PROPRIEDADE HORIZONTAL
ENCARGOS DE CONSERVAÇÃO DE PARTES COMUNS
TERRAÇOS
Sumário

I - Na falta de disposição negocial o princípio geral aplicável à repartição das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício é o da proporcionalidade – cada condómino paga na proporção do valor da sua fracção, sendo este o valor que resulta da aplicação do disposto na parte final do art. 1418º do C. Civil.
II - As despesas necessárias à conservação (por exemplo, limpeza e pintura do prédio, substituição de elevadores etc..), à fruição das partes comuns (despesas com electricidade, água, artigos de limpeza etc…) e ao pagamento de serviços de interesse comum (portaria, manutenção de elevadores e jardins etc…) são pagas pelos condóminos, na dita proporção.
III - Relativamente às despesas relativas aos lanços de escada e às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente alguns dos condóminos, o legislador, obedecendo ao critério da consagração da solução mais acertada, entendeu estabelecer que as mesmas deveriam ficar a cargo, exclusivamente dos que delas se servem (nº 3 do art. 1424º).
IV - No âmbito excepcional da previsão desse segmento normativo só podem caber as despesas de conservação e manutenção estritamente relacionadas com o uso normal e específico dessas partes. As que excederem esse campo, por envolverem, por exemplo a fachada ou a cobertura do prédio ou estiverem relacionadas com a estrutura do mesmo, já têm de ser integradas no regime geral consagrado no nº 1 do art. 1424º.
FG

Texto Integral

            Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
            Relatório.
            1. R, S.A. intentou, no dia 27.04.1999, no então 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Lisboa, acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra J, E e H.
Alegou, em síntese, que é proprietária da fracção “C”, destinada a habitação, correspondente ao 5º andar esquerdo do prédio constituído em propriedade horizontal, em Lisboa; o 6º andar do mesmo prédio, a que corresponde a fracção identificada pela letra “A”, pertenceu aos 1ºs R.R., que nela residiram até que, em 1998, a venderam à 2ª R, fazendo parte do mesmo um terraço, que serve de cobertura ao prédio e fica parcialmente por cima da fracção da A.; os 1ºs réus fizeram perfurações no terraço, para aí instalar as barracas dos cães, tendo furado a tela que servia de isolamento do prédio, o que originou, ainda no 1º semestre de 1997, infiltrações de águas pluviais e as consequentes humidades na fracção da A., que ficou sem condições de habitabilidade.
Mais invocou a autora que informou os primeiros réus, que nada fizeram para reparar os danos que fizeram no isolamento do prédio.
Como a A. ficou impedida de dar o uso normal a essa casa, perdeu nomeadamente a possibilidade de a arrendar por 200.000$00 por mês.
Por outro lado, a reparação e pintura dos tectos e paredes da casa da A. foram orçadas em 495.000$00; a reparação dos tacos do chão, igualmente danificados em consequência das infiltrações, foi orçada em 685.000$00 e a reparação do terraço da fracção “A” importará em 1.200.000$00, valores a que há que acrescer o IVA.
Mais alegou a autora que, como a 2ª R. comprou a fracção, sucedeu nos direitos e obrigações dos anteriores proprietários, sendo responsável em conjunto com os 1ºs R.R., pelos prejuízos causados à A.
Terminou pedindo a condenação solidária dos réus a reparar e isolar o terraço da fracção “A”, actualmente pertencente à 2ª R., por forma a evitar as infiltrações na fracção “C”, propriedade da A..
Subsidiariamente, pediu que, caso a 2ª R. fosse excluída da sua responsabilidade nas obras referidas, deveria ser obrigada a consentir nas obras de reparação e impermeabilização do terraço da fracção “A”, devendo facultar o acesso à sua fracção, pelo tempo necessário, com entrada de materiais e trabalhadores para o efeito.
Pediu ainda que os R.R,. fossem condenados a indemnizar a A. pelos prejuízos decorrentes da privação do uso em condições normais da sua habitação, no valor de 200.000$00 mensais, com início em 7 de Julho de 1997, até à efectiva reparação do terraço, ou subsidiariamente no valor que se liquidar em execução de sentença.
Pede também a condenação dos 1ºs R.R. a pagarem o valor da reparação da fracção da A., após as obras de reparação do terraço e da cessação das infiltrações, orçadas em 1.380.600$00, com IVA incluído, ou subsidiariamente no valor que se vier a liquidar em execução de sentença.
Mais pediu que a 2ª R. fosse condenada solidariamente com os 1ºs R.R. a pagar à A. a indemnização de 200.000$00 por mês, pela privação do uso habitacional da fracção, a contar da citação até à reparação, ou subsidiariamente no valor que se vier a liquidar.
E tudo acrescido dos juros de mora desde o fim de cada mês de privação do uso até efectivo pagamento, sendo que quanto à 2ª R., os juros só contariam desde a sua citação.

