GESTOR PÚBLICO
ADMINISTRADOR
INDEMNIZAÇÃO
DESPACHO SANEADOR
SENTENÇA
Sumário

I- A fixação da indemnização devida aos Gestores Públicos aos membros do Conselho de Administração  de empresa publica pela sua exoneração é aplicável o Estatuto do Gestor Público, constante do Dec. Lei nº 464/82 de 9 de Dezembro.
II- Tendo sido alegados factos que, a provarem-se,  podem levar a concluir que determinada despesas de representação  foram integradas pelas partes no conceito de vencimento ou remuneração deve ser elaborada base instrutória, quesitando tal matéria factica, pois tais factos têm relevância na fixação do montante  indemnizatório.
 III-O tribunal a quo decidiu prematuramente a acção no saneador-sentença quando havia matéria controvertida que, a provar-se, poderia conduzir a solução jurídica diversa da encontrada.

R.B.

Texto Integral

Acordam nesta secção cível os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa
J propôs acção declarativa com processo ordinário contra “RAVE – Rede Ferroviária de Alta Velocidade, S.A”, melhor identificados nos autos, pedindo:
- seja a ré condenada a pagar ao autor a quantia de € 25.904,51, relativa à parte ainda não liquidada de indemnização que lhe é devida pela exoneração, por mera conveniência de serviço, do seu cargo de administrador da ré, nos termos cominados do artº 6º, nº 1, 2 e 6, do Dec. Lei nº 464/82, de 09.11, aplicável ex vi do artº 39º, do Dec. Lei nº 558/99, de 17.12;
- seja a ré condenada no pagamento de juros de mora, vencidos e vincendos, e que actualmente se calcula ascenderem a € 1.036,18;
- seja a ré condenada em sanção pecuniária compulsória de valor adequado, por cada dia de atraso no cumprimento do pagamento da dívida ora reclamada, nos termos do artº 829º-A, do Cód. Civil.
Alegou, para tanto e em síntese, que:
- O autor é engenheiro de profissão, e encontra-se desde Outubro de 1986 integrado no quadro técnico da Estradas de Portugal, EPE (anteriormente Junta Autónoma das Estradas), com a categoria de Engenheiro Civil Assessor Principal;
- A ré é uma sociedade comercial anónima, cujo objecto consiste no desenvolvimento e coordenação dos trabalhos e estudos necessários para a formação de decisões de planeamento e construção, financiamento, fornecimento e exploração de uma rede ferroviária de alta velocidade a instalar em Portugal Continental e da sua ligação com a rede espanhola de igual natureza;
- A ré foi constituída em Dezembro de 2000 pelo Decreto-Lei 323-H/2000, de 19 de Dezembro, como sociedade anónima inserida no Sector Empresarial do Estado, regendo-se pela lei comercial, pelo referido diploma e pelos respectivos estatutos (cfr. artigo 1º do Decreto-Lei 323-H/2000);
- O capital social da sociedade ré, no valor de €2,5 milhões de euros, é detido em 60% pelo Estado Português e em 40% pela sociedade REFER, E.P. (esta por sua vez detida a 100% pelo Estado Português);
- De acordo com os critérios previstos nos artigos 2º e 3º do Decreto-Lei 558/99, de 17 de Dezembro, a ré insere-se no sector empresarial do Estado, devendo considerar-se como uma Empresa Pública, sujeitando-se pois à regulação constante deste último diploma, designadamente no que concerne ao estatuto dos respectivos administradores;
- Por Deliberação Social Unânime por Escrito da Assembleia-geral da ré, datada de 24 de Setembro de 2004, o autor foi nomeado para o Conselho de Administração desta;
- A nomeação do autor como administrador da ré teve suporte legal no artigo 9º do DL 323-H/2000, nos termos do qual poderiam ser autorizados a exercer funções na RAVE, em regime de requisição ou comissão de serviço, funcionários ou agentes do Estado, dos institutos públicos, das autarquias locais, de empresas públicas ou de empresas de capitais públicos, funcionários ou agentes estes que conservariam todos os direitos e regalias inerentes ao quadro de origem;
- O autor foi nomeado para o cargo de Administrador na ré em consequência de uma requisição ao entretanto extinto Instituto de Estradas de Portugal (actualmente Estradas de Portugal, EPE), requisição essa que era expressamente permitida pelo artigo 4º do DL 464/82, pelo artigo 9º do DL 323-H/2000, e pelo próprio artigo 17º do DL 558/99;
- O mandato para o qual o autor foi nomeado tinha a duração de três anos, iniciando-se na data da respectiva nomeação (24 de Setembro de 2004) e terminando em 31 de Dezembro de 2006, - Em Novembro de 2005, o autor auferia uma retribuição mensal ilíquida de 6.840,43€, repartida por três parcelas: - Retribuição base; - Despesas de representação; - Remuneração em espécie;
- Com efeito, o autor auferia uma retribuição base mensal ilíquida, atribuída pelo desempenho do cargo de vogal do conselho de administração, no valor 4.204,18€;
- A este valor acrescia ainda um montante mensal para despesas de representação no valor de 1.261,25€, que não tinha correspondência directa nas despesas efectuadas pelos administradores ao serviço e em nome da RAVE, isto é, aquele valor era atribuído mensalmente, regular e periodicamente, sem ter um carácter sinalagmático em relação ao valor das referidas despesas;
- O valor pago a título de despesas de representação dos administradores era processado e pago igualmente enquanto parte dos subsídios de férias e de Natal pagos pela ré, isto é, era atribuído aos administradores não doze, mas sim 14 vezes por ano;
- Ainda, era atribuído ao autor o uso total de uma viatura, em regime de locação operacional, e respectivo combustível, para utilização total – incluindo o seu uso privado, designadamente durante fins-de-semana e férias;
- Era facultada ao autor a utilização de um telemóvel, ao qual estava alocado um plafond mensal de comunicações, pessoais e profissionais, no valor de 125€;
- O valor total de remuneração em espécie, atribuído mensalmente ao autor, ascendia assim à quantia mensal de 1.375€, atribuído no entanto apenas 12 meses por ano.
- Realizada a soma aritmética do conjunto remuneratório recebido pelo autor enquanto administrador da ré, verifica-se que aquele auferia, pelo exercício daquelas funções, uma remuneração total anual ilíquida no valor de 93.016,02€;
- Por deliberação unânime por escrito da Assembleia Geral da ré, datada de 07 de Novembro de 2005, o autor foi destituído do seu cargo de vogal do conselho de administração daquela sociedade, tendo os accionistas, face à renúncia dos restantes administradores, eleito nova administração para o termo do mandato então em curso;
- Em 15 de Novembro de 2005, os accionistas da ré comunicaram ao autor a decisão tomada na deliberação unânime por escrito de 7 Novembro desse ano, de o destituir do cargo de vogal do Conselho de Administração daquela sociedade;
- Apenas a partir dessa data o autor deixou de desempenhar funções enquanto administrador da ré;
- A lei permite pois a exoneração dos administradores das empresas públicas, independentemente da existência de justa causa, conferindo no entanto a estes o direito a uma indemnização adequada, nos termos previstos no DL 464/82;
- Refira-se finalmente que, sempre que o administrador exonerado desempenhe o respectivo cargo de gestão na empresa pública em regime de comissão de serviço ou de requisição a outra entidade, a indemnização eventualmente devida deverá ser reduzida ao montante da diferença entre o vencimento auferido como administrador da Empresa Pública e o vencimento de lugar de origem à data da cessação de funções do administrador nomeado, nos termos do artigo 6º, nº 6 do DL 464/82;
- Ora, o Autor foi exonerado do respectivo cargo em 15 de Novembro de 2005, isto é, 13,5 meses antes do final do respectivo mandato, o qual terminaria em 31 de Dezembro de 2006.
- E, o total das remunerações que aquele administrador auferiria como administrador ao serviço da ré até ao final do mandato ascenderia a 103.276,67€ (6840,43€ x 13,5 meses + Subsídio de Férias + Subsídio de Natal);
- Sucede porém que, de acordo com as regras do artigo 6º, nº 2 e 6 do DL 464/82, a esta indemnização será necessário deduzir o vencimento que o Autor auferiria no respectivo lugar de origem, ou seja, deduzir o vencimento anual que este auferiria se estivesse ao serviço da Estradas de Portugal, EPE;
- O autor, enquanto assessor principal do Instituto de Estradas de Portugal (posteriormente renomeado Estradas de Portugal, EPE), auferiria a quantia total ilíquida mensal de 2.251,84€;
- O valor remuneratório ilíquido, que o autor auferiria até ao final do referido mandato – 13,5 meses, e respectivos subsídios de Férias e de Natal – ascenderia a 34.903,52€;
- Operada a dedução legalmente prescrita (cfr. artigo 6º, nº 6 do DL 464/82) desta quantia, que o autor auferiria no respectivo lugar de origem, à sua remuneração enquanto membro do conselho de administração da ré, verificamos que o valor da indemnização devida àquele pela exoneração sem justa causa do cargo de Administrador, operada pelos accionistas da ré, corresponde a 68.373,15€;
- E, este valor indemnizatório não ultrapassa o vencimento anual líquido do autor enquanto administrador da ré, no valor de 93.016,02€, pelo que cumpre igualmente o critério negativo previsto no artigo 6º, nº2, parte final, do DL 464/82;
- A quantia a pagar ao autor, pela ré, em virtude da destituição do cargo de vogal do conselho de administração operada em 15 de Novembro de 2005, ascenderá pois à quantia ilíquida de 68.373,15€;
- Em 20 de Dezembro de 2005, foi já atribuído e pago pela ré ao autor, a título indemnizatório, a quantia ilíquida de 42.468,64€, a que corresponde a quantia líquida de 34.422,75€, valor que este reconhece ter recebido;
- No entanto, o certo é que, eventualmente por lapso aritmético ou por dificuldades de tesouraria, o remanescente da indemnização devida ao autor, no valor ilíquido de 25.904,51€ nunca chegou a ser efectivamente paga a este, mantendo-se ainda em dívida, apesar de reiteradamente reclamado o respectivo pagamento.

