SUBSÍDIO POR MORTE
LEGITIMIDADE
Sumário

1. O subsídio por morte tem por finalidade compensar, de imediato, o acréscimo de encargos que se fazem sentir com maior premência logo após a morte do elemento da família, no activo ou aposentado, tendo em vista a reorganização da vida familiar.
2. O subsídio por morte, que, relativamente aos funcionários públicos, se encontra prevista no DL 223/95 de 8 de Setembro (art. 2º, 7º e 9º), deve ser requerida junto da entidade onde o funcionário exercia funções.
3. A responsabilidade da sua atribuição e pagamento compete ao serviço, onde o trabalhador exercia funções.
4. Tratando-se da morte de um aposentado ou reformado compete à CGA a sua atribuição e pagamento.
F.G.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
F, intentou acção sob a forma sumária, contra ESCOLA E B 2,3 DOM PEDRO IV DE QUELUZ, (identificação posteriormente corrigida para «Escola Secundária D. Pedro V, com sede na Estrada das Laranjeiras, 122, Lisboa) pedindo: se declare «a Autora titular das prestações por morte, no âmbito dos regimes da caixa geral de aposentações, previstas no DL 223/95 de 8 de Setembro, nomeadamente o vertido nos seus artigos 2º nº 1 al, a), 3º nº 1 al. a), 7º e 9º, decorrentes da morte de J e a R. condenada a reconhecê-lo com as legais consequências».
Para o efeito, alega em síntese o seguinte:
Em 04.11.2004, faleceu J no estado de viúvo desde 03.09.1998.
A A. e o falecido viveram juntos partilhando cama e relacionando-se sexualmente, cerca de 13 anos, até à morte deste, vivendo como marido e mulher.
A A. é solteira.
O falecido J, à data da morte era trabalhador por conta de outrem, auferindo o vencimento anual de aproximadamente 8.000,00 euros e era beneficiário da segurança social com o nº (da ADSE, Doc. nº 5).
A A., recebe como empregada de limpeza, aproximadamente a quantia de 3.266,42 euros por ano.
A A. não tem marido, filhos pais ou irmãos, não tendo além disso, qualquer parente em Portugal.

Por decisão de 16.05.2007 (fol. 29), foi a Ré julgada parte ilegítima e indeferida liminarmente a petição inicial. Na referida decisão, conclui-se da seguinte forma:
«Nos presentes autos, pede a Autora que a Ré seja condenada a reconhecer a autora como titular da prestação por morte no âmbito do regime da Caixa Geral de Aposentações prevista no DL 223/95 de 8 de Setembro, decorrente da morte de J.
Invoca como causa de pedir o facto de ter vivido com o falecido em união de facto, por mais de dois anos e até à data da morte deste e que este era beneficiário da segurança social.
Do que fica exposto se conclui que a presente acção devia ter sido intentada contra a CGA ou o ISS, entidades junto das quais a autora poderá vir a requerer o pagamento das prestações por morte do falecido, consoante este tenha sido ou não funcionário público.
Os factos alegados na petição inicial não deixam margem a quaisquer dúvidas quanto a não ser a ré o sujeito passivo do litígio.
Pelo exposto,, considero a Ré parte ilegítima e, visto o preceituado no art. 234-A, nº 1 do CPC, ex vi do nº 5 da referida disposição legal, indefiro liminarmente a petição inicial»
Inconformada recorreu a A. (fol. 34), recurso que foi admitido como agravo.

