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LEITURA DA SENTENÇA
Sumário
1 - A exigência prevista no art.º 372º nº 3 do CPP, de que a sentença seja lida publicamente, podendo dispensar-se a leitura do relatório, mas sendo obrigatória a leitura da fundamentação e do dispositivo, sob pena de nulidade, decorre da exigência contida no art.º 206º da Constituição da República Portuguesa, que consagra a publicidade da audiência, igualmente acolhida no art.º 321º nº 1 do CPP, que comina igualmente com nulidade a sua violação.
2 -E assim é porque o legislador não quis que houvesse qualquer sentença criminal que não se sujeitasse ao escrutínio popular e público a aplicação da justiça pelos tribunais.
Texto Integral
Decisão Sumária, nos termos do art.º 417º nº 6 alínea a) do CPP.
1.No Processo nº 1118/02.0JDLSB da 3ª Secção do 5º Juízo Criminal de Lisboa foram julgados (A) e (B) tendo, por sentença de 26 de Maio de 2008, sido decidido:
“Pelo exposto, julgam-se a acusação e a pronúncia procedentes por provadas e, em consequência, decide-se:
1. Condenar (B) pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256º, nºs 1, c) e 3 do Código Penal, e de um crime de atestado falso, p. e p. pelo art. 260º, nº4 do Código Penal, (e uma vez que as penas parcelares ficaram fixadas supra) na pena de multa que se fixa em 120 dias, à taxa diária de 2 euros, no montante de 240 euros;
2. Fixar em 80 dias a prisão subsidiária, relativamente a (B) (art. 49º, nº1 do C. Penal);
3. Condenar (A) pela prática, como autor material, de um crime de atestado falso, p. e p. pelo art. 260º, nº1 do C. Penal, na pena de multa que se fixa em 200 dias, à taxa diária de 5 euros, no montante de 1.000 euros;
4. Fixar em 133 dias a prisão subsidiária, relativamente a (A) (art. 49º, nº1 do C. Penal);
5. Condenar cada um dos arguidos na taxa de justiça que se fixa em duas UC, e nas legais custas, com a mínima procuradoria;
6. Condenar cada um dos arguidos em 1% da taxa de justiça (art. 13º, do D.L. nº 423/91, de 30.10);
7. Ordenar o cumprimento do art. 469º do C.P.P.
8. Fixar em 280 euros os honorários do Ilustre Defensor, presente em audiência, a adiantar pelo C.G.T.
Boletim ao registo criminal.
Passe e entregue mandados de detenção para notificação da presente sentença ao arguido (B), nos termos do art. 333º, nº5 do C.P.P.”
2. Não se conformando com esta decisão o arguido (A) dela interpôs recurso apresentando motivação da qual extrai as seguintes conclusões:
“1. O tribunal a quo não indicou na sentença recorrida, ainda que sumariamente, questões pertinentes suscitadas pelo arguido (A) em sede de contestação, nomeadamente a intervenção na matéria dos autos da Agência Automobilística Amaros, Lda. e a constatação de que este processo consiste numa violação do princípio non bis in idem nos termos do art. 29.º, n.º 5 da CRP.
2. Tal omissão viola o disposto no art. 374.º n.º 1, alínea d) do CPP.
3. O tribunal a quo, ao dar como provados os factos indicados nas alíneas n), o), s), t), z), aa), bb) e cc) da “Matéria de facto provada”, nos segmentos que afirmam que o ora recorrente emitiu atestado médico sem consultar (B), violou o artigo 127.º do C.P.P. e o princípio in dubio pro reo ínsito no artigo 32.º, n.º 2 da CRP, na medida em que tais factos, dados como provados, não apresentam o mínimo respaldo no teor das provas produzidas e examinadas em julgamento, nomeadamente no depoimento da única testemunha (M) (cassete 1, lado A, volta 0198 a 0320 e transcrito na motivação do presente recurso) e documentos dos autos, fls. 2 a 15, 24, 29, 43, 44 a 47, 63 a 64.
4. O tribunal a quo, ao fazer constar o facto indicado na alínea n), da “Matéria de facto provada”, no segmento que afirma que o ora recorrente entregou atestado médico a (S), violou o artigo 127.º do C.P.P. e o princípio in dubio pro reo ínsito no artigo 32.º, n.º 2 da CRP, na medida em que tal facto, dado como provado, não apresenta o mínimo respaldo nas provas produzidas e examinadas em julgamento, nomeadamente no depoimento da única testemunha (M)(cassete 1, lado A, volta 0198 a 0320 e transcrito na motivação do presente recurso) e documentos dos autos, fls. 2 a 15, 24, 29, 43, 44 a 47, 63 a 64.
5. O tribunal a quo, ao dar como provado o facto indicado na alínea t), da “Matéria de facto provada”, no segmento que afirma que o atestado médico continha elementos não conformes à verdade, violou o artigo 127.º do C.P.P. e o princípio in dubio pro reo ínsito no artigo 32.º, n.º 2 da CRP, na medida em que tal facto, dado como provado, não apresenta o mínimo respaldo nas provas produzidas e examinadas em julgamento, nomeadamente no depoimento da única testemunha (M) (cassete 1, lado A, volta 0198 a 0320 e transcrito na motivação do presente recurso) e documentos dos autos, fls. 2 a 15, 24, 29, 43, 44 a 47, 63 a 64.
6. Não foi produzida qualquer prova que pudesse sequer indiciar que (B) não possuía, à data dos factos, aptidão física e mental para a condução de veículos.
