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PROVIDÊNCIA CAUTELAR
CESSÃO DE QUOTA
TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
Sumário
1. Não comportando o procedimento cautelar uma fase de saneamento, os factos alegados na oposição não considerados na decisão só devem ser objecto de apreciação em recurso se tiverem influência na decisão da causa. 2. Tendo o requerido optado pela dedução de oposição, apenas pode apresentar factos novos e/ou novos meios de prova, mas já não discutir se, face aos factos apurados, a providência não deveria ter sido decretada por não estarem preenchidos os respectivos pressupostos, por se tratar de matéria de recurso. 3. Mantendo-se no essencial a factualidade que esteve na base da decisão que decretou a providência, não pode a decisão que julga a oposição alterar o enquadramento jurídico equacionado naquela decisão. 4. Não padece de omissão de pronúncia a decisão da oposição que não aprecia questões suscitadas pelo requerido cuja procedência levaria a um enquadramento jurídico diverso, com fundamento em que se trata de matéria de recurso, e não de oposição. 5. A cessão da totalidade das quotas de uma sociedade opera a transmissão indirecta do estabelecimento, obtendo-se um efeito equivalente ao trespasse. 6. Na compra e venda de empresas existe uma obrigação implícita de não concorrência: independentemente de estipulação expressa nesse sentido, o vendedor fica vinculado a não concorrer com o comprador em actividade similar, num certo espaço e durante um certo período de tempo. 7. É possível impedir o accionamento da garantia bancária on first demand em caso de fraude ou abuso por parte do beneficiário. (MP)
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1. Relatório e fundamentos de facto
P SA., com sede em Madrid, intentou procedimento cautelar não especificado contra J e outros, pedindo que os recorrentes sejam notificados para se absterem de accionar a garantia bancária prestada para cumprimento de obrigações emergentes de um contrato de cessão de quotas, através do qual os requeridos cederam as quotas de que eram titulares na sociedade LABO2, LDA, dando-se conhecimento ao Banco emissor de tal ordem judicial.
Alegam para tanto, e em síntese, que, em 09 de Junho de 2005, entre si e os requeridos foi celebrado um contrato-promessa de cessão de quota da sociedade LABO2 LDA, e em 22 de Junho de 2005 a respectiva escritura de cessão de quotas, tendo sido acordado o preço global de 2.485.000,00 euros, tendo os requeridos, nessa data, renunciado aos cargos de gerência da sociedade LABO 2, e sido denunciados os contratos de trabalho dos dois primeiros que, no mesmo dia, assinaram novos contratos de trabalho a termo com a LABO 2, tendo o terceiro mantido o seu vínculo laboral à empresa.
Posteriormente, os requeridos criaram uma empresa com o mesmo objecto social e concertadamente iniciaram um processo de esvaziamento do valor da sociedade, nomeadamente criando uma empresa/sociedade com uma denominação que gera confusão nos clientes (L2 ESpirit), contratando os trabalhadores da requerente para essa empresa, desviando a clientela da requerente para a empresa que criaram e concorrendo com a requerente no mercado, comportamento que lhe tem causado graves prejuízos, pretendendo pôr fim ao contrato, em processo próprio.
À data da celebração da escritura a requerente pagou aos requeridos a quantia de 595.000,00 euros, devendo o remanescente do preço ser pago em quatro prestações anuais, que estão devidamente discriminadas na escritura. E para garantia do pagamento do remanescente do preço estipulado para a cessão das quotas, a requerente entregou uma garantia bancária à primeira solicitação, emitida pelo Banco a beneficiar os requeridos.
Os requeridos assumiram o compromisso de darem quitação de cada um dos pagamentos efectuados pela requerente, o que não fizeram, apesar do pagamento em 22 de Junho de 2006 da quantia de 570.000,00 euros, mantendo-se, assim, o valor da garantia supra referida em 1.890.000,00 euros, que pode ser accionada pelos requeridos causando-lhe ainda maiores prejuízos.
Foi dispensado o contraditório, e procedeu-se à inquirição de testemunhas.
Foram considerados indiciariamente provados os seguintes factos:
1 - Até 22 de Junho de 2005, a sociedade LABO 2, LDA., (..), era detida pelos requeridos.
2 - Em 9 de Junho de 2005, os requeridos e a requerente celebraram um contrato--promessa de cessão de quotas da Labo 2.
3 - Os elementos fundamentais para a concretização do negócio entre requerente e requeridos, nomeadamente para estipulação do preço, foram a clientela, o Know how, a maquinaria e a capacidade de manutenção e de concorrer no mercado demonstrados pela Labo 2.
4 - Um outro elemento fundamental, considerado por requerente e requeridos para a estipulação do preço, foi o facto de a Labo 2 não ser proprietária das instalações onde desenvolve a sua actividade.
5 — Em 22 de Junho de 2005 foi celebrado, por escritura pública, entre requerente e requeridos, o contrato de cessão de quotas da Labo 2, pelo preço total de 2.485.000,00 (dois milhões quatrocentos e oitenta e cinco mil euros).
6 - Nessa escritura, os requeridos J e a A renunciaram aos seus cargos de gerência na Labo 2.
7 — Na mesma data, os requeridos J e A, denunciaram os respectivos contratos de trabalho que alegaram deter na Labo 2.
8 -Também no dia 22 de Junho de 2005, os requeridos J e A assinaram — respectivamente — um contrato de trabalho a termo com a Labo 2, por um período de duração de seis meses, para o cargo de "consultores da nova gerência".
9 - O requerido C manteve o seu vínculo laboral à Labo 2 até 21 de Abril de 2006.
10 - A relação laboral estabelecida, no dia 22 de Junho de 2005, entre a Labo 2 e os Requeridos J e A e a Labo 2, tinha como finalidade o apoio à transição da anterior gestão para a nova gestão, levada a cabo pela P, que assim se realizaria com o auxílio dos referidos "consultores", ex-gerentes da Labo 2.
11 - Estas funções para que os requeridos J e A eram contratadas, eram indispensáveis e especialmente importantes para o sucesso da Labo 2.
12 - Em 5 de Julho de 2005, o Senhor Eng. B — prestador de serviços de manutenção e reparação à Labo 2 — denunciou através e-mail, perante o Dr. J, colaborador da requerente, o teor de uma comunicação via e-mail que recebeu do requerido J.
13- Nesse e-mail, o requerido J instava B a "concertar posições estratégicas" com ele ou com o também requerido C, identificado nesse e-mail por "CB", posições estratégicas que seriam tomadas à revelia da ora requerente.
14 - Ou seja, os requeridos J e C actuavam e influenciavam outros colaboradores da Labo 2 a actuar contra as instruções que recebessem da sua entidade patronal – a Labo 2 – e, consequentemente, da ora Requerente, detentora do respectivo capital social, para prosseguirem estratégias próprias.
15 -Em 14 de Setembro de 2005, B denuncia perante o Dr. J, por e-mail diversas actuações por parte dos requeridos, levadas a cabo com o auxílio de outros colaboradores da Labo 2, que se mostraram danosas para os interesses da Labo 2 e da requerente.
16- Nesse e-mail dirigido ao Dr. J, colaborador da requerente, B denuncia que: Os ora requeridos J e A trancaram-se no respectivo gabinete e destruíram documentação pertença da Labo 2.
17- Os requeridos apropriaram-se de diversas pastas contendo informação essencial para a Labo 2, pastas estas que "levaram para os respectivos carros";
18 - Apoderaram-se ainda os requeridos de todas as chaves disponíveis do gabinete de J e de A na Labo 2, impedindo o acesso ao mesmo por parte de todos os demais colaboradores da Labo 2 e da própria requerente, pelo que B, em representação destas, foi obrigado a solicitar os serviços de um serralheiro para lograr o acesso ao referido gabinete;
Consigna-se que o facto nº 19 era constituído pela parte final do facto nº 18.
20 - Quando B logrou o acesso a esse gabinete, já nenhuma documentação se encontrava no seu interior, destruída ou retirada e ocultada pelos requeridos, que a fizeram sua;
21- O próprio C, ora requerido, veio a repreender B por este ter ordenado a abertura do gabinete referenciado supra, numa manifestação de conluio com os outros requeridos J e A;
22- Os requeridos, com a ajuda de diversos colaboradores da Labo 2, para além de destruírem e desviarem documentação das instalações desta sociedade, ainda destruíram diversos ficheiros informáticos com informação relevante e essencial à actividade da Labo 2 e que dela eram propriedade;
23- Apoderaram-se ainda os requeridos de diversos ficheiros com informações dos Clientes da Labo 2, que fizeram suas, posteriormente eliminando o acesso às mesmas por parte da Labo 2 e, consequentemente, da ora requerente, inviabilizando, dessa forma, diversos negócios;
23- Além disso, os requeridos, com o auxílio de outros colaboradores da Labo 2 lograram, ainda, criar um acesso paralelo e externo à rede desta entidade, permitindo-lhes, desta forma, aceder a toda a informação existente no universo informático da Labo 2,
24 - Não cumprindo horários de trabalho, nem se apresentando com a regularidade devida nas instalações da Labo 2, o que, manifestamente, influiu de modo negativo nas funções que eles desempenhavam na Labo 2, ou seja, no apoio à transição da sua anterior gerência, para a nova gerência da sociedade.
25- Na sequência de todos os acontecimentos referidos, e que já eram parcialmente do conhecimento da requerente e da gerência da Labo 2, foram instaurados por esta entidade processos disciplinares contra os Requeridos A e J; esses processos disciplinares terminaram na aplicação a ambos de uma sanção de suspensão por vinte dias.
26 - Os contratos de trabalho dos requeridos J e A, celebrados com a Labo 2 em 22 de Junho de 2005, terminaram no seu termo, ou seja, em 22 de Dezembro de 2005.
27- Entre 19 de Setembro de 2005 e 19 de Maio de 2006, dez trabalhadores da Labo 2 apresentaram cartas de rescisão de contrato de trabalho, concretamente (…).
28- Em 24 de Março de 2006, foi constituída a sociedade L2 SPIRIT, S.A. (de ora em diante "L2"), sendo o requerido J um dos administradores da mesma.
