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TELECOMUNICAÇÕES MÓVEIS
PRESTAÇÃO
PAGAMENTO
PRESCRIÇÃO
Sumário
I. A exclusão prevista pelo art.º 128, n.º1, da Lei n.º 5/2004, de 10.02 não é aplicável aos contratos cuja celebração e execução ocorreu à luz do regime anterior. II. o âmbito de aplicação da Lei 23/96, de 26 de Julho (redacção anterior à introduzida pela Lei 5/2004, de 10 de Fevereiro) inclui o serviço de telefone móvel. III. O n.º1 do art.º 10 da Lei 23/96, de 26/07, ao estatuir que o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação, prevê uma prescrição de tipo extintivo, não tendo cabimento a prescrição instituída no Código Civil, designadamente no seu art. 310º, al. g), de natureza presuntiva.
(sumário da Relatora)
Texto Integral
Acordam na Relação de Lisboa
Apelante/R: C
Apelada/A: B, SA.
I. Pedido: condenação do R. no pagamento da quantia de € 5.426,62, acrescida de juros moratórios já vencidos, no valor de € 895,26 , a acrescer aos vincendos.
Alega, em síntese, que: no exercício da sua actividade, prestou ao R. serviços de telecomunicações, no âmbito de um contrato celebrado em 11.02.2002, segundo o qual o R. deveria pagar o respectivo preço no prazo de 15 dias, a contar da data das respectivas facturas; apesar de várias vezes instado para pagar, o R. está a dever à A. o montante de € 5.012,70, relativos a serviços prestados; ainda no exercício da sua actividade, prestou serviços ao R., na sequência de 2 contratos celebrados em 09.02.2002, nos termos dos quais o R. se comprometia a permanecer na B durante 1 ano; não obstante, os serviços foram desactivados por falta de pagamento, havendo assim lugar ao pagamento de uma penalidade no montante de € 413,92, pagamento esse que, até ao momento, não foi feito; ao não cumprir atempadamente as suas obrigações, o R. incorreu em mora, devendo assim pagar à A. os respectivos juros moratórios que, à data da propositura da acção, ascendiam a € 895,26.
Goradas as tentativas para localizar o R., foi este citado editalmente (fls.74 a 94).
Foi citado o MP, nos termos do art.º 15.º CPC, tendo apresentado contestação, alegando a prescrição das dívidas pedidas pela A.
A A. respondeu à excepção deduzida, pugnando pela sua improcedência.
Foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu da excepção invocada, tendo a mesma sido julgada improcedente.
Inconformado com tal decisão, veio o MP interpor recurso, tendo apresentado as suas alegações.
A A., por sua vez, apresentou contra-alegações.
Foi proferida sentença que, julgando procedente a presente acção, condenou o R. a pagar à A., B , SA, a quantia de € 5.426,62, acrescida de juros à taxa legal civil, de 7% , desde o vencimento de cada uma das facturas referidas, até 30 de Abril de 2003, e de 4% a partir dessa data e até integral pagamento.
No presente recurso de apelação, o MP formula as seguintes conclusões:
1. Mediante decisão proferida em 29.10.08, foi julgada improcedente a invocada excepção peremptória da prescrição dos créditos resultantes da prestação ao R. de serviços telefónicos.
2. Considerou o tribunal recorrido que o prazo de seis meses a que alude o art.º 9.º DL 381-A/97, de 30.12, apenas se refere à apresentação das facturas; se estas forem enviadas nesse prazo, interrompe-se o decurso de tal prazo de prescrição, iniciando-se, então, o prazo de prescrição de cinco anos previsto no art.º 310.º/g) CC.
3. Tal entendimento ofende o disposto no art.º 9.º/4/5 do DL 381-A/97.
4. A lei 23/96, de 26.07, consagra que os créditos periódicos provenientes da prestação de ser viços públicos essenciais – como ali é considerado o serviço de telefone – prescrevem no prazo de seis meses após a sua prestação (art.º 1.º/2/d) e art.º 10.º/1).
