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PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
INDEMNIZAÇÃO
DANO EMERGENTE
LUCRO CESSANTE
Sumário
I - Dá-se a inexecução da obrigação quando, chegado o vencimento, o devedor não realiza a prestação ou realiza-a mal. II - Se da inexecução culposa e ilícita resultam prejuízos para o credor, está o devedor vinculado a suportar a sua eliminação ou reparação, ou seja, a indemnizar o credor (artigo 798º do Cód. Civ.). A indemnização cobre tanto os chamados danos emergentes como os lucros cessantes (artigo 564º do Cód. Civ.). III - Os gastos extraordinários (despesas feitas voluntariamente pelo lesado, mas que este não teria efectuado se não fosse a lesão) e o desaproveitamento de despesas (inutilização de despesas feitas com vista à aquisição de certos bens ou direitos, cuja obtenção a lesão veio impedir) podem reconduzir-se ao dano emergente, porque em qualquer delas se verifica uma diminuição efectiva do património ou, pelo menos, das possibilidades ou potencialidades deste. IV - Se a ré entregou a encomenda da autora para além do prazo em que se comprometeu a fazê-lo e a proposta da autora foi excluída do concurso para o qual havia sido elaborada, a exclusão da proposta do concurso é consequência directa e adequada da não entrega atempada pela ré, ou seja, do não cumprimento pontual do contrato. V – A não admissão da proposta que a autora elaborara para aquele concurso em concreto traduz-se, exactamente, na inutilidade da proposta, isto é, verifica-se um desaproveitamento das despesas tidas para a elaboração de uma obra cuja vocação e alcance a conduta da ré veio a impedir. VI – Logo o “investimento” feito pela autora e por ela peticionado assume a natureza de danos emergentes, a indemnizar pela ré e corresponde aos gastos tidos com a preparação e elaboração da proposta em causa (artigo 566º nº 2 do Cód. Civ.). FG
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
P, S.A. propôs contra Serviços, S.A. acção declarativa de condenação, sob forma comum e processo ordinário. Alegou, em síntese, que: a autora dedica-se à prestação de serviços nos domínios da engenharia, nomeadamente, obras de hidráulica agrícola; a ré é uma empresa subsidiária dos CTT, especializada em serviços de correio urgente; pretendendo apresentar o seu projecto no âmbito de um concurso público internacional promovido pelo Governo Regional da Madeira (através da Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais, que tutela a Direcção Regional de Agricultura), a autora, no dia 5.11.02, pelas 18:50 horas, entregou na estação dos CTT de Linda-a-Velha um volume contendo, devidamente acondicionados, todos os documentos exigidos no referido concurso público; pretendia que a ré o transportasse e entregasse na Direcção dos serviços Hidroagrícolas, no Funchal; a ré aceitou a encomenda e garantiu a sua entrega antes das 17:00 horas do dia 7.11.02, hora e data limite para entrega das candidaturas; a ré entregou a encomenda no dia 8.11.02, pelas 11:15 horas, razão pela qual a proposta da autora foi excluída do concurso; o incumprimento pela ré do contrato de transporte causou à autora graves danos patrimoniais, atento o investimento em material e mão-de-obra levado a cabo para a preparação e elaboração da proposta técnica, num total de 13.248,43€; tal incumprimento da ré afectou, ainda, a imagem da autora junto da entidade adjudicante, com a possibilidade de se reflectir gravemente em futuros concursos; a autora computa a indemnização devida por tais danos patrimoniais indirectos em 10.000€. Concluiu a autora, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 22.248,43€, acrescida de juros legais a partir da citação.
A ré apresentou a sua contestação. Rectificando não ser uma empresa subsidiária dos CTT, mas uma empresa por estes detida, a ré negou ter assumido o compromisso de entregar a encomenda até às 17:00 horas do dia 7.11.02, assumindo apenas o compromisso de proceder à entrega até ao final do 2º dia útil posterior à recepção da mesma nos seus serviços. Mais esclareceu a ré que se apresentou no local indicado pela autora, no dia 7.11.02, pelas 17:10 horas, a fim de entregar a encomenda, mas que a mesma não foi recebida, por não ser esse o local devido para entregar as propostas para o concurso público; a ré veio a entregar a encomenda no local indicado pelos serviços no dia seguinte, pelas 11:15 horas. Entendendo que a culpa pela não entrega atempada da encomenda se deveu a culpa da autora, que indicou uma morada incorrecta para o efeito, a ré enjeita a responsabilidade que aquela lhe assaca, impugnando, outrossim, os danos alegados. Mais invocou a ré: ter informado a autora de que não assumiria a responsabilidade por danos sequenciais ou indirectos pelo atraso na entrega da mercadoria, como consta do verso da guia que a autora preencheu, assinou e aceitou; saber a autora que, em caso de perda ou extravio da mercadoria, a responsabilidade máxima da ré era de 11,68€ por quilograma de mercadoria e que, em caso de atraso na entrega, a responsabilidade se limitava à devolução do valor correspondente ao preço do serviço; e saber a autora que tais limites se elevavam em caso de pagamento de uma sobretaxa. Concluiu a ré pela sua absolvição do pedido.
Convidada a apresentar articulado em que alegasse factos que permitissem aferir a forma de cálculo do valor dos denominados “danos patrimoniais indirectos”, a autora nada disse ou fez.
Realizou-se audiência preliminar, no âmbito da qual foi tida em consideração a alteração da denominação da ré para CTT Expresso-Serviços Postais e Logística, S.A.. Procedeu-se ao saneamento e condensação do processo.
Efectuada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, considerando a responsabilidade contratual da ré, a condenou a pagar à autora a quantia de 4.415,70€, acrescida de juros desde 1.10.03 até integral pagamento, às taxas legais supletivamente aplicáveis às empresas comerciais.