Nas alegações que apresentou, formula a agravante, as seguintes conclusões:
1- O falecido era beneficiário da Caixa Geral de Aposentações (ADSE), entidade completamente distinta do Instituto de Segurança Social.
2- Certo é que o falecido só apresentou descontos para a Segurança Social em 1985, não sendo à data do óbito, beneficiário activo ou pensionista da Segurança Social.
3- O falecido era contribuinte e beneficiário da Caixa Geral de Aposentações, enquanto funcionário público.
4- A Caixa Geral de Aposentações confirma que o falecido foi seu subscritor activo até 01.11.2004 (altura do falecimento) aplicando-se o respectivo regime legal.
5- A CGA apenas é responsável pelo pagamento de subsídio por morte quanto aos pensionistas falecidos e nunca relativamente aos funcionários cujo óbito sobreveio com aqueles no exercício de funções.
6- O falecido à data da sua morte não se encontrava aposentado, sendo antes funcionário público no activo, desempenhando funções de guarda-nocturno na Escola E B 2,3 Dom Pedro IV, de Queluz.
7- Assim, considerando que estava no activo o falecido, a entidade a quem compete a atribuição do subsídio de morte é o serviço onde o funcionário prestava serviço à data da sua morte, aplicando-se o regime legal.
8- Conforme o nº 1 do art. 83 do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo DL 498/72 de 9 de Dezembro, constata-se que: «As pessoas de família a cargo dos aposentados terão direito a receber, por morte destes, o subsídio correspondente a um número de pensões igual ao dos meses de vencimento que a lei concede por morte dos servidores no activo». Mais acresce o nº 2 deste artigo: «À concessão do subsídio é aplicável o regime fixado na lei para subsídios por morte dos funcionários na actividade, a caixa apenas é responsável pelo pagamento de tal prestação quanto aos pensionistas falecidos, nunca relativamente aos funcionários cujo óbito sobreveio com aqueles no exercício de funções, caso em que, nos termos do DL 223/95 de 8 de Setembro, tal responsabilidade é do serviço respectivo».
9- Ora, salvo douta opinião, deverá ser intentada a acção somente contra o serviço onde o funcionário prestava serviço à data da morte, que neste caso é a escola E B 2,3 Dom Pedro IV, de Queluz.
10- A Escola é parte legítima por ser titular directa e imediata da relação jurídica controvertida.

Ordenada a citação da R., para os termos da causa e do recurso, art. 234 CPC, apresentou-se a informar que «o funcionário em causa nunca prestou serviço» naquele estabelecimento, devendo tratar-se da Escola Dom Pedro V, em Lisboa.

Ouvida a agravante, veio requerer a «Intervenção Provocada» da Escola Secundária Dom Pedro V, em Lisboa.
Ordenada a citação desta (Escola Secundária D. Pedro V, com sede na Estrada das Laranjeiras, 122, em Lisboa), apenas constituiu mandatário.

Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.

FUNDAMENTAÇÃO.
Os factos com relevo para a decisão, são os consta do relatório que antecede.

