno agrícola, pelo que não se encontra preenchido o tipo objectivo da contra-ordenação p. e p. pelo artigo 59.º, n.º 1, alínea a) por infracção ao disposto no artigo 10.º, n.º s 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro.
É certo que sempre se dirá que o arguido, ao retirar os inertes, mexeu no solo, elemento do ambiente constitucionalmente protegido.
Não olvidemos, que não podem ser descuradas as medidas conducentes à racional utilização do solo, ao evitar da sua degradação e à promoção da sua fertilidade e regeneração e estabilidade ecológica (artigo 13.º, n.º 1, ambos da LBA).
Não integrando a conduta do arguido a exploração de massas minerais, não podemos deixar de sufragar que a mesma colocou em causa, injustificadamente, o relevo natural do solo.
Tal conduta é tutelada juridicamente pelo Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, que visa proteger o relevo natural e o revestimento vegetal do solo natural.
Com efeito, carecem de licença das câmaras municipais as acções de aterro ou escavação que conduzam à alteração do relevo natural e das camadas do solo arável e a sua não obtenção, para tais fins, constitui contra-ordenação (artigos 1.º, alínea b) e 3.º, n.º 1, ambos do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril.
A decisão condenatória vale como acusação e ao arguido não foram imputados factos relacionados com acções de aterro ou escavação, que alterem o relevo natural e o revestimento vegetal do solo natural.
Não tendo resultado provada a matéria constante da decisão condenatória, sem necessidade de outros considerandos, não nos resta senão absolver o arguido-recorrente J… da prática da contra-ordenação supra referida por que foi condenado por decisão da Direcção Regional do Ambiente, bem como do pagamento da coima que lhe foi aplicada, no valor de € 2.493,99 (dois mil, quatrocentos e noventa e três euros e noventa e nove cêntimos).
*
Dispositivo:
Nestes termos e com os fundamentos supra referidos, concedo provimento ao recurso e, em consequência, revogo a decisão administrativa da Direcção Regional do Ambiente de e absolvo o arguido J… da prática da contra-ordenação que lhe foi imputada, prevista e punida pelo artigo 59.º, n.º 1, alínea a), por infracção ao artigo 10.º, n.º s 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 270/01, de 06 de Outubro.
Sem custas (artigo 93.º, n.º 3 a contrario do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro).
(…)”
1.4- O Ministério Público porém, não concordando com esta absolvição, recorreu para a Relação e apresenta as seguintes conclusões da motivação de recurso:
“Deve admitir-se o presente recurso, designadamente, por tempestivo atenta a linha de jurisprudência advinda do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 462/2003, de 14 de Outubro de 2003, publicado no Diário da República, II série, de 24 de Novembro de 2003, que julgou inconstitucional o n.º 1 do artigo 74.º do D.L. 433/82, de 27 de Outubro, na redacção resultante do Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, quando dele decorre, conjugado com o artigo 411.º do C.P.P., um prazo mais curto para o recorrente motivar o seu recurso, por violação do principio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa. Sendo o prazo actual para a resposta de 20 dias (vide artigo 413.º, n.º 1 do C.P.P., aplicável por força do artigo 74.º, n.º 4 do D.L. 433/82, de 27 de Outubro), o prazo para motivar o recurso terá de ser também actualmente de 20 dias, o que, no caso de o recurso não ser interposto através de declaração em acta, implicará que seja também de 20 dias o prazo para a interposição de recurso.
2.º Na subsunção jurídica dos factos, o Tribunal recorrido considerou que os mesmos não integram a infracção prevista e punida pelo artigo 10.º , n.ºs 1 e 2 do Decreto – Lei 270/01, de 06 de Outubro, que constitui a contra ordenação prevista e punida pelo artigo 59.º, n.º 1. , al. a) do mesmo diploma legal, por em síntese, considerar que o termo “exploração “ a que alude o D.L. em referência, significa uma actividade que pressupõe continuidade, reiteração no sentido de a mesma puder ser economicamente viável e lucrativa no tempo. Mais considerou que a actividade do arguido se reconduz antes à previsão da contra ordenação, prevista e punida nos termos do artigos 1.º e 3.º , n.1 ambos do DL 139/89, de 28 de Abril, a qual prevê a acção de aterro ou de escavação que conduz à alteração do relevo natural do solo. Para tanto, o douto Tribunal alicerçou a sua posição na interpretação sistemática do artigo 10.º, n.s. 1 e 2 do Decreto – Lei 270/01, de 06 de Outubro e na ratio legis do diploma em referência.