29- A referida saída de trabalhadores da Labo 2 resultou da conduta dos requeridos, que por várias vezes aliciaram os trabalhadores da Labo 2 a rescindir os seus contratos com esta e a celebrar novos contratos de trabalho com a L2, então constituída ou em vias de constituição.
30 - Tal convite foi feito, nomeadamente, ao Sr. J e ao Sr. P, os quais, apesar da insistência dos requeridos, recusaram a proposta feita por estes.
31- Da conduta dos requeridos resultou que quase todos os trabalhadores que rescindiram os seus contratos de trabalho com a Labo 2, identificados supra, passaram a integrar o quadro de pessoal da L2 ou mantêm relações próximas com esta.
32- Os ex-trabalhadores da Labo 2, P, H e J são sócios fundadores da L2.
33- O referido J, trabalhador responsável pela área da orçamentação da Labo 2, de uma grande importância para essa entidade - apesar de ser sócio fundador da L2 desde 24 de Março de 2006, momento da sua constituição formal, apenas denunciou o seu contrato de trabalho em 17 de Maio de 2006, com efeitos - cumpridos os 60 dias de pré-aviso obrigatórios - a 16 de Julho de 2006.
34 - Também grande parte dos clientes da Labo 2 deixaram de o ser, passando a ser clientes da L2.
35 - Esta L2 prossegue a mesma actividade desenvolvida pela Labo 2.
36 - A denominação social da L2 é semelhante à da Labo 2, criando uma falsa ideia de continuidade e de passagem de testemunho entre as duas sociedades, o que não é inocente, até atento o discurso do requerido J à comunicação social.
37 - O ex-gerente e ex-sócio da Labo 2 e ora requerido, J, conhece bem o mercado em que opera essa sociedade, que é o mesmo onde opera a L2, de que é Administrador.
Consigna-se que não existe o facto nº 38.
39- Em 20 de Outubro de 2006, numa notícia publicada na revista "M", foi apresentada oficialmente ao mercado a sociedade L2 e nessa notícia, o requerido J afirma que a Labo 2 tinha fechado,
40- De acordo com essa noticia: "BES, Vodafone, Corte Inglés e Central de Cervejas são alguns dos clientes que trabalham com a L2Spirit, gráfica que teve na sua origem o fecho da Labo 2 Digital
"Com o fecho da Labo 2, que foi absorvida pela P, o mercado percebeu que havia um gap e uma carência de serviços e, além disso, havia um conjunto de pessoas que tinha vontade de se juntar", conta ao M&, responsável pelo planeamento estratégico da L2 Spirit".
41- Actualmente, um dos principais accionistas da L2 é o Sr. C, que dirige a sociedade PA que era um dos grandes clientes da Labo 2 e deixou de o ser.
42- Praticamente todos os clientes perdidos pela Labo 2 desde a cessão de quotas efectuada pelos Requeridos à Requerente, nomeadamente o BES, Vodafone, El Corte lnglés e Central de Cervejas, são agora clientes da sociedade L2.
43- A perda de clientela e de capacidade de produção da Labo 2, atenta a saída de trabalhadores especializados, a qual implicou a reorganização do trabalho interno e das equipas, com necessidade de se recrutarem novos trabalhadores – necessariamente sem a experiência dos anteriores – para substituírem aqueles que tinham saído, provocou a desvalorização da Labo 2.
44- Em consequência, a Labo 2 viu diminuir em muito os seus resultados de exploração.
45- Existem equipamentos que são essenciais para a Labo 2 prosseguir a sua actividade, entre eles, as máquinas que lhe permitem realizar os trabalhos de impressão digital.
46- A Labo 2 era a locatária num contrato de locação financeira mobiliária, celebrado com a sociedade "Locapor – Companhia Portuguesa de Locação Financeira Mobiliária, S.A.", contrato que tinha o seu início em 17 de Junho de 2002 e terminava 48 meses depois, ou seja, em 16 de Junho de 2006.
47- E consta do Anexo VII ao contrato promessa de cessão de quotas, fazendo parte do activo da Labo 2.
48- Esse contrato de locação financeira tinha por objecto a máquina Vutek Ultravu 5300 Printer, o software necessário ao seu funcionamento e o denominado Remote Installation Kit, em conjunto de ora em diante designado por "Equipamento".
49– O referido equipamento tem o valor de € 430.583,96 (quatrocentos e trinta mil quinhentos e oitenta e três euros e noventa e seis cêntimos)
50- Ainda hoje a Labo 2 e a Requerente desconhecem o paradeiro desse Equipamento, nunca tendo tido possibilidade de o utilizar depois de efectuada a cessão de quotas.
51- Também esta situação, imputável aos requeridos, contribuiu para a quebra de produção da Labo 2 e atrasos consecutivos na entrega de encomendas aos clientes.
52- Aos requeridos não são conhecidos outros rendimentos que não sejam os do seu trabalho.
53- Na data da escritura da cessão de quotas dos requeridos para a P, ora requerente, do estabelecido preço global de € 2.485.000,00 (dois milhões quatrocentos e oitenta e cinco mil euros), pagou esta aos requeridos o valor de € 595.000,00 (quinhentos e noventa e cinco mil euros).
54- O remanescente do preço deveria ser pago em 4 prestações anuais, respectivamente nos seguintes montantes e a vencerem-se nas seguintes datas:
€ 570.000,00 (quinhentos e setenta mil euros), no dia 22 de Junho de 2006;
€ 570.000,00 (quinhentos e setenta mil euros), no dia 22 de Junho de 2007; € 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil euros), no dia 22 de Junho de 2008 € 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil euros), no dia 22 de Junho de 2009.
55 - Para garantir o pagamento do remanescente do preço estipulado para a cessão de quotas, a ora requerente entregou uma garantia bancária à primeira solicitação, emitida pelo Banco, na Oficina de Madrid (de ora em diante "Banco" ou "banco emissor") a beneficiar os ora requeridos.
56- Por via dessa garantia, a ora requerente garantiu aos requeridos o pagamento de um máximo de € 1.890.000,00 (um milhão oitocentos e noventa mil euros).
57- Os requeridos assumiram, ainda, perante a requerente, a obrigação de darem quitação de cada pagamento, de modo a que fosse possível à ora requerente, junto do Banco emissor da Garantia Bancária à primeira solicitação, entregue para garantir o pagamento do preço pela requerente, ir reduzindo o montante garantido.
58- Até hoje os requeridos nunca emitiram qualquer quitação das quantias recebidas.
59- Apesar de a ora requerente ter efectuado aos requeridos o pagamento da prestação vencida em 22 de Junho de 2006, no montante de € 570.000,00 (quinhentos e setenta mil euros).
60- A requerente adquiriu as quotas de uma sociedade em pleno crescimento, com uma boa carteira de clientes, com um excelente quadro de profissionais e, por acção dos requeridos, o que detém é uma sociedade comercial que luta apenas para não encerrar as suas portas, numa situação financeira debilitada.
*
O procedimento cautelar foi julgado procedente, sendo ordenado aos requeridos que se abstivessem de apresentar ao Banco, SA., qualquer solicitação de accionamento e de entrega dos montantes assegurados pela garantia bancária a primeira solicitação (on first demand) entregue pela requerente P, bem como a sua transmissão a terceiros.
Os requeridos deduziram oposição à providência decretada, pedindo o respectivo levantamento.
Alegam para tanto, e em síntese, a falta de veracidade dos factos alegados pela requerente, pelo que pretendem produzir prova sobre eles, em ordem a afastar os fundamentos da providência decretada, que entendem não se encontrarem verificados.
Inquiridas as testemunhas, foram considerados indiciariamente provados os seguintes factos:
1- Nas negociações que precederam o contrato de cessão de quotas, foi acordada a realização, e realizada, uma auditoria legal, contabilística e financeira à Labo 2.
2- Os requeridos J e A estiveram nas instalações da Labo 2, no fim de Agosto/início de Setembro de 2005, a concluir dossiers pendentes e remover ou eliminar o arquivo das sociedades Labo 2 Ldª, e G, Ldª, que lá se encontravam, após o que entregaram as chaves do gabinete na recepção.
3- Para além dos 10 trabalhadores referidos no n° 27 da decisão proferida, pelo menos outros treze trabalhadores cessaram a sua relação laboral na LABO 2.
4- Assim aconteceu com:
- (...)
5- Dos trabalhadores acima referidos, (…) não trabalham na L 2 SPIRIT.
6- O Sr. J não era o responsável pela área de orçamentação.
7- Cabia ao Sr. A o exercício dessa função.
8- A requerente adoptou medidas que prejudicam a manutenção dos clientes, como seja a mudança de instalações da Labo 2, a ruptura de matérias primas, o não desenvolvimento de uma política de marketing.
9- O requerido J havia sido contactado por vários funcionários da Labo 2, a dar-lhe nota sobre a mudança de instalações, equipamentos e arquivos na sociedade, tarefas que iriam ser executadas pelo Eng.B.
10- Com a nova gerência, os trabalhadores passaram a ter a necessidade de fazer o transporte de placas com 3m x 2m à chuva, bem como não dispunham de ar condicionado em ambientes de trabalho com elevadas temperaturas, o que lhes causou desagrado.
11- A circunstância de uma dada empresa ser a escolhida para executar um trabalho não lhe dá qualquer garantia de que executará os trabalhos futuros desse cliente.
12- O BES e a Vodafone eram clientes da sociedade Palexpo, a qual solicitava a realização de trabalhos de impressão digital à Labo 2.
13- Em 2004, as vendas da Labo 2 perfizeram o valor de € 3.309.313, e em 2005 perfizeram o valor de € 3.315.503.
14- Em declarações públicas proferidas em Dezembro de 2005, o responsável pela LABO 2 afirmava que a aquisição desta empresa havia sido uma boa aposta.
15- A L2 SPIRIT foi constituída em Março de 2006 e iniciou a sua actividade em Outubro desse ano.
16- O requerido J foi contactado telefonicamente em finais do mês de Março pelo Sr. C e aceitou ser administrador/ responsável pelo planeamento estratégico dessa sociedade.
17- A designação L2 Spirit não foi escolhida pelo requerido J.
18- Esse nome foi escolhido depois de outros terem sido recusados pelo registo nacional de pessoas colectivas.