Citados, os dois primeiros réus invocaram, resumidamente, que as infiltrações na fracção da A. derivaram de vícios ou defeitos de construção do prédio e não de qualquer actuação deles; Insistiram diversas vezes junto da administração do prédio e do construtor para porem termo à situação, a qual se limitou a obter orçamentos para a reparação. Entretanto, antes de serem feitas as reparações, os 1ºs R.R. venderam a sua fracção à 3ª ré.
Terminaram pedindo a sua absolvição do pedido.

Por seu A 2ª R., H, veio requerer a intervenção provocada de todos restantes condóminos do prédio, defendendo que as obras eram da responsabilidade do condomínio e não da R. contestante, que não praticou qualquer facto ilícito que causasse lesão à A..
Impugnou todos os danos alegados pela A. e todos os factos de que não tinha conhecimento pessoal, invocando que comprou a fracção “A” no estado em que hoje se encontra, nunca tendo sido interpelada para efectuar obras, no terraço ou na fracção da A..
Pediu o chamamento/intervenção dos condóminos e a sua absolvição do pedido.
 
A A. notificada da apresentação das contestações dos réus, respondeu conforme consta de fls. 89 e 93 e seguintes e, admitindo a hipótese do terraço vir a ser considerado parte comum e da reparação do mesmo ser considerada responsabilidade de todos os condóminos deduziu pedido subsidiário de condenação dos condóminos do prédio a promoverem a expensas deles, todas obras necessárias e suficientes para fazer cessar todas as infiltrações de águas e humidades na fracção da A. que tenham origem no terraço ou em parte comum do prédio; a reparar a expensas suas os estragos causados na fracção da A.; e indemnizar a A. pela privação do uso habitacional da sua casa, pelo seu valor locativo de 200.000$00 por mês, desde a sua citação até efectiva reparação do prédio e da fracção da A..

A ré Helena Maria Conceição Vieira pediu e obteve a concessão do benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total de pagamento de custas e preparos (fls. 101 verso).

O interveniente Agostinho André de Carvalho Fernandes foi citado editalmente e, cumprido o disposto no art. 15º do C.P.C., não foi apresentada contestação.
Os restantes condóminos chamados – (…)-  vieram contestar, impugnando os factos de que não tinham conhecimento, invocando a sua ilegitimidade passiva, na medida em que as obras em causa eram da responsabilidade dos proprietários da fracção “A”, e ainda que nunca lhes fora dado conhecimento de queixas da A. sobre infiltrações ocorridas na sua fracção.
Concluíram pedindo a sua absolvição da instância, por ilegitimidade, ou a sua absolvição do pedido.

Julgadas improcedentes as excepções deduzidas e corridos os ulteriores termos processuais, realizado o julgamento e enunciada a matéria de facto provada, a autora apresentou alegações reafirmando o entendimento de que o terraço faz parte da fracção “A” e que, por isso, deverão os 1.ºs e a 2ª R.R. ser condenados a indemnizar a A. pelo valor das obras que teve de realizar, nos montantes de 495.00$00 e 685.000$00, actualizados pelo valor dos índices de inflação desde Abril de 1999, devendo os R.R. isolar e reparar à sua custa o terraço da fracção “A”, facultando a 2ª R. o acesso necessário a essa obras, e indemnizando a A. pela privação do uso habitacional desde finais de 1998 ou, subsidiariamente, desde a citação, até à sua reparação, a liquidar em execução de sentença.
Ou ainda, caso assim se não entendesse, deveria ser considerado o pedido formulado na réplica contra os condóminos do prédio.
            Os 1.ºs R.R., J e esposa, E, apresentaram alegações, sustentando que o terraço que serve de cobertura ao prédio é parte comum do prédio, sendo a responsabilidade de nele fazer obras de todos os condóminos e não dos 1.ºs R.R. que não praticaram qualquer acto susceptível de prejudicar a A., devendo por isso ser absolvidos do pedido.
Os R.R., O, Lda e outros, chamados a intervir nos autos, na qualidade de condóminos do prédio, também apresentaram as suas alegações reforçando a ideia que o terraço dos autos é de uso exclusivo do condómino da fracção “A”, correspondente ao 6º andar do prédio e, nessa medida, os restantes condóminos não seriam responsáveis pelas obras aí realizadas, devendo ser absolvidos do pedido.