De tal sentença apelou a ré, formulando as seguintes conclusões: a) Analisando os depoimentos prestados pelas testemunhas (…), únicas testemunhas que foram inquiridas sobre a matéria de facto vertida nas alíneas t), x), z), aa) e bb), é insusceptível, salvo o devido respeito, o tribunal a quo considerar como provados os factos aí vertidos; (…) q) Não sendo possível determinar o número de horas despendidas tanto na globalidade pelo grupo, nem tão pouco individualmente por cada técnico adjudicado, não pode a decisão do Tribunal a quo dar como assente a matéria de facto vertida nas alíneas x), z) e, particularmente, na alínea bb); r) Não tendo, em caso algum, as testemunhas concretizado com rigor o número de horas despendidas pelos técnicos na elaboração da proposta de concurso, não pode o Tribunal a quo dar como provada a matéria de facto vertida na alínea bb), porquanto não tendo os depoimentos das testemunhas sido rigorosos quanto aos valores em causa, está o Tribunal a quo a condenar a recorrente sem ter factos que consubstanciem essa decisão condenatória; s) Por outro lado, não tendo as testemunhas conseguido determinar com certeza o número de horas despendidas na elaboração da mencionada proposta, é vedado ao Tribunal a quo proferir decisão condenatória, porquanto não foi feita prova concreta para se aferir quais os custos reais para a recorrida; t) Ora, condenar a recorrente por estimativa é bastante gravoso, não podendo o Tribunal a quo contribuir para condenações arbitrárias; u) Quanto aos valores alegados (matéria de facto dada como provada na alínea bb), salvo o devido respeito, também não podem ser considerados pelo tribunal, porquanto todas as testemunhas inquiridas sobre a matéria apenas deram "palpites", não podendo o Tribunal proceder à condenação da recorrente com base em opiniões não fundamentadas; v) Acresce que o Tribunal a quo deu como matéria de facto provada (alínea bb)) as taxas sociais e encargos legais, ou seja, mais 25%, pelo que o montante global foi de 12.248,43€, salvo o devido respeito, tal matéria nem tão pouco foi objecto de qualquer inquirição durante a audiência de discussão e julgamento; x) De facto, não foi explicado como se determinaram os 25% e não outra percentagem, não foi, igualmente, explicado, nem tão pouco alegado, como é que a recorrida chegou ao valor de 12.248,43€; z) Quanto à matéria de facto provada na alínea aa), salvo o devido respeito, também não deverá neste ponto proceder a sentença recorrida, porquanto em nenhum depoimento prestado tais factos foram objecto de inquirição, quanto mais de prova; a’) Na verdade, o Tribunal a quo considera, no que respeita à extensão do dano indemnizável, na perspectiva da recorrente, que o mesmo seria restrito ao preço de transporte; b’) Assim, atendendo a que não existem fundamentos para dar como provado a matéria de facto enunciada nas alíneas x), z) e bb), também não poderá ser dado como provado a menção de que durante três semanas a recorrida utilizou e ocupou vários computadores, fotocopiadoras, impressoras e outro equipamento, conforme referido na alínea cc) da matéria de facto; c’) Devido à impossibilidade de provar o nexo de causalidade adequado, que demonstre de forma inequívoca que esta ganharia o concurso, como também em determinar com certeza o valor dos lucros que seriam obtidos, o Tribunal a quo optou de forma a possibilitar uma indemnização parcial, por configurar o dano como perda de uma oportunidade; d’) Existindo diversos critérios de adjudicação, seria impossível aferir qual a concreta ponderação relativa que os árbitros realizariam caso a proposta da Autora tivesse sido admitida; e’) Ora, atendendo a que o Tribunal não consegue determinar com certeza que a recorrida seria a vencedora do concurso sub judice, não tendo sido alegado, nem demonstrado, qual o mérito e conteúdo das restantes propostas, não poderá resultar daqui uma condenação com base num juízo de probabilidade; f’) Ganhar o concurso a que a recorrida concorreu é, evidentemente, circunstância inteiramente estranha à recorrente, dependendo das diversas propostas em presença e dos critérios do júri nomeado pelo Governo Regional da Madeira; g’) Deveria o Tribunal a quo ter-se socorrido da teoria da causalidade adequada que pressupõe que o facto supostamente lesivo seja, na sequência causal que conduz ao dano, a causa que melhor se adequa à produção de tal efeito; h’) Ou seja, entende-se que entre a acção supostamente lesiva e o dano ocorra um processo causal adequado a tal desfecho que exclua ou afaste outros elementos potencialmente causais, mas menos adequados à produção do resultado; i’) Não estando provado o nexo de causalidade, necessário para a verificação do dever de indemnização, não é possível condenar no ressarcimento de um dano com uma extensão equivalente à margem do lucro do negócio não realizado, ainda que, dividido por três (para além da recorrida foram admitidas duas concorrentes), porque não é possível determinar com rigor que o êxito da proposta do recorrente seria decidido a seu favor; j’) No entanto, o Tribunal a quo considerou que, caso tivesse sido admitida a concurso, a recorrida teria, na realidade, uma probabilidade de adjudicação não inferior a 33,33%, que terá de corresponder à margem de lucro bruta (não obstante a recorrida não ter alegado qual o valor da mesma) com inclusão das despesas administrativas; l’) Não pode o Tribunal a quo, desconhecendo o teor das restantes propostas e os critérios de escolha do júri do concurso, decidir por uma condenação com base em juízos meramente hipotéticos e de probabilidade, atendendo a que ganhar o concurso é um factor totalmente alheio ao comportamento da recorrida; m’) Para além de que, conforme já alegado, não pode a ora recorrente aceitar os valores das despesas administrativas que o Tribunal a quo deu como provado na matéria de facto enunciada na alínea bb); n’) Teve em consideração o Tribunal a quo que é evidente que existe um nexo de causalidade entre o comportamento da recorrente e a perda de oportunidade de dedução daquelas despesas na referida margem de lucro bruta, tendo condenado a recorrente a pagar 4.415,70€, porquanto o dano teria de corresponder a 33,33%; o’) Ora, tal interpretação colide com a Teoria da Causalidade Adequada, porquanto é necessário verificar que a negligência da recorrente, por não ter entregue a tempo a proposta da recorrida, não se mostra como causa adequada do efeito, ou seja, perder o concurso; p’) De facto, intervêm outros factores causais, estranhos ao incumprimento da recorrente, como sejam a qualidade das propostas concorrentes, os critérios e a própria subjectividade dos elementos do júri, etc.; q’) Porquanto só com a certeza que a recorrida ganharia o concurso é que se poderia determinar que esta, no eventual lucro bruto que obtivesse, iria deduzir as despesas de carácter administrativo que despendeu na elaboração da proposta. Não havendo certezas de êxito da recorrida no concurso, até porque o ganho está dependente de factores exteriores tanto à recorrente e recorrida, não pode o Tribunal proferir sentença com base em juízos de probabilidade, porquanto tal entendimento viola grosseiramente o disposto no artigo 563° do Código Civil; r’) Ou seja, a expectativa da recorrida não passa, desta forma, de uma mera hipotética eventualidade, pelo que não pode proceder a possibilidade de serem deduzidas despesas de carácter administrativo que a recorrida despendeu na elaboração da proposta de concurso; s’) Deve ser revogada a sentença recorrida.
Não foram apresentadas contra-alegações.