19- A L2 SPIRIT seleccionou o seu pessoal através de anúncio publicado em jornal, análise posterior de currículos enviados e subsequente entrevista.
20- Responderam cerca de 200 candidatos.
21- Os requeridos J e A enviaram ao B cartas datadas de 25 e 26 de Junho de 2007, nos termos que constam dos documentos de fls. 812/813.
22- A requerente enviou, aos requeridos, uma carta datada de 10 de Julho de 2007, com o teor do documento junto a fls. 815.
23- O requerido J solicitou a rectificação das suas declarações publicadas na notícia da revista "M", nos termos que constam do documento de fls. 750/752.
24- Nos autos principais, os requeridos deduziram pedido reconvencional com fundamento no incumprimento do contrato ajuizado, por parte da requerente.
As oposições foram julgadas improcedentes.
Inconformados agravaram os 1º e 2º requeridos, apresentando alegações com as seguintes conclusões:
«1. Na Sentença de fls., o Tribunal a quo considerou que o meio processual escolhido pelos Recorrentes - a oposição à providência decretada – não foi o meio correcto e adequado para apreciar se, em face do circunstancialismo apurado, a providência deveria ter sido deferida.
2. Pelo que, concluiu o Tribunal a quo, não cabe a pronúncia sobre "a confundibilidade, ou não, dos nomes das sociedades, sobre a existência, ou inexistência, da invocada obrigação de não concorrência, sobre o facto de, na decisão proferida haver sido imputada a todos os Recorrentes a mesma conduta, sem distinção, ou sobre a inexistência do requisito lesão grave e de difícil reparação, pois que tal constituiria fundamento de recurso" (cfr. fls.)
3. A dedução de oposição, nos termos do artigo 388.° do Código de Processo Civil é o meio processual adequado para se trazerem aos autos novos factos e/ou produzir meios de prova não tidos em consideração pelo tribunal, com vista a afastar os fundamentos da providência.
4. Os Recorrentes, na Oposição que deduziram a fls. 567, por um lado, alegaram novos factos e, por outro, requereram a produção de prova não tida em conta pelo Tribunal a quo quando decidiu a providência sem a sua audição prévia.
5. Entendeu o Tribunal a quo que não é possível apresentar novos meios de prova sobre os factos alegados pela Requerente (ora Recorrida), devendo os Recorrentes (e Recorrentes) bastar-se com o recurso e, nessa medida, com a prova carreada para os autos pela Recorrida, sem que esta tenha passado sequer pelo crivo do contraditório.
6. Este entendimento viola o preceituado no artigo 388.° do Código de Processo Civil, enfermando a Sentença de que se recorre da nulidade prevista no artigo 668.°, n.°1, alínea d), do mesmo Código, porquanto deixou o Tribunal a quo de se pronunciar sobre questões que deveria ter apreciado.
7. Os Recorrentes alegaram factos essenciais para a descoberta da verdade, sobre os quais foi produzida prova que determina o levantamento da presente providência.
Assim, ficou provado que:
(…)
21. Por erro de julgamento, o Tribunal a quo não considerou provados estes factos, dos quais resulta que a presente providência deverá ser levantada.
22. Os Recorrentes são beneficiários de uma garantia bancária à primeira solicitação que têm o direito de executar.
23. Os Recorrentes não actuaram com manifesto abuso de direito ou fraude, únicos fundamentos que poderiam ser invocados para paralisar o seu direito à referida execução.
24. Os Recorrentes reconheceram já perante a Recorrida ter recebido as quantias respeitantes à primeira e segunda prestações do preço devido pela cessão de quotas, dando quitação na Oposição que apresentaram.
25. Pelo que inexiste o fundado receio de que os Recorrentes possam executar a garantia dos autos pelo seu valor integral.
26. Ainda antes de terem citados da providência sub judice, os Recorrentes pretenderam executar a garantia e fizeram-no apenas pelo valor parcialmente em dívida.
27. Os Recorrentes não assumiram, nem estão vinculados a nenhuma obrigação de não concorrência.
28. Os Recorrentes não constituíram uma sociedade concorrente da Recorrida.
29. Apenas o Recorrente J trabalha para a L2 SPIRIT.
30. A Sentença a quo violou o preceituado nos artigos 381º, 387° e 388° do Código de Processo Civil, devendo ser, por isso, revogada e substituída por acórdão que determine o levantamento da presente providência»
Também o 3º requerido agravou, apresentando as seguintes conclusões:
«1. A douta sentença recorrida não procedeu a uma correcta avaliação dos factos indiciariamente dados como provados, nem a uma aplicação das normas de direito processual consentânea com a presente providência cautelar.
2. Com efeito, não se verifica qualquer violação do disposto no artigo 388.° do C.P.C., uma vez que o meio processual adequado para o efeito pretendido pelo ora agravante era a oposição à providência e não o recurso da decisão preliminar proferida no âmbito da mesma.
3. Nos termos do artigo 388.° do Código de Processo Civil, o recorrente num procedimento cautelar pode: (...) (ii deduzir oposição "quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução".
4. Ou seja, de acordo com a Lei, a dedução de oposição é o meio processual adequado para trazer aos autos novos factos e/ou para produzir meios de prova não tidos em consideração pelo tribunal, com vista a afastar os fundamentos da providência.
5. Sucede que ora agravante veio efectivamente invocar novos factos, como ficou patente e demonstrado não só no texto da oposição por si apresentado mas também nas sessões de julgamento que tiveram lugar no Tribunal de Cascais.
6. Tais factos foram, no entender do ora recorrente, não só comprovados pela prova produzida como são de molde a contradizer em absoluto as teses defendidas pela recorrida, e que a levaram a requerer a presente providência cautelar.
7. É o que resulta de forma clara do depoimento das testemunhas inquiridas em juízo, conforme o demonstra o conteúdo dos respectivos depoimentos.»
Contra-alegou a agravada, com as conclusões seguintes:
I- Os Recorrentes interpuseram recurso da douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual manteve a providência cautelar conservatória que impede aqueles de accionarem a garantia bancária concedida pela Recorrida para garantir o pagamento do preço de aquisição da Labo 2, porquanto esta suspendeu licitamente o pagamento do preço de aquisição do capital social da Labo 2, ao abrigo da excepção de não cumprimento (i.e., incumprimento dos Recorridos);
II- No presente procedimento cautelar está unicamente em causa acautelar a imputação de uma lesão irreparável à Recorrida por força do exercício da garantia bancária pelos Recorrentes. Paralelamente, o (in)cumprimento contratual das partes encontra-se a ser discutido em sede de acção principal;
III- Os Recorrentes baseiam todas as suas alegações de recurso no facto de o Tribunal a quo ter considerado que a oposição por aqueles apresentada, nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 388.° do Código de Processo Civil, não foi o meio correcto e adequado para apreciar se a providência cautelar em causa deveria, ou não, ter sido decretada;
IV- Os argumentos dos Recorrentes são fortemente questionáveis, porquanto - inocentemente ou não - distorcem o entendimento vertido na Decisão recorrida, na medida em que referem que não lhes foi `possível apresentar novos meios de prova sobre os factos alegados";
V- Porém, tal quadro não corresponde à realidade, tendo o Tribunal a quo apreciado a toda a prova, maxime testemunhal, carreada para os autos pelos Recorrentes (vide Sentença, a fls. 979 e ss., "(...) do circunstancialismo fáctico agora apurado, entende-se não haverem resultado afastados os fundamentos da providência, que os Recorrentes visaram afastar com as suas oposições" - realçado nosso);
VI- Com efeito, o que o Tribunal a quo entende, e bem, é que, como se veio a apurar no caso concreto, não existem novos factos que pudessem justificar a substituição da providência decretada ab initio, logo o meio processual adequado a accionar pelos Recorrentes teria sido o recurso previsto na alínea a) do n.° 1 do artigo 388.° do Código de Processo Civil;
VII- Isto porquanto, para se lançar mão do expediente previsto na alínea b) do n.° 1 do artigo 388.° do Código de Processo Civil são necessários dois requisitos cumulativos: (i) alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal quando decretou a providência cautelar antes do contraditório; e (ii) que estes factos efectivamente afastem os fundamentos que suportaram a decisão de decretar a providência;
VIII- Ora, na oposição apresentada pelos Recorrentes, ora Recorridos, o segundo pressuposto ora referido não se encontra minimamente preenchido, dado que os factos novos alegados ou não se mostram relevantes em sede cautelar ou não foram dados como provados;
IX- Neste contexto, é relevante não olvidar que o presente processo diz respeito a um procedimento cautelar, pelo que a decisão nele tomada tem um carácter sumário, não se podendo exigir uma apreciação e fundamentação da matéria de facto tão exaustiva como no âmbito de uma acção principal, como erroneamente pretendem os Recorrentes;
X- Assim, não tendo sido alterado o circunstancialismo fáctico inicial relevante à luz do qual o Tribunal a quo decretou a providência cautelar, não haveria motivo - nem faria sentido - para que este mesmo Tribunal repetisse a apreciação de questões anteriormente apreciadas e que integram a Decisão recorrida à luz do disposto no n.° 2 do artigo 388.° do Código de Processo Civil (aliás, neste sentido aponta a Jurisprudência e Doutrina invocada no corpo das presentes contra-alegações), pelo que não faz sentido obrigar o Tribunal a quo a repetir toda a fundamentação que já expôs no início do procedimento;
XI- Caso o entendimento dos Recorrentes acerca da violação do artigo 388.°, n.° 1, alínea b), do Código de Processo de Civil, seja acolhido, permitir-se-á uma subversão do regime estabelecido neste normativo legal;
XII- Perante tudo o que foi exposto supra quanto à prova oferecida pelos Recorrentes, aqui Recorrentes, e apreciada pelo Tribunal a quo, por maioria da razão, não se compreende que os Recorrentes aleguem que a decisão do Tribunal a quo foi tomada sem qualquer espécie de contraditório ou que este não se tenha pronunciado sobre as questões relevantes para efeitos cautelares;
XIII- De resto, os argumentos dos Recorrentes improcedem na medida em que estes, na fase de oposição apresentaram nos autos os respectivos articulados, juntaram 42 documentos e arrolaram 14 testemunhas, tendo todas elas sido inquiridas, prova esta que foi apreciada, não só na Sentença recorrida a fls. 979 e ss., mas também no Despacho de fls. 973 e ss., nos termos do artigo 396.° do Código Civil e 655.° do Código de Processo Civil, i.e., de acordo com a livre convicção do Tribunal;
