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TRANSPORTE AÉREO
PREÇO
Sumário
1. A denominada " passenger service charge é "um encargo do passageiro pela utilização do aeroporto. 2.Trata-se de uma taxa de serviço a passageiros que é devida por cada passageiro embarcado e pode ser diferenciada segundo o destino do passageiro, taxas devidas pela ocupação de terrenos, edificações e outras instalações, bem como pelo exercício de quaisquer actividades, na área dos aeroportos e aeródromos públicos ou pela sua utilização ou dos seus respectivos serviços e equipamentos 3.Embora debitada às transportadoras, o transportador faz repercutir essa taxa ao passageiro, que a paga quando da emissão do bilhete. 4.Não obstante se tratar de mera taxa, tem de admitir-se como constituída, incluída no preço do transporte do preço. 5.Assim, são, pois, as transportadoras responsáveis pela devolução do montante de tais taxas, uma vez que aquelas actuam como comissárias. (SS)
Texto Integral
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA – SECÇÃO CÍVEL:
I.
A Associação Portuguesa ………….., intentou, no tribunal judicial de Lisboa, a presente acção declarativa de condenação e simples apreciação, com processo ordinário, contra ………………….., S.A.,
pedindo a condenação da R. a pagar os montantes correspondentes à comissão incidente sobre o passenger service charge, desde 1 de Janeiro de 1994 até final, bem como juros desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento, calculados às taxas legais em vigor em cada momento, sendo o montante devido relativamente aos anos de 1998 a 2000 de € 168.433,29 (resultante da soma de € 41.003,80, € 50.043,13 e € 77.386,36, montantes correspondentes aos anos de 1998 a 2000, respectivamente), e € 74.516,52, relativos aos juros dos anos atrás mencionados, contados desde o dia 1 de Janeiro do ano seguinte ao que se reportam.
Pediu ainda que seja declarada a existência do direito das representadas da APAVT a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à passenger service charge.
Para tanto alega, em síntese, que:
- até 31 de Dezembro de 1993, as companhias aéreas, nomeadamente a R., apresentavam uma tarifa única no título de transporte (adiante designado bilhete) e autonomizavam uma taxa única (a taxa de segurança), pagando aos Agentes de Viagens uma comissão, correspondente a uma percentagem, em vigor em cada momento, sobre a tarifa; - a partir de 1 de Janeiro de 1994, a R. alterou esta prática, passando a apresentar, no título de transporte, uma série de caixas (boxes) - PTE – Tarifa, PT – correspondente à taxa de segurança (security charge) e YP – correspondente à taxa de serviço de passageiros (passenger service charge) – com o objectivo de excluir da comissão paga aos Agentes de Viagens o montante referente à passenger service charge; - a passenger service charge cobrada pelo aeroporto às companhias aéreas faz parte dos custos que estas têm que suportar para transportar os passageiros que procuram os seus serviços, correspondendo ao montante que o aeroporto cobra à companhia aérea pela utilização e movimentação de passageiros, clientes dessa companhia, naquelas instalações.
Citada a Ré, a mesma contestou, excepcionando a ilegitimidade da A. relativamente ao pedido formulado e a prescrição do eventual crédito resultante das comissões vencidas até 15 de Novembro de 1998.
Alegou que, por lapso, até 31 de Dezembro de 1993 comissionou as agências de viagens incluindo a taxa de serviços de passageiros na tarifa ou preço do bilhete. Alegou ainda que a alteração ocorrida a partir de 1 de Janeiro de 1994 corresponde ao cumprimento da Resolução 814 e que a taxa de serviço de passageiros não é um encargo da Companhia de Aviação, sendo devida por cada passageiro, embora debitada às transportadoras que a fazem repercutir no passageiro, razão pela qual não pode ser incluída na tarifa (que reflecte o preço da actividade da transportadora).
Na réplica a Autora pronunciou-se sobre as excepções invocadas, pedindo a sua improcedência e respondeu à factualidade alegada na contestação.
II.