3.º O legislador apesar de ter referido no artigo 1.º do D.L 270/01, de 06 de Outubro que o mesmo se destina à revelação e aproveitamento de massas minerais, compreendendo a pesquisa e a exploração, não veio definir o que seja “ revelação”, “aproveitamento” e exploração”. De facto, como se constata no artigo 2.º, o mesmo legislador que define explorador, licença de exploração, pesquisa, pedreira, não define “exploração”, “aproveitamento”, “revelação”, termos esses referidos no artigo 1.º do diploma em referência a propósito do seu âmbito.
4.º O legislador, de modo propositado, não definiu esses conceitos de modo a serem interpretados de acordo com cada caso concreto, designadamente, para averiguar se a retirada, pesquisa e aproveitamento das massas minerais são de monta significante de modo a poder subsumir-se à previsão de “exploração”. Assim, a retirada de areia na praia por exemplo, não poderia integrar o referido conceito.
O legislador ao não definir o conceito de “exploração”, não distingue se em causa está a exploração com o fito económico ou não;
5.º Exploração tem o significado de “ descobrir, pesquisar, observar , tirar proveito de; especular, cultivar, desfrutar, abusar de outrem para auferir algum beneficio, etc” , ou seja, o seu significado não está intimamente ligado ao seu proveito económico. Por isso se diz, por exemplo, que Jacques Costeau era um “explorador dos mares”;
6.º Sendo certo que o Decreto Lei 270/01, de 06 de Outubro, surgiu da necessidade de rever o Decreto _lei n.º 89/90 , de 16 de Março a chamada lei das pedreiras, não menos certo é que em sede de preâmbulo se refere o seguinte “entre as mais importantes alterações do diploma foram as relativas ao procedimento de atribuição de licença. Assim, introduziram-se dois capítulos novos, de modo a tornar independente o regime jurídico relativo à licença de pesquisa e de exploração”;
7.º Atendendo à noção de pedreira na al. k) do artigo 2.º, não nos repugnaria considerar que quando o arguido praticou os factos referidos nos pontos 1. , 4., 5 e 6 dos factos provados, estávamos perante uma pedreira, isto é, um conjunto formado pela área de extracção e zonas de defesa, pelos depósitos de massas minerais extraídas, estéreis e terras removidas e, bem assim, pelos seus anexos;
8.º Ainda que assim não se entenda, o comportamento do arguido ao extrair pedra pomes, vulgo cascalho-branco, da encosta de um monte, sito na T… , freguesia de S.., concelho de V… , ao fazer escavações de terra naquela zona do sopé do cabeço e, por fim, ao retirar a capa de terreno fértil para o lado, removendo cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno, oferecendo, de seguida, o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha e nos currais dos animais, explorou e/ou aproveitou das massas minerais ali existentes;
9.º O próprio legislador demonstrou intenção em diferenciar os comportamentos de exploração. Neste sentido, vide o corpo do artigo 59.º, n.º1 al. a) do D.L. n.º 270/2001, de 6 de Outubro que apresenta ao aplicador do direito balizas de aplicação dos montantes de contra-ordenação tudo indicando que diferentes comportamentos, geram diferentes montantes de coimas a aplicar;
10.º É consentâneo a essencialidade de um sistema sancionatório de carácter punitivo aos danos ambientais que deve começar por ser do tipo contraordenacional;
11.º No tipo de diplomas como o D.L. 270/2001, de 6 de Outubro, a componente ética surge diluída porque em causa não estão as condições elementares de sobrevivência da sociedade, mas a construção de uma certa ordem social que cada vez mais se preocupa e se tem que preocupar com as condições ambientais, designadamente, no que concerne à preservação;
12º O D. L. 270/2001 de 6 de Outubro, não referiu expressamente se exploração estava ligada a um fim económico ou não, porque caso estivesse ligado somente ao fito económico, estaria descoberto o caminho para a falta de punição, designadamente, do nivelamento de terrenos agrícolas por retirada de massas minerais várias sempre com o prejuízo das nossas rochas, rochedos e configuração ambiental associada;
13.º O conceito de exploração deverá ser entendido em sentido amplo e com o significado de que a extracção/a retirada de massa mineral seja minimamente relevante, ou seja, que em si, demonstre uma determinada danosidade, pelo que não abarcará actividades como sejam a da retirada de uma pequena quantidade de terra, mas já abarcará comportamentos como os descritos nos factos provados em sede de sentença;
14.º O comportamento do arguido não se reconduziu a uma acção de mero aterro ou escavação que conduziu a uma alteração do relevo natural e das camadas do solo arável p. e p. pelos artigos 1.º, al. b) e 3.º n.º 1 ambos do D.L. n.º 139/89, de 28 de Abril. Note-se que a acção do arguido consistiu, designadamente, na retirada de massas minerais em cerca de 300 a 400 metros para conquistar área útil de terreno. Mais se provou que as massas minerais extraídas do referido lugar, foram, de seguida, oferecidas pelo arguido aos seus vizinhos. O nivelamento das terras aráveis, surgiu como consequência directa da retirada das massas minerais.