São os seguintes os factos que a 1ª instância deu como provados: A) A ré é uma empresa detida a 100% pela empresa pública “CTT” e assume-se como especializada em serviços de correio urgente. B) A autora é uma sociedade comercial cujo objecto consiste na prestação de serviços nos domínios da engenharia, designadamente na elaboração de estudos, projectos de obras e assistência técnica às mesmas, fiscalização de fornecimentos e empreitadas. C) A autora tem capacidade e grande experiência no desenvolvimento de estudos e na elaboração de projectos de obras de hidráulica agrícola. D) O Governo Regional da Madeira, através da Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais, que tutela a Direcção Regional da Agricultura, fez publicar, entre outros, nos jornais “Jornal da Madeira” de 18.07.2002, “Correio da Manhã” de 19.07.2002, “Diário de Notícias” de 24.07.2002, “Diário da República” nº 176, III Série de 01.08.2002 e “Jornal Oficial das Comunidades Europeias” de 14.08.2002, o anúncio do Concurso Público Internacional nº 11/SRA-DRA/2002, com vista à elaboração do “Projecto de Rede de Água Sob Pressão no Perímetro de Rega do Concelho do Funchal”. E) Foi fixado naquele anúncio, e posteriormente alterado no anúncio rectificativo, publicado no “Jornal Oficial das Comunidades Europeias”, Suplemento nº 157 de 14.08.2002, que a data limite de entrega seriam as 17.00 horas do dia 7 de Novembro de 2002, constando na alínea A) do ponto 8 desse anúncio que:
“As propostas e documentos que as acompanham podem ser entregues ou enviadas para a Direcção dos Serviços Hidroagrícolas da Direcção Regional da Agricultura – Av. Zarco, Edifício do Governo Regional, R/C, 9004-527 Funchal”. F) A autora, como empresa de consultadoria de engenharia, com capacidade e grande experiência para desenvolver estudos e elaborar projectos de obras de hidráulica agrícola, tomou a decisão de concorrer, começando por adquirir o Programa de Concurso à Entidade Pública que abriu o mesmo procedimento. G) De acordo com o Programa de Concurso, o objecto do contrato consistia na aquisição de serviços para a elaboração do projecto de obras para a construção da “Rede de Água Sob Pressão no Perímetro de Rega do Concelho do Funchal”, no âmbito da informação contida na Carta à escala 1:5000, que vinha anexa ao Caderno de Encargos. H) O objectivo da prestação de serviços que a Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais pretendia contratar estava expresso no artigo 8º do Programa de Concurso e consistia na concepção de uma solução para o sistema correspondente ao Programa definido, com peças escritas e desenhadas justificando tecnicamente a viabilidade dos temas seguintes:
a) Indicação dos condicionamentos principais relativos à delimitação precisa do Perímetro de Rega, definido na Solução (áreas de ocupação, características climáticas e topográficas) e exigências urbanísticas (infra-estruturas, servidões, aspectos paisagísticos, ambiente, etc.);
b) Definição e justificação dos caudais necessários à Solução concebida para a Rede de Água de Rega sob Pressão;
c) Justificação do esquema desenhado da solução e da sequência das diversas operações a realizar, a representar em carta à escala 1:5000, com indicação do desenvolvimento da rede, características das tubagens a aplicar, equipamentos, acessórios, infra-estruturas de armazenamento, considerando as cargas necessárias, a maximização dos recursos e os elementos de obra existentes;
d) Apresentação de estimativa geral do custo do empreendimento, a que conduzir a solução proposta, com base num pré-dimensionamento, tendo em consideração os encargos mais significativos com a sua realização;
e) Apresentação de estimativa de custo para a exploração e conservação do sistema na solução proposta, tendo em conta as exigências de comportamento e funcionamento;
f) Informação sobre a necessidade de obtenção de elementos topográficos, geológicos, hidrológicos ou outros, que interessem ao estudo da solução proposta, bem como das actividades ou formalidades que eventualmente se exijam quer para a elaboração do Projecto, quer para a execução da obra, com a correspondente justificação. I) No dia 5 de Novembro de 2002, pelas 18.50 horas, a autora entregou na estação dos CTT de Linda-a-Velha, um volume contendo todos os documentos, devidamente acondicionados, conforme era exigido no programa do concurso, para que a ré os transportasse e procedesse à respectiva entrega no Funchal, na Direcção dos Serviços Hidroagrícolas, sita na Av. Arriaga, Edifício G. J) A ré aceitou efectuar tal encomenda até ao final do 2º dia útil posterior ao envio. L) De acordo com as condições contratuais para transporte de objectos postais que a ré abundantemente divulga, inclusive na Internet, esta garante que este tipo de encomendas, quando destinadas à cidade do Funchal, serão entregues “até ao final do 2º dia útil”. M) A ré procedeu à entrega da encomenda ao destinatário da mesma, no edifício do Governo Regional na Av. Zarco, no dia 8 de Novembro de 2002. N) Este facto determinou a exclusão do concurso da proposta que a autora pretendia que fosse avaliada ficando, assim, impedida de ver a sua proposta ser apreciada em confronto com as apresentadas pelos restantes concorrentes àquele concurso internacional. O) A ré reconheceu o “efectivo atraso na entrega”, reconhecendo que o objecto “só foi entregue ao seu destinatário no dia 08-11-02, às 11h15m, quando era previsível a sua entrega no dia 07/11/02”. P) A ré assumiu a obrigação de proceder ao transporte e entrega dos documentos num prazo máximo de 72 horas, sem opor quaisquer reservas. Q) A ré assumiu sem quaisquer reservas a obrigação de entrega do objecto num prazo máximo de 72 horas. R) A ré emitiu a declaração constante de fls. 23, com o seguinte teor: “Informamos ainda que, por razões de todo alheias à nossa vontade e normal diligência do Operador CTT – Correios de Portugal, SA/Postlog, este objecto só foi entregue ao destinatário no dia 08-11-02 às 11h15m, quando era previsível no dia 07/11/2002”. S) Nas condições gerais de transporte constam as seguintes cláusulas:
“12 – Responsabilidade da Postlog
12.1. Sem prejuízo do disposto na cláusula 13, a Postlog só responde por prejuízos sofridos em consequência da perda ou dano que a mercadoria venha a sofrer durante o transporte, ou do atraso na respectiva entrega, quando tais factos lhe sejam imputáveis a título de dolo ou de culpa grave e com os limites estabelecidos no nº seguinte.
12.2. A responsabilidade máxima da Postlog por quaisquer prejuízos sofridos em consequência da perda ou danos na mercadoria ou de demora de entrega será a seguinte:
- Por objecto/mercadoria €-11,68/Kg
– Demora de Entrega – valor correspondente ao preço do serviço
12.3. Se o cliente desejar o aumento dos limites de responsabilidade referidos no número anterior, poderá estabelecer com a Postlog valores mais elevados, mediante o pagamento da respectiva sobretaxa.
