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PENHOR
DEPÓSITO BANCÁRIO
Sumário
1 -O penhor de aplicações financeiras, frequentemente utilizado pelas instituições de crédito, poderá revestir uma modalidade de penhor de direitos, pressupondo quer na modalidade clássica de depósitos a prazo quer na de qualquer outra aplicação financeira um depósito no banco, que vai ser ulteriormente transformado em produto bancário nos termos estabelecidos entre o depositante e o depositário ou mesmo terceiro. 2 - Logo que o crédito empenhado se torne exigível, o credor pignoratício deve cobrá-lo, passando o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse crédito (art. 685º nº1 do C. Civ.). Só com o consentimento do credor pignoratício poderá o crédito empenhado ser recebido pelo seu titular, extinguindo-se nesse caso o penhor (art. 685º, nº4 do C. Civil). 3 - A execução do penhor não é automática, sendo necessário um acto de resgate para esse fim. 4 - O significado da expressão renovação é o de celebração de algo novo idêntico a algo que vigorou entre as mesmas partes e que se extinguiu. R.G.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1-Relatório:
A autora C demandou o réu, Banco, S A, pedindo seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 26.708,38 acrescida de juros à taxa legal desde a petição inicial até integral pagamento sobre a quantia de € 26.531,00.
Alega para tanto, que é titular de uma conta depósito a prazo na ré, da promissória respectiva consta que o depósito pode ser desmobilizado a qualquer momento, mediante solicitação do respectivo titular, solicitou a liquidação da totalidade da referida conta e a Ré recusou fazê-lo.
Citada contestou a ré dizendo que foi celebrado um contrato de conta corrente e penhor sobre uma aplicação financeira e a ré nunca renunciou ao penhor.
Prosseguiram os autos a sua normal tramitação, tendo vindo a ser proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar à autora a quantia de € 26.425,38, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 18 de Março de 2006 até à presente data da sentença e daqui até integral pagamento, à taxa legal que vigorar, absolvendo-a do mais peticionado.
Inconformado recorreu o réu, concluindo nas suas alegações, em síntese:
- O Digno Tribunal a quo entendeu, e bem, que o penhor constituído sobre a Aplicação Especial 2001-Obrigações passou a incidir sobre a respectiva prestação, logo que se venceu aquela aplicação.
- Ao fazê-lo, aplicou o disposto no artigo 685.º, n.º 1, in fine do Código Civil, no que bem andou aquele Ilustre Tribunal.
- Porém, ao entender que a constituição, pelo Banco recorrente, de uma conta de depósito a prazo em nome da autora com o produto daquela aplicação equivale à entrega, àquela, da prestação do crédito empenhado, o que redundaria na extinção do penhor (artigo 685.º, n.º 4 do Código Civil), falhou a primeira instância na qualificação jurídica dos factos assentes.
- É que se com o produto da aludida Aplicação Especial 2001-Obrigações foi constituído um depósito à ordem em nome da autora, então estamos perante um contrato de depósito (irregular – artigo 1205.º do Código Civil), o que quer dizer que, por inerência de conceito (artigo 1185.º do Código Civil), quem ficou com a prestação resultante da Aplicação Especial 2001 foi o Banco recorrente e não a autora.
- E, se assim é, não é possível concluir-se como a primeira instância, i.e., que com a constituição desse depósito o Banco recorrente entregou à autora o produto da aplicação especial 2001-Obrigações; consequentemente não é aplicável o n.º 4 do artigo 685.º do Código Civil.
- Diversamente, se não houve entrega à autora da prestação resultante dos direitos empenhados, então o penhor constituído sobre estes mantém-se sobre aquela prestação (artigo 685.º, n.º 1 do Código Civil) e, por conseguinte, está legitimada a recusa do Banco recorrente em entregar à autora os valores depositados na conta de depósitos à ordem em causa.
- Quanto à circunstância de no documento intitulado “Promissória de Depósito a Prazo” constar declaração do Banco recorrente segundo a qual o titular da conta a poderia desmobilizar a qualquer momento, esta não releva numa declaração de renúncia ao penhor, não podendo ser interpretada com esse sentido.