XIV- No que toca ao recurso sobre a decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, os Recorrentes sustentam as suas alegações, quase exclusivamente, na prova testemunhal produzida em sede de oposição e esporadicamente nalguns documentos, já impugnados pela Requerente em sede própria;
XV- Assim, para efeitos da apreciação deste recurso, é necessário ter em atenção a importância do princípio da imediação, o qual resulta dos artigos 652.°, n.° 3, alínea d), 654.° e do carácter excepcional do 654.°, todos do Código de Processo Civil;
XVI- Neste contexto, cumpre atentar que o que está em causa no presente recurso, não é a simples reavaliação da prova produzida e prolação de decisão com base na convicção então formada pelo Tribunal a quo, como se de primeira "decisão" se tratasse. Está, sim, em causa a alteração de uma "decisão anterior", a qual foi fundada na livre convicção de quem a proferiu, o que aconteceu com a clara vantagem de ter acompanhado e dirigido a produção de prova, numa relação de imediação que a gravação sonora ou reprodução escrita não consente;
XVII- Pelo que, uma eventual alteração só deverá ocorrer se houver elementos que a imponham muito claramente, não bastando que a apreciação da prova disponível sugira respostas diferentes, ao contrário do que os Recorrentes pretendem fazer crer nas suas alegações;
XVIII- Ora, in casu, é manifesto que o processo não contém elementos que imponham decisão diversa da que foi tomada pelo Tribunal a quo, uma vez que a mesma se mostra insusceptível de ser destruída pelas provas oferecidas erra Primeira Instância, e os Recorrentes não apresentaram qualquer documento novo superveniente;
XIX- Assim, é imperativo concluir que a Sentença recorrida é insusceptível de censura, porquanto cuidou ter em atenção somente os factos estritamente relevantes para a boa decisão do procedimento cautelar;
XX- Aliás, é de todo injustificável que o Tribunal deixe arrastar o andamento do processo e proceda a averiguações demasiado pormenorizadas e complexas susceptíveis de retirar à providência requerida qualquer efeito útil;
XXI- Daí que, na Decisão de fls. 973 e ss., o Tribunal a quo refira que "Os restantes factos não mencionados, ou resultaram não provados, ou tratam-se de juízos de valor e conclusivos, e matéria de direito, ou não interessam à decisão da causa";
XXII- Neste sentido, a matéria referida nos pontos 8, 9, 10 - 2ª parte, 14, 16, 17, 18 2ª e 3ª parte, 19 e 20 das conclusões dos Recorrentes A e J é irrelevante para efeitos da actividade a levar a cabo pelo Tribunal em sede do procedimento cautelar, uma vez que ela não contribui minimamente para a verificação de nenhum dos pressupostos exigíveis para o decretamento da providência cautelar, i.e. o periculum in mora e o fumus boni iuris, não devendo integrar a actividade de sumaria cognitio;
XXIII- Ainda assim, quanto a toda a matéria de facto em causa, os depoimentos invocados - recordando-se aqui a relevância do princípio da imediação - mostram-se parciais, inverosímeis ou descontextualizados (vide as respectivas transcrições supra), v.g.:
(…)
XXIX- Com efeito, in casu, verifica-se o periculum in mora para o direito da Recorrida, o qual reside no facto de os Recorrentes pretenderem - como já demonstrado pelo Doc. 41 junto à oposição apresentada pelos Recorrentes J e A - accionar a garantia bancária, lesando, de forma dificilmente reversível, o património da Recorrida;
XXX- Encontra-se igualmente demonstrada a aparência do direito da Recorrida, na medida em que os Recorrentes expurgaram a Labo 2 das qualidades específicas consagradas no contrato de compra e venda de quotas, após a celebração do mesmo, o que legitimou o recurso à excepção de não cumprimento, por parte da Recorrida (estando preenchido o fumus boni iuris);
XXXI- Acresce que a providência cautelar decretada pelo Tribunal a quo não é desproporcional, porquanto a providência cautelar requerida apenas impede os Recorrentes de alterarem o quadro actual, prevenindo que estes accionem uma garantia bancária, i.e. trata-se de protelar uma situação actual cuja manutenção não lhes imputa um maior prejuízo do que o prejuízo que será imposto à Recorrida, caso a providência cautelar decretada pelo Tribunal a quo seja revogada;
XXXII- Ao contrário do que os Recorrentes afirmam, a providência cautelar não foi decretada com base na falta de quitação de qualquer pagamento, mas sim “por existir tal garantia, que podem accionar a qualquer momento, sobretudo se vencer a próxima prestação, os recorrentes podem lesar ainda mais o direito da requerente, existindo, por conseguinte o periculum in mora" (realçado nosso) (vide Decisão de fls. 396 e ss. em tudo reiterada pela Sentença de fls. 979 e ss.);
XXXIII- Outro dos argumentos mobilizados pelos Recorrentes consiste no facto de que "Os Recorrentes não assumiram nenhuma obrigação de não concorrência (...)";
XXXIV- Com efeito, os Recorrentes ignoram que a compra e venda de empresas se concretiza, fundamentalmente, de duas formas: ou através da aquisição directa do estabelecimento ou através da aquisição das participações sociais da sociedade que explora o estabelecimento;
XXXV- No caso concreto, impõe-se averiguar se a aquisição da totalidade das participações sociais é equiparável à aquisição da própria empresa e, em caso afirmativo, se deve ser aplicado o regime da responsabilidade por vícios e o regime do trespasse no aspecto da obrigação de não concorrência explícita;
XXXVI- De acordo com a Doutrina e a Jurisprudência, tem-se vindo a entender que, quando são alienadas todas as participações sociais – como no caso concreto –, juridicamente, estamos perante a venda de uma empresa, na medida em que há uma transmissão indirecta da empresa - podendo mesmo falar-se de transferência de propriedade indirecta ou mediata sobre o estabelecimento (neste sentido, inter alia, HENRIQUE MESQUITA, CALVÃO DA SILVA, COUTINHO DE ABREU, obs. cit. supra);
XXXVII- Pelo que, "Se o vendedor de uma empresa viola a obrigação implícita de não concorrência - v.g. abrindo um estabelecimento com objecto idêntico, ou entrando em sociedade com similar objecto (...), pode o comprador exercer os direitos previstos nas normas relativas ao não cumprimento das obrigações" (COUTINHO DE ABREU, ob. cit. );
XXXVIII- De resto, a Jurisprudência invocada pelos Recorrentes, por paradoxal que este facto se revele, é contrária à pretensão dos mesmos, uma vez que, no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 23 de Setembro de 2003, está em causa a venda de uma quota minoritária, razão pela qual foi entendido, nesse caso concreto, não existir obrigação de não concorrência, tendo sido, contudo, admitido, nesse mesmo acórdão, que no caso de alienação da totalidade do capital social recai sobre os vendedores a obrigação de não concorrência (vide transcrições supra);
XXXIX- Por fim, note-se que, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15 de Outubro de 2004, invocado pelos Recorrentes para sustentar a inexistência de periculum in mora - já que esse requisito não foi preenchido no caso sob apreciação nesse acórdão -, o desfecho da decisão aí vertida não é aplicável ao caso sub iudice, porquanto a providência aí requerida era impeditiva/modificativa e consistia na pretensão de que os vendedores parassem de exercer concorrência com a actividade da empresa alienada. Ora, tendo essa concorrência sido já consumada, não haveria razão para decretar a providência cautelar, uma vez que a lesão que se pretendia aí evitar já tinha ocorrido;
XL- Todavia, no presente procedimento cautelar não se pretende que os Recorridos parem de exercer concorrência para com a Labo 2, tendo-se somente recorrente uma providência cautelar conservatória para aqueles não accionarem uma garantia bancária. Assim, não tendo esta garantia bancária sido accionada até à presente data, ainda não se consumou qualquer lesão na esfera jurídica da Recorrida, podendo o seu direito ser ainda acautelado pela manutenção da providência cautelar decretada pelo Tribunal a quo.
XLI- Pelo exposto, conclui-se, necessariamente, pela absoluta improcedência dos Recursos apresentados pelos Recorrentes, mantendo-se a douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo.
Nestes termos, e nos demais de direito, devem os precedentes recursos serem julgados improcedentes, e, consequentemente, mantida a douta Sentença recorrida, e os Recorrentes impedidos de accionarem junto do Banco Espírito Santo a garantia bancária.»
2. Do mérito do recurso
O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 3, CPC), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660º, nº 2, in fine), consubstancia-se nas seguintes questões:
- reapreciação da matéria de facto;
- nulidade da sentença que apreciou a oposição por violação do artigo 388, CPC;
- levantamento da providência com base nos novos factos que consideram provados;
- inexistência de fundado receio de que os recorrentes possam accionar a garantia pelo seu valor integral;
- inexistência de obrigação de não concorrência;
2.1. Da impugnação da matéria de facto
Tendo a prova sido objecto de gravação, e os recorrentes dado cumprimento aos ónus previstos no artigo 690º A CPC, cumpre conhecer da impugnação da matéria de facto (cfr. artigo 712º, nº 1, alínea a), CPC).
Os articulados apresentados são de extensão considerável: 236º artigos na petição inicial, 427º na oposição dos 1º e 2ª recorrentes, e 128º na oposição do 3º recorrente, num total de 791 artigos.
Nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea b), CPC, a oposição destina-se a permitir ao recorrente alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal, e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 386º e 387º.
Nessa conformidade, só interessa reapreciar a prova relativamente a factos que sejam relevantes para o destino da oposição, isto é, que sejam susceptíveis de afastar os fundamentos da providência.
Refira-se ainda que o contraditório subsequente a uma decisão apresenta sempre limitações na parte reportada aos factos indiciariamente provados, desde logo pela impossibilidade de instâncias às testemunhas cujo depoimento fundou a decisão.
Por outro lado, a problemática da imediação, presente na reapreciação de qualquer decisão, assume ainda maior relevo por não estar em causa neste recurso a reapreciação dos depoimentos que estiveram na base do decretamento da providência.