Nestes termos, e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, devendo a sentença ser revogada na parte que absolveu o arguido da prática da contra – ordenação.”
1.5- Admitido o recurso, o arguido não respondeu e. ao abrigo do artº 416º do CPP, o Exmo Sr Procurador Geral Adjunto não se pronunciou especificamente, limitando-se a pôr simples visto.
1.6- Em exame preliminar o recurso foi admitido e remetido para decisão em conferência.
II-CONHECENDO
2.1- O âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelo recorrente nas conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo, no entanto, das questões que sejam de conhecimento oficioso , cfr se extrai do disposto no artº 412º nº 1 e no artº 410 nºs 2 e 3 do Código de Processo Penal (c.p.p.)
Isto, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no art. 410º, n.º2 do CPP .
Tais conclusões visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância dos recorrentes em relação à decisão recorrida
2.2- No presente recurso em matéria de direito contraordenacional está em apreciação o seguinte problema: - a conduta do arguido, tendente ao aumento de área útil agrícola de um terreno seu, com separação de cascalho/pedra-pomes, sem qualquer valor económico, que deu gratuitamente a agricultores para uso em currais e caminhos de animais, é susceptível de punição como contraordenação nos termos sublinhados pela DRA ao abrigo do DL 270/2001?
Vejamos então como e o que decidir.
2.3- Foi dado com o assente o seguinte núcleo essencial de factos:
“
“1. No dia 05 de Janeiro de 2007, o arguido J… , extraiu pedra pomes, vulgo cascalho-branco, da encosta de um monte, sito na T… , freguesia de S… , concelho de V… , sem que possuísse a respectiva licença administrativa .
2. O arguido é proprietário dos terrenos a que se alude em 1., os quais fazem parte da sua exploração agrícola;
3. Na zona alta do prédio, o arguido já teve vinha, a qual se encontra há alguns anos sem ser cultivada; a zona baixa do prédio está cultivada há alguns anos;
4. Em data não concretamente apurada, mas situada entre Outubro e Novembro de 2006, o arguido fez escavações de terra naquela zona do sopé do cabeço, com o objectivo de conseguir área útil arável, tendo aproveitado para nivelar o resto do terreno na zona mais baixa, o que lhe permitia operar melhor com as máquinas agrícolas, tendo obtido, por conseguinte, cerca de 1000 metros quadrados de terreno arável;
5. Nestas operações, o arguido retirou a capa de terreno fértil para o lado, removendo cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno; logo após, devolveu a capa de terreno fértil à anterior posição;
6. O arguido ofereceu o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha e nos currais dos animais;
7. Mais se provou que:
8. A pedra pomes, vulgo cascalho – branco não tem valor comercial e é uma massa mineral;
(…)
O tribunal recorrido entendeu, em suma, que “os factos não integram a infracção prevista e punida pelo artigo 10.º , n.ºs 1 e 2 do Decreto – Lei 270/01, de 06 de Outubro, que constitui a contraordenação prevista e punida pelo artigo 59.º, n.º 1. , al. a) do mesmo diploma legal por considerar, em síntese, que o termo “exploração “ a que alude o D.L. em referência, significa uma actividade que pressupõe continuidade, reiteração no sentido de a mesma puder ser economicamente viável e lucrativa no tempo e que a actividade do arguido, quando muito, se reconduziria, “maxime”, à previsão da contraordenação, prevista e punida nos termos do artigos 1.º e 3.º , n.1 ambos do DL 139/89, de 28 de Abril, que prevê a acção de aterro ou de escavação que conduz à alteração do relevo natural do solo.”