- Devidamente enquadrada no contexto que os autos nos fornecem – i.e., recordando-se que o penhor foi constituído sem determinação de prazo e que ficou previsto que deveria subsistir enquanto as responsabilidades garantidas se encontrassem em dívida – número 2, clausula 14.ª, da matéria assente – conclui-se que o sentido daquela declaração não pode ser outro que não seja a de significar a possibilidade dada ao titular da conta de a desmobilizar a mera solicitação sua, desde que, por qualquer motivo, tenha cessado o penhor incidente sobre os respectivos valores.
- Por todos estes motivos é forçoso concluir-se que o penhor constituído sobre a Aplicação Especial 2001-Obrigações passou a incidir sobre a respectiva prestação, mantendo-se a garantia plenamente vigente e sendo, por isso, perfeitamente legítima a recusa do Banco recorrente em entregar à autora os valores depositados.
Por seu turno, contra-alegou a apelada, em síntese:
- Como bem decidiu a sentença recorrida, houve efectiva entrega do dinheiro correspondente à liquidação da `Aplicação Especial 2001' à ora apelada quando este valor foi creditado na conta de depósito à ordem desta em momento anterior ao da constituição de um depósito a prazo.
- Com o que essa colocação à disposição da ora apelada desse produto da liquidação da `Aplicação Especial 2001' fez extinguir o penhor que esta havia constituído a favor do ora apelante.
- Há três realidades distintas que o ora apelante não considera: um crédito sobre o qual foi constituído um penhor, traduzido no direito a receber uma prestação em dinheiro quando da liquidação da `Aplicação Especial 2001 - Obrigações; o dinheiro resultante da liquidação dessa aplicação; um outro crédito, traduzido num depósito a prazo de que emerge a obrigação do ora apelante entregar à ora apelada uma determinada quantia em dinheiro, sobre o qual nenhum penhor foi constituído.
- Ora, se a lei diz que, vencido o direito empenhado, o penhor se mantém sobre o objecto da prestação daquele direito, já nenhuma norma diz que o penhor se mantém sobre o direito em que o objecto da prestação do primeiro direito venha a ser convertido sem consentimento do seu credor.
- Com o que bem andou a sentença recorrida ao condenar o ora apelante no pedido.
Da ampliação do âmbito do recurso:
- Os números dos depósitos a prazo constantes dos docs. de fls. 5 e 135 são diferentes, daquele constando o n° 1… e deste o n° 7….
- Nenhuma prova foi feita nos presentes autos de que ambos os números correspondam a um só e ao mesmo depósito a prazo: tal não resulta de nenhum documento dos autos nem do depoimento da testemunha em que assentou a resposta positiva ao art. 1° da Base Instrutória — de resto com uma razão de ciência muito duvidosa como resulta do depoimento considerado no seu todo.
- Consta mesmo da fundamentação a tal resposta ter ficado demonstrado que o depósito a prazo com o n° 1… foi constituído com o produto da `Aplicação Especial 2001', mas não que o depósito como n° 7… o tenha sido como aí se perguntava.
- Com o que deve ser alterada a resposta dada ao art. 1° da Base Instrutória que deve passar a ser `Não Provado'.
- Assentando toda a defesa do ora apelante em que o depósito a prazo n° 70353741974 fora constituído com o produto da liquidação da `Aplicação Especial 2001' e não resultando minimamente demonstrado nos autos, sempre teria a acção de proceder, como procede na sentença recorrida, mesmo que com este diferente fundamento.
- Consta do doc.5 uma declaração que traduz inequivocamente uma promessa de prestação ou o reconhecimento de uma dívida, incompatível com a existência de um penhor a favor do declaratário e que teria sido constituído pelo respectivo destinatário.
- Tal declaração não está sujeita a qualquer condição ou restrição, não podendo ser entendida com sentido diferente do que do doc. expressamente consta e, muito menos, com o sentido pretendido pelo ora apelante por este não ter o mínimo de correspondência no respectivo texto, mesmo «que imperfeitamente expresso».
- Porque tal declaração é plenamente válida e chegou ao conhecimento da ora apelada, estava esta dispensada de demonstrar mais o que quer que fosse para exigir o respectivo cumprimento pelo ora apelante, cabendo então a este demonstrar que a relação subjacente a tal declaração, espontaneamente emitida, não existia. O que não fez.
- Com o que sempre a acção teria de proceder, mesmo que por diferente fundamento do constante na sentença recorrida, que seria o da promessa de dívida ou de reconhecimento de um direito feito pelo ora apelante.