            Com data de 19 de Junho de 2006 foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente por provada:
           
a) Absolveu os 1.ºs R.R., J e E, dos pedidos de reparar e isolar o terraço da fracção “A”, actualmente pertencente à 2ª R., por forma a evitar as infiltrações na fracção “C”, propriedade da A.;
b) Absolveu os mesmos 1.ºs R.R. dos pedidos de indemnizar a A. pelos prejuízos decorrentes da privação do uso em condições normais da sua habitação, no valor de 200.000$00 mensais, com início em 1 de Julho de 1997, até à efectiva reparação do terraço ou, subsidiariamente, no valor que se liquidar em execução de sentença;
            c) Absolveu os 1ºs R.R. de pagarem o valor da reparação da fracção da A., após as obras de reparação do terraço e da cessação das infiltrações, orçadas em 1.380.600$00, com IVA incluído, ou, subsidiariamente, no valor que se vier a liquidar em execução de sentença;
            d) Absolveu a 2ª R., H, e os 1.ºs R.R. dos pedidos de condenação solidária a pagar à A. uma indemnização de 200.000$00 por mês, pela privação do uso habitacional da fracção, a contar da citação até à reparação, ou, subsidiariamente, no valor que se viesse a liquidar em execução de sentença.
e) Absolveu os 1.ºs R.R. e a 2ª R.R. dos pedidos de pagamento de juros de mora sobre os supra mencionados valores.
f) Condenou os R.R., H e outros, na qualidade de condóminos do prédio sito em Lisboa, a realizarem todas as obras necessárias e suficientes para fazerem cessar todas as infiltrações de águas e humidades na fracção da A. que tenham origem no terraço que serve de cobertura ao prédio, ou em qualquer parte comum do mesmo;
g) Condenou a 2ª R., H, a consentir na realização das obras de reparação e impermeabilização do terraço, facultando o acesso através da sua fracção, pelo tempo necessário, com entrada de materiais e trabalhadores, para o efeito.
h) Condenou ainda os R.R. condóminos do mesmo prédio no pagamento dos valores efectivamente dispendidos pela A. nas obras de pintura dos tectos, paredes e reparação dos tacos de madeira do chão das divisões afectadas pelas infiltrações provindas do terraço que serve de cobertura ao prédio, a apurar em incidente de liquidação.
i) Absolveu os R.R. condóminos do prédio do pedido de indemnizar a A. pelos prejuízos decorrentes da privação do uso em condições normais da sua habitação, pelo seu valor locativo de 200.000$00 mensais, desde a citação até à efectiva reparação do terraço.

            Após resposta a um pedido de aclaração em conformidade com o que consta de fls. 826, e verso, dizendo-se inconformados com o decidido, interpuseram recurso os chamados (…), obviamente só relativamente à parte da sentença que lhes foi desfavorável.
            Alegaram, e no final, concluíram, em síntese, o seguinte:
            - Face aos factos provados, não restam dúvidas que o terraço que a autora diz ter provocado os seus prejuízos é de utilização exclusiva da fracção A (6º andar) já que só essa mesma fracção a ele tem acesso;
            - Daí que mesmo que se entenda que tal terraço é parte comum do prédio, as despesas relativas a esse terraço estariam sempre a cargo dos proprietários da fracção A, já que só eles ao mesmo têm acesso, usando-o e fruindo-o na sua plenitude – art. 1424º nº 3 do C. Civil.
            - E sendo os proprietários/condóminos da fracção os únicos e exclusivos responsáveis pelas despesas de conservação do dito terraço, igualmente são eles os únicos e exclusivos responsáveis pelos prejuízos que de tal terraço advenham;
            - A conclusão que o tribunal recorrido tirou, ao afirmar que “as obras relativas aos benefícios que só o dono da fracção retira do uso exclusivo do terraço são por conta desse condómino, mas, por exemplo, as obras relativas à funcionalidade do terraço como “cobertura” geral do prédio estão a cargo de todos os condóminos” deriva de uma interpretação errada do preceituado no citado art. 1424º do C. Civil.
            - Como regra, o estabelecido no nº 1 deste preceito rege para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, que são pagas por todos os condóminos, na proporção do valor das suas fracções.
            - O estabelecido nos nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo constituem excepção e o terraço de cobertura (parte comum) que serve exclusivamente o condómino da fracção A é precisamente uma das excepções previstas no nº 3 do art. 1424º do C. Civil.  
            - A referência legal a que as despesas relativas às partes comuns que sirvam exclusivamente alguns condóminos ficam a cargo dos que delas se servem, não pode ser confundida com a ideia de responsabilizar os que dela tiram qualquer “benefício”.
            - A decisão recorrida violou, entre outros, os artigos 1421º e 1424 nºs 1 e 3 do C. Civil.
            Terminaram pedindo a procedência do recurso.