Foi proferido o despacho de fls. 114 dos autos, que considerou inadmissível a réplica à matéria que excede as excepções da ilegitimidade e prescrição e declarou como não escritos os artigos 26º a 98º, inclusive, da réplica.
III.
Saneou-se o processado, julgando improcedentes as excepções da ilegitimidade da A. e da prescrição invocadas.
IV.
A decisão que julga a A. parte ilegítima foi objecto de recurso admitido coimo agravo.
V.
A base instrutória foi objecto de reclamação e decisão a fls. 662 a 665 dos autos.
VI.
Uma vez efectuado o julgamento, as partes alegaram por escrito (fls. 748 a 763 e 767 a 773).
Foi junto o parecer de fls. 776 e ss.
VII.
Consideraram-se assentes os seguintes factos:
1. A A. …………….., é uma associação empresarial representativa dos interesses de 511 agências de viagens e turismo, com sede em Portugal, as quais representam 1018 pontos de venda (al. A) da matéria assente). 2. A R. .............. é a maior companhia aérea de Espanha (al. B) da matéria assente). 3. A R. é membro efectivo da International Air Transport Association (IATA), associação representativa dos interesses das companhias aéreas (al. C) da matéria assente). 4. Das agências de viagens associadas da APAVT, as constantes da lista a fls. 422 e ss., com exclusão das constantes de fls. 468 (a partir das datas aí referidas) estão acreditadas junto da IATA (al. D) da matéria assente). 5. As agências de viagens acreditadas junto da IATA subscreveram o contrato de adesão à mesma, aceitando o bloco de normas que esta entidade emite, relativas à emissão e venda de bilhetes das companhias aéreas associadas da IATA, ao abrigo de um contrato-tipo de agência, nos termos definidos por aquela e pelos seus membros (al. E) da matéria assente). 6. As agências de viagens incluem, na sua actividade, a intermediação na venda de bilhetes de avião (al. F) da matéria assente). 7. A esmagadora maioria dos bilhetes vendidos em Portugal é-o através das agências de viagens acreditadas pela IATA (al. G) da matéria assente). 8. No que concerne à venda de bilhetes das companhias aéreas pelas agências de viagens, dispõe o artigo 9º da Resolução n.º 824 da IATA, intitulada «Passengers Sales Agency Agreement», de 15.12.1993: “9. Remuneração No âmbito deste contrato, a Companhia Aérea retribuirá ao Agente, pela venda de bilhetes de avião e serviços adicionais prestados pelo Agente, com a importância periodicamente fixada e comunicada ao Agente pela Companhia Aérea. Esta retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à companhia aérea» - vd. documento a fls. 341 e sua tradução a fls. 343 (al. H) da matéria assente). 9. O artigo 9.4., da Resolução n.º 814 da IATA, intitulada «Passengers Sales Agency Rules», de 17.01.1990, estabelece o seguinte: «9.4. Condições Para Pagamento da Comissão 9.4.1. Havendo lugar ao pagamento de comissão ao Agente deverá a mesma ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de passageiros ou sobre o pagamento de preço do charter pago ao membro ou ao “Clearing Bank” nos termos do “Bank Settlement Plan”, e recebido pelo Agente (…) 9.4.2. As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) para o transporte, de acordo com as tarifas dos Membros e excluem quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem, bem como todos os impostos e outros encargos cobrados pelo Agente» - vd. documento a fls. 339-340 e sua tradução a fls. 344-345 (al. I) da matéria assente). 10. Em tempos mais recuados, as companhias aéreas, nomeadamente a R., apresentavam uma tarifa única no título de transporte (bilhete) e autonomizavam uma taxa única (a taxa de segurança), pagando aos Agentes de Viagens uma comissão, correspondente a uma percentagem, em vigor em cada momento, sobre a tarifa (al. J) da matéria assente). 11. Tal prática vigorou até 31.12.1993 (al. L) da matéria assente). 