13 – Exclusões de Responsabilidade
13.1/13.2. A Postlog não será responsável por danos consequenciais ou indirectos (nomeadamente, lucros cessantes, perda de mercado, perda de utilização do objecto ou perda de oportunidade negocial) que resultem da perda, extravio, dano ou atraso na entrega da mercadoria, mesmo que tivesse conhecimento de que tais danos poderiam ocorrer.
13.3. A mercadoria transportada viaja sempre por conta e risco do cliente, salvo se o evento danoso resultar de dolo ou for originado em culpa grave da Postlog.
13.4. A Postlog não será responsável se a mercadoria ou parte da mesma se perder, extraviar, danificar ou atrasar em resultado de circunstâncias fora do seu controlo ou de actos ou omissões por parte do cliente ou de terceiro, tais como:
- Endereço insuficiente/incorrecto: deficiente preenchimento da Guia de Transporte, mau acondicionamento ou deficiente embalamento, vício próprio ou alteração proveniente da natureza intrínseca dos objectos transportados, incumprimento pelo cliente das obrigações estabelecidas nas presentes condições gerais, nomeadamente nas cláusulas 3 e 10, e dos prazos previstos para a entrega da mercadoria;
- Todos os casos fortuitos ou de força maior, tais como actos ou omissões de quaisquer autoridades públicas, greves, “lock-outs”, distúrbios laborais e cataclismos naturais;
- Não cumprimento de horários de companhias transportadoras aéreas e quaisquer actos ou omissões de quaisquer Alfândegas ou entidades aduaneiras, companhias aéreas ou aeroportos.
13.5. A Postlog não é uma transportadora comum e não aceita qualquer responsabilidade que lhe seja imputada como se tivesse essa qualidade”. T) Para elaborar a proposta a submeter a concurso, a autora constituiu uma equipe de trabalho formada por cinco técnicos com licenciatura universitária, um desenhador projectista e uma secretária para prestar apoio administrativo à equipe. U) Do empenho posto na realização da proposta que visava a elaboração do projecto posto a concurso, resultou um volume técnico com 125 páginas, contendo um estudo prévio de engenharia e integrando texto, fotografias e peças desenhadas, e um volume de documentos, que seguiu junto à proposta, que se compunha de 212 páginas. V) A ré informou a autora que a encomenda seria entregue até ao final do dia 7 de Novembro de 2002. X) Na preparação e elaboração da proposta técnica da autora para o concurso internacional, foram consumidas muitas horas de trabalho de técnicos com formação superior e altamente qualificados. Z) Durante mais de duas semanas de trabalho útil, cinco engenheiros e um desenhador projectista estiveram, em permanência, a estudar e a recolher dados e elementos que habilitassem a autora a elaborar e fundamentar a sua proposta de trabalhos. AA) Por outro lado, uma secretária qualificada, despendeu outro tanto tempo em recolha e selecção de documentação, trabalhos de processamento de texto e fotocópias. BB) Só em salários directos a estes seus trabalhadores, a autora despendeu as seguintes verbas:
Eng. Sénior 40 horas x 72,00 €
Eng. Gestor de Projecto 51 horas x 43,00 €
Eng. Projectista 68,5 horas x 29,00 €
Eng. Júnior 15 horas x 24,00 €
Desenhador projectista 9,25 horas x 25,00 €
Secretária 70 horas x 22,00 €
a que se devem acrescer as taxas sociais e encargos legais, ou seja, mais 25%, pelo que o montante global foi de 12.248,43€. CC) Para a elaboração do projecto de candidatura, a autora utilizou e ocupou durante três semanas vários computadores, fotocopiadoras, impressoras, plotters e outro equipamento. DD) Tendo também consumido papel, tinta, toners e outros consumíveis, tudo num valor não inferior a 1.000€. EE) A participação neste concurso gerou para a autora expectativas quanto à possibilidade de adjudicação dos trabalhos ou serviços postos a concurso, sendo que havia dois outros concorrentes e a autora conhecia-os. FF) Houve um funcionário dos CTT que se deslocou no dia 7 de Novembro, pelas 17.10 horas, à Av. Arriaga, nº 21-A, Edifício G, 4004-528 Funchal, para entrega do referido documento e, segundo os registos da ré, o objecto ficou pendente de entrega.
I – A primeira questão a tratar respeita à impugnação da decisão sobre a matéria de facto. A) A recorrente “ataca” as respostas dadas aos quesitos 1º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º, que correspondem, respectivamente, aos pontos T), X), Z), AA), BB) e CC).
Mas duas rectificações se impõem para já. É que tais quesitos mereceram a resposta de “Provado”, pelo que se impunha “transpor” para a sentença o exacto teor daqueles quesitos. O que não foi feito quanto aos pontos X) e BB). Efectivamente, no quesito 4º falava-se em “técnicos com formação superior e altamente qualificados”, constando do ponto X) “técnicos com formação superior e altamente especializados”; e no quesito 7º incluía-se um outro “engenheiro júnior”, que trabalhara durante 32 horas a 19€ por hora, item que foi omitido no ponto BB). Importa, por conseguinte, tomar em consideração a “versão” que decorre da decisão sobre a matéria de facto.
Os quesitos ora em análise respeitam ao esforço desenvolvido pela autora para a elaboração da proposta a apresentar ao concurso, quer em termos de mão-de-obra, quer em termos de equipamento e considerando o tempo gasto e o custo daqueles.
A propósito das pessoas que constituíram a equipa que trabalhou na proposta em causa, disse a testemunha F (engenheiro agrónomo, administrador da autora entre 1988 e 2005 e, desde então, director comercial da mesma) que a equipa era constituída por 5 ou 6 pessoas, entre as quais ele próprio, como supervisor responsável geral, um outro engenheiro, responsável directo pela proposta, outros dois engenheiros mais jovens, um desenhador e pessoal administrativo. A testemunha M (a trabalhar para a autora desde 1994, como secretária, sendo coordenadora do respectivo departamento) referiu que no projecto trabalharam técnicos de formação superior e pessoal do secretariado, especificando o Engenheiro A, 3 ou 4 engenheiros júniores, um desenhador e ela própria. A testemunha A (que trabalha para a autora desde Fevereiro de 1995, já exerceu funções de coordenador do departamento hidráulico de desenvolvimento agrícola, gestor de projecto, integrou a direcção comercial e, desde princípios de 2006, é director adjunto) afirmou, salvo engano, ter a equipa de trabalho sido constituída por 6 ou 7 pessoas, esclarecendo ter sido o gestor da proposta em causa e para ela terem contribuído o trabalho do Sr. … e de dois engenheiros mais novos. Mais esclareceu que na elaboração da proposta não trabalhou outro engenheiro projectista, tendo sido ele o responsável pela concepção e gestão da proposta. A testemunha J (que trabalha para a autora há 17 ou 18 anos como desenhador, sendo o coordenador do núcleo de desenho) mencionou ter trabalhado para a elaboração da proposta, o que também fizeram alguns engenheiros e uma secretária.