            Não houve contra alegação.
            Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

            Matéria de facto
            2. O tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:
            1) A aquisição da fracção “C”, correspondente ao 5º Esq.º, composta de 5 divisões, cozinha, 3 casas de banho, 2 vestíbulos, despensa, arrecadação na esteira e lugar de estacionamento na cave, do prédio urbano, freguesia do Lumiar, (…), encontra-se registada a favor da A. pela ap. 04/170294, conforme certidão de fls 8 a 14, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. A) dos factos assentes );
            2) A aquisição da fracção “A”, correspondente ao 6º frente, composta de 7 divisões, cozinha, 4 casas de banho, 3 vestíbulos, despensa, terraço, arrecadação na esteira e 2 lugares de estacionamento na cave, do prédio descrito em A encontra-se registada a favor da R. H pela ap. 26/270398, convertida pela ap. 28/280998, por compra aos RR J e E, conforme certidão de fls 15 a 17, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. B) dos factos assentes );
3) A aquisição da fracção “B”, correspondente ao 5º Dt.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor da interveniente V pela ap. 15/270495, convertida pela ap. 34/280795, conforme certidão de fls 114 a 115, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. C) dos factos assentes );
4) A aquisição da fracção “D”, correspondente ao 4º Dt.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes J pela ap. 09/120994, conforme certidão de fls 118 a 119, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. D) dos factos assentes );
5) A aquisição da fracção “E”, correspondente ao 4º Esq.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes M pela ap. 25/290595, conforme certidão de fls 120 a 122, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. E) dos factos assentes );
6) A aquisição da fracção “F”, correspondente ao 3º Dt.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes V pela ap. 17/191094, conforme certidão de fls 123 a 125, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. F) dos factos assentes );
7) A aquisição da fracção “G”, correspondente ao 3º Esq.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes A pela ap. 06/250394, conforme certidão de fls 126 a 127, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. G) dos factos assentes );
8) A aquisição da fracção “H”, correspondente ao 2º Dt.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes M pela ap. 01/310195, conforme certidão de fls 128 a 129, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. H) dos factos assentes );
9) A aquisição da fracção “I”, correspondente ao 2º Esq.º, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor do interveniente Ag pela ap. 22/050495, conforme certidão de fls 130 a 131, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. I) dos factos assentes );
10) A aquisição das fracções “J” e “L”, correspondentes ao 1º Dt.º e 1º Esq.º, respectivamente, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor dos intervenientes Ma pelas ap. 28/151194 e 22/060495, respectivamente, conforme certidão de fls 132 a 135, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. J) dos factos assentes );
11) A aquisição das fracções “M” e “N”, correspondente ao R/C – Lojas 1 e 2, respectivamente, do prédio descrito em 1) encontra-se registada a favor da interveniente B, S.A. pela ap. 22/220399, conforme certidão de fls 136 a 139, que aqui se dá por integralmente reproduzida - ( Al. L) dos factos assentes );
12) O terraço referido em 2) situa-se do lado da frente e da rua, parcialmente por cima da fracção “C” - ( Al. M) dos factos assentes );
13) E esteve desde sempre afectado ao uso exclusivo da fracção “A” e só é possível aceder ao mesmo através da referida fracção - ( Al. N) dos factos assentes );
14) A fracção “C” situa-se num prédio e num bairro novos, em local tranquilo e de prestigio, em Telheiras, no Lumiar, a cerca de 300 metros do Carrefour - ( Al. O) dos factos assentes );
15) Na vizinhança predominam urbanizações modernas, de qualidade acima da média, com ruas amplas e a zona tem bons acessos à 2ª circular, ao eixo Norte/Sul e à CRIL - ( Al. P) dos factos assentes );
16) Havia infiltrações na fracção “C” provenientes do terraço referido em 2) - ( Resposta aos 2º e 5º da base instrutória );
17) Os R.R., J e E, tinham um cão no terraço, onde estava instalada a respectiva casota - ( Resposta ao 3º da base instrutória );
18) As infiltrações provindas do terraço da fracção “A” começaram a aparecer nos anos de 1997/1998 - ( Resposta ao 4º da base instrutória );
19) Na sala grande, no quarto contíguo a esta, do lado da frente, e no quarto contíguo à cozinha, as infiltrações causaram danos nos tectos, nas paredes e no chão, que é de tacos de madeira - ( Resposta ao 6º da base instrutória );
20) A fracção “C” está desabitada desde pelo menos finais de 1998 - (Resposta ao 7º da base instrutória);
21) Em consequência das infiltrações verificadas na fracção “C” foi necessário proceder à pintura de paredes e tectos nas divisões afectadas, sendo que a A. já procedeu a reparações na sua fracção, onde deixaram de ser visíveis os vestígios das infiltrações - ( Resposta ao 9º da base instrutória );
22) Essa pintura foi orçada em Abril de 1999 em 495.000$00, acrescidos de IVA - ( Resposta ao 10º da base instrutória );
23) E à reparação e reposição do chão nas divisões afectadas em taco de madeira, sendo que a A. já procedeu a reparações na sua fracção, onde deixaram de ser visíveis os vestígios das infiltrações - ( Resposta ao 11º da base instrutória );
24) Essa reparação e reposição do chão foi orçadas em Abril de 1999 em 685.000$00, acrescidos de IVA - ( Resposta ao 12º da base instrutória );
25) A sala comum da fracção “C” tem 57 m2, a cozinha 25.5 m2 e os 4 quartos, todos com roupeiros, respectivamente, 18.5, 17, 17.5 e 16.5 m2 - (Resposta ao 13º da base instrutória );
26) O valor locativo da fracção “C” nunca seria inferior a 120.000$00 por mês - ( Resposta ao 14º da base instrutória );
27) O terraço referido em 2) dá cobertura a parte do prédio - ( Resposta ao 15º da base instrutória );
28) Desde 1995/1996 os condóminos da fracção “A” começaram a queixar-se do aparecimento de infiltrações e humidades na sua fracção - (Resposta ao 16º da base instrutória);
29) O aparecimento de infiltrações e humidades na fracção “A” deviam-se à má construção e deficiências no isolamento que permitiam pontos de entrada de água, registando-se uma deficiente betumagem de juntas de mosaico e soleiras em vão de portas e janelas no terraço - ( Resposta ao 17º da base instrutória ).