É neste contexto que a prova deverá ser reapreciada.
2.2. Das oposições
a) Artigos 56º e 57º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Tendo o tribunal considerado provado que, nas negociações que precederam o contrato de cessão de quotas, foi acordada a realização, e realizada, uma auditoria legal, contabilística e financeira à Labo 2, entendem os 1º e 2ª recorrentes que se devem considerar provados os factos constantes dos artigos 56º e 57º respectiva oposição:
- que os auditores requereram a presença do ROC e do TOC da Labo 2 inúmeras vezes;
- que o departamento de contabilidade da Labo 2 disponibilizou duas pessoas em permanência para apoio aos auditores que passaram em revista todos os aspectos relevantes da sociedade.
Estes factos em nada relevam para a apreciação do procedimento cautelar por as auditorias não estarem em causa, já que se inserem no processo de negociação da empresa, enquanto que no presente procedimento cautelar se discute a actuação dos recorrentes após a realização da cessão de quotas.
Recorde-se que a recorrida alega que, por acção dos recorrentes, a sociedade que adquiriu – a Labo 2 – perdeu parte importante do seu know how, da sua capacidade produtiva, e parte substancial dos seus clientes, nomeadamente os mais importantes que asseguravam as maiores receitas, para uma nova empresa criada, entre outros, por J, ou, pelo menos, onde este ocupa um dos cargos de administrador (cfr. artigo 82º do requerimento inicial). E pretende que os recorrentes sejam intimados a abster-se de accionar a garantia bancária por pretender invocar a excepção do não cumprimento relativamente a estes.
Ora, a recorrida não alega que os dados resultantes das auditorias realizadas fossem falsos, distorcidos ou parcelares, mas sim que os recorrentes «esvaziaram» a sociedade adquirida dos seus elementos mais importantes.
Daí a absoluta irrelevância de tais factos.
Por outro lado, a circunstância de as testemunhas terem referido que os auditores tiveram acesso a todos os elementos que pretenderam e tiraram as fotocópias que entenderam (e que desconhecemos quais tenham sido) não descaracteriza a alegada destruição de documentos da Labo 2: o facto de a requerida ter tido pleno conhecimento dos documentos e terem sido extraídas cópias de vários documentos a pedido dos auditores (e certamente não seria cópia integral de toda a documentação) não legitima a sua destruição.
Os factos alegados são, pois, irrelevantes para a oposição.
b) Artigos 170º e 171º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Os 1º e 2ª recorrentes pretendem infirmar os factos provados sob os nºs 3 e 4 da sentença que decretou a providência com base nos considerandos II e III e cláusula 2.2 do contrato-promessa de cessão de quotas.
O teor dos factos provados objecto de impugnação é o seguinte:
3 - Os elementos fundamentais para a concretização do negócio entre requerente e recorrentes, nomeadamente para estipulação do preço, foram a clientela, o Know-how, a maquinaria e a capacidade de manutenção e de concorrer no mercado demonstrados pela LABO 2.
4 - Um outro elemento fundamental, considerado por requerente e recorrentes para a estipulação do preço, foi o facto de a Labo 2 não ser proprietária das instalações onde desenvolve a sua actividade.
O considerando II do contrato-promessa de cessão de quotas refere que a sociedade dedica-se ao comércio de artigos e serviços de imagem digital, edição electrónica e artes gráficas, e o considerando III que a P (recorrida), directa ou indirectamente dedica-se a igual actividade em Espanha e Portugal, pretendendo expandir a sua actividade neste último país.
Por outro lado, a cláusula 2.2 estipula que o preço foi determinado tendo em conta uma valorização da sociedade efectuada com base na situação financeira da mesma, tal como reflectida nas suas contas de 31 de Dezembro de 2004, que se juntam como Anexo III. Tendo sido realizada uma auditoria fiscal, contabilística e legal à sociedade, levada a cabo pela D e pela G, doravante referida como «Auditoria», na qual foram já identificadas as contingências que se encontram descritas no Anexo III do presente contrato, as partes expressamente acordam que essas contingências, assim como as demais que possam resultar do relatório final das referidas D e G, serão da responsabilidade e da conta dos promitentes-vendedores, devendo o preço ser reduzido do valor das mesmas (quando estas se concretizem) que será restituído pelos promitentes vendedores à P.
Estes factos que os 1º e 2ª recorrentes pretendem ver provados, e que se prendem com a base de cálculo do preço, são irrelevantes em sede cautelar, pelas razões já enunciadas na alínea a) supra relativamente ao objecto do procedimento cautelar: não está em causa o preço pago pela recorrida, mas a actuação posterior dos recorrentes n sentido de «esvaziamento» da sociedade dos seus elementos mais importantes, legitimadora da invocação da excepção do não cumprimento pela recorrida.
c) Artigo 184º e parte final do artigo 255º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Dizem os recorrentes que, ao contrário do facto nº 11 considerado provado na sentença que decretou a providência, não foram contratados como «consultores», mas como consultores efectivos. E que deve ser considerado provado que o recorrente J previu ficar a trabalhar na área do negócio da impressão por um período de dois anos.
A aposição de aspas na expressão consultores não assume qualquer relevo. Tratou-se apenas de significar que não era essa a designação que constava do contrato de trabalho a termo, mas sim «assessores da administração» e «assessora da direcção financeira».
Relativamente ao artigo 255º, não se percebe qual o alcance da referência à parte final, já que o artigo em causa contém uma única ideia: o recorrente previra e organizara a sua vida para que, após a venda da Labo 2, ficasse a trabalhar naquela área de actividade por um período de dois anos.
Para que se perceba o alcance desta afirmação, há que inseri-la no devido contexto: que o recorrente J apenas aceitara o convite do Sr. C para integrar a administração da L2 Spirit três meses depois de cessado o vínculo com a Labo 2, e que tinha previsto e organizado a sua vida para que, após a venda da Labo 2, ficasse a trabalhar naquela área de actividade por mais dois anos, projecto de que teria sido espoliado pela recorrida sem qualquer fundamento [cessação do contrato de trabalho pelo prazo de seis meses por caducidade] (artigos 221º a 227º da respectiva oposição).
Relativamente a este facto, o que as testemunhas referidas pelos recorrentes disseram foi que os 1º e 2ª recorrentes iriam permanecer na Labo 2 por mais dois anos, por forma a acompanhar a transição, e que o 1º recorrente pretendia abandonar a actividade da impressão digital quando atingisse os 50 anos.
Daqui não resulta, porém, que fizesse parte do «projecto de vida» do 1º recorrente manter-se durante dois anos no ramo da impressão digital, e que a sua vida estivesse estruturada em função desse objectivo, por forma a que a sua entrada na L2 Spirit fosse a concretização desse projecto após a cessação do seu vínculo laboral com a Labo 2.
Do depoimento de J, que pertence à empresa Tradinvest, que mediou a negociação da Labo 2, resultou que o 1º recorrente não se mostrou muito disponível para se manter no negócio, embora estivesse disposto a garantir a continuidade, durante um período razoável, e que a P (a recorrida) manifestou interesse em que eles se mantivessem na empresa por um período de dois anos.
Aliás, a ideia que o interesse da manutenção dos 1º e 2ª recorrentes na Labo 2 era principalmente da recorrida perpassa em vários documentos trocados durante a fase das negociações, designadamente num e-mail datado de 05.02.03, que o 1º recorrente dirigiu a José, junto a fls. 643, de cujo ponto 3 consta: «Conforme pedido da P, gostaríamos de ver garantidos aos dois actuais gerentes um período de trabalho até Março de 2007 (…)».
Podia ler-se na parte inicial deste e-mail que «como é do conhecimento global tratar-se-á de uma compra dos activos assim como dum compromisso dos actuais quadros dirigentes da L2DP, em dar o seu melhor contributo ao longo de pelo menos dois anos para que a integração / fusão se processe sem sobressaltos , quer para fornecedores, clientes, funcionários e proprietários presentes e futuros».
Recorde-se ainda que nos artigos 10º e 11º da respectiva oposição é alegado que, em 2003, os 1º e 2ª recorrentes decidiram vender as suas participações sociais na Labo 2 por o 1º recorrente ter decidido criar condições para levar a curto/médio prazo projectos pessoais incompatíveis com a gerência da Labo 2. E no artigo 21º e 22º da mesma peça consta que o 1º recorrente explicou à recorrida as razões que o levavam a vender a sua participação social relacionadas com a intenção de, até 2007, estar completamente afastado da actividade da Labo 2, ou, pelo menos, não se manter ligado a esta com carácter permanente e obrigatório, embora admitisse desempenhar até 2008 a função de consultor da Labo 2.
Pelo exposto, não se considera provado o artigo 255º da oposição em apreço.
d) Artigos 190º e 191º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e artigos 16º e 17º da oposição do 3º recorrente
Entendem os recorrentes que do documento nº 9 não resulta provado o facto nº 13 da sentença que decretou a providência, ou seja, que nesse e-mail, o recorrente J instava Bruno a "concertar posições estratégicas" com ele ou com o também recorrente C, identificado nesse e-mail por "CB", posições estratégicas que seriam tomadas à revelia da recorrida.
Este facto assentaria numa leitura truncada do documento, e que a leitura integral do mesmo permitiria concluir pela preocupação do 1º recorrente com a adopção de medidas que contrariavam o anteriormente acordado com a requerida, já que o e- -mail fora escrito pelo 1º recorrente na qualidade de consultor.
É o seguinte o e-mail do teor em causa:
«B…
A forma como certas coisas estão a decorrer configuram muita preocupação em alguns colegas. A fórmula que combinámos durante as negociações foi de que nós seriamos uma PONTE e ao mesmo tempo de ADVISE.
Na nossa ausência existe uma pressa em alterar tudo e demasiado depressa, o que configura uma mudança de planos, cujo objectivo ainda não entendemos.
Aparentemente está a ser feita uma estratégia completamente ao revés e julgo que não conduzirá a bons resultados, quer para o nosso espírito de grupo, nem para os resultados que a P precisa.
Pedia-lhe assim que não ajudasse em demasia a apressar uma mudança que no nosso entender não está suficientemente estudada e preparada, que não deve ocorrer na nossa ausência.