5. Acrescendo ao estatuído pela lei 23/96, o DL 381-A/97, de 30.12 (regulador da actividade de todos os operadores de serviços de telecomunicações de uso público), no seu art.º 9.º/4, dispõe que o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.
6. Neste jaez, nos limites desse prazo – 6 meses – deve o utente pagar o montante respectivo, sob pena de incorrer em mora – art.º 804.º/2 CC.
7. A factura funcionará, assim, como interpelação ao utente para pagar o serviço prestado.
8. Em nosso entender, o n.º 5 do art.º 9.º do DL 381-A/97, de 30.12 significa que com a apresentação da factura, o assinante tem-se por interpelado para cumprir, o que releva, naturalmente, para o momento da constituição em mora, nos termos do art.º 805.º CC, e não para a prescrição do direito de exigir judicialmente o seu cumprimento.
9. Prestado o serviço, a obrigação é exigível, começando a correr o prazo da prescrição – art.º 306.º CC.
10. Conforme resulta do disposto no n.º 1 do art.º 323.º CC, tal prazo não se interrompe com a interpelação para cumprimento.
11. Com efeito, a interpelação do credor ao devedor, relevante no que toca ao vencimento da divida, não produz o efeito interruptivo da prescrição.
12. Ou seja, o prazo prescricional inicia-se com a prestação mensal do serviço e não após a sua facturação.
13. Note-se que a redacção do n.º 4 do art.º 9.º DL 381-A/97, reproduziu, na íntegra, o disposto no n.º 1 do art.º 10º da Lei 23/96.
14. Assim, não se compreenderia por que motivo o legislador retomou a redacção do n.º 1 do art.º 10.º da lei 23/96, para depois se concluir que o prazo prescricional ali referido corresponde ao direito de apresentar a factura e não ao crédito nela titulado, ao qual se continuaria a aplicar o prazo estabelecido na al. g) do art.º 310.º CC.
15. Tal interpretação não faria sentido e levaria a que se tivesse por inútil e destituído de efeito o disposto na Lei 23/96.
16. Teríamos, assim, que todos os direitos de crédito emergentes da prestação de serviços públicos prescreveriam no prazo de seis meses, excepto os direitos de crédito resultantes da prestação de serviços de telefone – considerado um serviço público essencial – os quais prescreveriam em cinco anos.
17. Em suma, através de um diploma regulamentar, o legislador derrogaria o regime geral destinado a proteger o utente de todos os serviços públicos essenciais.
18. Atento o exposto, afigura-se-nos manifesto, por não se vislumbrarem razões em contrário, que os créditos periódicos resultantes da prestação de serviço de telefone – fixo ou móvel – passaram a prescrever no prazo de seis meses contado do momento da sua prestação.
Por sua vez a A. nas contra-alegações, formula as seguintes conclusões:
1. A lei 23/96 de 26.07, não tem aplicação ao caso sub judice.
2. A recorrida apresentou à recorrente as facturas em débito no prazo de seis meses previsto no DL 381- A/97.
3. O n.º 4 do art.º 9 do DL 381-A/97 não obriga a que o devedor seja demandado judicialmente no prazo de seis meses, pelo que não há qualquer prescrição do crédito.
4. A recorrente tinha o prazo de cinco anos previsto no art.º 310.º/g) CC para exigir judicialmente o pagamento.
5. A recorrente instaurou a acção judicial muito tempo antes do decurso do prazo prescricional.
II.1. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir a questão de saber se, no caso concreto, se aplica o prazo prescricional de seis meses previsto, na Lei 23/96 de 26.07 ou, antes, o prazo prescricional de 5 anos, previsto no art.º 310.º g) do CC.
II.2. Com interesse para a decisão da causa, consideram-se assentes os seguintes factos:
1. A A. é uma sociedade comercial que se dedica, inter alia, ao fornecimento de bens e serviços, nomeadamente, de comunicações móveis terrestres.
2. No âmbito da referida actividade, a A. celebrou, em 11.02.2002, com o ora R., um acordo de prestação do serviço móvel terrestre.
