SIMULAÇÃO
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
Sumário

Na venda de um imóvel por um preço manifestamente inferior ao preço de mercado há que demonstrar que os contraentes tiveram a intenção de beneficiar gratuitamente o comprador com a diferença de valor entre as duas prestações.
(Sumário do Relator - V.G.)

Texto Integral

Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa
I – RELATÓRIO
APELANTE/AUTOR: B...
APELADOS/RÉUS: C...; BANCO, S.A.;  
Todos com os sinais dos autos.
*
O Autor propôs contra os Réus a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário que aos ... foi distribuído na 1.ª espécie ao ...juízo cível do Tribunal de Família e de Menores e de Comarca de Cascais, com o valor de € 244.800,00, onde pede a declaração de nulidade com o fundamento previsto na alínea a) do art.º 16 do Código de Registo Predial e ordenado o respectivo cancelamento da inscrição correspondente à fracção “H” do prédio urbano descrito na matriz da freguesia de Cascais sob o art.º ... e descrito no n.º ... da mesma freguesia na ... Conservatória do Registo Predial..., provisória por natureza a favor de D... e cancelamento das inscrições C-6 e C-7 da Casa Um do mesmo prédio, provisórias por natureza a favor do Banco, SA, por as mesmas serem dependentes de um registo de aquisição provisória por natureza nulo, em suma alegando:
· O A. é sócio-gerente da 1.ª Ré e o 2.ª Réu é também sócio gerente da 1.ª Ré e o 3.ª é filho do 2.º Réu, o 4.º será credor do 3.º Réu com hipoteca registada sobre o prédio acima descrito.
· A 1.ª Ré tem por objecto social a promoção, construção comercialização e investimentos imobiliários, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, a importação e exportação de materiais de construção civil e é proprietária das fracções “A” e “H” do prédio acima descrito.
· Em 13/12/02 o 2.º Réu, alegadamente em representação da 1.ª Ré e na qualidade de sócio-gerente apresentou na ... Conservatória do Registo Predial ... uma requisição de registo declarando vender a seu filho. 3.ª Réu a fracção “H”, casa 8 descrita sob o n.º ...da freguesia de Cascais, onde declara que pretende o registo da aquisição provisória por natureza a favor do 3.º Réu da fracção mencionada e que o preço a pagar pela alegada venda foi declarado no valor de € 249.398,95 (por lhe ter prometido vender).
· No mesmo dia o 3.º Réu, representado pelo seu pai, 2.º réu declarou constituir a favor do 4.º réu, o Banco, SA, hipoteca provisória sobre a fracção acima identificada como garantia de um empréstimo que alegadamente lhe terá sido concedido no valor de € 249.388,95, declarando ainda o 3.º Réu constituir outra hipoteca sobre a referida fracção a favor do 4.º Réu, como garantia de empréstimo de € 124.699,47, tendo sido lavradas as respectivas inscrições.
· A declaração de intenção de venda, pelo preço de € 249.398,95 é falsa posto que se reporta a uma doação e não a uma venda, já que não entrará qualquer valor nos cofres sociais da 1.ª Ré, em prejuízo dos seus sócios, o Autor, porquanto o outro sócio, ora 2.ª réu, pretende transferir o património da sociedade para a sua família.
· O valor comercial real do imóvel em causa varia entre os € 550.000,00 e os € 650.000,00, conforme as circunstâncias do mercado e a oportunidade de venda e o preço declarado é apenas um artifício para aparentar que se está a fazer uma compra e venda, pelo que é preciso declarar um preço, uma ficção de venda, tem de ser suficientemente baixa para ser baixo o valor da SISA a pagar mas não tão baixo que desperte a desconfiança das autoridades fiscais, tendo em conta que - coincidência!... o valor patrimonial da fracção é de € 244.800.
· Ocorre uma tentativa do 2.º Réu de transferir gratuitamente para a sua família o que for possível do património da 1.ª Ré já que não o pode fazer directamente para si, 2.º Réu sem autorização dos outros sócios.
· Os empréstimos se existirem e estiverem garantidos por hipoteca no que se não concede, o produto dos mesmos não foi utilizado na aquisição da fracção mas para qualquer outro fim, porquanto o valor do preço da venda declarada nunca deu entrada nos cofres sociais acrescentando o facto de o 3.º Réu estar a usufruir um crédito à habitação mais favorável que o crédito bancário geral.
· Sendo o negócio dissimulado, realmente querido, uma doação, o 2.º Réu como sócio-gerente da 1.ª Ré não tem sozinho, isoladamente, poderes para fazer tal declaração, mesmo que só para efeitos registrais, pois é exigida uma deliberação favorável dos restantes sócios, devendo o Conservador exigir uma acta da assembleia geral deliberando autorizar a doação ou declarações de todos os demais sócios, por estas não integrarem o objecto social. Desta forma haveria que fazer a conversão no negócio dissimulado que é a doação mas esta contraria a lei (art.ºs 246/2/c do CSC e pacto social) sendo, por conseguinte nula (art.º 294 do cCiv).
