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JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
FALTAS INJUSTIFICADAS
FALTAS POR CASAMENTO
COMUNICAÇÃO
Sumário
1. As faltas dadas pelo autor por ocasião do seu casamento são injustificadas não porque não existisse motivo justificativo e legal- casamento– mas porque sendo previsíveis não foram comunicadas com a antecedência devida. Todavia a gravidade das faltas injustificadas por omissão da sua comunicação atempada é menor que as faltas objectivamente injustificadas, isto é, quando desprovidas de motivo. 2. O comportamento do autor, ao não comunicar atempadamente as suas faltas dadas por motivo de casamento é censurável, constituindo uma infracção disciplinar, que não assume porém uma tal gravidade que torne imediata e praticamente impossível a manutenção da relação de trabalho, em termos objectivos e concretos, de acordo com o entendimento de um empregador normal em face do caso concreto e segundo critérios de objectividade e razoabilidade, e por isso que seja suficiente para justificar a aplicação da sanção de despedimento que constitui a mais grave que a ré podia ter aplicado. (sumário elaborado pela Relatora)
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa A…intentou a presente acção com forma de processo comum contra: B…, SA, pedindo: “que se julgue ilícito e abusivo o despedimento e a Ré condenada:
a) a reintegrar o A. ao seu serviço sob a cominação de sanção pecuniária compulsória adequada; b) ou caso opte pela indemnização, pagar-lhe 45 dias de retribuição por cada ano ou fracção e antiguidade até ao trânsito em julgado da sentença, no mínimo de 12 meses de retribuição; c) a pagar-lhe as retribuições intercalares vencidas no valor de 3.835,83 e as que venham a vencer-se até ao trânsito em julgado da sentença; d) bem como os respectivos juros de mora desde o despedimento somando os já vencidos 76,72.”
Para o efeito alega que começou a trabalhar para a ré em 1.2.03 e foi despedido em 20.10.05, despedimento que é ilícito porque efectuado sem justa causa.
A ré contestou impugnando a factualidade constante da petição inicial, sustentando a justa causa de despedimento porquanto o autor deu 15 faltas injustificadas.
Após a realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou do seguinte modo: “Nestes termos, considerando a acção procedente, decide-se julgar ilícito o despedimento do Autor e, consequentemente, condeno a Ré: a) a reintegrar o Autor, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; b) a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de 50€ (cinquenta euros) diários, que reverte, em partes iguais, para o Autor e para o Estado, por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegração do Autor. c) a pagar ao Autor uma quantia a título de salários vencidos desde 28 de Fevereiro de 2006 até ao trânsito em julgado desta decisão, deduzidas das quantias aludidas supra sob o nº 3.4., a liquidar posteriormente, incluindo férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal, acrescida dos juros que se vencerem, desde a data da liquidação até integral pagamento, à taxa legal.”
A ré, inconformada, interpôs recurso tendo nas suas alegações formulado as a seguir transcritas, Conclusões : (…)
Nas contra-alegações o autor pugnou pela confirmação do decidido.
O Exmº Procurador-geral-adjunto deu parecer no sentido da confirmação do decidido.
Colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar de decidir I – A questão essencial a apreciar é a de saber se as faltas injustificada dadas pelo autor constituem um comportamento suficientemente grave integrador de justa causa de despedimento. II - Fundamentos de facto
Foram considerados provados pelo tribunal da 1ª instância os seguintes factos:
1. A) A… trabalhou por conta, sob autoridade e direcção da Ré, Sociedade gestora do Autódromo …, SA, desde 1.2.03 a 20.10.05.
2. B) Com a categoria profissional de electricista.
3. C) E o vencimento de 620,00 mensais e 126,50 mensais de subsídio de alimentação.
5. D) O A. é associado do CESP – Sindicato dos Trabalhadores do Comércio Escritórios e Serviços de Portugal desde Setembro de 2003.
6.E) Bem como delegado sindical daquele, eleito em 12 de Maio de 2005.
7.F) Eleição esta comunicada à Ré por oficio de 25.05.05.
8.G) A Ré encetou um processo disciplinar com intenção de despedimento, comunicando-o ao Autor, conforme consta de fls. 217 dos autos, por carta registada com A/R, que o Autor recebeu a 08/09/2005 – fls. 224.