Podemos, pois, concluir pela demonstração de que, para a elaboração desta proposta, concorreu o trabalho do Engenheiro B, que é possível apelidar de “engenheiro sénior”, do Engenheiro R, “engenheiro gestor do projecto”, de dois “engenheiros juniores”, do Sr. J, “desenhador” e da Sra. D. “secretária”. Podemos, igualmente, ter por seguro que não trabalhou na proposta qualquer outro engenheiro, designadamente “engenheiro projectista”.
A resposta ao quesito 1º deve, em consequência, ser alterada para a seguinte: “Para elaborar a proposta a submeter a concurso, a autora constituiu uma equipa de trabalho formada por quatro técnicos com licenciatura universitária, um desenhador e uma secretária, para prestar apoio administrativo à equipa.
E idêntica alteração importa fazer na resposta dada ao quesito 5º e, com as necessárias adaptações, na resposta dada ao quesito 7º.
Por outro lado, importa eliminar da resposta dada ao quesito 7º as referências ao “engenheiro projectista”.
Sobre o período de tempo gasto na preparação e elaboração da proposta, disse a testemunha F que estiveram a trabalhar durante cerca de 3 semanas ou durante 2 a 3 semanas, crendo que não trabalharam ao fim-de-semana. Esclareceu depois que a equipa não trabalhara ininterruptamente – nem unicamente - na proposta durante essas semanas (havia formação) e que ele próprio não trabalhara a tempo inteiro na proposta. Acrescentou não poder afirmar o número de horas de trabalho que cada pessoa tinha gasto na proposta que, aliás, seria variável. E explicou que é prática da empresa, relativamente a todos os concursos a que se apresentam, estimar as horas gastas, “até para o futuro trabalho”, caso ganhem o concurso. A testemunha M referiu apenas que, quando o resultado do trabalho dos técnicos chegou às suas mãos para formatar, encadernar, etc., já tinha decorrido 1 mês ou mais. A testemunha A afirmou que a elaboração da proposta tinha demorado entre 2 e 3 semanas, mais ou menos, sendo que ele próprio tinha despendido à volta de 50 ou 51 horas de trabalho. Disse desconhecer quanto tempo tinham o “engenheiro sénior” e a “secretária” trabalhado na proposta. A testemunha J não se lembrava do tempo que gastara com a proposta, alvitrando 15, 20 ou 10 horas.
Podemos, pois, concluir que a preparação e elaboração da proposta em causa ocorreu num período de entre duas a três semanas, que o trabalho e utilização do equipamento decorreram intermitentemente e que cada um dos profissionais que integravam a equipa trabalhou na proposta num total de várias horas, tendo o “engenheiro gestor do projecto” despendido 51 horas de trabalho.
Em consequência – e considerando que as expressões “muitas”, “altamente especializados” e “qualificada” assumem natureza conclusiva, não têm um sentido preciso e, além disso, nem sequer foram corroboradas pelas testemunhas - alteramos as respostas dadas aos quesitos 4º, 5º, 6º e 8º nos seguintes termos:
Quesito 4º - Provado apenas que na preparação e elaboração da proposta técnica da autora para o concurso internacional foram consumidas horas de trabalho de técnicos com formação superior.
Quesito 5º - Provado apenas que, num período de duas a três semanas, um “engenheiro gestor do projecto” trabalhou durante 51 horas e três engenheiros e um desenhador trabalharam durante várias horas, estudando e recolhendo dados e elementos que habilitassem a autora a elaborar e fundamentar a sua proposta de trabalhos.
Quesito 6º - Provado apenas que, num período de duas a três semanas, uma secretária trabalhou durante várias horas, recolhendo e seleccionando documentação, processando o texto e extraindo fotocópias.
Quesito 8º - Provado apenas que, num período de duas a três semanas, a autora utilizou e ocupou durante várias horas equipamento, nomeadamente, vários computadores, fotocopiadoras, impressoras e plotters.
Por outro lado, da resposta ao quesito 7º hão-de eliminar-se o concreto número de horas de trabalho de cada membro da equipa (as 51 horas de trabalho do “engenheiro gestor do projecto” integraram, por mais adequado, a resposta ao quesito 5º.
No tocante ao custo da hora de trabalho de cada um dos membros da equipa, a testemunha F começou por dizer que ele próprio ganhava por hora na ordem dos 70€ e o “engenheiro gestor do projecto” 40€. Mas explicou que é prática da empresa, relativamente a todos os concursos a que se apresentam, estimar as horas gastas, “até para o futuro trabalho”, caso ganhem o concurso, sendo que a valorização da hora de trabalho de cada profissional consta de uma tabela oficial da empresa, aplicada a todos os concursos. E esclareceu que tal tabela não corresponde ao vencimento dos técnicos (os trabalhadores são pagos ao mês), antes reflectindo o “custo horário da empresa”, os “encargos da empresa”, os “custos directos e indirectos”, nomeadamente, a “renda de casa”, “todo o apoio” e os “computadores”. A testemunha A respondeu que, à data, o seu trabalho estava valorizado em 43€, a taxa horária do “engenheiro sénior” devida estar nos 55€ e o valor dos “engenheiros juniores” variaria entre 25€ e 29€. Desconhecia a valorização dada ao trabalho da secretária. A testemunha J referiu que o custo interno de uma hora de trabalho de um desenhador andaria, na altura, à roda de 25€.
Relembremos que no quesito se perguntava – de acordo com o que a autora alegara – se a autora tinha despendido determinadas verbas “só em salários directos aos seus trabalhadores”, não havendo, pois, dúvidas de que o quesito respeita apenas aos encargos salariais da autora. Aliás, essa conclusão é corroborada pelos dois quesitos seguintes, em que se trata de computar as despesas com equipamento e consumíveis. A prova testemunhal produzida (e será que em matérias desta natureza se não aconselharia a prova documental?), limitando-se a invocar valores necessariamente superiores aos do salário horário de cada uma das pessoas envolvidas na proposta, não contribuiu minimamente para o esclarecimento do que efectivamente se alegara e pretendia provar.
Por outro lado, quanto à expressão “a que se deve acrescer as taxas sociais e encargos legais, ou seja, mais 25%”, das duas, uma: ou a autora está a referir-se a encargos directamente derivados da lei e a resposta ao quesito deve ser, nessa parte, considerada não escrita (artigo 646º nº 4 do Cód. Proc. Civ.); ou se trata de matéria de facto e, então, nenhuma prova foi produzida a respeito. Em qualquer caso, deve tal expressão ser eliminada da resposta dada ao quesito.