· Com a venda simulada e a “real” doação (“dissimulada”) iria desaparecer um importante activo do património social sem que entrasse nos cofres sociais o valor correspondente ao valor comercial, de mercado, da fracção, o qual em condições normais e não fora a declaração cuja nulidade se pretende ver declarada, iria integrar os lucros a que os sócios têm direito
Por requerimento autónomo posterior veio o Autor requerer a rectificação do art.º 27 da p.i. no segmento que passa a ser: “nunca deu nem dará entrada nos cofres sociais.”
O Réu C... veio contestar, excepcionando a incompetência relativa do Tribunal e impugnando em suam dizendo:
· Entre A. e R. foi firmado uma “joint venture” com vista ao desenvolvimento, construção e venda de um projecto de habitação em Portugal denominado Urbanização Quinta ..., onde as partes estabeleceram um comité de gestão composta por A e Réu, tendo sido acordado que os diferendos entre as partes devem ser submetidos à arbitragem, nos termos do art.º 99 do CPC cuja violação por força do disposto no art.º 108 do CPC determina a incompetência relativa do Tribunal; A e R combinaram, logo no início do projecto que cada um ficava com uma vivenda pelo preço de 50 mil contos (€244.398,95), cada um pediu empréstimo em finais de 2001 no valor de 75 mil contos, tendo o do R. sido aprovado e concedido.
· A declaração de venda em causa é perfeitamente válida e consubstancia uma promessa de compra e venda e não uma promessa de doação, sendo que a correspondente compra e venda com mútuo foi já outorgada em 1/04/2003, tendo o respectivo produto de venda entrado nos cofres da sociedade E....
· O A. só em Março de 2003 conseguiu o empréstimo para a concretização do projecto da joint venture mas não concretizou a operação bancária o que deixou o Réu aflito para levar a boa conclusão o projecto “Quinta ...” que ambos se comprometeram a concretizar (o Autor, tal como o Réu que cumpriu comprometera-se a ficar com uma vivenda, precisamente a fracção A que falta vender pelo preço de 50 mil contos).
· O Réu pretende que o Autor adquira a fracção “A” tal como estava combinado pagando por ela naturalmente o que também estava combinado entre ambos, a quantia de 50.000 contos, hoje, € 249.398,95 livre de hipoteca e encargos ou com hipoteca e encargos, entrando o valor monetário correspondente ao pago pelo Réu nos cofres da E..., ou então que a venda a terceiros entrando o produto nos cofres da E... fazendo-se depois as contas entre A e R.
Contestou também o Banco em suma dizendo:
· Confiou na fé pública que é o fim do registo predial e na presunção legal de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos termos do art.º 7 do CRgP, pelo que é evidente que o direito de propriedade pertence ao titular inscrito 1.º Réu e esse direito não estava por qualquer causa diminuído, estando de boa fé, tanto nas negociações como nos preliminares desconhecendo no momento do financiamento, sem culpa um eventual vicio do negócio (art.º 291/1 e 3 do cCiv)
· O 3.º Réu solicitou um pedido de financiamento para aquisição do imóvel em causa no valor de € 249.398,95 e outro no valor de € 124.699,47, empréstimos que o 3.º Réu tem vindo a cumprir religiosamente.
· Não existe subjacente à compra e venda qualquer doação não tendo existido qualquer simulação.
Replicou o Autor a contestação do Banco onde responde às excepções duvidando da boa fé do mesmo na medida em que no dia seguinte ao da celebração da escritura apresentada como doc. 2 o A. lhe comunicou por carta que não estava de acordo, na qualidade de sócio gerente da 1.ª Ré com a venda da fracção em causa nestes autos ao filho do seu sócio, além do que tendo ele Banco Réu avaliado o imóvel por 118.000.000$00 (cerca de € 592.571,90)não estranhou que o mesmo fosse depois vendido por € 249.398,95.
Alterou o pedido no seguintes termos: - “Deve ser declarada a nulidade, por simulação, do negócio de compra e venda celebrado por escritura pública lavrada pelo ...Cartório Notarial..., fls. 78 a 80 v.º em 01/04/2003, e, consequentemente, declarada a nulidade com o fundamento previsto na alínea a) do art.º 16 do Código de Registo Predial e ordenado o cancelamento da inscrição G-4 da Casa oito, correspondente à fracção “H” do prédio urbano descrito na matriz da freguesia de Cascais sob o art.º ... e descrito no n.º ... da mesma freguesia de Cascais, na ... Conservatória do Registo Predial..., inscrição essa definitivamente registada a favor de D..., solteiro, maior, residente na Rua ..., Cascais; - Deve ser ordenado o cancelamento das inscrições C-6 e c-7 da Casa oito, correspondente à fracção “H” do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de Cascais sob o art.º ... e descrito sob o n.º ..., da mesma freguesia de Cascais, na ... Conservatória do Registo Predial.... inscrição essa definitivamente registada a favor do Banco, S.A:, com sede na Rua ...., Porto, por as mesmas serem dependentes de um registo de aquisição nulo, nos termos da alínea a) do art.º 16 do Código do Registo Predial. Como fundamento e em suma alegou:
· Como consta das certidões do Registo predial juntas pelo Banco as inscrições provisórias cujo cancelamento de requer na acção já foram convertidas em definitivas em consequência da celebração das escrituras de compra e venda e mútuo com hipoteca, entretanto juntas.
