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SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
DESISTÊNCIA DA INSTÂNCIA
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
Sumário
1. Enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os actos urgentes destinados a evitar dano irreparável. Contudo, a suspensão da instância não impede, em regra, a sua extinção por desistência, confissão ou transacção, desde que não contrariem a sua razão justificativa (artigo 283º, nº 3, do CPCivil). 2. A desistência da instância depende de aceitação do réu, mas se for concretizada antes do oferecimento da contestação/oposição (cfr. art. 296º do CPCivil), é válida, não dependendo de aceitação. 3. A suspensão é consumida pela desistência que tem um efeito mais vasto e definitivo relativamente à instância. Com a desistência, a instância, que até aí se mantinha pendente (embora suspensa) contra o demandado, extingue-se. 4. A habilitação de herdeiros tem carácter instrumental, qual seja o de fazer cessar a suspensão da instância, visando criar condições para que a acção prossiga seus termos, se nisso a parte tiver interesse. (F.G.)
Texto Integral
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I – RELATÓRIO
Na pendência da execução que a CGD move contra H e outros, vieram a falecer dois dos executados, J e C.
Em 17.10.2006 foi proferido despacho que declarou suspensa a instância.
Posteriormente, a CGD veio requerer a desistência da instância quanto aos executados J e C, prosseguindo a execução contra os executados sobrevivos.
Foi, de seguida, proferido despacho, com o seguinte teor: “Encontrando-se a instância suspensa e não tendo ocorrido causa de cessação da suspensão, nos termos do art. 284º, nº1, a) do CPC, indefere-se o requerido”.
Inconformada vem a CGD recorrer da decisão tendo, no essencial, formulado as seguintes conclusões:
1. A presente execução foi instaurada contra 4 executados, todos devedores solidários da quantia exequenda.
2. Os 4 Executados são devedores solidários da quantia exequenda, pelo que se trata de um litisconsórcio voluntário, podendo inclusive a Exequente ter optado, ab initio, por intentar a presente execução apenas contra os executados mutuários, uma vez que, tratando-se de responsabilidade solidária, o cumprimento pode ser exigido a qualquer um dos devedores.
3. Na presente lide executa-se dívida com garantia real - hipoteca - pelo que a execução tem obrigatoriamente que iniciar-se pela penhora e venda do imóvel que garante a dívida, nos termos legalmente previstos.
4. Apenas caso o produto da venda não seja suficiente para ressarcir integralmente a dívida de que é titular a CGD, a execução poderá prosseguir com indicação à penhora de bens ou direitos de que sejam titulares os Executados, sejam os mutuários, sejam fiadores.
5. A Exequente não tem interesse em que contra os herdeiros, prossiga a presente execução, uma vez que não são conhecidos quaisquer bens ou direitos que integrem o património hereditário.
6. A habilitacão processual dos sucessores teria, no presente caso, natureza instrumental, porque com ela criar-se-iam condições para, na eventualidade de a presente execução ter de prosseguir, se poderem indicar à penhora bens ou direitos da herança.
7. Exequente veio então aos autos requerer ao Tribunal que admitisse e desistência da instância quanto àqueles Executados - J e C - devendo a execução prosseguir contra os Executados H e M.
8. A desistência consubstancia um acto livre da parte, e "consome" a suspensão, porque é mais vasta e tem um efeito definitivo relativamente a essas partes, devendo a execução ser extinta, quanto aos dois executados falecidos, na fase em que se encontrar - neste caso suspensa.
9. A suspensão penaliza quer a Exequente, que não que não recebe o seu crédito, quer os Executados sobrevivos, uma vez que a dívida aumenta diariamente podendo, no limite, não resultar integralmente paga com o produto da venda, ou seja, quanto mais a presente execução se arrasta maior a probabilidade de a mesma vir a prosseguir com indicação à penhora de outros bens ou direitos dos executados sobrevivos.
10. O despacho proferido a fls. 141 dos autos, ao indeferir a requerida desistência da instância contra os Executados J e C, violou, nomeadamente, o art. 287, alínea d) do Código do Processo Civil.
