TELECONFERÊNCIA
INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA
Sumário

1. No âmbito dos depoimentos por teleconferência o código do trabalho é omisso pelo que, não estando em causa a sua admissibilidade, aplicam-se as regras do processo civil que regulam esta matéria, artigo 621º e 623 do CPC.
2. Não pode proceder como fundamento para o indeferimento do depoimento por teleconferência o ter-se verificado no passado, "dificuldades de gravação de depoimentos prestados por videoconferência, pois que no despacho recorrido não são indicadas quais são essas dificuldades, o que impossibilita avaliação da sua gravidade e da inviabilidade da sua efectivação no caso presente.
3. Também a circunstância do autor não ter invocado, ao pedir a videoconferência, quaisquer factos donde possa concluir-se que a apresentação as testemunhas lhe é economicamente incomportável não é exigível pois este requisito, a que alude o art.º67 do CPT, é aplicável apenas quanto à inquirição de testemunha por carta precatória em processo laboral.
(sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

         Na presente acção em que é autor A… e réus B… & C…, Ldª e outros foi proferido despacho saneador com a elaboração da base instrutória, tendo sido indeferido o depoimento por teleconferência das testemunha arroladas pelo autor, conforme cópia do despacho junto a fls. 19 destes autos.

         O autor inconformado interpôs recurso de agravo, tendo arguido a nulidade do mesmo despacho.
         No despacho, cuja cópia se encontra junto aos autos a fls. 40 e 41, foi julgada inexistente a nulidade invocada e admitido o recurso, com subida imediata, em separado e efeito suspensivo, ao abrigo do artigos 84n.º2, 85, e 83, n-º4, todos do CPT.
        
         Foi admitido o recurso neste Tribunal da Relação.
        
         Nas alegações do recurso interposto, foram proferidas as a seguir transcritas,
         Conclusões:
1. “O indeferimento em apreço não é fundamentado de direito, o que só por si o inquina de nulidade, ex. vi do art° 659, n° 2 e art° 668, n° 1, b) do CPC. Subsidiariamente, não é causa legal e bastante de indeferimento da vídeo-conferência, terem-se verificado no passado, e noutros processos não especificados, eventualmente, "dificuldades de gravação de depoimentos prestados por vídeo-conferência».
2. Muito menos quando tais "dificuldades" nem sequer são identificados ou contabilizados, de forma a poder-se ter uma ideia – mínima que seja – das suas causas, nem do seu número ou alcance.
3. Quanto ao facto do A., ao pedir a videoconferência, não ter invocado quaisquer «factos donde possa concluir-se que a apresentação das testemunha é economicamente incomportável», tal fundamento não colhe, pois a lei não exige que tal falta de meios para o requerente seja por este invocada.
4. Aliás, o sistema de videoconferência não se destina apenas, nem sobretudo, a prevenir a falta de meios da parte que a requer, mas também, e principalmente, a acautelar a comodidade das testemunhas e/ou a economia dos meios empregues na sua deslocação e/ou audição.
6. De resto, ao tempo da acção a residência do autor é em Lisboa enquanto que numerosas testemunhas residem e ou trabalham em Coimbra, sendo certo que o A. litiga com apoio judiciário, factos que não precisava de alegar, pois decorrem directamente dos próprios autos e são do conhecimento oficioso do Tribunal.
7. Nestes termos o despacho recorrido não só viola os art°s 621 e 623 do CPC, como afecta, ainda que indirectamente, o próprio direito de acesso ao Direito do requerente, no caso a parte jurídica e economicamente mais fraca.”

O Exmº Procurador-geral-adjunto deu parecer no sentido da procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir
                       
A única questão a apreciar é sobre indeferimento da inquirição por teleconferência das testemunhas indicadas pelo autor.