Na sua contestação (cfr. fls. 62), a Ré/Apelada pediu a improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido.
Alegou em síntese, que:
- O autor foi nomeado membro do Conselho de Administração da ré para o triénio 2004-2006, na qualidade de vogal, em sede de Assembleia Geral da ré, a qual ocorreu no dia 22 de Janeiro de 2004;
- O autor foi requisitado ao Instituto das Estadas de Portugal nos termos e para os efeitos previstos no artigos 17º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, artigo 5º do Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro e artigo 9º do Decreto-Lei n.º 323-H/2000 de 19 de Dezembro;
- Em 7 de Novembro de 2005, por força da Deliberação Social Unânime por Escrito dos accionistas da ré, o autor foi destituído do cargo de vogal do Conselho de Administração da ré;
- A decisão de destituição referida no número anterior, foi comunicada ao autor no dia 15 de Novembro de 2005;
- Ainda que o lapso temporal compreendido entre a data da comunicação da destituição do autor (15.11.2005) e a data de terminus do respectivo mandato (31.12.2006), corresponda a um período superior a um ano, a indemnização do gestor não poderá ser superior ao seu vencimento anual;
- O autor, no âmbito do mandato de vogal do Conselho de Administração da ré, auferia a quantia base mensal ilíquida de 4.204,18€, a título de vencimento/ordenado, acrescida de 1.261,25€, a título de despesas de representação;
- De acordo com o disposto no artigo 3º da Resolução do Conselho de Ministros n.º 121/2005 de 1 de Agosto de 2005, aplicável às sociedades anónimas de capitais exclusiva ou maioritariamente públicos, é fixado “em 12 meses o abono de despesas de representação aos administradores das empresas públicas”;
- O vencimento anual ilíquido que o autor auferiria como Vogal do Conselho de Administração da ré ascenderia a 73.994,40€, correspondente ao somatório de 14 meses de vencimentos/ordenados base, que perfazem um total de 58.858,80€, acrescidos de 12 meses despesas de representação, que perfazem um total de 15.135,60€;
- De acordo com o disposto no artigo 6º, n.º 6, do Decreto-Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro, a indemnização será reduzida ao montante da diferença entre o vencimento como gestor e o vencimento de lugar de origem à data da cessação de funções de gestor;
- O vencimento mensal ilíquido do autor nas Estradas de Portugal E.P.E (anterior Instituto de Estradas de Portugal) ascende a 2.251,84€;
- O vencimento anual ilíquido que o autor aufere como engenheiro civil assessor principal das Estradas de Portugal E.P.E ascende a 31.525,76€, correspondente a 14 meses;
- A diferença entre o vencimento anual ilíquido que o autor auferiria na qualidade de vogal do Conselho de Administração da ré, e o vencimento do seu lugar de origem nas das Estradas de Portugal E.P.E, à data da cessação de funções de Administrador, corresponde a um total de 42.468,64€;
- A ré cumpriu de forma voluntária e espontânea o pagamento da referida quantia ilíquida de 42.468,64€, correspondente à quantia líquida de 34.422,75€, a título de indemnização decorrente da destituição do autor do cargo de vogal do Conselho de Administração da ré;
- A ré disponibilizou ao autor toda a informação detalhada referente ao modo de cálculo da referida indemnização;
- O autor tinha completo e absoluto conhecimento dos termos da indemnização proposta pela ré;
- A ré enviou ao autor o cheque n.º 2144653674 da Caixa Geral de Depósitos, no valor de 34.422,75€, acompanhado do respectivo recibo e minuta de declaração de quitação;
- Após o envio da referida documentação, o autor remeteu à ré uma declaração e recibo de quitação parcial.

Ao abrigo do disposto no artº 510º, nº 1, al. b), do Cód. Proc. Civil, o Tribunal a quo conheceu do mérito da causa, proferindo saneador-sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a ré “RAVE – Rede Ferroviária de Alta Velocidade, S.A” dos pedidos formulados pelo autor José Luís Ribeiro dos Santos.

O A. J interpõe o presente recurso da decisão.