- A sentença recorrida não violou o art. 685°, n° 4, do C. Civil, como pretendido pelo apelante. De qualquer modo, nos termos do art. 712°, n° 1, alíneas a) e b), do C.P.C. sempre teria de ser alterada a resposta dada ao art. 1° da Base Instrutória para `Não Provado' e, nos termos dos arts. 685°, n° 1, a contrario, 224°, 238° e 458°, todos do C. Civil, sempre a acção teria também de proceder, mesmo que por razões diversas das constantes na sentença recorrida.
Foram colhidos os vistos.
2- Cumpre apreciar e decidir:
As alegações de recurso delimitam o seu objecto, conforme resulta do teor das disposições conjugadas dos artigos 660º, nº2, 664º, 684º e 690º, todos do CPC.
A questão a dirimir consiste em aquilatar se o penhor constituído sobre a Aplicação Especial 2001-Obrigações se extinguiu ou se manteve plena vigência.
Para o caso de se vir a aplicar o mecanismo constante do art. 684º-A do CPC., incumbiria a apreciação da resposta atribuída ao quesito 1º. da base instrutória.
A matéria de facto delineada na 1ª.Instância foi a seguinte:
1. A 18 de Maio de 1999, o Banco S A, na qualidade de 1° contraente, J e A, titulares da conta no Banco n.º , na qualidade de 2°s contraentes ou beneficiário e C e A, titulares da conta no Banco n. ° , subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 47-50, denominado " Contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente caucionada e penhor de aplicação financeira aplicação especial 2001 celebrado em 14 de Maio de 1999" e que aqui se dá integralmente por reproduzido. (al. A) da MA).
2. No referido instrumento ficou consignado (no que aos autos releva):
1ª.- O crédito ora concedido tem como limite o montante de Esc. 5 000 000$00 e será movimentado sob a forma de conta corrente caucionada, dentro do referido limite e para a finalidade referida na cláusula 2ª.do presente contrato.
(...)
8ª. - As responsabilidades emergentes ou derivadas do presente contrato encontram-se garantidas por Penhor de Aplicação Especial 2001, Obrigações como valor nominal de 10 000$00 cada.
9ª.- os 3°s contraentes são donos e legítimos possuidores de Aplicação especial 2001, Obrigações com valor nominal global de 5 000 000$00.
10ª.- Os títulos atrás identificados, no valor nominal global de 5 000 000$00, encontram-se já depositados em nome dos 3°s contraentes e em poder do 1° contraente.
11ª.- pelo presente instrumento, os 3°s contraentes constituem, formal e voluntariamente, a favor do 1° contraente, o penhor dos títulos identificados na cláusula 9°, para cumprimento das obrigações e responsabilidades da 2ª contraente decorrentes do crédito ora concedido sob a forma de conta corrente caucionada, conforme o disposto no clausulado deste contrato, até ao limite de Esc. 5 000 000$00 em capital.
12ª.- O presente penhora garante ainda:
a)Os juros remuneratórios á taxa anual de 4.5%, ou outra, ou outras, que venham a ser fixadas acrescida, em caso de mora, da sobretaxa de 2% nos termos indicados na cláusula 4ª;
b)Comissões de garantia eventualmente devidas;
c) O reembolso de eventuais despesas judiciais e extrajudiciais emergentes do presente contrato, que se estimam em Esc. 250 000$00.
13ª.- os identificados títulos encontram-se plenamente livres e desonerados de encargos.
14ª.- O presente contrato de penhor é constituído sem determinação de prazo, devendo subsistir enquanto as responsabilidades garantidas se encontrem em dívida.
17ª. - O Banco poderá rescindir unilateralmente o presente contrato e considerar vencidas e exigíveis todas as obrigações decorrentes do mesmo, quando: a) estejam vencidas e não pagas há mais de 15 dias obrigações no âmbito deste contrato; b) (.) ° (al. B) da MA).
3. Está matriculada na CRC do Porto sob o n.º 40 043 denominada Banco Comercial Português, S A. (al. C) da MA).
4. Pela apresentação 8/000630 foi inscrita a fusão por incorporação, sendo incorporada, entre outras, o Banco M SA. e incorporante o Banco B, S A. (al. D) da MA).
5. A Autora é titular de uma conta de depósito a prazo com o n.º 70353741974, a qual se renovou a 2006.02.27 e se renovaria a 2006.08.27. (al. E) da MA).