3. A A. procedia à facturação dos serviços prestados ao R., ficando este vinculado a pagar as facturas enviadas pela A.
4. A A. emitiu as seguintes facturas, enviadas para a morada indicada pelo R. aquando da celebração do contrato, que não foram, até ao momento, pagas por este:
· facturas/recibo n.º 359924390, emitida a 21.02.2003, no valor de € 1.942,75, com data limite de pagamento em 26.03.2003;
· factura/recibo n.º 36425472, emitida a 20.03.2003, no valor de € 1. 623,17, com data limite de pagamento em 09.05.2003;
· factura/recibo n.º 36893532, emitida em 19.04.2003, no valor de € 1.001,53, com data limite de pagamento em 03.06.2003;
· factura/recibo n.º 37294845, emitida em 19.05.2003, no valor de € 445,45, com data limite de pagamento a 30.06.2003.
5. O R, obrigou-se a manter o vínculo contratual durante um período de 24 meses na sequência de acordos celebrados com a A. em 09.02.2002, quanto aos n.º 91 662 4898 e 91 736 9080.
6. A A. desactivou os cartões de acesso acima identificados e emitiu a factura n.º 37682277, datada de 19.06.2003, com data limite de pagamento em 21.07.2003, com o valor cujo descritivo é “quebra contrato permanência”, de € 413,92, com IVA à taxa legal.
7. A presente acção foi proposta em 03.11.2004, tendo o R. sido citado editalmente em Maio de 2008 e, em 12.09.2008 o MP, nos termos do art.º 15.º do CPC.
II.3. Apreciando:
Vem o MP recorrer da decisão proferida pelo tribunal a quo a fls. 113 a 116. alegando que a mesma deve ser revogada, com fundamento na prescrição das dívidas accionadas.
Para tanto, alega que, ao caso concreto, deve ser aplicado o DL 381-A/97, no sentido de considerar que o tipo de dívidas em causa prescrevem no prazo de seis meses a contar da prestação do serviço e não no prazo de cinco anos após interpelação ao devedor para cumprir.
Do que se trata é saber qual o âmbito de aplicação da Lei 23/96, de 26 de Julho (redacção anterior à introduzida pela Lei 5/2004, de 10 de Fevereiro) e se aí se inclui o serviço de telefone móvel.
Afigura-se-nos que a resposta é afirmativa.
Sob a epígrafe âmbito e finalidade dispõe-se no art. 1º, da Lei nº 23/96: 1. A presente lei consagra regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do utente; 2. São os seguintes os serviços públicos abrangidos: (...) d) Serviço de telefone.
Como tem sido lembrado em anteriores decisões, esta Lei teve na sua génese a Proposta de Lei nº 20/VII, apresentada pelo Governo à Assembleia da República ([1]). Como resulta do debate parlamentar, inicialmente, a Proposta aludia apenas a serviço fixo de telefone e a razão de ser da alteração teve precisamente a ver com a necessidade de incluir o serviço de telefone móvel no perímetro da Lei ([2][3]). Por outro lado, a própria Lei, ao disciplinar os deveres de informação, a cargo dos operadores de serviços de telecomunicações, alude expressamente – no art. 4º, nº2 – à «rede móvel», o que reforça a ideia de não ter querido deixar fora do seu âmbito os serviços móveis de telefone. Também os artigos 2º e 4º, n.º 2, a), do Regulamento de Exploração dos Serviços de Telecomunicações de uso público, aprovado pelo Dec. Lei nº 290-B/99, de 30 de Julho, qualificam expressamente como serviços de uso público os serviços de telecomunicações móveis, pelo que não pode subsistir dúvida de que o serviço de telefone móvel terrestre é um serviço de uso público e, por essa razão, sujeito ao regime da Lei nº 23/96.
Também neste sentido se colhe do Ac RL 2296/2008[4]: o Ac. da Relação de Lisboa de 20.06.2006[5], quanto a esta matéria, vem salientar que a privatização de todos os operadores de serviço telefónico, rouba sentido à distinção […] entre serviço de telefone fixo e serviço de telefone móvel.