São as seguintes as conclusões de recurso apresentadas:
CONCLUSÕES
1. Nos termos da decisão recorrida, considerou o Mmo. Juiz a quo que, pese embora o Recorrente tenha direito a uma indemnização pela destituição sem justa causa do cargo que ocupava como administrador da Recorrida, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro (Estatuto do Gestor Público), no cálculo dessa indemnização deve atender-se tão só à parte da sua retribuição relativa a “ordenados”, sem considerar as demais componentes da retribuição do Recorrente;
2. Em abono de tal tese, chama o Mmo. Juiz a quo a atenção para a distinção entre a previsão do n.º 1 do artigo 7.º daquele Diploma, «(…) onde se alude genericamente às “remunerações” auferidas pelo gestor público (…)» e as restantes previsões contidas no mesmo artigo;
3. De acordo com a sentença em crise, no cálculo da indemnização não devem ser considerados os valores auferidos pelo Recorrente «(…) a título de “despesas de representação”, com “chamadas telefónicas”, [ou] com “uso de automóvel”»;
4. Ora, salvo o devido respeito, não pode o Recorrente conformar-se com o sentido de tal decisão;
5. Está em causa, nos presentes autos, a interpretação e o sentido a atribuir à norma constante do n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público;
6. Coloca-se a questão de saber se no cálculo da indemnização a atribuir ao Recorrente se deve atender aos montantes mensalmente auferidos por aquele a título de despesas de representação e remuneração em espécie, como partes integrantes da sua retribuição considerada no seu todo, ou se, ao invés, se deve atender apenas ao montante relativo à retribuição base mensal daquele;
7. O Recorrente apresentou contra a Recorrida acção declarativa com processo ordinário, nos termos da qual peticionou a condenação desta no pagamento de parte da indemnização, ainda não liquidada, que lhe é devida na sequência da exoneração do mesmo do cargo de vogal do Conselho de Administração da Recorrida, nos termos dos números 2 e 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público;
8. Tendo a Recorrida procedido ao pagamento ao Recorrente, a título indemnizatório, da quantia ilíquida de € 42.468,64, encontra-se ainda em dívida o montante ilíquido de € 25.904,51, ao qual acrescem os respectivos juros de mora até efectivo e integral pagamento;
9. Tal montante refere-se às parcelas da retribuição auferida pelo Recorrente, relativas a despesas de representação e a remuneração em espécie, às quais, contrariamente ao entendimento vertido na douta sentença recorrida, se terá necessariamente de atender na contabilização da indemnização prevista no n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público;
10. A decisão de destituição do Recorrente antes do termo do prazo do mandato para o qual tinha sido nomeado fundou-se num juízo de oportunidade ou mera conveniência relativamente à política de gestão empresarial da Recorrida, tratando-se, portanto, de um acto lícito;
11. Prevê a lei nesses casos o direito de o titular do órgão objecto de tal decisão auferir uma indemnização de valor correspondente aos ordenados vincendos até ao termo do mandato, com o limite máximo do vencimento anual do gestor – Cfr. n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público;
12. Trata-se, conforme tem sido entendido de forma unânime, quer na doutrina, quer na jurisprudência, de um direito a indemnização por factos lícitos, implicação directa do princípio da livre revogabilidade do mandato;
13. Mediante a previsão de tal indemnização procurou o Legislador indemnizar o gestor destituído pelo prejuízo que lhe é causado pela decisão de destituição, que implica, sempre e necessariamente, uma quebra na expectativa legítima e juridicamente tutelada do mesmo de chegar ao termo do mandato para o qual foi nomeado;
14. A indemnização em causa visa restabelecer o equilíbrio patrimonial, salvaguardar os interesses e as expectativas patrimoniais do gestor destituído, na sequência da quebra da relação do mandato por causa que não lhe é imputável;
15. No que se refere ao conteúdo da indemnização, a lei estabelece um duplo critério considerando, por um lado, o prejuízo adveniente da destituição para o gestor, correspondente àquilo que o mesmo auferiria se continuasse a exercer as suas funções até ao termo do mandato – “os ordenados vincendos”;
16. Por outro lado, fixa a lei como limite máximo do conteúdo da obrigação de indemnizar o montante relativo ao vencimento anual do gestor destituído;
17. As expressões “ordenados vincendos” e “vencimento anual” não têm diferente significado, antes querendo o Legislador estabelecer apenas que o limite máximo da indemnização a considerar é o do ordenado anual do gestor – como aliás é assinalado na sentença recorrida;
18. Nenhuma ilação deve ser retirada da distinção terminológica entre as expressões “ordenado”, “vencimento” e “retribuição”, usando o Legislador as três expressões para se referir a uma mesma e única realidade: a remuneração auferida pelo gestor, in casu, pelo Recorrente, como contrapartida do exercício das funções de vogal do Conselho de Administração da RAVE, conceito jurídico unitário
19. Referindo a lei que a indemnização a atribuir ao gestor destituído deve ser calculada atendendo aos ordenados vincendos até ao termo do mandato, mas não superior ao vencimento anual do gestor, é forçoso concluir que, tal indemnização terá de ser calculada com base na retribuição, no seu todo, que seria auferida pelo gestor destituído até ao termo do mandato;
20. Só dessa forma se cumprirá o objecto visado pelo Legislador com a previsão da referenciada indemnização, qual seja, o de acautelar os interesses do gestor que, por motivos de mera política de gestão, com base em juízos de oportunidade ou conveniência, é destituído do cargo para que tinha sido legitimamente mandatado;
21. Um outro limite ao conteúdo da indemnização aqui em causa, atendendo ao caso específico do Recorrente, é o constante do n.º 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público;
22. O Recorrente foi nomeado administrador da Recorrida em consequência de uma requisição ao entretanto extinto Instituto de Estradas de Portugal (actual Estradas de Portugal, EPE), onde prestava as suas funções, ao abrigo do disposto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 646/82 e no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 323-H/2000;
23. De acordo com o limite estabelecido nos n.ºs 2 e 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público, à indemnização a que o Recorrente tem direito na sequência da sua destituição será necessário deduzir o vencimento que aquele auferiria no respectivo lugar de origem, ou seja, deduzir o vencimento anual que este auferiria se estivesse ao serviço da Estradas de Portugal, EPE;
24. A decisão relativa à sua destituição do Recorrente, tomada na Deliberação Unânime por Escrito da Assembleia-Geral da Recorrida, de 7 de Novembro de 2005, foi-lhe comunicada em 15 de Novembro de 2005, tendo a partir dessa data aquele cessado as suas funções na RAVE;
25. Em Novembro de 2005, o Recorrente auferia uma retribuição mensal mista ilíquida de € 6.840,43, a qual se encontrava repartida por três parcelas: retribuição mensal base, despesas de representação e remuneração em espécie;
26. A título de retribuição base mensal ilíquida, o Recorrente auferia a quantia de € 4.204,18;
27. À retribuição base acrescia mensalmente, a título de despesas de representação, o montante de € 1.261,25;
28. O valor pago pela Recorrida ao Recorrente a título de despesas de representação era atribuído, sem qualquer correspondência directa nas despesas efectivamente realizadas pelos administradores ao serviço e em nome da RAVE, portanto, de forma regular e periódica, sem ter carácter sinalagmático em relação ao valor das referidas despesas;
29. Nunca foi solicitada ao Recorrente, nem a qualquer outro dos administradores, a apresentação de quaisquer comprovativos ou suportes documentais das despesas realizadas o que reforça a natureza remuneratória daquela atribuição;
30. O valor pago a título de despesas de representação era processado e pago igualmente como parte dos subsídios de férias e de Natal pagos pela RAVE aos seus administradores, sendo, deste modo, recebido por estes não doze mas catorze vezes por ano;
31. O pagamento, regular, periódico, de forma permanente e com valor fixo, feito pela Recorrida ao Recorrente a título de despesas de representação constituía, assim, parte integrante da retribuição auferida por este como contrapartida das funções que desempenhava como vogal do Conselho de Administração da RAVE;
32. Na retribuição auferida pelo Recorrente incluía-se ainda uma parcela correspondente a retribuição em espécie, na medida em que a este era facultada a utilização de uma viatura, de forma total e livre;
33. A Recorrida facultava também ao Recorrente a utilização de um telemóvel, ao qual estava alocado um plafond mensal de comunicações, pessoais e profissionais, no valor de € 125,00;