6. A Ré enviou à autora o documento junto por cópia a fls. 5, denominado "
Promissória Depósito a Prazo " em que consta:
" Este depósito a prazo poderá ser desmobilizado a qualquer momento, mediante solicitação do respectivo titular." (al. F) da MA).
7. A 17.03.2006 a autora solicitou a liquidação da totalidade da conta n.º
70353741974 e a transferência dos fundos para a conta depósitos à ordem n.º 24298792. (al. G) da MA).
8. Com a data de 21 de Março de 2006 a Ré enviou à autora, que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 7, com o seguinte teor:
" Assunto: Resolução do contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente caucionada n.º 10000780123".
N/Ret (.. J: A
Dr. J.
O Banco M foi incorporado, por fusão, no Banco C pelo que este adquiriu o conjunto dos activos e passivos, direitos e obrigações do ex-Banco M, onde se incluem os direitos de crédito sobre V.Ex.as.
Tendo aquela instituição de crédito, em 18 de Maio de 1999, celebrado com os referenciados o contrato de abertura de crédito cuja utilização se encontra espelhada na conta corrente caucionada n.º 1 e no qual V.Ex.s intervêm na qualidade de garante, vem o Banco C (. -) comunicar a V.Ex.a que, estando vencidas e não pagas prestações do empréstimo em epígrafe e nos termos do art. 781 e 1150 do CC, considera resolvido o referido contrato e vencida e imediatamente exigível toda a dívida". (al. H) da MA).
9. Com a data de 11 de Abril de 2006, a Ré enviou à autora que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 8, com o seguinte teor:
" Em resposta á sua solicitação de transferência da conta de depósitos a prazo 7 para a conta depósitos à ordem n.º 2, cumpre-nos informar o seguinte:
1. em 14.05.99. foi celebrado contrato de conta corrente, identificado com o n.º 10000780123, com o Sr. J e A.
2. para garantia foi constituído penhor sobre a Aplicação Especial 2001, Obrigações propriedade de V.Ex.a e da Sr.ª. A.
3. tendo-se vencido esta Aplicação, foi em 12.09.01. constituído com o produto daquela uma Conta Depósitos a Prazo com o n.º 70353 74 19 74, procurando deste modo o Banco C rentabilizar os fundos de V.Ex.a.
4. tendo o contrato de conta corrente entrado em incumprimento e tendo-se procedido à respectiva denúncia, por carta de 21.03.06., foi utilizado o saldo existente na Conta de Depósitos a Prazo para liquidação da dívida, considerando ser aquela constituída pelo produtos de fundos que haviam sido objecto de contrato de penhor.
Pelo exposto, não pudemos dar cumprimento ao solicitado por V.Ex.a" (al. J) da MA).
10.A conta de depósito a prazo com o n.º 70353741974, foi constituída exclusivamente com o produto da Aplicação 2001, vencida a 12.09.01. (resp. 1° da BI).
11.Com a data de 21 de Março de 2006, a Ré enviou a A e J a carta junta por cópia a fls. 56, em que declara resolvido o contrato de conta corrente. ( resp. 2° da BI).
12.0 saldo da referida conta era de € 26 425,38. ( resp. 3° da BI).
13. Dos quais € 24 840,32 liquidaram a dívida de capital da conta corrente n.º 10000780123 e € 1 401,60 os respectivos juros. ( resp. 4° da BI).
Vejamos:
Insurge-se o apelante relativamente à sentença que o condenou a pagar à autora a quantia fixada, uma vez que do seu ponto de vista, sob a mesma pendia uma garantia vigente de penhor.
Ora, resulta da materialidade fáctica apurada que em 18 de Maio de 1999, entre o Banco, SA., na qualidade de 1º. contraente, outros indivíduos na qualidade de 2º.s contraentes e a ora apelada, entre outros, na qualidade de 3ºs contraentes, subscreveram o denominado «Contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente caucionada e penhor de aplicação financeira especial 2001, celebrada em 14 de Maio de 1999».
De acordo com a cláusula 8ª. de tal instrumento, as responsabilidades emergentes ou derivadas de tal contrato encontram-se garantidas por penhor de aplicação especial 2001, Obrigações.
O penhor constituído nos termos do documento junto de fls. 47 a 50 dos autos traduz um penhor de direitos por antítese a um penhor sobre coisas, enquadrando-se num penhor de aplicações financeiras.