            O Direito.
            3. Embora os recorrentes não a enunciem exactamente nestes termos, em rigor, a questão a decidir traduz-se em saber quem deve ser responsabilizado pelo pagamento dos prejuízos causados numa fracção de um prédio, constituído em regime de propriedade horizontal, derivados de infiltrações oriundas num terraço do andar superior que, parcialmente serve de cobertura, mas que está afecto única e exclusivamente a outra fracção e é usado e fruído unicamente pelos donos da última, que são também os únicos a ter acesso ao dito terraço.
            Não vem questionado por ninguém que o terraço em causa, apesar de unicamente fruído e com acesso exclusivo por parte do condómino titular da fracção “A” (no caso os réus) é parte comum, nos termos do art. 1421º nº 1, al. b) do C. Civil.
            Posto isto, vejamos.
            Defendem os recorrentes que o tribunal recorrido interpretou erradamente o estatuído no preceito referido, já que, tratando-se de terraço exclusivamente afecto a uma única e concreta fracção, as despesas de conservação e manutenção do mesmo integram o segmento excepcional consagrado no nº 3 do dito art. 1424º e não a regra geral enunciada no seu nº 1 e, consequentemente a responsabilidade pelos danos causados nas outras fracções por causa do dito terraço estão também a coberto da previsão do citado nº 3.
            Todavia, sem razão, atenta a natureza das deficiências causadoras dos danos verificados.
            Estatui a norma invocada, sob a epígrafe “Encargos de conservação e fruição” que:
“1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”.
E acrescenta-se no nº 3 que “As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem”.
            Daqui deriva que, na falta de disposição negocial, como é o caso, o princípio geral aplicável à repartição das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício é o da proporcionalidade – cada condómino paga na proporção do valor da sua fracção, sendo este o valor que resulta da aplicação do disposto na parte final do art. 1418º do C. Civil. As despesas necessárias à conservação (por exemplo, limpeza e pintura do prédio, substituição de elevadores etc..), à fruição das partes comuns (despesas com electricidade, água, artigos de limpeza etc…) e ao pagamento de serviços de interesse comum (portaria, manutenção de elevadores e jardins etc…) são pagas pelos condóminos, na dita proporção.
E essa obrigação é, como afirma a generalidade da doutrina[1] uma típica obrigação propter rem – uma obrigação decorrente não de uma relação creditória autónoma, mas do estatuto do condomínio.