Por conseguinte, atendendo à ratio legis da presente Lei (protecção dos utilizadores), bem como aos trabalhos preparatórios é manifesto que a Lei 23/96, ao referir no seu art. 1º, nº 2, al. d) o “serviço de telefone” abarca também, na sua previsão, o serviço de telefone móvel ([6]).
Assim sendo, ao caso em apreço é perfeitamente aplicável o disposto no art.º 10.º, n.º1, da mencionada Lei, o qual dispõe expressamente que… O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação….
De qualquer modo, a questão fulcral acaba por centrar-se na interpretação a dar ao disposto no DL 381-A/97 de 30 de Dezembro (que regulou o regime de acesso à actividade de operador redes públicas telecomunicações e prestador de serviço de telecomunicações de uso público), especialmente o seu art.º 9.º, n.º4 e n.º5, ainda que revogada posteriormente pela Lei 5/2004, de 10 de Fevereiro, uma vez que esta última é posterior aos factos em causa e, logo, só dispõe para o futuro.
Ora, o referido n.º4 do art.º 9.º acaba por reproduzir, ipsis verbis, o já mencionado art.º 10.º n.º1 da Lei 23/96, de26 de Julho. Contudo, uma inovação veio a ser introduzida pelo n.º5 do mesmo artigo, a de que … Para os efeitos do número anterior, tem-se por exigido o pagamento com a apresentação de cada factura … . Entendimentos diversos têm sido sustentados tanto na doutrina como na jurisprudência acerca do objecto da prescrição aqui estabelecida e do significado e valor que devem ser atribuídos à exigência de pagamento feita através da apresentação de cada factura, prevista no segundo dos dispositivos legais referidos. Uns, perfilhando a tese de Calvão da Silva[7], entendem que o prazo de seis meses em causa, contando-se a partir da prestação do serviço, se reporta tanto à apresentação da factura como ao exercício judicial do direito de crédito, dando lugar a sua inobservância à prescrição – extintiva - do direito. Este regime especial afasta, pois, a aplicação do art. 310º, al. g) do C. Civil às dívidas emergentes da prestação dos serviços em causa.[8] Uma segunda linha, em tudo o mais coincidente com a acabada de referir – seja quanto à natureza da prescrição, seja quanto à exclusão de aplicação a estes casos do regime do art. 310º, al. g) do C. Civil - entende, porém, que a apresentação da factura a pagamento no prazo de seis meses contados a partir da prestação do serviço gera a interrupção da prescrição, iniciando-se, a partir de então, um novo prazo de seis meses para a prescrição. Segundo outros, na esteira do entendimento preconizado por Menezes Cordeiro[9], o legislador ao instituir a prescrição de seis meses em apreço teve em mente, não o direito de crédito emergente da prestação dos serviços em causa – aí teria referido o direito ao preço -, mas apenas o direito de exigir o pagamento, ou seja, de enviar a factura respectiva. Não sendo enviada no prazo de seis meses a contar da prestação, presume-se que a remessa foi feita e que a factura foi paga; mas se tiver ocorrido o envio dentro desse prazo, a exigência do pagamento foi feita em tempo, caindo-se então no âmbito da prescrição, esta de natureza extintiva, do art. 310º, al. g) do C. Civil.[10]
Como se vê, a posição do MP, ora recorrente, vai no sentido do primeiro dos três entendimentos acima referidos.