7. Uma correcta e constitucionalmente imbricada interpretação do artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa não se coaduna com aquela que o Tribunal a quo implicitamente professou, pois, à luz do princípio in dubio pro reo não se pode admite que se dê como ultrapassado o estado de dúvida razoável a respeito de factos que não encontram uma única prova que os suporte.
8. Não resulta preenchido elemento subjectivo do tipo de crime de atestado falso, p. e p. no art. 260.º n.º 1 do Código Penal, na medida em que não se demonstre que o arguido soubesse que o teor desse atestado não correspondia à verdade.
9. A não ser assim, estar-se-á a assumir, ainda que implicitamente, que a redacção conferida a este tipo legal de crime pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, que inegavelmente dispensa esta demonstração, é aplicável, tendo-o sido pelo tribunal a quo, violando assim o n.º 1 e n.º 4 do artigo 2.º do código Penal e simultaneamente o n.º 1 e n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa.
10. A condenação do arguido, ora recorrente, na prática de um crime de atestado falso sem que nos autos existam factos que integrem o elemento subjectivo do dito crime é violadora do artigo 260.º, n.º 1 do CPP, e concomitantemente do princípio da legalidade inscrito nos artigos 1.º do Código Penal e artigo 29.º, n.º 1 da CRP.
Pelo exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente:
Deverá ser revogada a sentença recorrida, porque irregular, ou revogada a decisão sobre matéria de facto no sentido de julgar como não provados os segmentos ora impugnados, absolvendo o arguido aqui recorrente do crime que lhe é imputado.”
3. Admitido o recurso com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, respondeu o Digno Magistrado do Mº Pº pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do decidido.
4. Neste Tribunal da Relação o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de serem os autos devolvidos à 1ª instância uma vez que o juiz no final das alegações se pronunciou em acta dispensando a leitura da sentença, “a qual se encontrará disponível a partir de 26 de Maio de 2008, sendo a falta da publicidade da sentença, por omissão da leitura, nulidade insanável, nos termos do parecer a fls. 263 e seguinte.
5. O objecto do recurso versa a questão prévia da nulidade insanável da omissão de leitura por violação da regra da publicidade.
6. Suscita o MºPº nesta instância a questão prévia da falta de leitura da sentença, pois sendo a “leitura da fundamentação … bem como do dispositivo, obrigatória, sob pena de nulidade”, nos termos do art.º 373º nº 3 do CPP, e a falta do arguido ou do seu defensor, no acto de leitura da sentença, cominada como nulidade insanável, por tais presenças serem obrigatórias naquele acto, nos termos do art.º 119º alínea c) do CPP, tal importaria que fosse ordenada a prática do acto em falta, ou seja da leitura da sentença.
Tem integralmente o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, não olvidando sequer que o regime das nulidades insanáveis é do conhecimento oficioso, “devendo ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do processo”, por força do corpo do art.º 119º do CPP, como aliás é jurisprudência pacífica das instâncias superiores verbi gratia a decisão sumária por nós lavrada no âmbito do processo nº 5740/08.5 datada de 28 de Outubro de 2008.
Sucede que a nulidade insanável não só deve ser conhecida oficiosamente, como pode ser suscitada pelo interessado, (como titular do direito protegido pela norma violada,) ou pelo MºPº na sua qualidade constitucional de defensor da legalidade (art.º 219º nº 1 da CRP).
Por outro lado “a renúncia do interessado à sua arguição, a sua aceitação expressa dos efeitos do acto, e mesmo a sua prevalência da faculdade a cujo acto se dirigia são irrelevantes,” (neste sentido vide Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, 2ª Edição, 2008, página 304, 14ª anotação ao art.º 119º do CPP).
A exigência prevista no art.º 372º nº 3 do CPP, de que a sentença seja lida publicamente, podendo dispensar-se a leitura do relatório, mas sendo obrigatória a leitura da fundamentação e do dispositivo, sob pena de nulidade, decorre da exigência contida no art.º 206º da Constituição da República Portuguesa, que consagra a publicidade da audiência, igualmente acolhida no art.º 321º nº 1 do CPP, que comina igualmente com nulidade a sua violação.
E assim é porque o legislador não quis que houvesse qualquer sentença criminal que não se sujeitasse ao escrutínio popular e público a aplicação da justiça pelos tribunais.
A sublime missão de julgar não se esgota na realização dos actos da audiência de julgamento, nem com os actos relativos à produção de prova, nem com a produção e discussão das alegações, apenas atingindo o seu escopo ou finalidade com a decisão final, de condenação, absolvição ou outra, a qual deverá ser obrigatoriamente publicamente lida, de modo a assegurar o amplo conhecimento pela comunidade do desfecho do caso submetido a julgamento, e os fundamentos do pensamento do julgador.
Não podia, em conformidade com o exposto, a senhora Juiz proferir o despacho de: “dispenso qualquer leitura de sentença, a qual se encontrará disponível a partir do dia…”, por violação dos art.ºs 372º nº 3 e 119º alínea c) ambos do CPP.
Decisão:
Por todo o exposto julga-se procedente a questão prévia da falta de leitura da sentença, o que obsta ao conhecimento do recurso, pelo que se determina a devolução dos autos à 1ª instância para que o despacho de dispensa de leitura de sentença, que se revoga, por fulminado de nulidade insanável, seja substituído por outro que designe data para leitura da decisão nos termos do art.º 372º nº 3 do CPP.
Sem tributação.
Lisboa, 3 de Fevereiro de 2009
Ricardo Manuel Chrystello e Oliveira de Figueiredo Cardoso