12. A partir de 01.01.1994, a R. alterou esta prática, passando a apresentar, no título de transporte, uma série de caixas (boxes), a saber: PTE – Tarifa; PT – correspondente à taxa de segurança (security charge); YP – correspondente à taxa de serviço de passageiros (passenger service charge) em Portugal (al. M) da matéria assente). 13. As caixas mencionadas são as constantes de um bilhete em transporte aéreo doméstico (al. N) da matéria assente). 14. Nos bilhetes utilizados em transporte aéreo internacional (que são todos os emitidos pelas Agências em nome da R., há mais uma caixa, correspondente ao passenger service charge cobrado à companhia aérea pelo aeroporto do outro país (al. O) da matéria assente). 15. Até ao final de 1993, a passenger service charge não era referida no bilhete emitido para o passageiro, embora já antes daquela data os aeroportos a cobrassem às companhias aéreas (al. P) da matéria assente). 16. Em consequência de tal alteração, desde 01.01.1994 as Agências de Viagens deixaram de receber da R., por força da introdução da caixa (box) YP (referente à passenger service charge), os montantes referentes às comissões sobre essa parcela (al.Q) da matéria assente). 17. As comissões em vigor entre 01.01.1994 e 31.03.2001 correspondiam a 9% do valor da venda do dos bilhetes (al.R) da matéria assente). 18. Entre 01.04.2001 e 31.10.2001, a taxa acima mencionada desceu para os 8% (al.S) da matéria assente). 19. Desde 01.11.2001 aquela taxa situa-se nos 7% (al.T) da matéria assente). 20. Nos anos de 1998, 1999 e 2000 a R. cobrou, a título de passenger service charge quantias não concretamente apuradas (resp. q. 1º, 2º e 3º da B.I.). 21. A R. cobrou ainda nos anos de 1994, 1995, 1996, 1997, 2001, 2002, 2003, 2004, bem como nos respeitantes com data posterior a 31 de Dezembro de 2004, quantias a título de passenger service charge (resp. q. 4º da B.I.).
VIII.
Face a tais factos, o tribunal julgou a acção procedente e em consequência, decidiu:
«a) reconheço o direito das representadas da APAVT a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à taxa de serviço a passageiros (passenger service charge); b) condeno a R. a pagar à A. a quantia que se apurar em execução de sentença, referente à comissão devida sobre a passenger service charge no período de 1 de Janeiro de 1994 até hoje».
VIII.
Desta decisão recorre agora a Ré, pretendendo a sua alteração com as seguintes conclusões:
1. A Taxa de Serviços ao Passageiro é devida por cada passageiro embarcado (n°.1 do Art°. 8° do Dec. Reg. 12/99). 2. A Taxa é cobrada pela Operadora com o preço do bilhete mas entregue, integralmente, à entidade que gere o Aeroporto. 3. O valor da Taxa não integra o preço do bilhete ou, o mesmo é dizer, o respectivo tarifário. 4. A comissão devida às Agências de Viagens por intermédio de venda de bilhetes para Transporte Aéreo de Passageiros incide sobre a tarifa, sendo excluídas destas as penalidades (excesso no valor da bagagem), impostos e demais encargos. (Art°. 9.4. do Regulamento LATA n°.814). 5. O valor da taxa não é passível de comissionamento. 6. A sentença recorrida faz errada aplicação do disposto no n°.1 do Artigo 8° do Decreto-Lei 12/99 e do Artigo 9.4 do Regulamento IATA n°.814.
Termos em que, e nos que doutamente serão supridos, espera:
1. A procedência dos agravos interpostos e, em consequência, que a Autora seja declarada parte ilegítima e a R. absolvida.
2. Para a hipótese de se apreciar o Recurso de Apelação, que a sentença de 1a. Instância seja revogada e em consequência a R. absolvida do pedido.
Contra alegou a A. entendendo que os recursos não merecem provimento.
IX.
Mostram-se interpostos 3 recursos:
Um de agravo do despacho de fls.114 na parte em que indefere o desentranhamento de dois requerimentos da Ré;
Outro de agravo do despacho saneador;
O terceiro de apelação da sentença final.