Peço-lhe ainda que me mantenha informado em detalhe das operações em marcha — as pessoas, têm a sua vida e eu não aprovarei mudanças de local de trabalho enquanto a sua eficácia não fôr justificada e enquanto não se derem às pessoas pelo menos 15 dias para se prepararem. Esta "pressa" inicial, não estudada em profundidade, sem atender às consequências para a Labo 2 em nome duma qualquer resolução dos problemas da Imprime constituem no meu entender um erro estratégico porque a Labo 2 não pode ser um penso na hemorragia da Imprime.
A forma atabalhoada como se está a querer progredir sem olhar ao conjunto, configura no meu entender um amadorismo não aceitável no projecto P — eu quero para este projecto um elevado nível de eficácia e profissionalismo, sem o qual não será possível qualquer comprometimento da minha parte.
Tente concertar posições estratégicas quer com o C, quer comigo — juntos poderemos ajudar a construir um projecto bonito. Isoladamente a nossa força diminuirá e os resultados serão maus para todos.
Um abraço»
O discurso patente neste e-mail não é o de um mero consultor, mas sim de uma pessoa que pretende mudar o rumo dos acontecimentos, chegando mesmo a pedir que não ajudasse em demasia a apressar uma mudança que em seu entender não conduziria a bons resultados.
O concertar de posições que o 1º recorrente propõe ao Engº B destina-se a contrariar a estratégia que estava a ser seguida pela P, o que decididamente não se coaduna com as funções de consultor.
O depoimento da testemunha M é irrelevante para o efeito pretendido pelos recorrentes. A alegada circunstância de o Engº B poder discordar da forma como se processou a mudança das instalações em nada legitima a actuação do 1º recorrente.
O e-mail de fls. 660 (e-mail da 2ª recorrente em resposta a um e-mail da funcionária Maria e outros), junto como documento nº 13 com a oposição destes recorrentes, em nada auxilia a sua pretensão.
Em primeiro lugar, este e-mail constitui resposta a outro que não se encontra junto aos autos, desconhecendo-se, designadamente, quais os relatos geradores de apreensão.
Em segundo lugar, este e-mail é da autoria da 2ª recorrente quando o artigo 191º da oposição se reporta ao 1º recorrente.
Assim, improcede a pretensão dos 1º e 2ª recorrentes no sentido de ser considerado provado que o 1º recorrido não instou o Engº B a concertar posições estratégicas a tomar à revelia do recorrente (artigo 190º) e que este pretendia tão só levar a cabo a missão de que fora encarregue pelo presidente da recorrida, i.e., garantir o êxito do projecto (artigo 191º).
e) Artigos 82º, 192º e 193º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Propõem-se os 1º e 2ª recorrentes contrariar o facto nº 14 da decisão que decretou a providência com base nos depoimentos das testemunhas (…), e no e-mail de fls. 660 supra referida, da autoria da 2ª recorrida.
O teor do facto nº 14 é o seguinte:
Os requeridos J e C actuavam e influenciavam outros colaboradores da Labo 2 a actuar contra as instruções que recebessem da sua entidade patronal – a Labo 2 – e, consequentemente, da ora Requerente, detentora do respectivo capital social, para prosseguirem estratégias próprias.
O depoimento das testemunhas indicadas e o e-mail da 2ª recorrente não são suficientes para infirmar o facto nº 14, não legitimando a pretendida conclusão de que os 1º e 2ª recorrentes nunca actuaram contra os interesses da Labo 2, procurando boicotar a sua gerência, e que sempre reiteraram aos funcionários da Labo 2 que deveriam obedecer às instruções e ordens da nova gerência.
(…)
Os elementos probatórios apresentados não são suficientes para afastar o teor do facto nº 14.
f) Artigos 202º e 204º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Relativamente ao facto nº 2 (e não nº 3 como por lapso se refere) da sentença que decidiu a oposição, pretendem os 1º e 2ª recorrentes que se faça constar que os recorrentes apenas destruíram, os documentos da Labo 2, Ldª, e G, Ldª, assim dando por infirmados os factos constantes do e-mail do Engº B.
Invocam o depoimento da testemunhas (…) que referiram que apenas a documentação daquelas duas empresas tinha ficado nas instalações da Labo 2.
A circunstância de os documentos da documentos da Labo 2, Ldª, e G, Ldª, terem sido destruídos em fim de Agosto / início de Setembro, não invalida a destruição de documentos da Labo 2 Digital tenha ocorrido em momento anterior.
Não pode, pois, ser acolhida a pretensão dos recorrentes.
g) Artigos 206º e 208º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e artigos 41º e 42º da oposição do 3º recorrente
Entendem os recorrentes que o tribunal deve considerar não provado que não destruíram ficheiros informáticos, não se apoderaram de ficheiros informáticos com informações de clientes, nem criaram um acesso externo e paralelo à rede da sociedade, com a finalidade de infirmar os factos nºs 22, 23 e 23 (da matéria de facto constam dois factos com o nº 23).
Contrariamente ao alegado pelos 1º e 2ª recorrentes, não é correcto afirmar-se que o tribunal a quo não considerou provados os factos constantes do e-mail do Engº Bruno, mas apenas que desse e-mail constavam as denúncias.
Com efeito, ficou indiciariamente provado, através do facto nº 15 da sentença que decretou a providência, que o Engº B denunciou por e-mail perante o Dr. J diversas actuações dos requeridos levadas a cabo com o auxílio de outros colaboradores da Labo 2. E nos números seguintes são descritas as referidas actuações.
E tanto assim é que no facto nº 25 se considera indiciariamente provado que, na sequência de todos os factos referidos, foram instaurados procedimentos disciplinares que culminaram com a aplicação de vinte dias de suspensão a cada um.
Relativamente à pretensão dos 1º e 2ª recorrentes, os depoimentos das testemunhas (…) não se revelam idóneos para infirmar os factos nºs 22, 23 e 23.
A primeira depôs de forma vaga, «achando» que os 1º e 2ª recorrentes não se apoderaram das fichas de clientes, revelando desconhecer se destruíram ficheiros com informação de clientes, não vendo grande lógica na rede pirata. E afirmou que, devido às auditorias que foram feitas, a recorrida dispunha de cópia de toda a documentação, o que se afigura excessivo, porque uma auditoria, por norma, não fotocopia toda a documentação.
Quanto à testemunha A, a sua afirmação de que não era possível a criação de um acesso externo à rede da Labo 2 surgiu pouco circunstanciada, para além de não resultar que tivesse conhecimentos técnicos que lhe permitissem sustentar a afirmação.
E a circunstância um dos seus primeiros trabalhos para a nova gerência ter sido reunir a informação dos clientes não invalida, por si, que os 1º e 2ª recorrentes se tenham apoderado da informação de clientes.
Improcede, pois, a pretensão dos recorrentes nesta parte.
h) Artigos 94º, 126º a 131º e 211º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e artigo 45º da oposição do 3º recorrente
O facto nº 24 reporta-se ao incumprimento dos horários de trabalho e à irregularidade da presença dos 1º e 2ª recorrentes nas instalações da Labo 2.
O depoimento das testemunhas indicadas pelos recorrentes não permitem considerar indiciariamente provados os artigos em causa.
(…)
O facto nº 24 considerado indiciariamente provado não é descaracterizado pelo período em que os 1º e 2ª recorrentes estiveram suspensos no âmbito do procedimento disciplinar que lhes foi instaurado, pois um dos fundamentos foi precisamente o não cumprimento dos horários de trabalho.
Ou seja, o artigo 24º reporta-se necessariamente ao período anterior à suspensão dos 1º e 2ª recorrentes no âmbito do processo disciplinar que lhes foi instaurado.
Termos em que não se acolhe a pretensão dos recorrentes.
i) Artigos 220º, 236º, 237º, 242º, e 247º a 250º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e artigos 51º, 59º a 62º e 65º da oposição do 3º recorrente
Dizem os recorrentes que, sem prejuízo dos factos considerados provados nos pontos 3 a 5 da sentença que apreciou a oposição, e que infirmam o facto nº 31 da sentença que decretou a providência, deveria ter sido ainda considerado provado que trabalham na L2 Spirit antigos trabalhadores da Labo 2 que não saíram directamente de uma para outra: (…).
São invocados os depoimentos de V e A.
Sustentam também que deve ser infirmado o ponto 29 da sentença que decretou a providência por ter resultado provado que a saída dos trabalhadores da Labo 2 não resultou de aliciamento dos 1º e 2ª recorrentes, com base no depoimento de T e D.
(…)
Assim, não ficou claro que tivesse sido a actuação de J a motivar a saída dos trabalhadores, pois a afirmação foi feita de uma forma genérica, não se tendo apurado que foi esse comportamento que motivou a saída de cada um dos trabalhadores. j) Artigo 261º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Para os 1º e 2ª recorrentes que, para além do facto nº 7 da sentença que decidiu a oposição, deve a matéria do artigo 261º deve ser considerada provada conforme depoimento de A.
Tinha sido dado como indiciariamente provado que J, trabalhador da Labo 2 responsável pela área da orçamentação, de importância fundamental para a empresa, apesar de ser sócio fundador da L2 Spirit desde 24 de Março de 2006, apenas denunciou o contrato de trabalho em 17 de Maio de 2006, com efeitos a 16 de Julho de 2006 (facto nº 33).
Na sentença que apreciou a oposição, ficou indiciariamente apurado que J, trabalhador da Labo 2, não era responsável pela área da orçamentação (facto nº 6) que o responsável era A (facto nº 7).
Dizer que a elaboração de orçamentos estava a cargo de todos os vendedores e que o programa de contabilidade foi desenvolvido pelo 1º recorrente é absolutamente irrelevante: o que interessava e ficou indiciariamente assente no facto nº 6 é que J não era responsável pela área da orçamentação. l) Artigos 292º, 314º, 317º a 320º e 322º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e artigos 72º e 82º da oposição do 3º recorrente
Estes artigos reportam-se à problemática da perda de clientela da Labo 2 para a L2 Spirit, atento o facto nº 34 da sentença que decretou a providência, onde consta que grande parte dos clientes da Labo 2 deixaram de o ser, passando a ser clientes da L2.