 Replicou, também, à contestação do Réu C..., formulando a alteração do pedido já cima enunciada, respondendo também às excepções, dizendo que quando A. e R. constituíram a Sociedade Comercial na sequência da joint venture quiseram situar-se no âmbito dessa sociedade comercial, seus estatutos e ordenamento português, sendo, por isso, competente o Tribunal (art.º 73 do CPC); mas ainda que se entendesse ser a sociedade um instrumento da joint venture a cláusula compromissória do 3.05 não se aplica aos autos por estar em causa matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses por força do art.º 65-A, alíneas a) e d) do CPC; no mais diz que a ser verdade, o que não concede, que o dinheiro da compra e venda deu entrada nos cofres sociais da sociedade tal impediria os efeitos da nulidade pretendidos; no mais respondeu às excepções mantendo o pedido.
Conforme acordado pelas partes, a instância foi suspensa por 90 dias nos termos do art.º 279/4 do CPC, conforme despacho de 12/11/2003, tendo havido nova suspensão da instância nos mesmos termos em 25/06/2004, após o que, decorrido sem frutos esse período, veio o Autor a demonstrar o registo da acção que se demonstra efectivado pela AP ..., ficando provisória por natureza mediante a ... nos termos da aliena a) do n.º1 conforme fls. 352/353.
 Designado dia para a audiência preliminar ela efectivou-se aos 31/01/2006, onde foi proferido saneador julgando improcedente a excepção de incompetência relativa e se admitiu a alteração do pedido. Condensados os factos assentes e a matéria controvertida na Base Instrutória, instruídos os autos, procedeu-se ao julgamento com observância do legal formalismo com depoimentos gravados, após o que foi proferida decisão de facto relativa à Base Instrutória, a que se seguiram alegações de direito do A.
Inconformado com a sentença 14/01/2008 que julgando a acção improcedente absolveu os Réus dos pedidos dela apelou o Autor em cujas alegações conclui:
1. Dos factos dados como provados sobre a venda da fracção “H” (venda a filho de representante da sociedade por preço muito inferior ao valor real) tem de se presumir a simulação;
2. E, para ilidir essa presunção, teriam de ser trazidos ao processo factos que justificassem esse desvio da regra que consiste em os bens serem vendidos pelo seu real valor.
3. Nada foi alegado e, consequentemente provado, sobre as razões de ser praticado um preço muito inferior ao real.
4. A razão porque tem de prevalecer a presunção de que foi feita uma venda destinada a favorecer o adquirente, provando-se, consequentemente a simulação.
5. Ora, a sentença recorrida se aceita, por um lado, a prova por presunção não pode, por outro, afastá-la com base em meros juízos hipotéticos não alegados pelos Réus.
6. Resultaram assim violadas as disposições dos art.ºs 349 e 351 do CCiv.
Em contra-alegações o banco recorrido BANCO, S.A. conclui:
1. Se por um lado não resultou provado que o contrato de compra e venda celebrado seja um contrato simulado, cuja prova confinada ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado o Autor não produziu, não se encontrando preenchidos nenhum dos seus requisitos, maxime o intuito de prejudicar terceiros, pois para além da convenção do preço constar de documento exigido por lei, houve recurso in casu ao financiamento bancário o qual foi efectivamente concedido tendo sido garantido por duas hipotecas registadas e fiança, tendo sido depositado o valor nos cofres sociais da vendedora, 1.º do sinal e mais tarde o valor remanescente do financiamento (cfr. docs 5 e 6 da contestação do 2.º réu)
2. Da mesma forma, não foi igualmente produzida pelo A. nem prova directa nem indirecta por presunção do intuito de beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valores das prestações, próprio das doações mistas. (cfr. defende a nossa doutrina e jurisprudência nacionais: por todos veja-se Vaz Serra, “União de Contratos, Contratos Mistos”, pág. 54 e Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, I, pág. 299 da 8.ª edição e o acórdão de 6 de Maio de 1998 do S.T.J.).
3. Efectivamente, cfr. o Ac. do S.T.J. de 9 de Outubro de 2003: não pode recorrer-se a presunções para suprir a falta de prova relativamente a factos discutidos e apreciados em audiência de discussão e julgamento.
4. Finalmente, atente-se que a alegada simulação de preço, a ser real, não seria suficiente para tornar nulo o negócio: o contrato valeria com o preço realmente contratado, sendo outra a sede e outro o órgão o competente para analisar somente a declaração respeitante ao montante do preço e não as demais cláusulas do contrato de compra e venda, não sendo suficiente a demonstração de indícios de simulação do preço constante da escritura pública, cfr. refere o Ac de 8 de Março de 2005, do Tribunal Central Administrativo do Sul (vejam-se ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Março de 2004, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 7 de Novembro de 2005).