Salvo melhor opinião, entendemos também ser esta a posição a acolher. Tal como refere Calvão da Silva, a prescrição em causa tem natureza extintiva e não meramente presuntiva. A de natureza presuntiva é excepção, assumindo a prescrição, em regra geral a natureza extintiva ou liberatória, sendo que no caso nada no texto da lei consente a conclusão de que se esteja perante uma mera presunção de cumprimento, como o são as prescrições presuntivas excepcionalmente tipificadas na lei – arts. 312º e segs. do Código Civil. Ademais, porque se está perante obrigações em que é enviada factura ao devedor e o documento de quitação, não se verifica quanto a elas uma das razões determinantes da existência das prescrições presuntivas – a protecção do devedor contra o risco de ter de pagar duas vezes uma dívida cujo pagamento costuma ser feito sem que se exija o correspondente recibo ou sem que se guarde o mesmo por muito tempo.[11] E não existem, segundo cremos, razões para distinguir entre prescrição “do direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado” e prescrição do crédito correspondente ou, ainda, do preço respectivo. Porque só existe direito de exigir o pagamento do preço quando ainda não decorreu o prazo de prescrição do correspondente crédito, quando se fala na prescrição do primeiro está a falar-se na prescrição do segundo. É que a prescrição, quando completada, não determina, em bom rigor, a extinção do direito; apenas gera, como se vê do nº 1 do art. 304º do Código Civil, para o respectivo beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito, não podendo, por outro lado, ser repetida a prestação realizada espontaneamente em cumprimento de uma obrigação prescrita – nº 2 do mesmo dispositivo legal. A prescrição não extingue a obrigação, “mas somente o meio de exigir o seu cumprimento e execução, ou seja, a acção creditória (art. 817º do Código Civil), restando assim uma obrigação sem acção”,[12] uma obrigação natural. Porque o decurso do prazo de prescrição sempre determina a extinção do direito de exigir o cumprimento da prestação – no caso o pagamento do preço dos serviços prestados – e não a extinção do correspondente direito, não faz sentido ver na estabelecida prescrição “do direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado” algo de diferente da prescrição do correspondente direito. Como a este propósito se escreve no acórdão do STJ de 4.10.2007, já acima referenciado, sendo a prescrição em causa de natureza extintiva, não faz “muito sentido estar a considerar relevantes para a extinção do mesmo direito substancial, o direito ao crédito, dois momentos diferentes. O decurso do prazo de prescrição sempre extingue o direito de exigir judicialmente o pagamento, mas não o direito ao pagamento. Já seria naturalmente possível essa distinção se, como sustenta Menezes Cordeiro, fosse meramente presuntiva aquela prescrição de seis meses.” Concluímos, pois, que a prescrição em causa tem natureza extintiva, o seu prazo de seis meses conta-se a partir da prestação do serviço e, sendo ela a aplicável, não tem cabimento a prescrição instituída no Código Civil, designadamente no seu art. 310º, al. g)[13].
E qual o sentido a dar à referida inovação introduzida pelo já mencionado n.º5 do art.º 9.º? Também quanto a este ponto duas correntes jurisprudenciais se vêm desenhando. Entendem uns que a apresentação da factura, valendo como exigência de pagamento e, portanto, como interpelação para cumprir apenas pode gerar a mora do devedor, caso este não satisfaça a obrigação no prazo indicado pelo credor; mas nunca poderá servir para interromper a prescrição, efeito que só poderá ser obtido pelas vias consagradas no Código Civil, designadamente nos seus arts. 323º, nº 1, 324º e 325º.[14] Outros, considerando que no citado nº 4 do art. 9º se fala no direito de exigir o pagamento e logo de seguida, no nº 5, se diz que se considera exigido o pagamento e isto para efeitos do número anterior, entendem que “o único sentido útil, lógico e correctamente expresso é o de que a exigência do pagamento constitui acto adequado a interromper a prescrição, a acrescer aos previstos nos arts. 323º a 325º do Código Civil”[15] Parece-nos ser este o entendimento mais correcto, sob pena de não se atribuir qualquer significado à expressão “para efeitos do número anterior” feita constar no nº 5 do art. 9º depois de equiparar a apresentação da factura à exigência de pagamento; como se escreveu no último dos citados acórdãos do STJ, tal expressão, naquele concreto enquadramento, só pode ser interpretada como querendo significar “para os efeitos de evitar a prescrição”[16].
No caso sub judice, verifica-se que as facturas em causa foram emitidas e enviadas para o R. entre 21.02.2003 e 19.06.2003, tendo a presente acção sido interposta apenas em 03.11.2004 (a citação ocorreu apenas em 2008), pelo que é manifesto que já há muito que havia decorrido o prazo prescricional de 6 meses, estando, pois, prescrito o direito de crédito da A. pelos serviços prestados, o que impõe a revogação da decisão em análise e, consequentemente, a perda de efeito da sentença final.