Entendem os 1º e 2ª recorrentes que a diminuição da facturação é imputável à recorrida pela sua deficiente gestão da Labo 2, e que clientes da Labo 2 passaram a ser facturados pela Imprime, diminuindo a facturação da Labo 2.
Segundo os 1º e 2ª recorrentes, para além do facto provado nº 8 (que a requerida adoptou medidas que prejudicam a manutenção de clientes, como seja a mudança das instalações da Labo 2, a ruptura de matérias primas, o não desenvolvimento de uma política de marketing), da prova produzida resultaria provado que as medidas adoptadas não se limitaram a prejudicar a manutenção de clientes, mas conduziram à efectiva perda de clientes, com a consequente diminuição dos resultados de exploração da Labo 2.
Dizer que determinadas medidas prejudicaram a manutenção dos clientes não é coisa substancialmente diversa de dizer que levaram a perda de clientes, e havendo perda de clientes há necessariamente diminuição dos resultados de exploração.
No que à facturação de trabalhos da Labo 2 em nome da Imprime concerne, o depoimento das testemunhas que se pronunciaram a este respeito não foi esclarecedor.
(…)
Também relativamente às demais questões (afastamento dos quadros qualificados e experientes; deficiente comunicação com clientes, banca, e fornecedores) os depoimentos foram vagos e genéricos, não permitindo a formulação de uma convicção minimamente segura. m) Artigos 231º a 233º e 278º a 281ºda oposição dos 1º e 2ª recorrentes
Os artigos 231º a 233º estão relacionados com a designação L2 Spirit.
A este propósito há que destacar o depoimento de C, impulsionador e accionista maioritário desta empresa.
Interrogado sobre a designação da empresa, respondeu que a pergunta já lhe foi posta várias vezes e confessou que até hoje não conseguiu perceber bem, que talvez tenha sido o desespero por causa das exigências do RNPC. Que foi lançado um repto na Pa, outra empresa de que é accionista maioritário, e surgiram mais de 100 nomes, e pensa que o nome saiu de um lote fornecido pelo Dr. F. Não soube dizer se L2 significaria Level 2.
Ora, seria esta a testemunha mais habilitada a esclarecer esta questão. E a circunstância de existirem outras empresas cuja designação é integrada pela expressão L2 é irrelevante porquanto o confronto tem de ser feito entre a designação destas duas empresas, que actuam no mesmo ramo, sem perder de vista todo o circunstancialismo envolvente.
(…)
O teor do ponto nº 36 da sentença que decretou a providência, onde se afirma que a denominação social da L2 é semelhante à da Labo 2 reveste natureza conclusiva.
A questão da confundibilidade das designações será apreciada a propósito dos pressupostos da providência.
n) Artigos 331º, 335º a 337º e 342º da oposição dos 1º e 2ª recorrentes e 94º, 98º e 99º da oposição do 3º recorrente
Estes artigos relacionam-se com a máquina Vutek Ultravu 5300, tendo sido a prova produzida pouco convincente.
(…)
Não deixa de se afigurar pouco verosímil que uma máquina com as características desta, com um contrato de locação financeira em vigor, fosse substituída por outra mais potente quando estavam em curso negociações para a cessão de quotas que implicaria a transferência do estabelecimento, sendo certo que essa máquina constava dos elementos contabilísticos que estavam a ser considerados para a determinação do valor da empresa.
No tocante aos elementos contabilísticos, nenhuma testemunha se pronunciou sobre eles, designadamente alguém que tivesse conhecimentos específicos nessa área.
2.2. Da alegada nulidade da sentença
Defendem os recorrentes que a sentença que apreciou a oposição é nula, no termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), CPC, por violação do disposto no artigo 388º CPC, por ter deixado de apreciar questões que deveria ter apreciado, i.e., a confundibilidade, ou não, dos nomes das sociedades, sobre a existência, ou inexistência, da invocada obrigação de não concorrência, sobre o facto de, na decisão proferida haver sido imputada a todos os requeridos a mesma conduta, sem distinção, ou sobre a inexistência do requisito lesão grave e de difícil reparação, pois que tal constituiria fundamento de recurso.
Apreciando:
Quando o contraditório é posterior ao decretamento da providência, o artigo 388º, nº 1, CPC, abre ao requerido duas hipóteses, que se revolvem em alternativa:
- recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não deveria ter sido decretado (alínea
a);
- deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução (alínea b).
Ora, tendo optado pela dedução de oposição, os requeridos apenas poderiam apresentar factos novos e/ou novos meios de prova, mas já não discutir se, face aos factos apurados, a providência não deveria ter sido decretada por não estarem preenchidos os respectivos pressupostos, v.g., por não se encontrar demonstrado o requisito lesão grave ou de difícil reparação.
Como refere Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Almedina, III vol., 3ª edição, pg. 275, «confrontado com uma decisão cautelar proferida sem audição contraditória, o requerido é colocado perante uma encruzilhada, cabendo-lhe optar por um dos meios de defesa colocados ao seu alcance».
O que o Mmº Juiz a quo afirmou foi que, tendo optado por deduzir oposição, os recorrentes não podiam introduzir na defesa argumentos que só poderiam ser feitos valer em sede de recurso.
Como entendeu o acórdão da Relação de Lisboa, de 2007-03-29 (Ezaguy Martins), www.dgsi.t.jtrl, proc. 692/07, «Deduzida oposição à decretada providência cautelar, e mantida a essencialidade do quadro fáctico inicialmente dado por assente, não pode a decisão que julgar a oposição enveredar por um enquadramento jurídico-normativo distinto do operado na decisão inicial» (ponto IV do sumário elaborado pelo relator).
Bem andou, pois, o Mmº Juiz a quo em não apreciar as referidas questões.
Se a prova produzida em sede de oposição justificasse um enquadramento jurídico diverso do acolhido na decisão que decretou a providência, e se isso passasse pela análise das referidas questões que o Mmº Juiz a quo não abordou na sentença, então estaríamos perante erro de julgamento, mas não de nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Nessa medida a decisão que apreciou a oposição não enferma de qualquer nulidade.
2.3. Dos pressupostos do decretamento da providência e da sua manutenção
Defendem os 1º e 2ª recorrentes que o tribunal não considerou provados os factos assinalados no número anterior e que levariam ao levantamento da providência. E que não actuaram com manifesto abuso de direito ou fraude, únicos fundamentos que poderiam ser invocados para paralisar o direito à execução da garantia de que são titulares.
Dizem ainda que deram quitação das quantias recebidas na oposição que apresentaram, inexistindo o receio que possam executar a garantia pela totalidade, por que antes de terem sido citados para o procedimento executaram a garantia apenas pelo valor parcialmente em dívida. E que não assumiram nem estão vinculados a qualquer obrigação de não concorrência e que não constituíram uma sociedade concorrente da recorrida, sendo que apenas o 1º recorrente trabalha para a L 2 Spirit.
Constituem pressupostos do decretamento da providência cautelar não especificada:
a) probabilidade séria da existência do direito (fumus boni iuris) – artigo 381º, nº 1, e 387º, nº 1, CPC;
b) fundado receio de que outrem, antes de ser intentada a acção principal ou na sua pendência, cause lesão grave e dificilmente reparável desse direito (periculum n mora) - 381º, nº 1, e 387º, nº 1, CPC;
c) adequação da providência para remoção do periculum in mora – artigo 381º, nº1 , CPC;
d) inaplicabilidade das providências cautelares especificadas, tipificadas nos artigos 393º a 427º CPC;
e) que o prejuízo do seu eventual decretamento não seja superior ao dano que se pretende acautelar – artigo 387º, nº 2, CPC.
Os pressupostos questionados são os enunciados nas alíneas a), b) e e).
A probabilidade séria da existência do direito da recorrida radica na existência de uma obrigação de não concorrência.
A decisão que decretou a providência entendeu terem os recorridos violado uma obrigação de não concorrência com a sociedade que cederam, ao se concertarem para criar uma empresa concorrente e retirarem da mesma os trabalhadores especializados que aliciaram para a nova sociedade, levando consigo a clientela, iludida por estar a trabalhar com as mesmas pessoas com quem antes contactavam (antigos vendedores e o seu anterior gerente, o 1º recorrente), e por a sociedade ter um nome próximo daquele a que estavam habituados, com o intuito de prejudicarem a recorrida, como efectivamente prejudicaram.
Defendem os recorrentes que não assumiram nenhuma obrigação de não concorrência, nunca actuaram contra os ditames da boa fé e que cumpriram todas as obrigações a que se vincularam.
A circunstância de não ter sido expressamente convencionada no contrato de cessão de quotas a obrigação de não concorrência não significa que a mesma não exista.
No caso vertente, através da cessão da totalidade das quotas que os recorrentes detinham na sociedade Labo 2, operou-se a transmissão indirecta do estabelecimento, obtendo-se um efeito equivalente ao trespasse (cfr. Coutinho de Abreu, Da empresarialidade – as empresas e o direito, Almedina, pg. 344 e ss., e 357-8; Fernando de Gravato Morais, Alienação e Oneração de Estabelecimento Comercial, Almedina, pg. 122 e ss.).
Como dá conta Coutinho de Abreu, loc. cit., pg. 355-6, a doutrina e jurisprudência estrangeiras têm considerado existir, na compra e venda de empresas, uma obrigação implícita de não concorrência: independentemente de estipulação expressa nesse sentido, o vendedor fica vinculado a não concorrer com o comprador em actividade similar, num certo espaço e durante um certo período de tempo.
A nível da jurisprudência, relativamente à obrigação implícita de não concorrência destacam-se os acórdãos do STJ, de 2007.03.13 (Nuno Cameira), www.dgsi.pt.jstj proc. 06 A 4523, e da Relação de Coimbra, de 97.01.21 (Coelho de Matos), CJ, 97, I, 25.
Dentre os fundamentos invocados para esta obrigação encontram-se a boa fé, a leal concorrência, a garantia contra a evicção, a obrigação do vendedor de entregar a coisa vendida (no estado em que a vendeu).