9.H) Enviando-lhe ainda, com essa carta, a nota de culpa que consta de fls. 219 a 223 dos autos, com esse teor, acusando o A. de ter faltado injustificadamente ao serviço de 18 a 28 de Julho de 2005 e referindo, nomeadamente, que “a falta de comunicação do Arguido e a sua ausência por tanto tempo sem o mencionado aviso prévio interferiu directamente com os trabalhos executados pela entidade patronal que teve de estruturar de novo as tarefas que lhe estavam destinadas e reordenar os trabalhos face à ausência inesperada do trabalhador”(art. 15º) .
10.I) O Autor respondeu conforme consta de fls. 215 e 216 dos autos, resposta que a Ré recebeu a 16/09/2005.
11.J) Procedeu-se à inquirição de testemunhas.
12.L) Foi feita a comunicação ao CESP conforme fls. 207.
13. M) O CESP deu o parecer junto a fls. 204 a 206.
14.N) O Autor foi ouvido prestando as declarações constantes do auto de fls. 202
15.O) O instrutor do processo elaborou o relatório final cuja cópia consta de fls.189 a 201 dos autos.
16.P) Foi feita a comunicação ao CESP referida a fls. 187.
17.Q) A Ré proferiu a decisão final junta a fls. 186 dos autos, decidindo despedir o Autor, nos termos que daí constam.
18.R) A Ré decidiu despedir o Autor, conforme fls. 180, comunicando ao Autor por carta enviada em 21/10/2005, registada e com A/R, que o Autor recebeu conforme fls. 181
19.S) Na mesma data foi feita a comunicação ao CESP conforme fls. 183 a 185.
20.T) Nos dias 14 e 15 de Julho de 2005 o A. gozou férias.
21.U) O A. casou-se no dia 16 de Julho de 2005, conforme certidão de fls.19 dos autos.
22.V) Os dias 16 e 17 foram, respectivamente, sábado e domingo.
23.X) Na 2ª feira seguinte, dia 18 de Julho, o A. deslocou-se à empresa e informou a Drª O… – Directora Administrativa e Financeira da Ré, que havia contraído casamento no sábado, dia 16.
24.Z) E que em consequência tinha direito a gozar a respectiva licença de casamento por 15 dias seguidos.
25.AA) Pelo que lhe fez entrega de um “justificativo de não picagem de ponto” de 18 a 29.7.2000, por motivo de casamento, cuja cópia a referida Drª O… lhe assinou, documento junto a fls. 20 dos autos.
26.BB) Informou ainda que mais tarde faria entrega da certidão comprovativa do casamento, logo que a obtivesse.
27.CC) A Drª O… fez-lhe reparo, dizendo que deveria ter efectuado a “comunicação do casamento mais cedo”.
28.DD) O Autor faltou ao serviço no período de 18 a 28 de Julho de 2005, inclusive.
29.EE) A Ré instaurou ao Autor um outro processo disciplinar, a que se reporta o documento junto a fls. 55 a 94 dos autos, no âmbito do qual decidiu, em 8 de Novembro de 2004 a sanção disciplinar de repreensão registada pelo “comportamento assumido no dia 10 de Setembro de 2004”, considerando que o Autor violou os deveres consagrados nas alíneas a), c) e d) do artº 121º do C.T..
30.FF) O A. formulou, em 7 de Abril de 2005, o desejo de gozar férias repartidas em quatro períodos, a saber:
- 1º período – 15/04/2005 a 18/04/2005;
- 2º período – 01/06/2005 a 09/05/2005;
- 3º período – 14/07/2005 a 15/07/2005;
- 4º período – 01/08/2005 a 17/08/2005.
31. O Autor não pensou que estivesse obrigado a comunicar o casamento com antecedência e pensava que lhe bastaria fazer entrega do documento “justificativo de não picagem de ponto”, no próprio dia em que a licença se iniciara (R.Q.5º).
32.E da certidão do casamento logo que ela lhe fosse passada pela Conservatória (R.Q.6º).