No despacho recorrido foram duas as razões invocadas para o indeferimento do depoimento das testemunhas por videoconferência, a saber: - terem-se verificado no passado dificuldades de gravação de depoimentos prestados por videoconferência; - o autor não ter invocado, ao pedir a videoconferência, quaisquer factos donde possa concluir-se que a apresentação das testemunhas é economicamente incomportável para o requerente.

Vejamos então 

O artigo 1º do CPT dispõe que o processo do trabalho é regulado por ele próprio e nos casos omissos recorre-se, nos termos do seu n.º2 a), à legislação processual comum, civil ou penal, que directamente os previna.
Ora, no âmbito dos depoimentos por teleconferência o código do trabalho é omisso pelo que, não estando em causa a sua admissibilidade, aplicam-se as regras do processo civil que regulam esta matéria.
Artigo 621. °do CPC
(Lugar e momento da inquirição)
As testemunhas depõem na audiência final, presencialmente ou através de teleconferência, excepto nos seguintes casos:

a) Inquirição antecipada, nos termos do artigo 520. °;
b) Inquirição por carta rogatória, ou por carta precatória expedida para consulado português que não disponha de meios técnicos para a inquirição por teleconferência
c) Inquirição na residência ou na sede dos serviços, nos termos do artigo 624.0;
d) Impossibilidade de comparência no tribunal.
e) Inquirição reduzida a escrito, nos termos do artigo 638. °-A;
f) Depoimento prestado por escrito, nos termos do artigo 639. °;
g) Esclarecimentos prestados nos termos do artigo 639. °-B.

Artigo 623°
(Inquirição por teleconferência)
1 - As testemunhas residentes fora do círculo judicial, ou da respectiva ilha, no caso das Regiões Autónomas, são apresentadas pelas partes, nos     termos do n.º 2 do artigo 628. °, Quando estas assim o tenham declarado aquando do seu oferecimento, ou são ouvidas por teleconferência na própria     audiência e a partir do tribunal da comarca da área da sua residência ou, caso nesta não existam ainda os meios necessários para tanto, a partir do tribunal da sede do círculo judicial da sua residência.
         (...) (sublinhados nossos)

         Assim, e desde logo, não pode proceder como fundamento para o indeferimento proferido, terem-se verificado no passado, "dificuldades de gravação de depoimentos prestados por videoconferência, sendo certo que no despacho recorrido não são indicadas quais são essas dificuldades, o que impossibilita avaliação da sua gravidade e da inviabilidade da sua efectivação no caso presente.
        A 2ª razão, constante no despacho recorrido, prende-se com a circunstância do autor não ter invocado, ao pedir a videoconferência, quaisquer factos donde possa concluir-se que a apresentação das testemunhas lhe é economicamente incomportável.  
 O despacho recorrido ao invocar este fundamento faz apelo ao disposto no art. 67 do CPT, aplicável quanto à inquirição de testemunha por carta precatória em processo laboral, e onde se estatui que a mesma só pode ser ordenada se a testemunha residir fora da área da jurisdição do tribunal em causa, o juiz considerar o seu depoimento necessário e a apresentação for, para a parte, economicamente incomportável.
Todavia, estes requisitos não são exigíveis para a inquirição por teleconferência, como resulta dos dispositivos acima referidos, pelo que o tribunal recorrido não podia ter indeferido os depoimentos por videoconferência, com a falta de fundamentos que não eram exigíveis, sendo certo que, também por essa razão, o requerente não tinha de alegar factos sobre as dificuldades económicas na apresentação das testemunhas, o que não fez.
 Afigura-se-nos assim, que o despacho recorrido carece de correcto fundamento pelo que deverá ser substituído.
             
Decisão 
Face ao exposto, revoga-se o despacho recorrido, devendo ser substituído por um outro que defira os depoimentos por teleconferência, verificados os requisitos, previstos nos dispositivos acima referidos do CPC.
             
Sem custas. 

Lisboa, 4 de Fevereiro de 2009.

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Paula Sá Fernandes
José Feteira
Filomena Carvalho