34. O valor total de remuneração em espécie atribuído mensalmente ao Recorrente, ascendia à quantia mensal de € 1.375, atribuído, contudo, apenas doze meses por ano;
35. No início do mandato, mantendo-se durante todo o período de execução do mesmo, foi atribuído ao Recorrente um veículo automóvel em regime de locação operacional, com combustível e portagens a cargo da RAVE, para uso total e não exclusivamente para fins profissionais, de acordo com a previsão expressa constante do Regulamento Interno da RAVE n.º 2004-3, de 14 de Abril;
36. Durante toda a execução do mandato, o Recorrente utilizou a viatura, seja para fins profissionais, seja a título pessoal, mesmo durante fins-de-semana, feriados e períodos de férias, com todos os respectivos encargos, incluindo despesas de combustível e portagens, a cargo da Recorrida e sem que esta limitasse ou sequer controlasse tal utilização;
37. Os demais administradores da Recorrida, os quais, de igual modo, dispunham de viaturas à sua disposição, adoptavam o mesmo comportamento que o Recorrente, prática essa não só aceite, como expressamente autorizada pelo Conselho de Administração e pelos accionistas da Recorrida;
38. A atribuição ao Recorrente, para utilização total e permanente, sem quaisquer limitações ou controlo, para fins profissionais ou pessoais, da aludida viatura, com combustível e portagens incluídos, tinha carácter retributivo, constituindo parte integrante do pacote remuneratório atribuído ao Recorrente como contrapartida das funções prestadas pelo mesmo;
39. A utilização da viatura constituía um benefício económico para o Recorrente, auferido pelo mesmo com carácter de regularidade e permanência como contrapartida das funções que desempenhava;
40. Durante o período de execução do mandato para que foi nomeado, o Recorrente também sempre teve liberdade para usar o telemóvel que lhe foi atribuído, e respectivo plafond pago pela Recorrida, quer para fins profissionais, quer para fins pessoais, sem que esta controlasse ou limitasse essa utilização;
41. A disponibilização de forma permanente, periódica e regularmente, de um plafond mensal a cargo da RAVE constituía um benefício económico que era parte integrante da retribuição do Recorrente, auferida pelo mesmo como contrapartida das funções que desempenhava;
42. Realizada a soma aritmética do conjunto remuneratório recebido pelo Recorrente, verifica-se que aquele auferia, pelo exercício das funções de administrador da Recorrida, globalmente, uma remuneração total anual ilíquida no valor de € 93.016,02;
43. Sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público, é ao valor acima indicado como remuneração total anual ilíquida que se tem de atender como limite máximo da indemnização devida pela Recorrida ao Recorrente (Cfr. n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público);
44. Na senda do entendimento plasmado na mais avisada Jurisprudência dos nossos tribunais superiores e contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, a indemnização a que o Recorrente tem direito deverá ser apurada mediante o cômputo das remunerações (ou ordenados) vincendas até ao termo do mandato daquele – incluindo, necessariamente, as três parcelas nas quais se decompõe essa retribuição;
45. Visando aquela indemnização salvaguardar os interesses económicos e as legítimas expectativas do Recorrente, no seu cálculo ter-se-á, necessariamente, de levar em consideração as três mencionadas parcelas nas quais se decompunha a retribuição auferida pelo Recorrente, e que este legitimamente contava auferir até ao termo do seu mandato;
46. Apesar de ser pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência que a relação contratual estabelecida entre o gestor público e, in casu, a RAVE constitui um contrato de mandato, importa, por outro lado, atender aos princípios gerais do Direito do Trabalho, aqui aplicados analogicamente e como matrizes interpretativas;
47. Nos termos do n.º 1 do artigo 249.º do Código do Trabalho «só se considera retribuição aquilo que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho»;
48. Nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, na contrapartida do trabalho incluem-se, para além da retribuição base, todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, pelo empregador ao trabalhador, sejam em dinheiro ou em espécie;
49. Se durante todo o período de execução do mandato, até à sua destituição, o Recorrente recebeu de forma fixa, regular e periódica a mencionada prestação a título de despesas de representação, daqui só se pode retirar que foi intenção das partes considerar a prestação em causa como uma parcela da retribuição devida ao Recorrente;
50. O mesmo se aplica à utilização, pelo Recorrente, da viatura, com combustível e portagens incluídas, e do telemóvel com plafond pago pela RAVE, para fins profissionais e pessoais, sem quaisquer limites ou controlo, de forma regular e permanente;
51. A indemnização legalmente prevista no n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Pública visa acautelar os interesses económicos e as expectativas juridicamente tuteladas do gestor que seja destituído do seu cargo, antes do termo do mandato para que tinha sido nomeado, por motivos de política de, como ocorreu com o Recorrente;
52. O Recorrente tinha expectativa legítima e juridicamente tutelada de auferir, quer a retribuição base mensal, quer a prestação a título de despesas de representação, e ainda de poder continuar a utilizar, de forma livre e total a viatura e o telemóvel que lhe tinham sido atribuídos, até ao termo do mandato que lhe tinha sido conferido;
53. A indemnização a que o Recorrente tem direito só poderá cumprir o objectivo para que foi legalmente prevista de restabelecer o equilíbrio da relação afectada – i. é., salvaguardar as mencionadas expectativas jurídicas – se ressarcir o Recorrente pela perda do benefício económico que para ele representava aquela retribuição no seu todo;
54. Andou mal o Tribunal a quo ao sufragar entendimento em sentido diverso na sentença ora em crise;
55. Tendo o Recorrente sido exonerado 13,5 meses antes do final do respectivo mandato, o total das remunerações que o Recorrente auferiria como administrador ao serviço da Recorrida até 31 de Dezembro de 2006 ascenderia a € 103.276;
56. O Recorrente, enquanto Assessor Principal do Instituto de Estradas de Portugal (actual Estradas de Portugal, EPE) auferiria a quantia total ilíquida mensal de € 2.251,84;
57. O valor remuneratório que o Recorrente auferiria até ao final do respectivo mandato, ou seja, por treze meses e meio, e respectivos subsídios de férias e Natal ascenderia a € 34.903,52 (trinta e quatro mil novecentos e três euros e cinquenta e dois cêntimos);
58. Operada a dedução, prevista no n.º 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público, daquela quantia à remuneração do Recorrente enquanto membro do Conselho de Administração da Recorrida, constata-se que o valor da indemnização devida àquele corresponde a € 68.373,15;
59. Tendo a Recorrida pago ao Recorrente apenas a quantia de € 42.648,64, a título de indemnização pela destituição daquele sem justa causa, encontra-se ainda em dívida o montante ilíquido de € 25.904,51;
NESTES TERMOS, e nos mais de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se a mesma por Douto Acórdão, nos termos do qual:
a. Seja condenada a Recorrida no pagamento ao Recorrente da quantia de € 25.904,51 (vinte e cinco mil novecentos e quatro euros e cinquenta e um cêntimos), relativa a parte ainda não liquidada da indemnização que lhe é devida pela exoneração, por mera conveniência de serviço, do seu cargo de administrador da RAVE, nos termos conjugados do disposto nos n.ºs 1, 2 e 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público; e
b. Seja condenada a Recorrida no pagamento dos juros de mora, já vencidos e vincendos até ao efectivo e integral pagamento da quantia indicada na alínea anterior.