5. Por outro lado, muito menos resultou provado que o Banco ora Réu agiu em algum momento de má fé, que tanto nas negociações preliminares como na conclusão dos contratos, agiu de boa fé, bem como os títulos e os documentos que serviram de base ao registo não padecem de qualquer falsidade ou ilegalidade, cuja força probatória opera in casu de forma plena, tendo sido legalmente constituídos e registados tais direitos: os empréstimos existem e estão à data activos, em vigor e regulares.
Conclui pela manutenção da sentença recorrida.
Em contra-alegações o co-réu C... conclui:
1. Não resultou provado que o contrato de compra e venda celebrado seja um contrato simulado, cuja prova confinada ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado o Autor não produziu.
2. O Autor chegou a sustentar que não tinha entrado dinheiro nos cofres sociais da vendedora, resultante do pagamento do preço no contrato de compra e venda, o que se provou, não era, naturalmente, verdade.
3. Não se encontram, deste modo, preenchidos nenhum dos requisitos do contrato simulado, maxime, o intuito de prejudicar terceiros, pois para além da convenção do preço constar de documento exigido por lei, verificou-se a entrada nos cofres da vendedora do preço convencionado, resultante do recurso ao financiamento bancário o qual foi efectivamente concedido tendo sido garantido por duas hipotecas registadas e fiança, sido depositado o valor nos cofres sociais da vendedora, 1.º do sinal e mais tarde do valor remanescente do financiamento.
4. Da mesma forma não foi produzida pelo A. nem prova directa nem indirecta por presunção do intuito de beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valores das prestações, próprio das doações mistas.
5. Ora, como se refere no Ac do S.T.J. de 9 de Outubro de 2003 não pode recorrer-se a presunções para suprir a falta de prova relativamente a factos discutidos e apreciados em audiência de julgamento.
6. Por seu lado, como também refere o Ac do S.T.J. de 18 de Dezembro de 2003” a chamada prova por presunções (judiciais) permitida pelo art.º 349 e segs. Do C.Civil - presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido” (art.º 349 do C.Civil) terá, em princípio, que confinar-se  a reportar-se aos factos incluídos no questionário e não estender-se a factos dessa peça exorbitantes.
7. Por último, nos termos do Ac do S.T.J. de 6 de Maio de 1998 refere-se o seguinte: “Para que se esteja na presença de doação mista, como contrato misto de doação e venda, é necessário que ocorra o requisito subjectivo de ser intenção e vontade dos contraentes beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valores das prestações (coisa transmitida, por um lado, e preço pago por outro). Só assim se poderá dizer que o contrato de compra e venda, como contrato instrumento serve também a função da própria doação”.
8. No mesmo acórdão acrescenta-se: “Sem juízos pré-concebidos, facilmente se podem encontrar no comércio jurídico hipóteses em que existe grande diferença nos valores das prestações das partes sem que seja ilícito falar de contrato de doação mista, precisamente por falecer o requisito de ser vontade dos contraente que um beneficie gratuitamente o outro”.
9. O acórdão enuncia vários casos onde isso pode acontecer, concluindo, em defesa da segurança das relações jurídicas que “a vida é demasiado rica em acontecimentos e frequentes vezes acontece até o inverosímil; tantas vezes o que parece não é. A razão de ser de um determinado evento não tem que ser necessariamente uma de duas que se concebam, pois tantas vezes é outra.”
10. Daí que o Direito se tenha que orientar pela cautela. Quando não foi feita a prova de ter sido vontade e intenção dos contraentes que o vendedor beneficiasse gratuitamente a compradora, num alegado contrato de doação mista, não é por acaso que o Direito renuncia à criação de hipóteses especulativas, para não arriscar navegar em águas incertas.
11. Finalmente se diga que a alegada simulação de preço, a ser real, não seria suficiente para tornar o negócio nulo: o contrato valeria com o preço realmente contratado, sendo outra a sede e outro o órgão competente para analisar somente a declaração respeitante ao montante do preço e não as demais cláusulas do contrato de compra e venda, não sendo suficiente a demonstração de indícios de simulação do preço constante da escritura pública, como refere o Ac de 8 de Março de 2005 do Tribunal Central Administrativo do Sul, (Vejam-se, ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de Março de 2004; o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 7 de Novembro de 2005).
Recebido o recurso, foram os autos aos vistos dos Meritíssimos Juízes-Adjuntos os quais nada sugeriram. Nada obsta ao conhecimento de mérito.
Questão a resolver: saber se ocorre erro de julgamento na sentença recorrida ao não considerar provada, a partir da comprovada  diferença de preço declarado na escritura de compra e venda do imóvel e o preço e real, por presunção judicial o intuito de beneficiar gratuitamente o comprador, por isso a doação, logo a simulação no negócio jurídico e consequente nulidade.