Recorde-se que a recorrida alega que, por acção dos recorrentes, a sociedade que adquiriu – a Labo 2 – perdeu parte importante do seu know how, da sua capacidade produtiva, e parte substancial dos seus clientes, nomeadamente os mais importantes que asseguravam as maiores receitas, para uma nova empresa criada, entre outros, por J, ou, pelo menos, onde este ocupa um dos cargos de administrador (cfr. artigo 82º do requerimento inicial). E pretende que os recorrentes sejam intimados a abster-se de accionar a garantia bancária por pretender invocar a excepção do não cumprimento relativamente a estes e peticionar uma indemnização por incumprimento, ou mesmo resolver o contrato (artigos 136º a 138º do requerimento inicial).
Embora a Labo 2 fosse uma sociedade de capital – sociedade por quotas –, a verdade é que a pessoa dos três sócios era particularmente relevante. Com efeito, todos eles tinham papel activo nos destinos da empresa, com especial destaque para o 1º recorrente, com quem a 2ª recorrente é casada. E no e-mail dirigido ao Engº B o 1º recorrente falava na concertação de posições com ele ou com o CB (C, o 3º recorrente).
Nessa medida, deve considera-se que os recorrentes se encontravam adstritos à obrigação implícita de não concorrência.
Vejamos então qual o núcleo factual relevante para consubstanciar o direito da recorrida.
A sociedade L 2 Spirit S.A., que prossegue a mesma actividade da Labo 2, foi constituída em 2006.03.24, menos de três meses após a cessação do vínculo laboral dos 1º e 2º recorrentes com a Labo 2. Entre os sócios fundadores encontram-se três antigos trabalhadores da Labo 2, P, H e J (este último apenas cessou o seu vínculo laboral com a Labo 2 em 2006.07.16, mais de três meses após a constituição da sociedade L2 Spirit) - factos nºs 28, 32, 33 parte final, e 35 da sentença que decretou a providência.
Embora não figure como sócio, o 1º recorrente foi nomeado administrador da L2 Spirit (facto nº 37 da sentença que decretou a providência), e em entrevista à revista «M» foi identificado como responsável pelo planeamento estratégico da L2 Spirit.
Recorde-se que entre os elementos fundamentais para a concretização do negócio entre recorrida e recorrentes, nomeadamente para estipulação do preço, constavam a clientela, o Know-how, a maquinaria e a capacidade de manutenção e de concorrer no mercado demonstrados pela Labo 2 (facto nº 3 da decisão que decretou a providência).
Nessa entrevista é afirmado pelo 1º recorrente que «BES, Vodafone, Corte Inglés e Central de Cervejas são alguns dos clientes que trabalham com a L2 Spirit, gráfica que teve na sua origem o fecho da Labo 2 Digital» e que «Com o fecho da Labo 2, que foi absorvida pela P, o mercado percebeu que havia um gap e uma carência de serviços e, além disso, havia um conjunto de pessoas que tinha vontade de se juntar» (factos nºs 39 e 40 da sentença que decretou a providência).
E se é certo que o 1º recorrente solicitou a rectificação dessas declarações através do e-mail de que existe cópia a fls. 750-1, não é menos verdade que, tendo a destinatária da comunicação proposto uma rectificação em próxima edição do jornal, caso fosse essa a vontade do 1º recorrente, não consta dos autos qualquer rectificação.
A fls. 752 consta cópia de um fax dirigido ao director adjunto da Revista M, em que, após ter enunciado os erros da notícia, designadamente o alegado fecho da Labo 2, conclui afirmando:
«Creio que a M deveria dar na próxima edição uma notícia com igual destaque sobre a Labo 2, emendando assim a mão; assim como deveria no jornal edital rectificar de imediato estes erros. Peço que leve em conta este meu pedido e no futuro estarei disponível para entrevistas ESCRITAS, para evitar mais confusões.».
Da posição assumida pelo 1º recorrente relativamente à notícia em causa, verifica--se que não é pedida rectificação da notícia na Revista (mas tão só no jornal digital), embora se sugira uma notícia com igual destaque sobre a Labo 2.
Embora as denominações Labo 2, Ldª, e L 2 Spirit, S.A., não sejam, em abstracto, confundíveis, a verdade é que a forma sincopada «L 2» não deixa de evocar a Labo 2. E se a isto associarmos as declarações do 1º recorrente à Revista (e que não se mostrou tivessem sido objecto de rectificação), em que a criação da L 2 surgia associada ao fecho da Labo 2 e a um «gap» e uma «carência de serviços», é legítimo que as pessoas do meio pensassem que a L 2 estava a substituir a Labo 2.
Aliás, no e-mail em que pede a rectificação das suas declarações, o 1º recorrente reconhece que algumas das incorrecções de que a notícia enferma «poderão causar turbulência no mercado».
E a questão de como surgiu a denominação L 2 não ficou minimamente esclarecida
Ficou ainda apurado indiciariamente que houve aliciamento de trabalhadores da Labo 2 para a L 2 Spirit (factos nºs 29 e 30 da sentença que decretou a providência), facto que não é descaracterizado na sua essência por alguns dos trabalhadores terem saído para outras empresas (factos nº 3 a 5 da decisão que apreciou a oposição), nem que alguns não tenham saído directamente para a L 2 Spirit (facto aditado na sequência da reapreciação da matéria de facto).
Por outro lado, a associação da criação da L 2 Spirit a um alegado fecho da Labo 2 num jornal da especialidade não deixa de ter reflexos, designadamente no desvio de clientela.
A circunstância de neste ramo não se poder falar numa fidelização de clientela, até porque os grandes clientes trabalham normalmente com várias empresas devido à incapacidade de resposta de uma única empresa para grandes campanhas, não invalida a existência de uma carteira de clientes.
Nem, obviamente, o facto de uma dada empresa ser escolhida para executar um trabalho não lhe dar qualquer garantia que executará os trabalhos futuros desse cliente (facto nº 11 da decisão que apreciou a oposição). Trata-se de uma realidade natural numa economia de mercado e de livre concorrência, seja qual for o ramo que não funcione em regime de monopólio ou outro semelhante.
Relativamente ao desvio de clientela refira-se, a título de exemplo, o Corte Inglês e a Central de Cervejas, e a Pa empresa detida por C (um dos mentores da L 2 Spirit), que solicitava à Labo 2 trabalhos para clientes como o BES e a Vodafone (factos nº 41 e 42º da decisão que decretou a providência e facto nº 12 da decisão que apreciou a oposição).
Não se ignora que, em sede de oposição, ficou indiciariamente apurado que a requerente adoptou medidas que prejudicam a manutenção dos clientes, como seja a mudança de instalações da Labo 2, a ruptura de matérias primas, o não desenvolvimento de uma política de marketing (facto nº 8 da decisão que apreciou a oposição). No entanto, não se apurou que clientes concretos foram perdidos por essa razão, nem a sua expressão na situação da empresa.
O núcleo de factos supra enunciado é suficiente para caracterizar a probabilidade séria da existência do direito da recorrida.
Importa agora analisar o periculum in mora, ou seja, saber se é fundado o receio da requerida de que os recorrentes causem lesão grave e dificilmente reparável do seu direito.
Nas palavras de Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Almedina, II vol. , 3ª ed., pg. 103:
«Determina a lei que o receio deve ser fundado, ou seja, apoiado em factos, que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo.
Não bastam, pois, simples dúvidas, conjecturas ou receios meramente subjectivos ou precipitados, assentes numa apreciação ligeira da realidade, embora, de acordo com as circunstâncias, nada obste que a providência seja decretada quando se esteja ainda face a simples ameaças advindas do requerido, ainda não materializadas, mas que permitam razoavelmente supor a sua evolução par futuras lesões».
No entanto, adverte o mesmo autor, a pg. 104-5,
«o critério de aferição não deve reconduzido à certeza inequívoca quanto à existência da situação de perigo dificilmente comprovada em processos com as características e objectivos dos procedimentos cautelares, bastando para isso que se mostre razoavelmente fundado esse pressuposto.
As circunstâncias em que o juiz deve ter por justificado o receio de lesões futuras devem ser apreciadas objectivamente, tendo em conta o interesse do requerente que promove a medida e do requerido que com ela é afectado, as condições económicas de um e de outro, a conduta anterior e a sua projecção nos comportamentos posteriores».
Dizem os 1º e 2ª recorrentes que o tribunal a quo invocou a falta de quitação das quantias já recebidas pelos recorrentes como justificação para o não levantamento da providência, e que do artigo 352º da oposição consta tal quitação.
A problemática da falta de quitação é acessória.
Como já se referiu, os direitos que estão em causa são o de deduzir excepção do não cumprimento, de uma indemnização por incumprimento ou eventualmente resolver o contrato de cessão de quotas. E não o de garantir a quitação.
O risco que a recorrida pretende esconjurar é o de a garantia bancária prestada para salvaguardar o pagamento do preço seja accionada pelos recorrentes antes de o direito que a recorrida se arroga estar definido na acção principal, tanto mais que aos recorrentes não são conhecidos outros bens para além do seu salário (facto nº 52 da decisão que decretou a providência).
Ou seja, se a providência não fosse mantida, os recorrentes poderiam accionar a garantia (pelo remanescente da dívida ou pela totalidade da garantia), obtendo o pagamento integral do preço da cessão de quotas, e a recorrida, caso visse a sua pretensão acolhida na acção principal, não teria meios de se ressarcir.
A única maneira de o evitar é manter a providência decretada, não se vislumbrando que o prejuízo decorrente do decretamento da providência exceda o do dano que se pretende evitar. Nada foi alegado que permita essa conclusão.
Resta concluir que a situação de concorrência consubstanciada na criação da L 2 Spirit, com aliciamento de trabalhadores da Labo 2 e desvio de clientela, é susceptível de integrar uma situação de manifesto abuso por parte do beneficiário da garantia bancária, legitimador da paralisação da sua eficácia através de um procedimento cautelar
Relativamente à possibilidade de impedir o accionamento da garantia bancária on first demand em caso de fraude ou abuso por parte do beneficiário, vejam-se os acórdãos do STJ, de 2004.10.14 (Araújo Barros), www.dgsi.pt.jstj, proc. 04B2883, e da Relação de Lisboa, de 2004.05.04 (Jorge Santos), www.dgsi.pt.jtrl, proc. 1308/2003.
3. Decisão
Termos em que se decide negar provimento aos agravos, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Lisboa, 2009.01.29
Márcia Portela
Carlos Valverde
Granja da Fonseca