Desta interpretação tem o recorrente uma visão diametralmente oposta.
As linhas de força da argumentação do recorrente MºPº foram as seguintes:
a)- Analisado todo o diploma em referência, constata-se que o legislador apesar de ter referido no artigo 1.º que o mesmo se destina à revelação e aproveitamento de massas minerais, compreendendo a pesquisa e a exploração, não veio definir o que seja “ revelação”, “aproveitamento” e exploração”.
b)- O legislador propositadamente não quis definir esses conceitos de modo a serem interpretados de acordo com cada caso concreto, designadamente, para averiguar se a retirada, pesquisa e aproveitamento das massas minerais são de monta significante de modo a poder subsumir-se à previsão de “exploração”.
c) - Intencionalmente o legislador não quis definir o conceito de “exploração” e quando o refere não distingue se em causa está a exploração com o fito económico ou não.
d)-O significado de exploração não está intimamente ligado ao seu proveito económico. A lei não referiu expressamente se exploração estava ligada a um fim económico ou não, porque caso assim não fosse, estaria descoberto o caminho para a falta de punição, designadamente, do nivelamento de terrenos agrícolas por retirada de massas minerais várias sempre com o prejuízo das nossas rochas, rochedos e configuração associada.
e)- No preâmbulo do Decreto Lei 270/01, de 06 de Outubro, se refere que o diploma em causa surgiu da necessidade de rever o Decreto _lei n.º 89/90 , de 16 de Março a chamada lei das pedreiras.
f)- Entre as mais importantes alterações do diploma foram as relativas ao procedimento de atribuição de licença. Assim, introduziram-se dois capítulos novos, de modo a tornar independente o regime jurídico relativo à licença de pesquisa e de exploração”.
g)-Atendendo à noção de pedreira na al. k) do artigo 2.º, não nos repugnaria considerar que quando o arguido praticou os factos referidos nos pontos 1. , 4. e 5 dos factos provados, estávamos perante uma pedreira, isto é, um conjunto formado pela área de extracção e zonas de defesa, pelos depósitos de massas minerais extraídas, estéreis e terras removidas e, bem assim, pelos seus anexos.
h)-O comportamento do arguido ao extrair pedra pomes, vulgo cascalho-branco, da encosta de um monte, ao fazer escavações de terra, ao retirar a capa de terreno fértil para o lado, removendo cerca de 300 a 400 metros de cascalho branco para conquistar área útil e nivelar o resto do terreno, oferecendo, de seguida, o cascalho a lavradores vizinhos para ser espalhado nas zonas de ordenha e nos currais dos animais são comportamentos significantes de exploração e/ou aproveitamento das massas minerais.
i)-Em suma, o conceito de exploração deverá ser entendido em sentido amplo e com o significado de que a extracção, a retirada de massa mineral seja minimamente relevante, ou seja, que em si, demonstre uma determinada danosidade, pelo que não abarcará actividades como sejam a de uma pequena retirada de terra, mas já abarcará comportamentos como os descritos nos factos provados em sede de sentença.
j)-Discorda que o comportamento do arguido se pudesse ter reconduzido apenas e tão somente a uma acção de aterro ou escavação que conduziu a uma alteração do relevo natural e das camadas do solo arável previsto e punido pelos artigos 1.º, al. b) e 3.º n.º 1 ambos do D.L. n.º 139/89, de 28 de Abril.
2.4 –
2.4.1- O DL 270/01 e os seus objectivos
O decreto-lei nº 270/2001 de 6 de Outubro de 2001, do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território aprovou o regime jurídico da pesquisa e exploração de massas minerais-pedreiras, revogando o Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de Março.
Este Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de Março, por seu lado, estabelecera o regime jurídico em matéria de exploração de massas minerais-pedreiras, dando cumprimento ao mandato contido no Decreto-Lei n.º 90/90, que estabeleceu o regime geral dos recursos geológicos, remetendo, no seu artigo 51.º, para legislação própria a fixação de disciplina específica aplicável a cada tipo de recurso.
Desde então, o Decreto-Lei n.º 89/90 passou a ser a designada “ lei das pedreiras”, na qual se baseou a exploração desta importante actividade a nível nacional, face ao seu alto valor de exportação e directamente ligada ao aproveitamento de um recurso natural escasso.