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O Tribunal recorrido deu como assentes os seguintes factos que o Recorrente não impugna nos termso da lei de processo civil:
A. O autor é sócio-gerente da ré E..., Lda..
B. A ré E..., Lda., tem por objecto social “a promoção, construção, comercialização e investimentos imobiliários, a compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, a importação e exportação de materiais de construção civil” e é proprietária das fracções “A” e “H” do prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ..., da Freguesia de Cascais.
C. O réu C... é também sócio-gerente da ré E..., Lda..
D. O réu D... é filho do réu C....
E. Por escritura pública celebrada a 1 de Abril de 2003 no ...Cartório Notarial ... o réu C...., em representação da ré E..., Lda., declarou vender ao réu E..., também por si representado naquele acto, livre de ónus ou encargos, e na invocada qualidade, em nome dele, declarou comprar, pelo preço de € 249.398,99 (duzentos e quarenta e nove mil trezentos e noventa e oito euros e noventa e cinco cêntimos), a referida fracção “H”.
F. Da mesma escritura pública consta destinar-se aquela fracção a habitação própria e permanente.
G. Da mesma escritura pública consta ainda que para aquisição da fracção autónoma referida em D. o réu Banco, S.A., emprestou ao réu D... € 249.398,95 pelo prazo de 30 (trinta) anos, tendo sido constituída em caução e garantia do referido empréstimo uma hipoteca a favor do mutuante sobre a fracção autónoma identificada.
H. Essa fracção situa-se num condomínio fechado, em ..., sendo composta por cave, rés-do-chão, primeiro andar e sótão, tendo também abrigo para carros, piscina e logradouro.
I. De escritura pública celebrada na mesma data e no mesmo Cartório Notarial consta ter o réu Banco, S.A., concedido ao réu D... outro empréstimo sob a forma de abertura de crédito no montante € 124.699,47, tendo sido constituído a favor do banco mutuante hipoteca voluntária sobre a fracção “H”, já acima identificada.
J. A 13/12/2002 o réu C..., em representação da ré E..., Lda., e na qualidade de sócio gerente apresentou na ...Conservatória do Registo Predial ... uma requisição de registo declarando vender a favor do réu D..., seu filho, a fracção “H”, casa 8, descrita sob o nº ..., da freguesia de Cascais, na referida Conservatória.
L. Nessa requisição o réu C... em representação da ré E..., Lda., declara pretender o registo da aquisição provisória por natureza a favor do réu D... a que se refere a alínea J.
M. Das hipotecas em causa foi feito registo definitivo na ...Conservatória do Registo Predial ....
N. Com base nas referidas apresentações foram lavradas pela ... Conservatória do Registo Predial ... a inscrição “G-4”, aquisição provisória por natureza por compra a favor do réu D.... e as inscrições “C-6” e “C-7”, hipotecas provisórias por natureza, ambas a favor do Banco, SA..
O. Aquelas inscrições provisórias foram convertidas em definitivas através das apresentações 19 a 21 de 11 de Junho de 2003.
P. O réu C.... tentou, em representação da ré E..., Lda., registar uma aquisição provisória por natureza.
Q. O preço que consta da escritura de compra e venda da fracção “H” é muito inferior ao valor comercial real do imóvel em causa – uma casa destinada a habitação, situada em Cascais, num condomínio fechado, numa zona de luxo (...), composta por cave, rés-do-chão, primeiro andar e sótão, com abrigo para carros, piscina e logradouro.
R. O valor real comercial daquela fracção varia entre os € 550.000,00 e os € 650.000,00.
S. Relativamente à declaração de venda referente à fracção “A” do prédio mencionado o autor também intentou acção declarativa de condenação requerendo a nulidade do registo da aquisição provisória por natureza a favor do réu D.... e o correspondente cancelamento da inscrição a que ela deu origem.
T. Em Janeiro de 2002, após a celebração do contrato promessa de compra e venda relativo a fracção “H” do prédio já identificado entrou nos cofres da ré E..., Lda., a quantia de Esc. 33.200.000$00 a que correspondem € 165.600,90.
U. O réu D... apresentou-se junto do réu Banco, S.A., na qualidade de sujeito particular, tendo solicitado financiamento para aquisição de um imóvel em que o vendedor era uma sociedade que tinha tal actividade por objecto social.
V. Na data da escritura de compra e venda, celebrada a 1 de Abril de 2003, deram entrada nos cofres da ré E..., Lda., € 83.798,05, relativos ao remanescente do preço da fracção “H”.
X. Sobre os € 249.398,95 recaiu um imposto de SISA no valor de € 24.316,40.
Z. A fracção “B” do mesmo empreendimento foi alvo de permuta, sendo atribuído à mesma o valor de € 249.398,95, e a fracção G foi vendida pelo preço declarado de € 339.182,59
AA. O réu C... informou o autor de que o réu Banco, S.A., avaliou as casas em Esc. 118.800.000$00.
BB. Aquando da realização do negócio entre os réus as fracções equivalentes à fracção “H” valiam cerca de Esc. 120.000.000$00.