A Ré/ Apelada apresentou contra alegações, concluindo nos seguintes termos:
CONCLUSÕES:
1) A Recorrida nada mais tem a liquidar ao Recorrente a título de indemnização pela sua destituição precoce do cargo de Gestor Público, por motivos de mera conveniência.
Na verdade,
2) O regime de fixação da indemnização devida aos Gestores Públicos é aquele que resulta do disposto no art. 6.º do EGP, e não, o que decorreria da aplicação das regras do mandato, uma vez que o regime do mandato apenas se aplica ao “que não for expressamente ressalvado no presente diploma” (vide: art. 3.º/3 do EGP).
3) Assim, em face do disposto nos arts. 3.º/3 e 6.º/2 e 6 do EGP, a aplicação das regras do mandato ao caso vertente contraria, frontalmente, a letra e o sentido da lei, sendo, por isso ilegítima e ilegal, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 9.º e 10.º do Código Civil.
4) Acresce que, por força do preceituado no art. 3.º do EGP, a aplicação das regras de Direito de Trabalho aos Gestores Públicos, seja para efeitos de cálculo da indemnização devida pela exoneração por conveniência, ou para quaisquer outros, é igualmente inadmissível. De facto, do disposto no art. 3.º do EGP decorre que, em tudo não esteja expressamente previsto naquele diploma, se deve recorrer ao regime do mandato, com a inerente consequência de excluir a possibilidade de interpretar as normas vertidas no EGP ou de integrar quaisquer das suas lacunas com recurso às regras específicas de Direito Laboral ou vertidas no Código das Sociedades Comerciais.
Ora,
5) Ficou sobejamente comprovado nos presentes autos, em 20 de Dezembro de 2005, a Recorrida liquidou ao Recorrente a quantia de € 42.468,64, a título da indemnização devida nos termos e para os efeitos do disposto no art. 6.º do EGP,
Sendo que,
6) Ao contrário do que sustenta o Recorrente, o conteúdo da expressão «ordenados vincendos» e «vencimento anual» constante do art. 6.º/2 do EGP não pode ser achado com base nas regras previstas no Código do Trabalho para efeitos de integração do conceito de retribuição dos trabalhadores, mais precisamente, o art. 249.º do CT, visto que, na relação mantida entre o Gestor e a empresa, falta, em absoluto, o elemento da subordinação jurídica que caracteriza a relação de trabalho, sob pena violação do disposto nos arts. 9.º e 10.º do Código Civil.
7) Na verdade, o caminho interpretativo daquelas expressões passa pelo confronto do dito art. 6.º com a norma do Código das Sociedades Comerciais que regula idêntica situação (art. 403.º do CSC), e pela análise do art. 26.º do Novo EGP no que se refere à indemnização devida aos Gestores Públicos destituídos por mera conveniência.
8) Assim, do confronto com estas normas decorre que o legislador veio prever dois regimes distintos para os Administradores das Empresas Públicas e para os Administradores das empresas privadas. Os Administradores de Empresas Públicas recebem, a este título, os vencimentos, entendidos como vencimentos base, devidos até ao final do mandato, mas cujo montante total não pode exceder o vencimento base anual devido. Por seu turno, os Administradores das Empresas Privadas recebem a indemnização estipulada no contrato, ou, em caso de a mesma não haver sido prevista, um outro montante acordado entre as partes que não pode ser superior ao montante das remunerações, o que inclui todos os montantes retributivos, que presumivelmente receberia até ao final do período para que foi eleito.
9) Efectivamente, como se concluiu na decisão em crise “a finalidade da previsão de uma indemnização para exoneração antes do termo de mandato de gestor, não consente outra interpretação que não seja a de que o legislador pretendeu apenas atender à consideração da retribuição relativa aos ordenados – não obstante saber – poderem os gestores públicos auferir outras componentes de retribuição (veja-se v.g. a previsão contida no art. 7.º, n.º 1 do Estatuto do Gestor Público vigente, onde se alude genericamente às «remunerações» auferidas pelo gestor público e às demais previsões contidas neste artigo).”
10) Aliás, esta é a tese que tem merecido mais acolhimento na doutrina e jurisprudência nacionais, da qual se destaca, a título meramente exemplificativo o Ac. do STJ de 01.06.1988 (disponível in BMJ 378.º, p. 583).
11) Pelo exposto, não sofre dúvida que, a quantia de € 1.261,25 recebida a título de despesas de representação e o direito de utilização da viatura e do telemóvel não integram os conceitos de «ordenados vincendos» e «vencimento anual» previstos no art. 6.º/2 do EGP, pelo que não devem ser considerados para efeitos de fixação da indemnização devida ao Recorrente.
12) Deste modo, e como decidiu o Tribunal a quo, tendo o Recorrente sido exonerado em 15 de Dezembro de 2005, e sendo certo que o seu mandato deveria ter terminado no dia 31 de Dezembro de 2006, de acordo com a primeira parte do art. 6.º/2 do EGP o Recorrente teria direito a receber 15,5 meses do seu vencimento (€ 4.204,18).
13) Porém, e porque a parte final do n.º 2 daquele preceito prevê que a indemnização não pode exceder o vencimento anual do Gestor, a indemnização seria equivalente a € 4.204,18 x 14 (considerando os doze meses do ano, acrescidos dos subsídios de férias e de natal devidos nos termos do art. 7.º/3 do EGP), ou seja, a € 58.858,52.
14) Acresce, ainda, que, o Recorrente foi requisitado ao Instituto das Estradas de Portugal, onde auferia a quantia mensal ilíquida de € 2.251,84, o que equivale a um vencimento anual de € 31.525,76. Deste modo, para se achar a quantia devida ao Recorrente haverá que reduzir este valor ao montante fixado a título de indemnização nos termos do art. 6.º/2 do EGP, o que corresponde a um total de € 27.332,76.
15) Sendo, certo, que, a Recorrida liquidou a quantia de € 42.468,64, que excede os € 27.332,76 efectivamente devidos, é evidente que o Recorrente nada mais tem a receber a este título.
16) De facto, como o Recorrente bem sabe, a referida indemnização corresponde à soma da retribuição mensal ilíquida de € 4.204,18 x 14 (num total de € 58.858,80) com a quantia de € 1.261,25, que lhe era liquidada a título de despesas de representação x 12 (num total de € 15.135,60), deduzida do vencimento anual ilíquido que o Recorrente aufere como Engenheiro Civil Assessor Principal das Estradas de Portugal EPE, no valor de € 31.525,76.
17) Assim sendo, a Recorrida não consegue alcançar por que motivo o Recorrente se debruça, de forma, aliás, insistente, sobre a questão de saber se as quantias que recebia a título de despesas de representação devem ou não ser consideradas para efeitos de cálculo da indemnização prevista no art. 6.º do EGP, visto que a indemnização que lhe foi liquidada traduz o pagamento das prestações daquela natureza;
18) Sendo que, por força do disposto no n.º 3 da Resolução de Conselho de Ministros n.º 121/2005, de 1 de Agosto, as despesas de representação liquidadas em todo o sector empresarial do Estado passaram a estar, obrigatoriamente, e sem qualquer excepção, fixadas em 12 meses.
19) Nestes termos, e uma vez que a destituição do Recorrente ocorreu em 7 de Novembro de 2005, é manifesto que não tinha qualquer expectativa legalmente protegida, e muito menos, um direito, em receber uma quantia equivalente a catorze meses de abono de despesas de representação.
20) Mais cumpre realçar que, a tese sustentada pelo Recorrente de que, nos termos das disposições conjugadas dos n.ºs 2 e 6 do art. 6.º do EGP, o vencimento anual de € 31.525,76 (quantia que auferia no local de onde foi requisitado) deve ser deduzido ao montante correspondente aos ordenados vincendos até ao termo do mandato (1.ª parte do art. 6.º/2), sendo esta a quantia que não pode ser superior ao vencimento anual do Gestor (limite previsto no art. 6.º/2 in fine), não tem qualquer correspondência com os elementos literal e sistemático da lei.
21) Na verdade, a operação de apuramento do tecto máximo da indemnização antecede, lógica e necessariamente, a tarefa de dedução do montante que o gestor cessante irá perceber nas funções reassumidas. Neste sentido depõe, a ratio legis do artigo – reajuste da indemnização à proporção da remuneração que vai receber pelas funções que reassume – e o facto de a dedução das quantias devidas pelo exercício das funções que o Gestor reassume vir tratada num preceito autónomo e logicamente posterior ao cálculo do montante indemnizatório máximo fixado.
22) Porém, mesmo que assim não se entenda o que, sem conceder, por mero dever de patrocínio se admite, é inequívoco que a Recorrida nada mais tem a pagar ao Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 6.º do EGP.
23) De facto, sendo certo que a Recorrida já liquidou ao Recorrente as quantias devidas a título de despesas de representação, abonadas doze vezes ao ano, em respeito pelo preceituado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 121/2005, de 1 de Agosto, e que, as quantias peticionadas e denominada pelo Recorrente como «retribuição em espécie», não passam de benefícios de carácter precário, e que lhe foram atribuídos para a assegurar a sua actividade na sua qualidade de membro do Conselho de Administração, é por demais evidente que o Recorrente nada mais ter a receber a título de indemnização pela sua exoneração.
24) Acresce que, como era – e é do conhecimento do Recorrente -, e como decorre dos Regulamentos Internos da Recorrida n.ºs 2004-2 e 2004-3, de 14 de Abril, juntos aos autos como docs. n.º 12 e 13 da contestação, a atribuição daqueles benefícios era totalmente precária, podendo ser cancelados a qualquer momento. Deste modo, o Recorrente não tinha qualquer expectativa, e muito menos, um qualquer direito, de manutenção daquelas regalias durante a vigência do seu mandato, e, menos ainda, após a sua cessação fosse, por que motivo fosse.
25) Por fim, refira-se ainda que, o único obstáculo apresentado pelo Recorrente à aplicação do art. 510.º/1 al. b) do CPC, nos presentes autos, reside no facto de a passagem de imediato, à apreciação do mérito da causa, o ter impedido de fazer a prova de que a quantia paga a título de despesas de representação constituía parte da retribuição.
26) Sucede, porém, que, não só esta questão se encontra totalmente ultrapassada (visto que a Recorrida liquidou as quantias devidas a título de despesas de representação, a abonadas doze meses, em respeito pelo preceituado no n.º 3 da Resolução de Conselho de Ministros n.º 121/2005, de 1 de Agosto), como os factos indispensáveis à apreciação desta questão se encontram devidamente comprovados.
27) Mais. As divergências reflectidas nas posições do Recorrente e da Recorrida assentam em questões de direito, pelo que, em nome do princípio da celeridade que deve pautar a realização da justiça, impunha-se a passagem, de imediato, à apreciação do mérito da causa, o que sucedeu.
28) Assim sendo, bem esteve o Tribunal a quo, ao proceder à análise do mérito da presente causa após concluída a fase dos articulados, em respeito pelo preceituado nos art. 508.º e 510.º do CPC.
NESTES TERMOS
Deve o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente, por não provado, e, em consequência, ser confirmada a sentença recorrida com as legais consequências.”