Apesar das expectativas depositadas na dita lei das pedreiras, a aplicação prática das suas disposições viria, contudo, a revelar limitações nos efeitos esperados tendo a crescente importância dos aspectos ambientais na actividade económica levado à formulação de políticas integradoras que importava traduzir no enquadramento legislativo do sector.
Ficou assim em evidência a necessidade de rever o citado decreto-lei, principalmente no tocante aos aspectos ambientais e nomeadamente no que se referia quer à recuperação paisagística quer ao reforço do papel do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAOT) no procedimento de obtenção de licença e, posteriormente, na fiscalização das explorações.
Entre as mais importantes alterações coube ali salientar as relativas ao procedimento de atribuição de licença, tendo-se por isso introduzido dois novos capítulos, de modo a tornar independente o regime jurídico relativo à licença de pesquisa e de exploração. Por outro lado, reforçou-se o rigor dos documentos administrativos e, sobretudo, técnicos, a apresentar pelo requerente no pedido de licença, todos eles referidos a uma nova concepção de plano de pedreira.
Outra alteração relevante assentou na substituição do plano de recuperação paisagística, tal como contemplado pelo Decreto-Lei n.º 89/90, por um plano muito mais abrangente do ponto de vista ambiental, o PARP (plano ambiental e de recuperação paisagística). Decorre, bem vistas as coisas e o que lhe esteve na génese, que o objectivo das alterações introduzidas, de acordo com o espírito da Comunicação da Comissão de 3 de Maio de 2000 [COM (2000) 265 final], relativa à promoção do desenvolvimento sustentável da indústria extractiva não energética da UE, era corrigir, na medida do possível, as numerosas situações de pedreiras abandonadas e não reabilitadas, visando a melhoria acentuada do desempenho ambiental da indústria extractiva.
Em matéria de definições, avultam no artigo 2.º e para efeitos desse diploma, que o legislador entendeu ali por:
(…)
g) «Explorador» - O titular da respectiva licença de pesquisa ou exploração;
h) «Licença de exploração» - O título que legitima o seu titular a explorar uma determinada pedreira nos termos do presente diploma e das condições de licença;
i) «Licença de pesquisa» - título que legitima o seu titular a proceder à actividade de pesquisa nos termos do presente diploma e das condições de licença;
j) «Massas minerais» - rochas e ocorrências minerais não qualificadas legalmente como depósito mineral;
k) «Pedreira» - conjunto formado pela área de extracção e zonas de defesa, pelos depósitos de massas minerais extraídas, estéreis e terras removidas e, bem assim, pelos seus anexos;
l) «Pesquisa» - conjunto de estudos e trabalhos, anteriores à fase de exploração, que têm por fim o dimensionamento, a determinação das características e a avaliação do interesse económico do aproveitamento de massas minerais, nela se compreendendo os trabalhos de campo indicados no anexo I deste diploma;
Por outro lado, no ANEXO I do diploma lê-se:
“Trabalhos de campo nas pesquisas:
A pesquisa abrange o conjunto de estudos e trabalhos, anteriores à fase de exploração, que têm por fim o dimensionamento, a determinação das características e a avaliação do interesse económico do aproveitamento de massas minerais.
As actividades de pesquisa serão realizadas tendo em consideração o princípio das melhores tecnologias disponíveis (MTD), sendo que, perante a possibilidade de optar por várias metodologias para obter os resultados pretendidos com a pesquisa, usar-se-á aquela que, de acordo com as MTD, minimize os impactes ambientais. (…)
2.4.1-Dispõe o artigo 1.º do D.L em referência que “o presente diploma aplica-se à revelação e aproveitamento de massas minerais, compreendendo a pesquisa e a exploração, conforme previsto neste decreto-lei”.
Por sua vez, dispõe o n.º1 do artigo 10.º do mesmo diploma que “a pesquisa e a exploração de massas minerais só podem ser conduzidas ao abrigo da licença de pesquisa ou de exploração, conforme for o caso, carecendo a sua atribuição de pedido do interessado que seja proprietário do prédio ou tenha, com este, celebrado contrato, nos termos do presente diploma”
Nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal, “as licenças definirão o tipo de massas minerais e os limites da área a que respeitam”.
Por sua vez, nos termos do disposto no n.º 1 al. a) do artigo 59.º do mesmo diploma, constitui contra ordenação punível com coima de 2493,99 euros a 44 891, 81 euros, designadamente, a exploração de massas minerais sem licença (vide al. a) do referido preceito).