III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
São as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto salvo as questões que são de conhecimento oficioso, e aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (art.ºs 660, n.ºs 1 e 2, 288, 514, 684/3, 690/4, 713/2 do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi introduzida pelo DL 329-A/95, de 12/12, e pelo DL 180/96 de 25/09, com exclusão do DL 38/03 de 8/3, tendo em consideração a data da entrada em juízo da acção (Março de 2003) e o disposto no art.º 20 do DL 38/03, 8/3, ou seja a sua aplicabilidade apenas aos processos instaurados a partir de 15/09/2003.

A questão a resolver é aquela enunciada em I supra ou seja:
Saber se ocorre erro de julgamento na sentença recorrida ao não considerar provada, a partir da comprovada diferença de preço declarado na escritura de compra e venda do imóvel e o preço real, por presunção judicial o intuito de beneficiar gratuitamente o comprador, por isso a doação, logo a simulação no negócio jurídico e consequente nulidade.

O Tribunal recorrido, suportando-se no art.º 342/1 do CCiv e no entendimento de que ao Autor cabe a prova dos factos constitutivos da simulação, por não ter sido cumprido por ele, julgou a acção improcedente. Em suma diz-se na sentença e no que aqui releva:
“(…)O autor vem invocar a existência de contrato misto de compra e venda e de doação.
No contrato misto reúnem-se elementos de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei, de tal sorte que se dá a fusão, num só negócio jurídico, de elementos contratuais distintos que, além de perderem a sua autonomia no esquema negocial unitário, fazem simultaneamente parte do conteúdo deste – Prof. Antunes Varela, em “Das Obrigações em Geral”, vol. 1º, pág. 288.
Numa das suas modalidades, um contrato de certo tipo é instrumento de realização de um outro. O contrato que serve de meio ou instrumento conserva a estrutura que lhe é própria, mas esta é afeiçoada de modo a que sirva, ao lado da função que lhe compete, a função própria do outro contrato.
É o caso daquilo a que se vem chamando doação mista: é o contrato em que, segundo a vontade dos contraentes, a prestação de um deles (em regra a transmissão de uma coisa) só em parte é coberta pelo valor da contraprestação, para que a diferença de valor entre ambas beneficie gratuitamente outro contraente.
Porém, para que se esteja na presença de doação mista, como contrato misto de compra e venda e de doação, é necessário que ocorra o requisito subjectivo de ser intenção e vontade dos contraentes beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valores das prestações (coisa transmitida, por um lado, e preço pago, por outro).
Só assim se pode dizer que o contrato de compra e venda, como contrato instrumento, serve também a função própria da doação.
No caso vertente, provou-se que a primeira ré venderam ao terceiro réu a fracção dos autos por preço muito inferior ao valor real dela. No entanto, não se pode falar aqui de doação mista precisamente porque não foi feita a prova de ter sido vontade e intenção dos contraentes que a vendedora beneficiasse gratuitamente o comprador pelo que respeita à diferença entre o preço e o valor da fracção autónoma.
Veja-se sobre esta matéria o acórdão do S.T.J. de 6 de Maio de 1998, em www.dgsi.pt/jstj.nsf/, que aqui se seguiu.
O autor não logrou, pois, fazer prova de tal simulação, como lhes competia, em obediência ao disposto no art. 342º, nº 1, do C. Civil.
Não se ignora que raramente é possível a prova directa da simulação, essa prova é normalmente alcançada pela concatenação de factos apurados que conduzem à certeza prática de que o acto é simulado, prova indirecta, por indícios e presunções. Desde sempre se tendo entendido que a prova da simulação se pode fazer através de presunções judiciais.
Efectivamente, «é lícito aos tribunais tirarem conclusões ou ilações lógicas da matéria de facto dada como provada, e fazer a sua interpretação e esclarecimento, desde que, sem a alterarem antes nela se apoiando, se limitem a desenvolvê-la, conclusões essas que constituem matéria de facto» - acórdão do S.T.J. de 19 de Outubro de 1994, no B.M.J. nº 440, pág. 361.
Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – art. 349º do C. Civil.
Porém, a possibilidade de recorrer às presunções judiciais não prejudica as regras relativas ao ónus de prova.
Analisando em concreto apenas nada se provou sobre esta matéria, sendo certo que, como se acentuou naquela douto acórdão, existem muitas outras justificações possíveis para que o preço de uma compra e venda divirja, ainda que substancialmente, o valor efectivo do bem.
Assim, atentas as regras de repartição do ónus de prova supra referidas, resta concluir pela improcedência da acção.(…)”
*
Matriz jurídica relevante no recurso e na decisão: art.ºs 240, 241, 242, 342/1, 349, 351 do Código Civil[1].
Dispõe o art.º 240/1: “Se, por acordo entre o declarante e o declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.”
n.º 2: “O negócio simulado é nulo.”
Estatui o art.º 242/1: “Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado.”
n.º 2: “Se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma exigida por lei.”
O art.º 242/1 por seu turno prescreve: “Sem prejuízo do disposto no art.º 286, a nulidade do negócio simulado pode ser arguida pelos próprios simuladores entre si, ainda que a simulação seja fraudulenta.”