Como referem, Pedro Romano Martinez e Pedro Fuzeta da Ponte, in, Garantias de Cumprimento, 4ª. ed., pág. 181 «O penhor de aplicações financeiras, frequentemente utilizado pelas instituições de crédito, poderá revestir uma modalidade de penhor de direitos, ao qual se aplicam os artigos 679º e seguintes do Código Civil».
Esta garantia pressupõe quer na modalidade clássica de depósitos a prazo quer na de qualquer outra aplicação financeira um depósito no banco, que vai ser ulteriormente transformado em produto bancário nos termos estabelecidos entre o depositante e o depositário ou mesmo terceiro.
«Constitui-se uma garantia revestida de solidez, na medida em que a sua disponibilidade pertence inteiramente ao banco credor, sem que, por outro lado, se afecte a rendibilidade, para o devedor cliente, da aplicação financeira em causa, que só será mobilizada antecipadamente pelo banco credor em caso de incumprimento (cfr. obra citada, pág. 181)».
Ora, nos termos exarados no art. 680º do Código Civil, só é admitido o penhor de direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e sejam susceptíveis de transmissão.
No caso vertente, conforme resulta do teor das cláusulas 9ª e 10ª do contrato, os 3ºs contraentes, onde se inclui a autora, são donos e legítimos possuidores da Aplicação Especial 2001, encontrando-se os títulos, no valor nominal global de 5 000 000$00 já depositados em nome dos 3ºs contraentes e em poder do 1º.contraente.
Assim, perante a caracterização efectuada é patente a existência de uma garantia de penhor ao qual se aplica o regime do penhor de direitos consagrado no art. 679º.e segs. do C. Civ., conforme se aludiu na sentença e que se aceita como pacificamente admitido.
Porém, o que não é pacífico e que motiva a discórdia será a manutenção ou a extinção de tal penhor, perante as vicissitudes surgidas e, concretamente, a aplicabilidade ao caso do disposto no nº.4 do art. 685º do C. Civil.
Com efeito, dispõe tal normativo que:
O titular do crédito empenhado só pode receber a respectiva prestação com o consentimento do credor pignoratício, extinguindo-se neste caso o penhor.
Analisando os factos apurados nos autos, temos a valorar o seguinte:
- A autora é titular de uma conta de depósito a prazo com o nº. 7, a qual se renovou a 2006.02.27 e se renovaria a 2006.08.27.
- Tal conta foi constituída exclusivamente com o produto da Aplicação 2001, vencida a 12-9-2001.
- A 17-3-2006 a autora solicitou a liquidação da totalidade da conta nº. 7 e a transferência dos fundos para a conta depósitos à ordem nº. 2.
- A 11-4-2006, o réu recusou tal liquidação, invocando que para garantia do contrato de conta corrente havia sido constituído penhor sobre a Aplicação Especial 2001, tendo-se vencido a mesma em 12-9-2001 e constituído com o produto daquela a conta de depósitos a prazo.
- Tendo o contrato de conta corrente entrado em incumprimento e tendo-se procedido à respectiva denúncia, por carta de 21-3-06, foi utilizado o saldo existente na conta de depósitos a prazo para liquidação da dívida, considerando ser aquela constituída pelo produto de fundos que foram objecto do penhor.
Ora, é inquestionável que a ora autora é titular de uma conta de depósito a prazo, a qual foi constituída exclusivamente com o produto da Aplicação 2001.
Não foi o Banco que ficou em poder do valor resultante da liquidação da Aplicação 2001, mas a autora que em resultado daquela materializou o crédito respectivo num depósito a prazo.
Relativamente a esta conta de depósito a prazo, não resulta existir sobre a mesma qualquer limitação, ou seja, não encontramos nos autos qualquer acordo ou documento no sentido de sobre a mesma pender qualquer penhor.
Como alude, Almeida Costa, in, Direito das Obrigações, 9ª ed., pág. 870 e 871 «Para a constituição do penhor de direitos, tornam-se necessários, como princípio geral, a forma e a publicidade requeridas para a transmissão dos direitos empenhados. Tendo por objecto um crédito, o mesmo apenas produz os seus efeitos desde que seja notificado ao respectivo devedor, ou desde que este o aceite.
Logo que o crédito empenhado se torne exigível, o credor pignoratício deve cobrá-lo, passando o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse crédito (art. 685º nº1 do C. Civ.). Só com o consentimento do credor pignoratício poderá o crédito empenhado ser recebido pelo seu titular, extinguindo-se nesse caso o penhor (art. 685º, nº4 do C. Civil)».