Conhecer-se-á primeiro dos recursos de agravo, não só porque os recursos são julgados pela ordem de sua interposição, mas também porque a sua (im)procedência pode condicionar ou prejudicar o conhecimento do recurso de apelação.
XI.
Agravo de fls. 169.
O despacho de fls. 166 ordenou o desentranhamento de dois requerimentos da Ré:
Um, de fls. 153/154, em que a Ré se opõe ao pedido de rectificação da A. constante de fls. 118;
Outro, de fls. 162/163, no qual a Ré responde ao pedido da A. de desentranhamento daquele requerimento de fls. 153/154.
Ambos os requerimentos traduzem atitude processual da Ré relativamente a entendimentos processuais da A.
Ora, independentemente da análise ou julgamento da questão fundamental expressa nos requerimentos que ora se referem, o certo é que, face ao disposto no art. 3-A do CPC o tribunal, por aplicação do princípio da igualdade, deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.
Por outro lado, o controle do julgamento e da conformidade da norma com o formalismo processual exige que todas as partes acompanhem o seu desenvolvimento de modo a que nada seja deferido sem prévia audiência da parte contrária (cfr. art. 207.º - regras gerais sobre o julgamento)
Por conseguinte, a audição da Ré relativamente aos requerimentos acima referidos evidenciava-se.
Razão porque não tem, pois, fundamento o despacho que se impugnou que por isso se revoga, aí se incluindo obviamente a decisão que condena em custas uma vez que não existe pressuposto que a determine.
XII.
2º agravo – parte da decisão do despacho saneador que julga a A. parte legítima
Entende a Ré que a A. é parte ilegítima, porquanto:
1. Ao contrário do que se afirma no Despacho recorrido a Assembleia-Geral de 18 de Julho de 2001 não deliberou a propositura da presente acção. 2. Nem essa Assembleia-Geral podia deliberar sobre essa matéria, uma vez que a mesma não integrava a respectiva Ordem de Trabalhos. 3. Os presentes autos não são os de uma acção popular prevista no Art°. 52° da Constituição e regulada na Lei 83/95 de 31 de Agosto. 4. A Autora não pode arrogar-se a representação que lhe daria a legitimidade por força das referidas disposições as do Art°. 26-A do C.P.C. 5. A Autora não pode ser admitida em Juízo em representação de quem não autorizou nem lhe conferiu mandato para o efeito. 6. A irregularidade da representação implica a ilegitimidade da Autora. 7.O Despacho recorrido infringe o Art° 26° do C.P.C.
Termos em que, e nos que doutamente serão supridos, pede e espera a revogação do Despacho recorrido e, em consequência, declarada a irregularidade da representação que a Autora se arroga e consequente ilegitimidade, a absolvição de instância.
Novamente entende a A. dever manter-se a decisão impugnada pelas razões que indica nas suas contra alegações.
XIII.
No despacho saneador o tribunal decidiu que a A. é parte legitima porque:
"A Autora alegou, na P.I. que é uma associação empresarial representativa dos interesses de 511 Agências de Viagens e Turismo, entre as quais 302 acreditadas junto da IATA. Pede a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia correspondente a parte de comissões que as referidas Agências creditadas junto da IATA deixaram de receber em razão do facto da Ré ter deixado de incluir, no valor de referência, o montante correspondente a passanger Service Charge. Do Artigo 3°, n°.1, alínea X) dos Estatutos da Autora, juntos a Fls. 132 e ss., resulta que entre as suas atribuições consta a de representar em Juízo os seus Associados, sempre que estejam em causa interesses que representem o Sector das Agências de Viagens. Da Acta de Assembleia-Geral da Autora, realizada a 18 de Julho de 2001 junta a Fls. 389 e ss., consta a aprovação da deliberação de serem intentadas pela Autora, acções judiciais contra as Companhias Aéreas, para recebimento das comissões de serviço aos passageiros. Daqui decorrem inequivocamente os poderes de representação da Autora relativamente à Agências acreditadas na IATA, suas Associadas. Tendo a Autora poderes de representação das Agências Associadas, a sua actuação tem, necessariamente, repercussões na esfera jurídica de cada uma delas. Actuando como representante, na acção, é também como representante – e não em nome próprio – que pede a condenação da Ré a pagar-lhe determinadas quantias. Em caso de procedência da acção, haverá eventualmente que proceder à divisão entre as representadas do produto que venha a ser obtido, mas trata-se já de uma questão interna, entre Autora e suas Representadas, à qual a Ré é alheia".