O n.º 2: “A nulidade pode também ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam agir em vida do autor da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar.”
Estabelece o n.º 1 do art.º 342: “Àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado.”
O art.º 349 diz: “Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de uma facto conhecido para firmar uma facto desconhecido.”
Art.º 351: “As presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.”

Diz-se na sentença que o Autor, sócio da 1.ª Ré, veio invocar, como fundamento do pedido de nulidade do negócio jurídico e subsequentes registos, o contrato misto de compra e venda e doação, a chamada doação mista. Não é inteiramente verdade: nas alegações de direito, face à decisão de facto proferida, o Autor veio dizer que os 1.º 2.º e 3.º RR celebraram um contrato misto, uma compra e venda por preço de favor que envolve uma liberalidade do vendedor em benefício do comprador, por isso uma compra e venda e doação praticada por uma sociedade comercial cujo objecto social não compreende doações e porque tal não foi objecto de deliberação social é nula. O que o Autor alegava na sua petição inicial é que o preço declarado na compra e venda escriturada não deu entrada nos cofres sociais da sociedade 1.ª Ré de que o Autor é sócio e que o 2.ª Réu C... pretende transferir gratuitamente o que for possível do património da 1.ª Ré para a sua família (art.º 20 da p.i.), não existe intenção de comprar ou vender antes de doar, a compra e venda escriturada é nula, o negócio dissimulado de doação contraria o objecto social da 2.ª ré sociedade comercial que não se dedica a doações de imóveis nem tal foi objecto de deliberação sendo nula.
Na sequência do julgamento, não se provou o alegado pelo Autor, ou seja que não tenha entrado nos cofres da Sociedade o preço declarado na escritura de compra e venda (art.º 1.º da b.i), pelo contrário, na sequência da promessa, em Janeiro de 2002, que antecedeu a venda deu entrada nos cofres da 1.ª Ré o valor de 33.200.000$00 (correspondente a €165.600,90)- resposta quesito 6.º e na data da escritura de venda em 1/04/2003 o remanescente valor do preço de venda de € 83.798,05 –resposta ao quesito 9- assim perfazendo a totalidade do preço.
O preço declarado na escritura de venda foi inteiramente entregue à Sociedade 1.ª Ré vendedora.
O que também ficou provado e era alegado pelo Autor, passou para os art.ºs  4, 14 e 15 da b.i era que o valor real comercial da fracção vendida varia (reportado à altura da venda), entre € 550.000 e €650.000,  o Réu C... informou o Autor de que o Réu Banco, S.A., avaliou as casas em Esc. 118.000.000$00, aquando da realização do negócio entre os Réus as fracções equivalentes à fracção “H” valiam cerca de Esc. 120.000.000$00,o que ficou provado sob R, Z AA e BB.
Dada a posição do Autor como sócio-gerente da sociedade vendedora (cfr. documento de fls. 17/19), a par do 2.ª Réu, considerando o princípio da especialidade, mitigado embora, quanto à capacidade de gozo das sociedades em geral[2], tal como previsto no art.º 6, n.ºs 1, 2 e 3 do Código das Sociedades Comerciais, tendo em mente que o objecto social da sociedade é o de promoção construção, comercialização e investimentos imobiliários, a compra e venda de imóveis revenda dos adquiridos para esse fim, a importação e exportação de materiais de construção civil (cfr. documento de fls. 18), os poderes dos gerentes (art.º 260 do Código das Sociedades Comerciais) e por conseguinte a eventual nulidade decorrente de uma doação realizada pela mencionada sociedade, releva saber se a venda escriturada é, na verdade, um negócio de doação o que traz à colação a figura jurídica do contrato misto de compra e venda e doação.
Breves considerações sobre a simulação e sobre os negócios mistos.
São pressupostos da simulação a divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o acordo simulatório entre declarante e declaratário e o intuito de enganar terceiros (art.º 240, n.sº 1 do CCiv).