11. Deve ser concedido provimento ao recurso e substituída a decisão recorrida, devendo a requerida desistência ser aceite, extinguindo-se a instância quanto aos executados J e C e prosseguindo contra os exeuctados sobrevivos.
Corridos os Vistos legais, Cumpre apreciar e decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido definem o objecto daquele – vd. arts. 684º, n.º 3, 690º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil – é questão proposta à resolução deste Tribunal, a de saber se é possível a desistência da instância que se encontra suspensa, em processo executivo, relativamente a dois dos executados.
II – FUNDAMENTAÇÃO
No caso vertente, na pendência da execução, dois dos executados faleceram. Declarada suspensa a instância, veio a Exequente requerer a desistência da instância em relação a tais executados, por não ter interesse que a execução prossiga contra os eventuais herdeiros destes executados.
A questão que se coloca é a de saber se, estando suspensa a instância, pode a parte, no caso o exequente, desistir da instância.
1. Analisemos, então, os referidos institutos da suspensão e da desistência da instância.
Uma das causas de suspensão da instância é o falecimento de alguma das partes, (artigos 276º, nº 1, alínea a), e 277º, nº 1, do CPC). Declarada a suspensão da instância, os seus efeitos reportam-se ao momento em que foi feita a prova no processo, do falecimento da parte (artigo 277º, nº 2, do CPC).
A suspensão só cessa, no caso de decesso de parte, quando for notificada a decisão em que se considerem habilitados os sucessores daquela (artigo 284º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil). A suspensão da instância visa que as partes removam os obstáculos que a determinaram, o que impõe a habilitação dos sucessores da parte que faleceu, a fim de com eles continuar a acção, o incidente ou o recurso, conforme os casos.
Por outro lado, nos termos do art. 287º, al. d) do CPCivil, a instância extingue-se por desistência, sendo que esta é uma das consequências do princípio dispositivo (cfr. art. 264º do CPCivil)[1].
Decorre do disposto no art. art. 295º do CPCivil, que a desistência, tanto pode ser do pedido, como da instância, sendo que da primeira resulta a extinção do direito que se pretendia fazer valer, enquanto a segunda apenas faz cessar o processo que se instaurara. A diferença entre ambas não se confina apenas ao seu efeito, mas também ao seu regime. Na realidade, enquanto a desistência do pedido é livre, ainda que não prejudicando a reconvenção, já a desistência da instância depende de aceitação do réu, desde que tenha sido concretizada após o oferecimento da contestação (cfr. art. 296º do CPCivil). Ou seja, a desistência da instância, enquanto não foi oferecida contestação/oposição, é livre e, consequentemente, operante, não dependendo de aceitação. 2. No caso sub judice, estando suspensa a instância, por falecimento de dois dos executados, pretende o Exequente, (alegadamente por não ter apurado a existência de bens ou direitos na herança aberta por óbito dos referidos executados e por desconhecer os seus herdeiros), que a execução seja declarada extinta em relação a estes.
Enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os actos urgentes destinados a evitar dano irreparável. Contudo, a suspensão da instância não impede, em regra, a sua extinção por desistência, confissão ou transacção, desde que não contrariem a sua razão justificativa (artigo 283º, nº 3, do CPCivil).
Os presentes autos encontram-se suspensos por morte de dois dos executados, pretendendo a Exequente desistir quanto aos mesmos, sendo certo que não lhes foram penhorados quaisquer bens e que os falecidos executados não intervieram nos autos, nomeadamente opondo-se à execução, como se constatou pela consulta do processo executivo que, para o efeito, se solicitou à 1ª instância.
Logo, no caso, a desistência da instância é livre não dependendo de aceitação (art. 296º, nº 1 do CPCivil).
Ademais, como assinala a Recorrente e decorre do disposto no art. 283º, nº 3 do CPC, a suspensão é, no fundo, consumida pela desistência que tem um efeito mais vasto e definitivo relativamente à instância. Com a desistência, a instância, que até aí se mantinha pendente contra o demandado (embora suspensa), extingue-se, cessa.