Entende o MºPº recorrente que, “analisado o diploma em referência, constata-se que o legislador apesar de ter referido no artigo 1.º que o mesmo se destina à revelação e aproveitamento de massas minerais, compreendendo a pesquisa e a exploração, não veio definir o que seja “ revelação”, “aproveitamento” e exploração”.
E que, como se constata no artigo 2.º, o mesmo legislador que define explorador, licença de exploração, pesquisa, pedreira, não define “exploração”, “aproveitamento”, “revelação”, termos esses referidos no artigo 1.º do diploma em referência a propósito do seu âmbito, sendo seu (dele recorrente) entendimento que o legislador propositadamente não quis definir esses conceitos de modo a serem interpretados de acordo com cada caso concreto, designadamente, para averiguar se a retirada, pesquisa e aproveitamento das massas minerais são de monta significante de modo a poder subsumir-se à previsão de “exploração”. De qualquer forma, adianta que foi intencional o legislador não ter querido definir o conceito de “exploração” e quando a refere não distingue se em causa está a exploração com o fito económico ou não. “
Discordamos deste entendimento, sufragando no mesmo sentido da decisão recorrida.
Temos para nós como claro que com a legislação sobre exploração de pedreiras se pretendeu essencialmente garantir uma exploração de inertes sustentada, tendo em conta o elevado interesse económico de exportação e os valores ambientais e paisagísticos.
Veja-se por exemplo o conjunto de requisitos necessário aos pedidos de licença:
“Artigo 10.ºLicença de pesquisa e de exploração
1 - A pesquisa e a exploração de massas minerais só podem ser conduzidas ao abrigo de licença de pesquisa ou de exploração, conforme for o caso, carecendo a sua atribuição de pedido do interessado que seja proprietário do prédio ou tenha, com este, celebrado contrato, nos termos do presente diploma.
2 - As licenças definirão o tipo de massas minerais e os limites da área a que respeitam.
3 - As áreas de licença deverão ter a forma de polígono regular compatível com o limite do prédio em cuja área se insere.
4 - A licença de pesquisa tem o prazo inicial de seis meses, contados da data da sua atribuição, o qual, a pedido do titular com 30 dias de antecedência, pode ser prorrogado por uma única vez e por igual período.
5 - A licença de pesquisa não autoriza o seu titular a alienar ou vender as substâncias minerais extraídas, sem prejuízo da realização de análises, ensaios laboratoriais e semi-industriais e testes de mercado no âmbito da prossecução dos fins inerentes à actividade de pesquisa.
6 - Só o titular de licença de pesquisa em vigor tem legitimidade para requerer a atribuição de licença de exploração relativamente a massas minerais e à área compreendidas naquela.
Artigo 20.º
Do pedido de licença de pesquisa
1 - O requerente de uma licença de pesquisa deve apresentar, em quadruplicado, à entidade licenciadora os seguintes documentos:
a) Certidão de parecer favorável de localização referida no artigo 9.º deste diploma;
b) Título comprovativo da propriedade do prédio ou certidão do contrato de pesquisa e exploração quando o explorador não for o proprietário;
c) Requerimento que contenha a identificação completa do requerente e seu endereço, indicação das substâncias que pretende ver abrangidas pela licença, localização da área pretendida e seus limites em coordenadas rectangulares planas, do sistema Hayford-Gauss, referidas ao ponto central;
d) Programa de trabalhos de pesquisa indicando os estudos e trabalhos a desenvolver, sua fundamentação, técnicas a utilizar, plantas e cortes detalhados dos trabalhos de campo projectados e da situação pós-operacional, identificando a solução de recuperação final das zonas alvo de trabalhos;
e) Planta de localização à escala de 1:25000 com a implantação dos limites da área de pesquisa;
f) Planta cadastral à escala de 1:2000, com implantação dos limites da área de pesquisa, limites dos prédios abrangidos e confinantes.
2 - A entidade licenciadora pode solicitar ao requerente, por uma única vez e fundamentadamente, elementos em falta ou adicionais que detalhem ou complementem os referidos no número anterior, tendo em vista avaliar a adequação do pedido.