Em consequência, alteramos a resposta dada ao quesito 7º para a seguinte: “Provado apenas que, para preparar e elaborar a proposta a apresentar ao concurso, a autora despendeu quantia indeterminada com os salários de um “engenheiro sénior”, um “engenheiro gestor do projecto”, dois “engenheiros juniores”, um “desenhador” e uma “secretária”.”.
B) Para melhor compreensão, realinharemos a matéria de facto provada na sequência das precedentes alterações. A) A ré é uma empresa detida a 100% pela empresa pública “CTT” e assume-se como especializada em serviços de correio urgente. B) A autora é uma sociedade comercial cujo objecto consiste na prestação de serviços nos domínios da engenharia, designadamente na elaboração de estudos, projectos de obras e assistência técnica às mesmas, fiscalização de fornecimentos e empreitadas. C) A autora tem capacidade e grande experiência no desenvolvimento de estudos e na elaboração de projectos de obras de hidráulica agrícola. D) O Governo Regional da Madeira, através da Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais, que tutela a Direcção Regional da Agricultura, fez publicar, entre outros, nos jornais “Jornal da Madeira” de 18.07.2002, “Correio da Manhã” de 19.07.2002, “Diário de Notícias” de 24.07.2002, “Diário da República” nº 176, III Série de 01.08.2002 e “Jornal Oficial das Comunidades Europeias” de 14.08.2002, o anúncio do Concurso Público Internacional nº 11/SRA-DRA/2002, com vista à elaboração do “Projecto de Rede de Água Sob Pressão no Perímetro de Rega do Concelho do Funchal”. E) Foi fixado naquele anúncio, e posteriormente alterado no anúncio rectificativo, publicado no “Jornal Oficial das Comunidades Europeias”, Suplemento nº 157 de 14.08.2002, que a data limite de entrega seriam as 17.00 horas do dia 7 de Novembro de 2002, constando na alínea A) do ponto 8 desse anúncio que:
“As propostas e documentos que as acompanham podem ser entregues ou enviadas para a Direcção dos Serviços Hidroagrícolas da Direcção Regional da Agricultura – Av. Zarco, Edifício do Governo Regional, R/C, 9004-527 Funchal”. F) A autora, como empresa de consultadoria de engenharia, com capacidade e grande experiência para desenvolver estudos e elaborar projectos de obras de hidráulica agrícola, tomou a decisão de concorrer, começando por adquirir o Programa de Concurso à Entidade Pública que abriu o mesmo procedimento. G) De acordo com o Programa de Concurso, o objecto do contrato consistia na aquisição de serviços para a elaboração do projecto de obras para a construção da “Rede de Água Sob Pressão no Perímetro de Rega do Concelho do Funchal”, no âmbito da informação contida na Carta à escala 1:5000, que vinha anexa ao Caderno de Encargos. H) O objectivo da prestação de serviços que a Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais pretendia contratar estava expresso no artigo 8º do Programa de Concurso e consistia na concepção de uma solução para o sistema correspondente ao Programa definido, com peças escritas e desenhadas justificando tecnicamente a viabilidade dos temas seguintes:
a) Indicação dos condicionamentos principais relativos à delimitação precisa do Perímetro de Rega, definido na Solução (áreas de ocupação, características climáticas e topográficas) e exigências urbanísticas (infra-estruturas, servidões, aspectos paisagísticos, ambiente, etc.);
b) Definição e justificação dos caudais necessários à Solução concebida para a Rede de Água de Rega sob Pressão;
c) Justificação do esquema desenhado da solução e da sequência das diversas operações a realizar, a representar em carta à escala 1:5000, com indicação do desenvolvimento da rede, características das tubagens a aplicar, equipamentos, acessórios, infra-estruturas de armazenamento, considerando as cargas necessárias, a maximização dos recursos e os elementos de obra existentes;
d) Apresentação de estimativa geral do custo do empreendimento, a que conduzir a solução proposta, com base num pré-dimensionamento, tendo em consideração os encargos mais significativos com a sua realização;
e) Apresentação de estimativa de custo para a exploração e conservação do sistema na solução proposta, tendo em conta as exigências de comportamento e funcionamento;
f) Informação sobre a necessidade de obtenção de elementos topográficos, geológicos, hidrológicos ou outros, que interessem ao estudo da solução proposta, bem como das actividades ou formalidades que eventualmente se exijam quer para a elaboração do Projecto, quer para a execução da obra, com a correspondente justificação. I) No dia 5 de Novembro de 2002, pelas 18.50 horas, a autora entregou na estação dos CTT de Linda-a-Velha, um volume contendo todos os documentos, devidamente acondicionados, conforme era exigido no programa do concurso, para que a ré os transportasse e procedesse à respectiva entrega no Funchal, na Direcção dos Serviços Hidroagrícolas, sita na Av. Arriaga, nº 21 A, Edifício G. J) A ré aceitou efectuar tal encomenda até ao final do 2º dia útil posterior ao envio. L) De acordo com as condições contratuais para transporte de objectos postais que a ré abundantemente divulga, inclusive na Internet, esta garante que este tipo de encomendas, quando destinadas à cidade do Funchal, serão entregues “até ao final do 2º dia útil”. M) A ré procedeu à entrega da encomenda ao destinatário da mesma, no edifício do Governo Regional na Av. Zarco, no dia 8 de Novembro de 2002. N) Este facto determinou a exclusão do concurso da proposta que a autora pretendia que fosse avaliada ficando, assim, impedida de ver a sua proposta ser apreciada em confronto com as apresentadas pelos restantes concorrentes àquele concurso internacional. O) A ré reconheceu o “efectivo atraso na entrega”, reconhecendo que o objecto “só foi entregue ao seu destinatário no dia 08-11-02, às 11h15m, quando era previsível a sua entrega no dia 07/11/02”. P) A ré assumiu a obrigação de proceder ao transporte e entrega dos documentos num prazo máximo de 72 horas, sem opor quaisquer reservas. Q) A ré assumiu sem quaisquer reservas a obrigação de entrega do objecto num prazo máximo de 72 horas. R) A ré emitiu a declaração constante de fls. 23, com o seguinte teor: “Informamos ainda que, por razões de todo alheias à nossa vontade e normal diligência do Operador CTT – Correios de Portugal, SA/Postlog, este objecto só foi entregue ao destinatário no dia 08-11-02 às 11h15m, quando era previsível no dia 07/11/2002”. S) Nas condições gerais de transporte constam as seguintes cláusulas:
“12 – Responsabilidade da Postlog
12.1. Sem prejuízo do disposto na cláusula 13, a Postlog só responde por prejuízos sofridos em consequência da perda ou dano que a mercadoria venha a sofrer durante o transporte, ou do atraso na respectiva entrega, quando tais factos lhe sejam imputáveis a título de dolo ou de culpa grave e com os limites estabelecidos no nº seguinte.