Colhidos os vistos cumpre decidir:

Objecto do recurso:
Nos termos do disposto nos art. 684, nº3 e 4 e 690, nº1, do CPC o objecto do recurso delimita-se, em princípio, pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento das questões de que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art. 660, ex. vi do art. 713, nº2, do mesmo diploma legal.

Os factos dados como provados pelo tribunal a quo, (por acordo e por documentos) são os seguintes:
– - O autor é engenheiro de profissão, e encontra-se desde Outubro de 1986 integrado no quadro técnico da Estradas de Portugal, EPE (anteriormente Junta Autónoma das Estradas), com a categoria de Engenheiro Civil Assessor Principal;
– - A ré é uma sociedade comercial anónima, cujo objecto consiste no desenvolvimento e coordenação dos trabalhos e estudos necessários para a formação de decisões de planeamento e construção, financiamento, fornecimento e exploração de uma rede ferroviária de alta velocidade a instalar em Portugal Continental e da sua ligação com a rede espanhola de igual natureza;
3.- A ré foi constituída em Dezembro de 2000 pelo Decreto-Lei 323-H/2000, de 19 de Dezembro, como sociedade anónima inserida no Sector Empresarial do Estado, regendo-se pela lei comercial, pelo referido diploma e pelos respectivos estatutos (cfr. artigo 1º do Decreto-Lei 323-H/2000);
4.- O capital social da sociedade ré, no valor de €2,5 milhões de euros, é detido em 60% pelo Estado Português e em 40% pela sociedade REFER, E.P. (esta por sua vez detida a 100% pelo Estado Português);
5.- O autor foi nomeado membro do Conselho de Administração da ré para o triénio 2004-2006, na qualidade de vogal, em sede de Assembleia Geral da ré, a qual ocorreu no dia 22 de Janeiro de 2004;
6.- Para o efeito, o autor foi requisitado ao Instituto das Estadas de Portugal nos termos e para os efeitos previstos no artigos 17º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, artigo 5º do Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro e artigo 9º do Decreto-Lei n.º 323-H/2000 de 19 de Dezembro;
7.- O autor auferia uma retribuição base mensal ilíquida, atribuída pelo desempenho do cargo de vogal do Conselho de Administração da ré, no valor € 4.204,18;
8.- A este valor acrescia ainda um montante mensal para despesas de representação no valor de € 1.261,25;
9.- Foi facultado ao autor, enquanto membro do Conselho de Administração da ré, a utilização de telemóvel, alocado a um plafond mensal de comunicações;
10.- Foi atribuída ao autor, enquanto membro do Conselho de Administração da ré, a utilização de uma viatura em regime de “uso total”;
11.- Por Deliberação Unânime por Escrito da Assembleia Geral da ré, datada de 07 de Novembro de 2005, o autor foi destituído do seu cargo de Vogal do Conselho de Administração da ré, tendo os accionistas, face à renúncia dos restantes administradores, eleito nova administração para o termo do mandato então em curso;
12.- A decisão de destituição supra referida foi comunicada ao autor em 15 de Novembro de 2005;
13.- Apenas a partir dessa data o autor deixou de desempenhar funções enquanto membro do Conselho de Administração da ré;
14.- O autor, enquanto assessor principal do Instituto de Estradas de Portugal (posteriormente renomeado Estradas de Portugal, EPE), auferiria a quantia total ilíquida mensal de € 2.251,84;
15.- Em 20 de Dezembro de 2005, foi atribuído e pago pela ré ao autor, a título indemnizatório, a quantia ilíquida de € 42.468,64, a que corresponde a quantia líquida de € 34.422,75, valor que este reconhece.

APRECIANDO O RECURSO
A apreciação do recurso circunscreve-se à questão de saber se no cálculo da indemnização a atribuir ao Apelante se deve atender aos montantes mensalmente auferidos por aquele a título de despesas de representação e remuneração em espécie, como partes integrantes da sua retribuição considerada no seu todo, ou se, ao invés, se deve atender apenas ao montante relativo à retribuição base mensal daquele, tal como se decidiu na primeira instância.