Artigo 27.º
Do pedido de licença de exploração
1 - O requerente de uma licença de exploração deve apresentar à entidade licenciadora, em sextuplicado, os seguintes documentos:
a) Documentos administrativos:
i) Requerimento de acordo com as minutas do anexo IV deste diploma;
ii) Certidão do parecer favorável de localização quando exigível nos termos previstos no artigo 9.º deste diploma;
iii) Titulo comprovativo da propriedade do prédio ou certidão do contrato quando o explorador não for o proprietário;
iv) Termo de responsabilidade do responsável técnico pelo plano de pedreira de acordo com as minutas do anexo V deste diploma;
v) Estudo de impacte ambiental no caso de explorações sujeitas a avaliação de impacte ambiental;
vi) Planta de localização à escala de 1:25000 com indicação dos acessos ao local, abrangendo um raio de 4 km;
vii) Planta cadastral à escala de 1:2000, com implantação da pedreira e indicação dos limites da propriedade, dos confinantes e dos acessos ao local;
viii) Planta topográfica à escala de 1:500 ou de 1:1000, indicando a localização dos anexos de pedreira quando eles estejam previstos;
b) Estudo de viabilidade económica;
c) Documentos técnicos relativos ao plano de pedreira previstos no anexo VI deste diploma.
2 - O requerente poderá não apresentar um ou mais dos documentos técnicos referidos no anexo VI quando, baseando-se nas características da pedreira que pretende licenciar, justifique devidamente que tais documentos não são necessários para a execução do plano de pedreira.
3 - Quando na instrução do processo se verificar que este não se encontra em conformidade com o disposto nos artigos anteriores, a entidade licenciadora solicitará ao requerente, no prazo de 10 dias, os elementos em falta, suspendendo-se os prazos do procedimento até à apresentação destes. “
Fará assim algum sentido exigir a um agricultor que quer “limpar” um terreno seu de “inertes”, vulgo pedra-pomes ou cascalho para aumento apenas de área agrícola útil que tenha ou tivesse de apresentar toda aquela panóplia documental? E que da sua conduta esteve como que a “pesquisar e explorar” uma pedreira? Não faz sentido e não se enquadra minimamente no espírito e valores em protecção pelo diploma dito violado. Até porque nem sequer se provou ou muito menos se alegou, também em sede de protecção ambiental, que houvesse também uma violação dos limites de protecção ambiental e/ou paisagística no local dos factos.
Aliás, veja-se das razões subjacentes aos indeferimentos dos pedidos de exploração que avultam em importância, sobretudo as atinentes à viabilidade económica dos projectos de pesquisa exploração: “Artigo 30.º
Indeferimento do pedido- O pedido devidamente instruído será indeferido, em qualquer momento da tramitação do procedimento, pela entidade licenciadora nos seguintes casos:
(…) b) Quando considerar que não estão garantidas as condições de viabilidade do projecto ou da sua conveniente execução; c) Quando o pedido não se mostre adequado à satisfação dos objectivos propostos pelo requerente; d) Quando o pedido não assegure o aproveitamento sustentável do recurso; (…)
Daqui decorre que está sempre subjacente um especial e predominante interesse económico, embora enquadrável em razões de protecção ambiental. Nunca por nunca seria o caso do recorrente, simples agricultor, que tal como muitos, desde tempos imemoriais, trabalham a terra, limpando-a de pedras e rochas, para lhe dar proveito agrícola. E proveito agrícola, mesmo quando afirmável, é bem diferente de proveito económico por exploração de inertes e por causa dela.
Há que ter algum bom senso nestas matérias, Não tendo a entidade autuante alguma vez alegado e demonstrado sequer que a actividade do arguido violou normas ambientais ou interesses paisagísticos não tem cabimento algum penalizá-lo por um comportamento que nada tem a ver com interesses económicos de exploração de pedreira e não se revela violar as normas jurídicas invocadas, cujos valores em protecção são bem diferentes, como se explicou.
Por isso, muito bem julgou a 1ª instância, com notável bom senso e apreciável hermenêutica jurídica.
Dessa forma, teremos de concluir pelo total acerto da decisão, mantendo-a integralmente.
III- DECISÃO
Acordam assim os juízes em julgar improcedente o recurso do MºPº, mantendo-se pois a decisão recorrida e a absolvição do arguido.
Sem tributação
Lisboa, 11 de Março de 2008
Os Juízes Desembargadores
(texto elaborado em suporte informático, revisto e rubricado pelo relator artº 94º do CPP)