Na contestação a ré havia excepcionado a sua ilegitimidade com o fundamento em que:
A A. não alega, nem prova, que a representação que se arroga lhe permita recorrer a juízo em nome das Agências de Viagem. Mas, ainda que tal faculdade lhe assistisse, certo é que, actuando em representação das Agências, a Autora tem de agir no interesse destas e em sua representação. E, por isso, a pretensão de que a Ré seja condenada teria de se traduzir na constituição de obrigação da mesma R. perante as Agências de Viagens representadas pela A e cuja existência seja comprovada.
XIV.
Ora, é sabido que a legitimidade das partes é uma figura de índole processual e por isso deve ser aferida com recurso às normas processuais.
Ultrapassadas, pois, as divergências doutrinais na definição de legitimidade entende-se que, para se aferir da legitimidade - processual – se deve atender à configuração da relação material controvertida tal como é configurada pelo A., sendo certo que a legitimidade processual pode coincidir ou não com a legitimidade de direito substantivo.
Por outro lado, “na falta da indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor” (artigo 26º/3).
Por conseguinte, a legitimidade, pressuposto processual subjectivo relativo ás partes, refere-se à sua posição perante o objecto da lide, prende-se com o interesse que estas têm na relação jurídica concreta trazida a juízo e é ‘apreciada pela relação da parte com o objecto da causa, pelo interesse que a relaciona com esse objecto’, pelo que as partes devem ser os titulares do interesse em litígio.
A aferição da legitimidade das partes é avaliada em função da posição que ocupam na relação alegada pelo autor, em face do pedido formulado e causa de pedir invocada, tal como foi delineada pelo autor.
Face ao estatuído no art 26 do CPC a parte é legítima quando tem um interesse directo em demandar ou contradizer, de modo que a decisão da causa seja susceptível de afectar uma relação jurídica de que a pessoa seja titular.
Ora, se se atentar na causa de pedir e no pedido formulados, bem como nos conceitos que supra se referiram sobre tal conceito dúvidas não existem que a A. tem todo o interesse em demandar, já que é evidente a utilidade que para si advém da procedência da acção.
Agora, se na realidade tem ou não o direito de accionar a demanda contra a Ré, se afinal lhe são ou não favoráveis as disposições legais para tanto, se é ou não reconhecida judicialmente como associação representativa para o efeito, isso já terá directamente que «ver» com a decisão de mérito, com o fundo da questão e não diz directamente respeito à legitimidade formal que ora se analisa.
Assim sendo, é, pois, a A. parte legítima.
Deste modo improcedem as conclusões das alegações de recurso quanto a tal particularidade.
XV.
É sabido e tem sido jurisprudência uniforme a conclusão de que o objecto do recurso se limita em face das conclusões contidas nas alegações do recorrente, pelo que, em princípio, só abrange as questões aí contidas, como resultado aliás do disposto nos artigos 684. 3 e 690.1 do CPC.
Face às conclusões das alegações temos que o objecto do recurso de apelação se resume:
Devem as alíneas O e P ser objecto de nova redacção nomeadamente aquela sugerida pela apelante?
Existe ou não fundamento para a procedência da acção?
XVI.
A redacção das alíneas O e P têm a seguinte redacção:
Nos bilhetes utilizados em transporte aéreo internacional (que são todos os emitidos pelas Agências em nome da R.), há mais uma caixa, correspondente ao passenger service charge cobrado à companhia aérea pelo aeroporto do outro país (nº 14 da matéria de facto) (al. O) da matéria assente).