12.2. A responsabilidade máxima da Postlog por quaisquer prejuízos sofridos em consequência da perda ou danos na mercadoria ou de demora de entrega será a seguinte:
- Por objecto/mercadoria €-11,68/Kg
– Demora de Entrega – valor correspondente ao preço do serviço
12.3. Se o cliente desejar o aumento dos limites de responsabilidade referidos no número anterior, poderá estabelecer com a Postlog valores mais elevados, mediante o pagamento da respectiva sobretaxa.
13 – Exclusões de Responsabilidade
13.1/13.2. A Postlog não será responsável por danos consequenciais ou indirectos (nomeadamente, lucros cessantes, perda de mercado, perda de utilização do objecto ou perda de oportunidade negocial) que resultem da perda, extravio, dano ou atraso na entrega da mercadoria, mesmo que tivesse conhecimento de que tais danos poderiam ocorrer.
13.3. A mercadoria transportada viaja sempre por conta e risco do cliente, salvo se o evento danoso resultar de dolo ou for originado em culpa grave da Postlog.
13.4. A Postlog não será responsável se a mercadoria ou parte da mesma se perder, extraviar, danificar ou atrasar em resultado de circunstâncias fora do seu controlo ou de actos ou omissões por parte do cliente ou de terceiro, tais como:
- Endereço insuficiente/incorrecto: deficiente preenchimento da Guia de Transporte, mau acondicionamento ou deficiente embalamento, vício próprio ou alteração proveniente da natureza intrínseca dos objectos transportados, incumprimento pelo cliente das obrigações estabelecidas nas presentes condições gerais, nomeadamente nas cláusulas 3 e 10, e dos prazos previstos para a entrega da mercadoria;
- Todos os casos fortuitos ou de força maior, tais como actos ou omissões de quaisquer autoridades públicas, greves, “lock-outs”, distúrbios laborais e cataclismos naturais;
- Não cumprimento de horários de companhias transportadoras aéreas e quaisquer actos ou omissões de quaisquer Alfândegas ou entidades aduaneiras, companhias aéreas ou aeroportos.
13.5. A Postlog não é uma transportadora comum e não aceita qualquer responsabilidade que lhe seja imputada como se tivesse essa qualidade”. T) Para elaborar a proposta a submeter a concurso, a autora constituiu uma equipe de trabalho formada por quatro técnicos com licenciatura universitária, um desenhador e uma secretária para prestar apoio administrativo à equipe. U) Do empenho posto na realização da proposta que visava a elaboração do projecto posto a concurso, resultou um volume técnico com 125 páginas, contendo um estudo prévio de engenharia e integrando texto, fotografias e peças desenhadas, e um volume de documentos, que seguiu junto à proposta, que se compunha de 212 páginas. V) A ré informou a autora que a encomenda seria entregue até ao final do dia 7 de Novembro de 2002. X) Na preparação e elaboração da proposta técnica da autora para o concurso internacional, foram consumidas horas de trabalho de técnicos com formação superior. Z) Num período de duas a três semanas, um “engenheiro gestor do projecto” trabalhou durante 51 horas e três engenheiros e um desenhador trabalharam durante várias horas, estudando e recolhendo dados e elementos que habilitassem a autora a elaborar e fundamentar a sua proposta de trabalhos. AA) Num período de duas a três semanas, uma secretária trabalhou durante várias horas, recolhendo e seleccionando documentação, processando o texto e extraindo fotocópias. BB) Para preparar e elaborar a proposta a apresentar ao concurso, a autora despendeu quantia indeterminada com os salários de um “engenheiro sénior”, um “engenheiro gestor do projecto”, dois “engenheiros juniores”, um “desenhador” e uma “secretária”.”. CC) Num período de duas a três semanas, a autora utilizou e ocupou durante várias horas equipamento, nomeadamente, vários computadores, fotocopiadoras, impressoras e plotters. DD) Tendo também consumido papel, tinta, toners e outros consumíveis, tudo num valor não inferior a 1.000€. EE) A participação neste concurso gerou para a autora expectativas quanto à possibilidade de adjudicação dos trabalhos ou serviços postos a concurso, sendo que havia dois outros concorrentes e a autora conhecia-os. FF) Houve um funcionário dos CTT que se deslocou no dia 7 de Novembro, pelas 17.10 horas, à Av. Arriaga, nº 21-A, Edifício G, 4004-528 Funchal, para entrega do referido documento e, segundo os registos da ré, o objecto ficou pendente de entrega.
II - A segunda questão a tratar prende-se com a medida da indemnização a atribuir à autora.
A) Na sua petição inicial, a autora equacionou da seguinte forma os danos derivados do incumprimento contratual por banda da ré: por um lado, os prejuízos patrimoniais sofridos pelo investimento feito na preparação e elaboração da proposta técnica a apresentar a concurso (mão-de-obra, equipamento e consumíveis), que computou em 13.248,43€; por outro lado, os “prejuízos patrimoniais indirectos”, consubstanciados na diminuição da sua credibilidade perante a entidade adjudicante, susceptível de se reflectir de forma grave em futuros concursos promovidos por essa entidade, que valoriza em 10.000€.
Esqueceremos, na presente análise, este último conjunto de prejuízos, de cujo ressarcimento foi a ré absolvida, desde logo por ausência de demonstração.
B) “Dá-se a inexecução da obrigação quando, chegado o vencimento, o devedor não realiza a prestação ou realiza-a mal” – Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Centro de Estudos Fiscais da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, Ministério das Finanças, Lisboa, 1968:19. E “há inexecução quando o devedor realiza a prestação tardiamente: o pagamento retardado ou atrasado não impede que, no momento do vencimento, se tenha verificado a inexecução e é em relação a esse momento que o conceito se afere” – Pessoa Jorge, obra citada:20.
A inexecução há-de ter-se por definitiva quando a prestação, mesmo que naturalisticamente possível, deixou de ter interesse para o credor. As obrigações cujo tempo de cumprimento apresenta importância fundamental para o credor, por tal forma que este perde por completo interesse na prestação se ela não for realizada pontualmente, são denominadas por certos autores obrigações de termo essencial” (Pessoa Jorge, obra citada:23).
“A inexecução diz-se imputável ao devedor, se pode atribuir-se a uma conduta voluntária sua: não cumpriu porque intencionalmente assim quis, ou porque se esqueceu, ou porque pensava erradamente que não devia” – Pessoa Jorge, obra citada:27. E, no âmbito da responsabilidade contratual, presume-se a culpa do devedor (artigo 799º nº 1 do Cód. Civ.).