O DIREITO.
O âmbito do recurso afere-se pelas conclusões das alegações do recorrente, que assim delimita o seu objecto. No caso presente, coloca-se a questão de saber se se verifica a situação de ilegitimidade passiva.
Intentou a agravante a acção contra a «Escola E B, 2.3 Dom Pedro IV de Queluz». Recebido o recurso, no seguimento da citação feita nos termos do nº 3 art. 234-A CPC, veio a R. dizer verificar-se erro manifesto na identificação da Ré». Ouvida a A. (agravante) veio identificar a R. como «Escola Secundária D. Pedro V», com sede na Estrada das Laranjeiras, Lisboa, entidade que foi então citada nos termos do nº 3 do art. 234-A CPC.
Dispõe o art. 26 CPC, que «o autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar; o réu é parte legítima quanto tem interesse directo em contradizer». Nos termos do nº 2 do mesmo preceito, «o interesse em contradizer exprime-se pelo prejuízo que da procedência da acção lhe advenha». No nº 3 do mesmo preceito, dispõe-se que «Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor».
O aditamento introduzido no nº 3, pela revisão de 1995/1996 - «tal como é configurada pelo autor» - veio por termo à polémica que nesta parte se verificava, nomeadamente quanto às teses objectivista e subjectivista, (perfilhadas respectivamente por Alberto dos Reis e Barbosa de Magalhães), sendo agora inquestionável que «ao apuramento da legitimidade interessa apenas a consideração do pedido e da causa de pedir», ou seja, a forma como o autor configura a relação controvertida.
No caso presente, alega a agravante factos tendentes à prova da situação de «união de facto» há mais de dois anos, entre ela e José Casimiro Freitas Carmo, falecido, na situação de funcionário da Escola Secundária D. Pedro V, sendo beneficiário da ADSE, com o nº 01485640.
O pedido formulado consiste em: «Ser declarada a A. titular das prestações por morte, no âmbito dos regimes da Caixa Geral de Aposentações, previstas no DL 223/95 de 8 de Setembro, nomeadamente o vertido nos seus artigos 2º nº 1 al, a), 3º nº 1 al, a), 7º e 9º, decorrentes da morte de J, e a R. condenada a reconhecê-lo, com as consequências legais».
Na decisão sob recurso, entendeu-se que a acção deveria ter sido intentada «contra a CGA ou o ISS, entidades junto das quais a autora poderá vir a requerer o pagamento das prestações por morte do falecido, consoante este tenha sido ou não funcionário público».
Ainda que a petição inicial enferme de alguma deficiência, (quiçá a pedir algum aperfeiçoamento) a agravante expressamente refere que pretende exercer o direito a que se referem os art. 2º al. a), 3º al. a) e 7º e 9, do DL 223/95 de 8 de Setembro.
Dispõe o art. 1º do DL 223/95 de 8 de Setembro (diploma de que serão os outros preceitos citados, salvo indicação em contrário) o seguinte: «O presente diploma regula a atribuição do subsídio por morte, prestação pecuniária, de concessão única, integrada no regime de protecção social da função pública».
O art. 2º nº 1 a) dispõe: «O subsídio por morte é atribuído aos familiares dos funcionários e agentes: a) Dos serviços e organismos da administração central, regional e local, incluindo os institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos...»
O art. 3º nº 1 a) dispõe: «Têm direito a perceber o subsídio por morte: a) O cônjuge sobrevivo ... ou a pessoa que esteja nas condições previstas no art. 2020 do CC, e que à data do falecimento do funcionário ou agente com ele vivesse em comunhão de mesa e habitação».
Dispõe o art. 7º que «o subsídio por morte é igual a seis vezes o valor da remuneração mensal, susceptível de pagamento de quota para a Caixa Geral de Aposentações, a que funcionário ou agente tem direito à data do seu falecimento».
Dispõe o art. 9 que «O subsídio por morte deve ser requerido pelos respectivos titulares aos serviços onde o funcionário ou agente exercia funções, em documento próprio, a aprovar por Portaria do Ministro das Finanças».
Do que fica referido, resulta que na situação presente, apenas está em causa o subsídio por morte, de funcionário não aposentado. Trata-se de prestação pecuniária única. Com efeito, as prestações por morte, podem também ser continuadas, o que acontece nomeadamente com a «pensão de sobrevivência».
Esta prestação, que relativamente aos funcionários públicos, se encontra prevista no DL 223/95 de 8 de Setembro (art. 2º, 7º e 9º), deve ser requerida junto da entidade onde o funcionário exercia funções. Como se refere no site da DGAEP – Direcção Geral da Administração e do Emprego Público, consultável na internet, «o subsídio por morte tem por finalidade compensar, de imediato, o acréscimo de encargos que se fazem sentir com maior premência logo após a morte do elemento da família, no activo ou aposentado, tendo em vista a reorganização da vida familiar. A responsabilidade da sua atribuição e pagamento compete ao serviço, onde o trabalhador exercia funções. Tratando-se da morte de um aposentado ou reformado compete à CGA a sua atribuição e pagamento ...»
Do que fica referido, impõe-se concluir que, a R., tem interesse directo em contradizer, sendo pois parte legítima.
O recurso merece ser provido.
DECISÃO.
Em face do exposto, decide-se:
a) Conceder provimento ao recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, que será substituída por outra a ordenar o normal prosseguimento da acção.
b) Sem custas, art. 2 nº 1 g) CCJ.
Lisboa, 19 de Fevereiro de 2009.
Manuel Gonçalves
Gilberto Jorge
Maria da Graça Araújo