Até ao final de 1993, a passenger service charge não era referida no bilhete emitido para o passageiro, embora já antes daquela data os aeroportos a cobrassem às companhias aéreas (nº 15 da matéria de facto) (al. P) da matéria assente).
Não parece na realidade que haja motivo para alteração da redacção das alíneas em causa e muito menos que devam passar para o questionário, sendo certo que salvo o devido respeito aquilo que a Ré invoca como justificação para nova ou outra redacção e /ou necessidade de quesitação.
O tribunal indeferiu tal reclamação com o fundamento entre outros que ….. A Ré ao contrário do que refere na sua reclamação, não impugnou tal factualidade, pelo que a mesma deve ser considerada assente.
Aliás, o serviço de passageiros é cobrado pela autoridade aeroportuária à Ré. O que a Ré questiona e não aceita é ser ela a devedora dessa taxa. Defende que o devedor é o passageiro e que a Ré apenas é intermediária nessa cobrança.
Todavia, tal posição não colide com a factualidade assente nas alíneas objecto de reclamação e deverá ser discutida em sede de sentença…».
Primeiro, a redacção a incluir na base instrutória deve ser aquela que emerge da alegação da A. na petição e não aquela originária da Ré na contestação, ainda que seja idêntico ou similar o seu conteúdo.
Segundo, parece que os factos invocados pela A. nesta sede não foram impugnados expressamente pela ré, antes lhe confere nova e outra complementaridade.
Atente-se na versão da A.: nos bilhetes emitidos pelas agências em nome da Ré existe mais uma referência - passenger service charge –que é cobrado à companhia aérea pelo aeroporto do outro país.
Adianta a Ré:
"a passenger service charge é "um encargo do passageiro pela utilização do aeroporto – cfr. art. 32 da contestação.
Não existe qualquer divergência.
Aliás a própria Ré admite:
A taxa de serviço a passageiros é devida por cada passageiro.(art. 24 p. i.)
Embora debitada às transportadoras (art. 26).
O transportador faz repercutir essa taxa ao passageiro, que a paga quando da emissão do bilhete.
Ambas admitem que é um encargo do passageiro. Aliás não podia deixar de ser doutro modo, sob pena de se questionar neste pormenor o princípio do utilizador –pagador.
Acresce que a Ré não questionou a circunstância de em tal bilhete existir mais essa «tal caixa».
O que a Ré questiona e por isso se insurge é a fundamentação jurídica e conclusiva da sua posição que não se enquadra nas alíneas em causa: a A. entende que tal taxa deve ser paga pelas companhias aéreas porque a cobram ao passageiro e a devem imputar à agência.
A ré porque …« o devedor é o passageiro e que a Ré apenas é intermediária nessa cobrança.
Por isso, não aceita é ser ela a devedora dessa taxa.
O próprio tribunal havia referido que …«a questão que importa apurar nestes autos é a de saber se as quantias cobradas pela R. a título de “passenger service charge” deverão ser consideradas para efeitos de cálculo da comissão a pagar ao agente (agências de viagem) por parte da R…».
É a mesma realidade, embora se utilize o termo cobrar em 2 sentidos: o serviço passenger service chargeé cobrado à companhia aérea pelo aeroporto.
E, como informa a Ré, esta taxa é cobrada ao passageiro por intermédio daquela companhia.
Trata-se, pois, de acepção complementar e não antagónica ou contraditória.
O mesmo se diga com s mesmos fundamentos do conteúdo da alínea P.
Assim sendo, improcedem as conclusões de recurso no que a tal diz respeito.
Finalmente, quanto à procedência da acção?
XVII.
A A. “……………” pede a condenação da R. a pagar os montantes correspondentes à comissão incidente sobre o “passenger service charge”, desde 1 de Janeiro de 1994 até final, bem como juros desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento, calculados às taxas legais em vigor em cada momento e que seja declarada a existência do direito das representadas da APAVT a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à passenger service charge.