33. Pelo menos desde Março/Abril de 2005 que o Autor sabia que ia contrair casamento (R.Q.8º).
34. Todas as situações de faltas, que careçam de justificação, são pela Drª O… comunicadas à Administração da Ré que avalia os factos e as justifica, ou não (R.Q. 11º).
III – Fundamentos de direito
A questão essencial a apreciar é a de saber se as faltas injustificadas dadas pelo autor constituem um comportamento suficientemente grave integrador de justa causa de despedimento.
Na decisão sob o recurso foi entendido que o comportamento imputado ao autor não era de molde a determinar uma impossibilidade prática da subsistência da relação laboral não constituindo por isso justa causa de despedimento.
Comecemos por uma breve referência ao conceito de justa causa consignado no art.º396 do CT, que dispõe, no seu n.º1: “O comportamento culposos do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento.”
O conceito de justa causa é um conceito indeterminado pois não facultando uma ideia precisa quanto ao seu conteúdo aponta para modelos de decisão a elaborar em concreto e, constituindo a mais grave das sanções disciplinares, visa o sancionamento da conduta do trabalhador que pela sua gravidade objectiva e pela imputação subjectiva torna impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe.
O aludido conceito de justa causa de despedimento, de harmonia com o entendimento generalizado na doutrina e na jurisprudência, compreende 3 elementos:
a) Comportamento culposo do trabalhador;
b) Comportamento grave e de consequências danosas;
c) Nexo de causalidade entre esse comportamento e a impossibilidade de subsistência da relação laboral
Não basta pois um comportamento culposo é também necessário que ele seja grave em si mesmo e nas suas consequências, gravidade que deverá ser apreciada em termos objectivos e concretos, no âmbito da organização e ambiente da empresa, e não com base naquilo que o empresário subjectivamente considere como tal. E é por isso que determina o n.º2 do art. 396 do CT que: “ para apreciação da justa causa deve o tribunal atender, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que ao caso se mostrem relevantes”
Finalmente, esse comportamento culposo e grave do trabalhador apenas constituirá justa causa de despedimento quando determine a impossibilidade da subsistência da relação laboral, o que sucederá sempre que a ruptura da relação laboral seja irremediável na medida em que nenhuma outra sanção seja susceptível de ser aplicada, perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade empregadora e o trabalhador.
Sublinhe-se que estes 3 elementos, culpa, gravidade e nexo de causalidade entre eles e a impossibilidade da subsistência da relação laboral, devem ser apreciados em termos objectivos e concretos, de acordo com o entendimento de um bom pai de família ou um empregador normal em face do caso concreto e segundo critérios de objectividade e razoabilidade, vide, jurisprudência sobre esta matéria, a título de exemplo, Ac. do STJ de 28.1.1998 in AD, 436º – 558 e de 12.5.1999, CJ 2º Tomo – pág. 276 e segts.
O autor é acusado na nota de culpa de ter faltado injustificadamente ao serviço durante 15 dias seguidos.
A noção de falta, dada pelo art.º224, do CT, é a ausência do trabalhador no local de trabalho e durante o período em que devia desempenhar a actividade a que está adstrito. Em matéria de faltas o art.º225, do CT distingue ainda as faltas justificadas e injustificadas, dispondo um elenco taxativo de justificações atendíveis – relevando, para o caso, o enunciado no nº 2, alínea a) – que considera justificadas as faltas dadas durante 15 dias seguidos, por altura do casamento.
Mas a lei estabelece ainda a obrigatoriedade da comunicação das faltas justificadas por parte do trabalhador, nos termos do art.º228, do CT. Aí se distinguem as faltas previsíveis, que devem ser comunicadas ao empregador com 5 dias de antecedência, e as imprevisíveis, que devem ser comunicadas à entidade patronal «logo que possível». O incumprimento do dever de comunicação torna as faltas injustificadas, nos termos do art.º229, nº6 do CT, sendo certo que é sobre o trabalhador que impende o ónus de provar a justificação embora a lei não imponha qualquer formalismo especial para o efeito.
No caso em apreço provou-se que o autor faltou ao trabalho no período de 18 a 28 de Julho de 2005, por motivo de casamento, mas só comunicou à ré a sua ausência e motivo respectivo no próprio dia em que se casou e que, por isso, deixou de prestar trabalho.