Já relativamente às despesas relativas aos lanços de escada e às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente alguns dos condóminos, o legislador, obedecendo ao critério da consagração da solução mais acertada, entendeu estabelecer que as mesmas deveriam ficar a cargo, exclusivamente dos que delas se servem, conforme evidencia o citado nº 3 do art. 1424º.
Só que, obviamente, no âmbito excepcional da previsão desse segmento normativo também só podem caber as despesas de conservação e manutenção estritamente relacionadas com o uso normal e específico dessas partes. As que excederem esse campo, por envolverem, por exemplo a fachada ou a cobertura do prédio ou estiverem relacionadas com a estrutura do mesmo, já têm de ser integradas no regime geral consagrado no nº 1.
Ora, no caso, ficou provado que as infiltrações verificadas na fracção da autora eram provenientes do terraço afecto à fracção A, (ponto 16 da matéria de facto), que esse terraço dá cobertura a parte do prédio (ponto 27 da matéria de facto), que o aparecimento de infiltrações e humidades na fracção da autora se deviam “à má construção e deficiências no isolamento que permitiam pontos de entrada de água, registando-se uma deficiente betumagem de juntas de mosaicos e soleiras em vão de portas e janelas no terraço” (ponto 29 da matéria de facto), causando danos nos tectos, nas paredes e no chão e que em consequência dessas infiltrações foi necessário proceder à pintura de paredes e tectos nas divisões afectadas e à reparação e reposição do chão, afectado, em taco de madeira (ponto 21 da matéria de facto), donde deriva que as infiltrações que estiveram subjacentes ao prejuízos invocados pela autora e verificados na sua fracção não se prendem com a falta de conservação ou uso anormal do terraço da fracção dos réus, mas sim com os seus elementos estruturais e com a sua finalidade enquanto elemento de cobertura do prédio ou de parte dele.
E assim sendo, dúvidas se não nos oferecem que os encargos derivados com a reparação dos prejuízos causados na fracção que actualmente pertence à 3ª ré, é da responsabilidade de todos os condóminos – incluindo da autora e 2ª ré - na proporção do valor das respectivas fracções, nos termos do citado artigo 1424º nº1 do C. Civil.[2]
Improcede, pelo exposto, a argumentação dos recorrentes, impondo-se a manutenção do decidido, na parte que foi objecto de recurso, reafirmando-se, todavia, que em sede de liquidação do valor dos danos se deverá atender à quota-parte da responsabilidade da autora e 3ª ré, dada a sua também qualidade de condóminas. 

Decisão.
4. Termos em que se acorda em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Lisboa, 13 de Março de 2008.
                                     (Maria Manuela B. Santos G. Gomes)
                                             (Olindo dos Santos Geraldes)
                                                      ( Fátima Galante )
________________________________________
[1] V, por todos, Henrique Mesquita, Rev. Direitos Sociais, ano XXIII, p. 130, Pires de Lima e Ant. Varela, Código Civil anotado, III, p. 432
[2] No mesmo sentido decidiu esta Relação, por acórdão de 29 de Junho de 1989, dito publicado na CJ, ano III, p.159 e seguintes, citado por Sandra Passinhas, em “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2º ed., p. 146/147, que considerou que o encargo com as obras de impermeabilização de um terraço de cobertura, ainda que afectado a uso exclusivo de algum dos condóminos, cabe a todos na proporção das respectivas quotas.   
E comentando aquele acórdão refere-se na obra citada: “Isto, apesar de as despesas relativas às partes comuns do edifício que sirvam algum condómino ficarem a cargo dos que delas se servem, já que o terraço, na sua função de cobertura, serve todos os condóminos, (…), do mesmo modo que um telhado não serve só o último andar, mas todos quantos protege, directa ou indirectamente. O que estava em causa, no caso concreto, não era o simples arranjo do terraço, mas antes o arranjo da própria placa, enquanto elemento da estrutura essencial do prédio e elemento protector de todo o bloco interior”.