Comprova-se da matéria de facto assente que:
A A. ……………… (APAVT), é uma associação empresarial representativa dos interesses de 511 agências de viagens e turismo, com sede em Portugal A R. é membro efectivo da International Air Transport Association (IATA), associação representativa dos interesses das companhias aéreas (al. C) da matéria assente). As agências de viagens acreditadas junto da IATA subscreveram o contrato de adesão à mesma, aceitando o bloco de normas que esta entidade emite, relativas à emissão e venda de bilhetes das companhias aéreas associadas da IATA, ao abrigo de um contrato-tipo de agência As agências de viagens incluem, na sua actividade, a intermediação na venda de bilhetes de avião A esmagadora maioria dos bilhetes vendidos em Portugal é-o através das agências de viagens acreditadas pela IATA (al. G) da matéria assente). Nos bilhetes utilizados em transporte aéreo internacional (que são todos os emitidos pelas Agências em nome da R., há mais uma caixa, correspondente ao passenger service charge cobrado à companhia aérea pelo aeroporto do outro país (al. O) da matéria assente). Até ao final de 1993, a passenger service charge não era referida no bilhete emitido para o passageiro, embora já antes daquela data os aeroportos a cobrassem às companhias aéreas (al. P) da matéria assente). Em consequência de tal alteração, desde 01.01.1994 as Agências de Viagens deixaram de receber da R., por força da introdução da caixa (box) YP (referente à passenger service charge), os montantes referentes às comissões sobre essa parcela (al.Q) da matéria assente).
O tribunal julgou a acção procedente e reconheceu o direito das representadas da APAVT a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à taxa de serviço a passageiros (passenger service charge), condenando a R. a pagar à A. a quantia que se apurar em execução de sentença, referente à comissão devida sobre a passenger service charge no período de 1 de Janeiro de 1994 até hoje.
A decisão parece-nos correcta e adequada às normas regulamentares e legais em quer se fundamenta.
XVIII.
Já se consignou que a R. é membro efectivo da IATA.
É expressamente reconhecido pelas partes a aplicabilidade das Resoluções emitidas pela IATA, que versam sobre o modo de determinação das comissões devidas pelas companhias aéreas às agências de viagem.
No que concerne à venda de bilhetes das companhias aéreas pelas agências de viagens, dispõe o artigo 9º da Resolução n.º 824 da IATA, intitulada «Passengers Sales Agency Agreement», de 15.12.1993:
“9. Remuneração
No âmbito deste contrato, a Companhia Aérea retribuirá ao Agente, pela venda de bilhetes de avião e serviços adicionais prestados pelo Agente, com a importância periodicamente fixada e comunicada ao Agente pela Companhia Aérea. Esta retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à companhia aérea» - vd. documento a fls. 341 e sua tradução a fls. 343 (al. H) da matéria assente).
O artigo 9.4., da Resolução n.º 814 da IATA, intitulada «Passengers Sales Agency Rules», de 17.01.1990, estabelece o seguinte:
«9.4. Condições Para Pagamento da Comissão
9.4.1. Havendo lugar ao pagamento de comissão ao Agente deverá a mesma ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de passageiros ou sobre o pagamento de preço do charter pago ao membro ou ao “Clearing Bank” nos termos do “Bank Settlement Plan”, e recebido pelo Agente (…)
9.4.2. As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) para o transporte, de acordo com as tarifas dos Membros e excluem quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem, bem como todos os impostos e outros encargos cobrados pelo Agente».
O Decreto regulamentar nº 12/99 de 30/07 que regulamenta o D. L. nº 102/99 de 21/03 define as taxas devidas pela ocupação de terrenos, edificações e outras instalações, bem como pelo exercício de quaisquer actividades, na área dos aeroportos e aeródromos públicos ou pela sua utilização ou dos seus respectivos serviços e equipamentos.