O credor do crédito empenhado não pode receber a prestação sem o consentimento do credor pignoratício (cfr. Prof. Antunes Varela, in C. Civil Anotado).
Ora, como se refere na sentença recorrida, não há qualquer declaração expressa de consentimento do BC, SA, como credor pignoratício, enquanto credor e enquanto devedor, porque são uma e a mesma pessoa, ou seja, se o BC, SA., entregou à autora a prestação, nos termos em que o fez, não pode invocar que foi na qualidade de devedor, sem conhecimento e consentimento do BC. SA., enquanto credor pignoratício.
O Banco M SA., na qualidade de 1º contraente no celebrado contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente caucionada e penhor de aplicação financeira, veio a ser incorporado, por fusão, no Banco C, SA., adquirindo este o conjunto dos activos e passivos, direitos e obrigações daquele.
Com efeito, a ora autora é titular de uma conta de depósito a prazo que foi constituída com o produto da Aplicação 2001, vencida em 12-9-2001.
O valor resultante dessa liquidação veio a constituir um crédito da própria autora, materializado na sua conta a prazo.
Este depósito a prazo não é da mesma espécie e qualidade do respeitante ao da inicial conta corrente caucionada e com penhor.
Houve uma entrega à autora de uma quantia resultante de uma obrigação empenhada, sobre a qual não resulta ter incidido um novo penhor.
Com a titularidade da autora sobre a conta a prazo constitui-se uma nova realidade, extinguindo-se o penhor que pendia até ao vencimento da Aplicação 2001, sem qualquer oposição do apelante, que voluntariamente permitiu tal operação.
A execução do penhor não é automática, sendo necessário um acto de resgate para esse fim.
Ora, tudo indica que o apelante não manifestou tal desiderato, pois, como resulta dos factos, a autora a 17-3-2006 solicitou a liquidação da totalidade da conta a prazo e a transferência para a conta de depósitos à ordem e só com data de 21-3-2006, a ré enviou à autora, a carta junta a fls. 7 dos autos. Além do mais, resulta dos factos apurados que, o réu enviou à autora o documento junto por cópia a fls. 5, denominado, Promissória Depósito a Prazo, em que consta: Este depósito a prazo poderá ser desmobilizado a qualquer momento, mediante solicitação do respectivo titular.
Se houvesse o propósito de salvaguardar a posição do Banco como credor pignoratício, nunca teria sido elaborada tal declaração.
Nem faz qualquer sentido o argumento do apelante, a defender que o sentido daquela declaração não poder ser outro, senão o de significar a possibilidade dada ao titular da conta de a desmobilizar a mera solicitação sua, desde que, por qualquer motivo, tenha cessado o penhor incidente sobre os respectivos valores.
Com efeito, em princípio, a aceitação, como declaração negocial, necessita de ser expedida pelo declaratário da proposta e de ser recebida pelo proponente ou conhecida dele, para que produza os seus efeitos nos termos aludidos no art. 224º, nº1 do Código Civil, o que aqui se não constata, pois, nada se encontra escrito a tal respeito, nem há qualquer manifestação de vontade para tal do destinatário.
Por último, consta ainda dos factos que, a autora é titular da aludida conta de depósito a prazo, que se renovou a 27-2-06 e se renovaria a 27-8-06.
Ora, o significado da expressão renovação é o de celebração de algo novo idêntico a algo que vigorou entre as mesmas partes e que se extinguiu.
Assim, a ora autora é legítima titular de uma conta, nada podendo impedir a sua liberdade de movimentação, que no caso, se reporta à solicitação da sua liquidação e a transferência para uma conta de depósitos à ordem, não tendo suporte a recusa do Banco.
Destarte, nenhuma censura merece a sentença recorrida, improcedendo na totalidade as conclusões do recurso apresentado.
O titular do crédito empenhado só pode receber a respectiva prestação com o consentimento do credor pignoratício, extinguindo-se neste caso o penhor.
Face ao explanado não se justifica a requerida ampliação subsidiária do recurso ao abrigo do disposto no art. 684º-A do CPC.
3- Decisão: Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença proferida.
Custas a cargo do apelante.
Lisboa, 4 de Novembro de 2008
Maria do Rosário Gonçalves
José Augusto Ramos
Aveiro Pereira