A inexecução imputável ao devedor tem-se, em princípio, por ilícita (Pessoa Jorge, obra citada:28).
Atenta a factualidade provada, não temos dúvidas em considerar que a ré incumpriu, culposa, ilícita e definitivamente, a sua obrigação.
O que, aliás, a mesma também não discute.
C) Se da inexecução culposa e ilícita resultam prejuízos para o credor, está o devedor vinculado a suportar a sua eliminação ou reparação, ou seja, a indemnizar o credor (artigo 798º do Cód. Civ.).
A indemnização cobre tanto os chamados danos emergentes como os lucros cessantes (artigo 564º do Cód. Civ.).
“O dano emergente compreende a perda ou diminuição de valores já existentes no património do lesado; e o lucro cessante refere-se aos benefícios que ele deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, ao acréscimo patrimonial frustrado” (Almeida Costa, Direito das Obrigações, Coimbra Editora, Coimbra, 1984:391).
“O Prof. Gomes da Silva aponta, ao lado destas, outras duas formas de prejuízos: os gastos extraordinários e o desaproveitamento de despesas.
Os gastos extraordinários seriam despesas feitas voluntariamente pelo lesado, mas que este não teria efectuado se não fosse a lesão, v.g. despesas judiciais ou despesas com tratamentos médicos.
O desaproveitamento de despesas consistiria, como a própria expressão indica, na inutilização de despesas feitas com vista à aquisição de certos bens ou direitos, cuja obtenção a lesão veio impedir. É o que sucede quando o lesado, por causa do facto danoso, não pôde apresentar-se a concurso para certo lugar, inutilizando as despesas já efectuadas com a respectiva candidatura.
Não nos parece que estas duas espécies de prejuízos tenha suficiente autonomia para se colocarem ao lado das outras; podem ambas reconduzir-se ao dano emergente, porque em qualquer delas se verifica uma diminuição efectiva do património ou, pelo menos, das possibilidades ou potencialidades deste.
A integração na categoria dos danos emergentes parece-nos nítida no caso dos gastos extraordinários, que são despesas feitas necessariamente em resultado da lesão. A despesa consiste na disposição de dinheiro (ou de outros bens patrimoniais) para evitar um prejuízo ou diminuí-lo; nessa medida, é um substitutivo ou sucedâneo do prejuízo inicialmente sofrido e representa sempre a diminuição, efectiva e actual, do património, que caracteriza o dano emergente.
No desaproveitamento de despesas já esta integração no conceito de damnum emergens não é tão clara. Trata-se de despesas feitas anteriormente à lesão, para se estar em condições de obter certo benefício. A lesão impede, não directamente o benefício (pois então haveria pura e simplesmente lucro cessante), mas vem destruir a situação favorável à obtenção dele, que é uma situação jurídica avaliável em dinheiro, cujo valor há-de corresponder, pelo menos, às despesas feitas para a alcançar. Parece-nos, por isso, estar-se ainda perante um dano emergente.” - Pessoa Jorge, obra citada:378/379.
No caso dos autos, porque a ré entregou a encomenda da autora para além do prazo em que se comprometeu a proceder à entrega, a proposta da autora foi excluída do concurso para o qual havia sido elaborada (cfr. pontos M) e N) da matéria de facto). É inequívoco – julga-se que mesmo para a recorrente – que ficou demonstrado que a exclusão da proposta da autora do concurso é consequência directa e adequada da não entrega atempada pela ré, ou seja, do não cumprimento pontual do contrato.
Ora, a não admissão da proposta que a autora elaborara para aquele concurso em concreto (com as especificidades que constam da factualidade provada) traduz-se, exactamente, na inutilidade da proposta. O caso dos autos é, pois, precisamente, de desaproveitamento das despesas tidas para a elaboração de uma obra cuja vocação e alcance a conduta da ré veio a impedir.
E é assim que o “investimento” alegadamente feito pela autora e por ela peticionado nestes autos assume a natureza de danos emergentes, a indemnizar pela ré.
D) O resultado a que chegou a sentença recorrida baseia-se em diferente perspectiva da questão, a de que, com a conduta da ré, a autora perdeu a oportunidade de ver apreciada a sua proposta e a possibilidade de ser ela a escolhida pelo júri. E, à míngua de elementos concretos e num juízo que se nos afigura equitativo, quantificou tal oportunidade em 1/3. Sucede que todo o raciocínio da sentença se insere num quadro de lucros cessantes, que julgamos não ter sido equacionado pela autora nem corresponder à mais correcta abordagem da questão. Na perspectiva adoptada são, aliás, patentes as dificuldades com que a sentença se debateu para a concretização do dano indemnizável, desde logo pela ausência de factos, não alegados pela autora porventura por formular o pedido a título de danos emergentes.
E) A indemnização a atribuir à autora corresponderia, assim, aos gastos tidos com a preparação e elaboração da proposta em causa (artigo 566º nº 2 do Cód. Civ.).
Sucede que, tendo em conta a alteração da decisão sobre a matéria de facto a que acima procedemos, quedou por demonstrar o montante gasto pela autora com os salários dos seus trabalhadores enquanto estiveram envolvidos na preparação e elaboração da proposta em causa. O que implica relegar para ulterior liquidação a respectiva fixação (artigo 661º nº 2 do Cód. Proc. Civ.).
Por outro lado, importa limitar a condenação da ré aos montantes em que foi condenada em 1ª instância, uma vez que só aquela apelou da sentença (artigo 684º nº 2 e 4 do Cód. Proc. Civ.).
*
Por todo o exposto, acordamos em: A) Alterar a decisão sobre a matéria de facto nos termos referidos em I-A); B) Manter a decisão recorrida no que toca à condenação da ré no pagamento à autora da quantia de 1.000€, acrescida de juros desde 1.10.03 e até integral pagamento, nos termos definidos na sentença; C) Revogar a decisão recorrida na parte em que condena a ré no pagamento à autora da quantia de 3.415,70€, acrescida de juros; D) Condenar a ré a pagar à autora a quantia que vier a liquidar-se como correspondendo aos encargos salariais da autora com os seus trabalhadores durante as horas em que estiveram envolvidos na preparação e elaboração da proposta em causa, com o limite de 3.415,70€, quantia acrescida de juros desde 1.10.03 e até integral pagamento, nos termos definidos na sentença; E) Manter a decisão recorrida na parte em que absolve a ré do remanescente do pedido.
Custas relativamente à parcela de 4.415,70€, em ambas as instâncias, provisoriamente em partes iguais e a fixar em definitivo na decisão de liquidação.
Lisboa, 9 de Outubro de 2008
Maria da Graça Araújo
José Eduardo Sapateiro
Maria Teresa Soares