Tal como refere a Agravante a habilitação dos herdeiros tem um caracter instrumental, no sentido de sanar o problema da legitimidade que se cria com a morte de uma das partes.
A promoção da habilitação dos herdeiros da parte falecida, só faz sentido se a parte sobreviva pretender fazer cessar a suspensão determinada pelo falecimento da parte, criando condições para que a acção prossiga, agora contra os habilitados herdeiros, que tomam o lugar da parte falecida. Porém, no caso, a Exequente não pretende que a execução prossiga contra os herdeiros, pelo que não tem interesse em promover a habilitação dos herdeiros dos Executados falecidos.
Não se vislumbram, portanto, razões para manter a suspensão da instância. Apenas no caso de a Exequente ter interesse no prosseguimento da execução se justificaria fosse deduzido o incidente em causa. Doutro modo, uma vez que, como se referiu, a desistência não depende de aceitação, obrigar o exequente a promover a habilitação de herdeiros, sem que pretenda que a execução prossiga contra estes herdeiros, envolveria a prática de actos inúteis que a lei não consente.
3. Tão pouco existem razões que justifiquem a necessidade de a execução prossiguir contra todos os executados contra quem foi promovida a execução.
Com efeito, consultados os autos de execução, verifica-se que o título executivo que serve de base à execução, consubstancia um contrato de mútuo outorgado com a CGD em 24.11.1989 (cfr. fls. 6 e segs da execução), sendo certo que os dois primeiros executados, (executados sobrevivos) intervieram no referido contrato na qualidade de mutuários e os executados João e Cecília subscreveram o dito contrato enquanto fiadores.
Estes executados assumiram, no dito contrato, a qualidade principais pagadores, ou seja, atribuem à fiança prestada natureza solidária (cfr. art. 640º do CCivil).
Por isso, tendo a obrigação dos fiadores em causa natureza solidária, como refere o Recorrente, a prestação pode ser exigida pelo credor a qualquer um dos devedores solidários, atento o art. 519° n°1 do Código Civil, tratando-se de uma situação de litisconsório meramente voluntário, nos termos do artigo 27° n°2 do CPCivil
Ademais, como faz notar o Recoorente, estando em causa uma dívida com garantia real, incidindo a garantia sobre um imovel pertencente aos Executados mutuários, a execução tem obrigatoriamente que começar pela penhora e venda do bem que garante a dívida. Pertencendo esse bem aos Executados sobrevivos, também não se coloca nenhum obstáculo relativamente à legitimidade passiva das partes.
Justifica-se, por tudo isto, que a requerida desistência da instância seja homologada, devendo a execução prosseguir seus termos apenas contra os identificados executados sobrevivos.
Concluindo:
1. Enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os actos urgentes destinados a evitar dano irreparável. Contudo, a suspensão da instância não impede, em regra, a sua extinção por desistência, confissão ou transacção, desde que não contrariem a sua razão justificativa (artigo 283º, nº 3, do CPCivil).
2. A desistência da instância depende de aceitação do réu, mas se for concretizada antes do oferecimento da contestação/oposição (cfr. art. 296º do CPCivil), é válida, não dependendo de aceitação.
3. A suspensão é consumida pela desistência que tem um efeito mais vasto e definitivo relativamente à instância. Com a desistência, a instância, que até aí se mantinha pendente (embora suspensa) contra o demandado, extingue-se.
4. A habilitação de herdeiros tem carácter instrumental, qual seja o de fazer cessar a suspensão da instância, visando criar condições para que a acção prossiga seus termos, se nisso a parte tiver interesse.
IV – DECISÃO Termos em que se acorda em conceder provimento ao agravo e em consequência, homologa-se a presente desistência da instância , extinguindo-se a instância quanto aos executados J e C, prosseguindo a execução contra os executados sobrevivos, H e M. Custas da desistência pela Exequente.
Não são devidas custas com o presente agravo.
Lisboa, 5 de Março de 2009.
(Fátima Galante)
(Ferreira Lopes)
(Manuel Gonçalves)
______________________________ [1] Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares do Processo Civil, pág. 373 e 374; Lebre de Freitas, CPC Anotado, vol. 1º, pág. 524.