III. Pelo exposto, e de harmonia com as disposições legais citadas, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida e, em consequência fica sem efeito a sentença final, absolvendo-se o R. do pedido.
Custas pela apelada.
Lisboa, 7 de Julho de 2009
Amélia Alves Ribeiro
Arnaldo Silva
Graça Amaral
[1] Esta Proposta de Lei está publicada no Diário da Assembleia da República, II Série-A, nº 33, de 4 de Abril de 1996 e os termos do debate parlamentar sobre esta proposta, podem consultar-se no mesmo Jornal Oficial, I Série, nº56, de 12 de Abril de 1996. [2] Para mais desenvolvimentos, cf. Calvão da Silva, RLJ, ano 132º, 138 e ss. [3] Ac RL na Ap. 10791/08: Des. Maria do Rosário Morgado. [4] De 01.07.2008: Des. Rosa Maria Ribeiro Coelho. [5]Processo nº 4914/2006 -7. Relator: Desembargador Luís Espírito Santo. Disponível em www.dgsi.pt. [6] Note-se que a actual redacção da al. d), do art. 1º, da Lei 23/96 (introduzida pela Lei 12/2008, de 26 de Fevereiro) ao referir-se a «serviços de comunicações electrónicas» vê o seu âmbito ainda mais alargado [7] RLJ, ano 132º, nºs 3901 e 3 3902, págs. 138 e segs. e 152 e segs., em anotação a acórdão da Relação de Lisboa. [8] Adoptaram esta tese nas suas linhas essenciais o recente acórdão do STJ de 4 de Outubro de 2007, relatado pela Sra. Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, acessível na há já citada base de dados, Processo 07B1996, e os acórdãos do mesmo STJ de 6 de Julho de 2006, relatado pelo Sr. Conselheiro Oliveira Barros, de 5.06.2003, relatado pelo Sr. Conselheiro Pires da Rosa e de 6.02.2003 relatado pelo Sr. Conselheiro Sousa Inês e da Relação de Lisboa de 12.05.05, relatado pelo Sr. Desembargador Ilídio Sacarrão Martins, todos acessíveis em www.dgsi.pt. [9]Em “O Direito”, ano 133º “Da prescrição do pagamento dos denominados serviços públicos essenciais, pág. 769 e segs. e 805 e segs. [10] Na nossa jurisprudência, adoptaram esta tese, entre outros, o recente acórdão do STJ de 2.10.2007, relatado pelo Sr. Conselheiro Mário Cruz, acessível em www.dgsi.pt, Proc. 07A2656 e o acórdão desta Relação já acima citado ainda o relatado pela Sra. Desembargadora Isabel Salgado acessível na mesma base de dados, datado de 20.05.2008 e com o nº de Processo 2023/2008-7. Apud cit. Ac RL 2296/2008. [11] Antunes Varela, RLJ, ano 103º, pág. 254. [12] Calvão da Silva na anotação citada, a pág, 152. [13] Ac RL 2296/2008: Des. Rosa Maria Ribeiro Coelho. [14] Neste sentido, cfr., designadamente, os já citados acórdãos do STJ de 6.07.2006, relatado pelo Sr. Conselheiro Oliveira Barros; na doutrina Calvão da Silva no já citado trabalho. [15] Acórdão do STJ já referenciado, datado de 6.02.2003 e relatado pelo Sr. Conselheiro Sousa Inês. No mesmo sentido se pronunciou também o acórdão do mesmo Tribunal de 13.05.2004, relatado pelo Sr. Conselheiro Silva Salazar, acessível em WWW.dgsi.pt. e, ainda, os acórdãos desta Relação de 12.05.2005, relatado pelo Sr. Desembargador Ilídio Sacarrão Martins, de 27.09.2007, relatado pelo Sr. Desembargador Jorge Leal e de 4.10.2007 relatado pelo Sr. Desembargador Borges Carneiro, todos acessíveis na mesma base de dados. O mesmo parece também ser admitido pelo acima citado acórdão do STJ de 5.06.2003, relatado pelo sr. Conselheiro Pires da Rosa. [16] Ac RL 2296/2008: Des. Rosa Maria Ribeiro Coelho.