Aqui se prevê - Artigo 8. - Taxa de serviço a passageiros: a taxa de serviço a passageiros é devida por cada passageiro embarcado e pode ser diferenciada segundo o destino do passageiro, taxas devidas pela ocupação de terrenos, edificações e outras instalações, bem como pelo exercício de quaisquer actividades, na área dos aeroportos e aeródromos públicos ou pela sua utilização ou dos seus respectivos serviços e equipamentos.
É sabido que o nosso regime fiscal define três tipos de tributos: impostos, taxas e contribuições especiais.
“Os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património”.
As taxas são aplicadas quando existe “prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.
OU,
Como se diz em parecer da autoria dos Drs. J. Xavier de Basto e António Lobo Xavier, transcrito no Ac. do TCA, de 12/03/02, Processo 5575/01, “para efeitos de uma correcta caracterização da taxa é útil a distinção marcada com nitidez pela doutrina nacional entre três tipos de situações que podem dar lugar à exigência de uma taxa, correspondentes a três diferentes naturezas de que pode revestir-se a contrapartida oferecida pelo Estado.
São, em primeiro lugar, as taxas devidas pela utilização dos serviços públicos individualizados.
São, em segundo lugar, as taxas devidas pela utilização de bens do domínio público.
São, finalmente, as taxas devidas pelo levantamento de obstáculos ao exercício de certas actividades pelos particulares, muito frequentemente designadas por licenças”.
Não restam dúvidas estarmos perante uma taxa.
Aliás a própria Ré não o nega, do mesmo modo que o eminente parecer fls. 776 e segs o reconhece.
Argumenta essencialmente que em virtude de ser responsável perante a autoridade portuária pela cobrança da taxa de passageiro e sua entrega àquela entidade não pode agora se responsável pelo seu pagamento tanto mais que não fazendo parte da tarifa o seu custo não pode ser objecto de comissionamento.
Ora, na própria decisão impugnada, se consignou que face à resolução nº 824 de 15.12.1993 e a Resolução nº 814 da I.A.T.A. a taxa de serviço a passageiros integra o conceito de “tarifa do transporte aéreo” devendo assim ser considerado para efeitos do cálculo da comissão.
E, não obstante se tratar de mera taxa, tem de admitir-se como constituída, incluída no preço do transporte do preço.
XIX.
De acordo com as citadas Resoluções – 814 e 824 – as empresas de transporte aéreo têm de remunerar as agências de viagens pela venda de bilhetes e pelos serviços que prestarem.
Esta comissão é calculada de forma proporcionada sobre o valor correspondente à tarifa.
A tarifa, de facto, consiste na retribuição dos serviços prestados pelas companhias aéreas aí se incluindo o transporte do passageiro e a respectiva bagagem.
Nessa tarifa se incluem taxas, com exclusão daquelas devidas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem e, bem assim, os demais encargos que eventualmente sejam cobrados pelo agente.
E obviamente que nela se inclui também a PSC – passenger service charge – correspondente à taxa de serviço de passageiros, tanto mais não excluída daquela uma vez que não é uma taxa pelo excesso de bagagem, não é uma taxa de valor de bagagem, não é um imposto e não é um encargo cobrado pelo agente.
Incluindo-se como se inclui na tarifa total é objecto de comissão a favor das respectivas agências de viagens.
Tendo-se comprovado que a Ré cobrou, ainda que quantias não apuradas, nos anos em referência, e a esse título não se comprovando o pagamento das respectivas comissões às associadas da Ré, é evidente que as mesmas são devidas à A.
Nessa perspectiva, improcedem as demais conclusões das alegações de recurso o que determina a sua improcedência.
XX. Deste modo, pelo exposto, julgam-se improcedentes os recursos de agravo atrás mencionados e bem assim o recurso de apelação, mantendo-se as respectivas decisões.
Custas do 1º agravo pela apelada.
Custas dos demais recursos pela apelante.
Registe e notifique.
Lisboa, 08.05.08
Fernando Silva Santos
Francisco Bruto da Costa
Catarina Arelo Manso