O Recorrente apresentou contra a Recorrida acção declarativa com processo ordinário, nos termos da qual peticionou a condenação desta no pagamento de parte da indemnização, ainda não liquidada, que lhe é devida na sequência da exoneração do mesmo do cargo de vogal do Conselho de Administração da Recorrida, nos termos dos números 2 e 6 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público. Tal montante de que pretendia ser indemnizado por via da acção intentada refere-se às parcelas da retribuição auferida pelo Recorrente, relativas a despesas de representação e a remuneração em espécie, às quais, contrariamente ao entendimento versado na sentença recorrida, o apelante entende que se deverá atender nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público.

E porque a Recorrida procedeu ao pagamento ao Recorrente, a título indemnizatório, da quantia ilíquida de € 42.468,64, na perspectiva do Apelante encontra-se ainda em dívida o montante ilíquido de € 25.904,51, ao qual acrescem os respectivos juros de mora até efectivo e integral pagamento.
Quid júris?
Tal como bem se considerou na decisão recorrida aos membros do conselho de administração da ré é aplicável o Estatuto do Gestor Público, ainda constante do Dec. Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro.
Em causa está, no entanto, a interpretação dada pelo tribunal a quo ao n.º 2 do artigo 6.º do Estatuto do Gestor Público.
Para não considerar abrangido na indemnização o montante auferido pelo apelante a título de despesas de representação, sustentou o tribunal recorrido que:
“Considerando o caso dos autos, resultou provado que por Deliberação Unânime por Escrito da Assembleia Geral da ré, datada de 07 de Novembro de 2005, o autor foi destituído do seu cargo de vogal do Conselho de Administração da ré, tendo tal decisão de destituição sido comunicada ao autor em 15 de Novembro de 2005, data, a partir da qual o autor deixou de desempenhar funções enquanto membro do Conselho de Administração da ré.
Neste ponto, interessa ter presente o estatuído no artigo 6º do Estatuto do Gestor Público em vigor (o referido D.L. nº 464/82, de 9 de Dezembro):
«1 - O gestor público pode ser livremente exonerado pelas entidades que o nomearam, podendo a exoneração fundar-se em mera conveniência de serviço.
2 - A exoneração dará lugar, sempre que não se fundamente no decurso do prazo, em motivo justificado ou na dissolução do órgão de gestão, a uma indemnização de valor correspondente aos ordenados vincendos até ao termo do mandato, mas não superior ao vencimento anual do gestor.
3 - Considera-se motivo justificado para efeitos do número anterior:
a) A falta de observância da lei ou dos estatutos da empresa;
b) A violação grave dos deveres de gestor público.
4 - O apuramento do motivo justificado para a revogação do mandato pressupõe a prévia audiência do gestor sobre as razões invocadas, mas não implica o estabelecimento ou organização de qualquer processo.
5 - A dissolução do órgão de gestão de uma empresa pública pode ser determinada pelas entidades a quem cabe a nomeação dos gestores, nos seguintes casos:
a) Não observância nos orçamentos de exploração e investimentos dos objectivos básicos definidos pela tutela;
b) Desvio substancial entre os orçamentos e a respectiva execução;
c) Deterioração dos resultados de exercício durante o qual o presidente haja exercido funções por período não inferior a 9 meses.
No caso de se verificarem os eventos descritos nas alíneas b) e c), a dissolução deve ser decretada, salvo se for considerado pelas entidades acima referidas que o órgão de gestão tomou todas as medidas ao seu alcance para reduzir ou evitar tais eventos.
A dissolução envolve a cessação do mandato de todos os titulares dos órgãos de gestão.
6 - Quando as funções forem prestadas em regime de comissão de serviço ou de requisição, a indemnização eventualmente devida será reduzida ao montante da diferença entre o vencimento como gestor e o vencimento de lugar de origem à data da cessação de funções de gestor.
7 - O gestor público pode renunciar ao mandato conferido com a antecedência mínima de 3 meses sobre a data em que se propõe cessar funções. A cessação de funções resultante de renúncia ao mandato determina a cessação da requisição ou comissão de serviço».
Ora, sem dúvida – nem isso foi posto em causa pela ré – a decisão de exoneração do autor e demais membros da administração da ré fundou-se num juízo de oportunidade ou conveniência relativamente à gestão da empresa pública ré e, não, no decurso do prazo do mandato para o qual foram nomeados.
Assim, de acordo com o nº 2 do artigo 6º do Dec. Lei nº 464/82, a exoneração em causa confere ao titular do órgão direito a auferir uma indemnização de valor correspondente aos ordenados vincendos até ao termo do mandato, mas não superior ao vencimento anual do gestor.
Tal opção da lei prende-se com o facto de, com a definição do limite máximo de indemnização de um ano de ordenados, o legislador ter entendido que tal valor permitirá ao gestor público «(…) enfrentar o mercado de trabalho e compensar as expectativas que a nomeação para o cargo criou e que se goraram» (assim, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/01/2003, sumariado na Internet, na base de dados do Ministério da Justiça, no endereço (url) http://www.dgsi.pt, tendo o respectivo documento o nº RL200301230029006, relatado pela Des. Fernanda Isabel Pereira).
Neste ponto, alegou o autor que tem direito a receber, por força da destituição operada, a quantia total de € 103.276,67 (da qual, entretanto, a ré lhe pagou € 42.468,64 em termos ilíquidos).
Para tanto, considerou o autor, não só o período de 13,5 meses (período desde a comunicação da destituição (15.11.2005) até ao final do seu mandato) e que o seu vencimento abrangia o vencimento base e despesas de representação, férias e subsídios de férias e Natal recebidos regularmente ao longo do mandato cumprido, bem como vários outros suplementos salariais, que denomina como “retribuição em espécie”, correspondendo ao uso de viatura automóvel e uso de telemóvel.
Neste ponto, interessa, desde já, ter presente, o artigo 6º, nº 2, do Estatuto do Gestor Público em vigor (o referido D.L. nº 464/82, de 9 de Dezembro), que estabelece que “A exoneração dará lugar, sempre que não se fundamente no decurso do prazo, em motivo justificado ou na dissolução do órgão de gestão, a uma indemnização de valor correspondente aos ordenados vincendos até ao termo do mandato, mas não superior ao vencimento anual do gestor. (sublinhado nosso).
Acresce que, também interessa ter presente que o artigo 6º, nº 2, do Dec. Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro menciona as expressões «ordenados vincendos» e «vencimento anual». Contudo, tais expressões não têm diferente significado, antes querendo representar que o limite máximo da indemnização a considerar é o do ordenado anual do gestor.
Na verdade, como se referiu no acórdão do S.T.J. de 01/06/88 (in BMJ 378º, p. 583), «I - O artigo 6º do Decreto-Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro, preceitua que a exoneração do gestor público dá lugar a uma indemnização de valor correspondente aos ordenados vincendos, até ao termo do mandato, mas não superior ao vencimento anual do gestor.
II – A norma aludida pretende que os ordenados e vencimentos signifiquem a mesma coisa, tendo a expressão vencimento anual o mesmo significado de que ordenado anual.
III – Alegando o autor na petição inicial, que o seu ordenado era de 129 contos, e referindo a lei, nos termos das conclusões anteriores, corresponder a indemnização aos ordenados, não cabem na indemnização devido ao autor os subsídios de representação, nem a equivalência económica pelo o uso do automóvel da empresa ré.
IV – Não é aplicável o artigo 82 do Decreto-Lei nº 49408, de 24 de Novembro de 1969, (regime do contrato individual de trabalho) que considera retribuição aquilo a que o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
V – Assim, no caso sub judice, o subsídio de representação e o direito do uso do automóvel não representam contrapartidas correspondentes ao trabalho do autor».
«A Lei fez uma definição e estabeleceu um limite. Definição: a indemnização corresponderia aos ordenados vincendos até ao termo do mandato. Limite: a indemnização não poderia ser superior ao vencimento anual do gestor. É de todo evidente que a definição é principal em relação ao limite e que o limite é uma circunstância em relação à definição. E essa evidência ganha contraprova nesta figuração: se faltarem, por exemplo, seis meses para o termo do mandato do gestor (…), o limite não chega a actuar para a fixação da indemnização e, assim, a indemnização é calculada apenas pela definição – é calculada, portanto, em função dos ordenados vincendos até ao termo do mandato. E dessa relacionação ente o principal (definição) e o acessório (limite) resulta que a Lei quis que ordenados e vencimento significassem a mesma qualidade – que, portanto, vencimento anual tivesse o significado conjunto de ordenados mensais» (assim, o citado acórdão do S.T.J. de 01/06/88).
Na verdade, a específica relação de confiança do cargo de gestor público com a entidade que o nomeou – e que pode justificar, legalmente, a sua livre destituição, nos termos supra expostos, por mera alegação de «conveniência de serviço» - e a finalidade da previsão de uma indemnização para a exoneração antes do termo do mandato do gestor, não consente outra interpretação que não seja a de que o legislador pretendeu atender apenas à consideração da retribuição relativa a ordenados – não obstante saber – poderem os gestores públicos auferir outras componentes de retribuição (veja-se v.g. a previsão contida no artigo 7º, nº 1, do Estatuto do Gestor Público vigente, onde se alude genericamente às «remunerações» auferidas pelo gestor público e às demais previsões contidas nesse artigo).
Assim, não obstante o alegado pelo autor – de que auferia um determinado valor a título de «despesas de representação», com «chamadas telefónicas», com «uso de automóvel»- tais valores não devem ser considerados para efeitos de cálculo do «ordenado» mensal do autor, enquanto desempenhou as funções de vogal do Conselho de Administração da ré, relativamente à indemnização a atribuir-lhe pela sua destituição.
Considerando que o autor terminaria o seu mandato em 31 de Dezembro de 2006, mas que, todavia, foi exonerado em 15 de Novembro de 2005, o mesmo teria direito a perceber uma indemnização correspondente aos ordenados vincendos até 31 de Dezembro de 2006.
Contudo, no caso concreto, o limite contido na parte final do nº 2 do artigo 6º do D.L. nº 464/82, deverá operar, motivo pelo qual, a indemnização a atribuir ao autor não poderá exceder o ordenado anual do mesmo.
Ora, no presente caso, como resultou provado, o ordenado do autor, enquanto vogal do conselho de administração da ré, era de € 4.204,18 mensais.
Tal ordenado era auferido pelo autor durante 14 vezes no ano, (considerando os 12 meses do ano, o subsídio de férias e o subsídio de Natal – cfr. artigo 7º, nº 3, do Dec. Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro).
Assim, o ordenado anual do autor era o de € 58.858,52 (€ 4.204,18 X 14).
De acordo com o exposto, a indemnização a atribuir ao autor por força da sua exoneração, não poderá ultrapassar o valor de € 58.858,52.
Neste ponto, temos também que considerar que resultou provado que o autor foi requisitado ao Instituto das Estadas de Portugal nos termos e para os efeitos previstos no artigos 17º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, artigo 5º do Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro e artigo 9º do Decreto-Lei n.º 323-H/2000 de 19 de Dezembro.
Assim, teremos que considerar o disposto no artigo 6º, nº 6, do Estatuto do Gestor Público em vigor (o referido D.L. nº 464/82, de 9 de Dezembro), que estipula que “Quando as funções forem prestadas em regime de comissão de serviço ou de requisição, a indemnização eventualmente devida será reduzida ao montante da diferença entre o vencimento como gestor e o vencimento de lugar de origem à data da cessação de funções de gestor”
Resultou também provado que o autor, enquanto assessor principal do Instituto de Estradas de Portugal (posteriormente renomeado Estradas de Portugal, EPE), auferiria a quantia total ilíquida mensal de € 2.251,84, pelo que o seu vencimento anual ilíquido ascenderia a € 31.525,76, correspondente a catorze meses.
Assim, a diferença entre o vencimento anual ilíquido que o autor auferiria na qualidade de vogal do Conselho de Administração da ré - € 58.858,52 - , e o vencimento do seu lugar de origem à data da cessação de funções de vogal da administração da ré – 31.525,76-, corresponde a um total de € 27.332,76.
Ora, sucede que ao autor já foi paga, em 20 de Dezembro de 2005, pela ré ao autor a quantia ilíquida de 42.468,64, quantia essa de valor muito superior à supra referida.
Assim, de acordo com o exposto, conclui-se que, tendo o autor já recebido a indemnização que lhe era devida, não lhe assiste qualquer direito a receber qualquer outra quantia por força da destituição do cargo que desempenhava na ré e, por consequência, não é também devida qualquer condenação da ré em sanção pecuniária compulsória.”