A sentença recorrida considerou, e parece-nos que bem, justificadas apenas as faltas dadas a partir do 6º dia de ausência, concluindo que o autor deu cinco faltas seguidas injustificadas, ou seja, nos dias 18, 19, 20, 21 e 22 de Julho de 2005 (2ª a 6ª feira), pois que sendo previsíveis não foram atempadamente comunicadas à ré.
Estas faltas são assim injustificadas não porque não existisse motivo justificativo e legal – o casamento do autor – mas porque sendo previsíveis não foram comunicadas com a antecedência devida. Acolhendo o entendimento perfilhado em acórdão do STJ de 29/04/1992, a gravidade das faltas injustificadas por omissão da sua comunicação atempada é menor que as faltas objectivamente injustificadas, isto é, quando desprovidas de motivo justificativo, como se refere no citado acórdão: “Devem distinguir-se três tipos de infracções relacionadas com o dever de assiduidade: a falta injustificável, a não comunicação tempestiva da falta justificável ou do motivo justificativo e a não comprovação ou justificação com verdade. O primeiro e o terceiro destes tipos de infracção, com previsão no nº 2 do art. 10º do Dec.-Lei 372-A/75, assumem uma gravidade mais intensa, representando o segundo tipo o incumprimento do dever de comunicar a falta e de a justificar, que corresponde ao dever de colaborar no processo de controlo do dever de assiduidade pela entidade patronal”. Citado no CT, Abílio Neto 2ª edição pág. 387-388.
Mas a recorrente alega ainda que o autor ao omitir que ia contrair matrimónio e propondo um plano de férias que, em conjunto com as férias de casamento, tiveram como efeito a sua ausência do serviço durante mais de um mês, numa altura em que os autódromos têm utilização plena, o apelado agiu de má fé, manifestando total desinteresse, incumprindo deveres contratuais e não colaborou com a apelante como devia, agindo, assim, com culpa grave.
Com efeito, parece-nos que a recorrente tem razão na afirmação de que o autor ao não ter comunicado atempadamente a sua ausência, por casamento, fazendo-a coincidir com a continuação das férias, revelou uma atitude pouco colaborante, atendendo a que se tratava de uma altura do ano em que o serviço prestado pela ré tem uma maior procura. Todavia tal comportamento não configura, por si só, uma infracção disciplinar grave embora revele uma atitude de menos empenho e colaboração por parte do autor a ser valorada nas suas qualidades produtivas. Resultou ainda provado, quanto à intencionalidade do autor, que este não pensou que estivesse obrigado a comunicar o casamento com antecedência e pensava que lhe bastaria fazer entrega do documento “justificativo de não picagem de ponto”, no próprio dia em que a licença se iniciara (facto n.º31), afastando-se assim a invocada má-fé por parte do autor.
Por último a recorrente faz ainda uma referência ao cadastro do autor, a quem lhe foi aplicada sanção disciplinar de repreensão registada em Novembro de 2004 (facto n.º 29). Contudo tal matéria não constava da nota de culpa nem da decisão de despedimento pelo que não poderá ser agora dada a relevância pretendia pela apelante, pois na acção de impugnação de despedimento apenas podem ser invocados os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador – conforme decorre do disposto n.º3 do art. 435 do CT.
Do exposto afigura-se-nos que o comportamento do autor, ao não comunicar atempadamente as suas faltas dadas por motivo de casamento é censurável, constituindo uma infracção disciplinar, que não assume porém uma tal gravidade que torne imediata e praticamente impossível a manutenção da relação de trabalho, em termos objectivos e concretos, de acordo com o entendimento de um empregador normal em face do caso concreto e segundo critérios de objectividade e razoabilidade, e por isso que seja suficiente para justificar a aplicação da sanção de despedimento que constitui a mais grave que a ré podia ter aplicado.
Não procedem pois os fundamentos do recurso.
IV – Decisão Face ao exposto, julga-se improcedente o recurso interposto pela ré/ recorrente e confirma-se a sentença recorrida. Custas pela recorrente. Lisboa, 23 de Abril de 2008.