Ora este entendimento versado na sentença não nos parece correcto considerando que na petição inicial o Apelante havia alegado como decorre dos art. 16 a 22 factos que, a provarem-se, poderiam levar o tribunal a quo a concluir que tais despesas foram integradas pelas partes no conceito de vencimento ou remuneração.
É que o apelante alegou que tais despesas de representação não tinham correspondência directa nas despesas efectuadas pelos admnistradores ao serviço e em nome da Ré , sendo atribuído mensalmente regular e periodicamente, sem ter carácter sinalagmático em relação ao valor das referidas despesas, que não lhes era solicitado suporte documental das despesas realizadas e que era pago igualmente enquanto parte dos subsídios de férias e de Natal (atribuído 14 meses).
Estes factos foram alegados em defesa da posição sustentada pelo
Apelante e a provarem-se poderiam conduzir a solução jurídica diversa da sustentada pelo tribunal a quo.
Veja-se neste sentido o Acórdão do SJ200312110037136 de 10.4.03, no sítio www.dgsi.pt., Relator Silva Salazar.
Com efeito e como também se sustenta num outro aresto do STJ (por aquele citado) sendo tais despesas pagas ao prestador dos serviços mediante um abono mensal fixo, será de admitir que as partes pretenderam integrar tais despesas no conceito de vencimento ou de remuneração, mas isto se comprovar serem elas independentes em relação ao montante das despesas efectivamente suportadas pelo servidor. Cf. AC. do S.T.J. de 25/11/92, in B.M.J. 421-426

Quer isto dizer que o tribunal a quo decidiu prematuramente a acção no saneador-sentença, quando havia matéria controvertida que, a provar-se, poderia conduzir a solução jurídica diversa da encontrada.

DECISÃO
Pelo exposto, revogam o saneador- sentença, determinando que os autos voltem à primeira instância para elaboração de base instrutória com a selecção dos aludidos factos controvertidos e ulteriores termos processuais.
Sem custas.
Lisboa, 13 de Janeiro de 2009.
Maria do Rosário Barbosa
Rosário Gonçalves
José Augusto Ramos