A simulação pode ser inocente quando não há da parte dos simuladores “animus nocendi”, intuito de prejudicar quem quer que seja, apenas intuito de enganar e simulação fraudulenta em que os simuladores são animados por “animus decipiendi” (intuito de enganar) e “animus nocendi” pelo menos a consciência de prejudicar alguém.[3]
A simulação é sempre uma divergência entre a vontade real e a vontade declarada. Se o conteúdo da vontade real for nulo, ou seja se as partes emitem declarações negociais quando na verdade nada querem ocorre a simulação absoluta e o negócio é nulo (art.º 240/2 do CCiv) mas se o conteúdo da vontade real for outro negócio jurídico mais ou menos diferente do primeiro ocorre a simulação relativa onde estamos perante dois negócios, aquele que é objecto da vontade declarada, ou seja o negócio aparente que é simulado e nulo e o objecto da vontade real o negócio dissimulado que será objecto de tratamento jurídico que lhe caberia se tivesse sido concluído sem a dissimulação, o qual poderá ser plenamente válido e eficaz ou poderá ser inválido consoante as consequências que teriam lugar se tivesse sido abertamente concluído.[4]
A nulidade do negócio simulado pode, como todas as nulidades, ser invocada por qualquer interessado e declarada ex officio pelo tribunal (cfr. art.ºs 242 e 286 do CCiv). Relativamente à oponibilidade a terceiros que são as pessoas titulares de uma relação, jurídica ou praticamente, afectada pelo negócio simulado[5], existe um regime especial (art.º 243 do CCiv) que, tudo indica, deve prevalecer sobre o regime geral (art.º 291 do CCiv), não sendo de atender aos requisitos deste último artigo[6].O terceiro de boa fé que é aquele que ignora a simulação ao tempo em que foi constituído o respectivo direito (n.º 2 do art.º 243 do CCiv) tem face aos simuladores e terceiros de má fé o direito, em alternativa, de manter o negócio simulado válido impedindo que oponham a sua nulidade ou de o destruir, opondo ele a nulidade por simulação[7]. Tal relevaria, ocorrendo os pressupostos da simulação do negócio para apreciar a situação do Banco BPI que no caso dos autos emprestou dinheiro ao comprador, mediante hipoteca que fez inscrever no registo do imóvel adquirido e que mostra interesse na manutenção do negócio, pelo que, ocorrendo os pressupostos da simulação e por isso da nulidade do negócio jurídico da compra e venda, verificando-se a boa fé do Banco mutuário, que fez inscrever no registo do imóvel transaccionado a hipoteca para garantia do capital mutuado, não sendo o mútuo afectado, aparentemente também o não seriam as hipotecas registadas e cuja eliminação do registo o Autor pretende efectivar.
No caso concreto prova-se a realização de uma compra e venda por escritura pública, o pagamento do respectivo preço. Não se prova qualquer divergência entre a vontade declarada na escritura e a vontade real dos outorgantes (de resto representados na escritura pelo Réu C..., que é gerente da Sociedade Comercial vendedora e é também representante com procuração do filho comprador).
 Poderá haver, como sustenta o recorrente nas suas alegações de direito do art.º 657 do CCiv, um negócio misto de compra e venda querida pelos outorgantes declarada na escritura pública e uma doação, esta também querida pelos negociantes mas propositadamente omitida pelos mesmos com o intuito de enganar o Autor, sócio da Sociedade Ré que por via da venda por um preço real e efectivo muito inferior ao preço de mercado do imóvel?

As partes, dentro dos limites da lei, têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos no código, incluir as cláusulas que lhes aprouver (n.º 1 do art.º 405 do CCiv); podem também reunir no mesmo contrato, regras de um ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei (n.º 2 do art.º 405 do CCiv).
Segundo os Autores o n.º 2 do art.º 405 do CCiv epigrafado de liberdade contratual, refere-se expressamente à categoria dos contratos mistos.[8] Misturam-se prestações de diversos tipos contratuais nos contratos mistos ao invés da união, junção ou coligação contratual em que os contratos não perdem a sua individualidade, acham-se todavia ligados entre si quer por nexo exterior acidental, temporal, situação em que se aplica a cada um deles o respectivo regime ou interior, funcional, que altera o regime normal de um dos contratos, situação em que se altera o regime normal de um dos contratos ou de ambos.[9]
Se um determinado tipo contratual é utilizado como meio ou instrumento para a consecução de finalidade diferente da que lhe é própria, como é o caso da doação mista, o contrato instrumento, que a mais das vezes é o contrato de compra e venda, conserva a estrutura que lhe é própria mas é afeiçoada de modo a que o contrato sirva, ao lado da função que lhe compete, a função própria da doação. Na doação mista o contrato em que, segundo a vontade dos contraentes, a prestação de um deles (a entrega do imóvel e a transferência da propriedade por parte do vendedor) só em parte é coberta pelo valor da contraprestação (o preço declarado e realmente entregue inferior ao valor real e de mercado do imóvel) para que a diferença de valor entre ambos beneficie gratuitamente o outro contraente, o que ocorre é que pela redução intencional do elemento fundamental da compra e venda, esta foi assimilada ou absorvida pela doação. Na venda de um imóvel por um preço manifestamente inferior ao preço de mercado há que demonstrar que os contraentes tiveram a intenção de beneficiar gratuitamente o comprador com a diferença de valor entre as duas prestações[10]. Na estrutura do contrato de doação há, da parte do doador, uma intenção um espírito de liberalidade à custa do seu património portanto um intenção de beneficiar alguém, benefício esse que sendo aceite aperfeiçoa o contrato (art.ºs 940, 960 do CCiv).
O Autor, nos presentes autos, estruturou a causa de pedir na venda simulada por doação, ou seja, na alegação de que o preço da compra e venda declarada e escritura não entrou nos cofres da Sociedade, o que significa que as partes quiseram na realidade dar o imóvel (negócio dissimulado), imóvel esse que de resto tinha um valor de mercado superior em dobro ao declarado na venda, doação aquela que não é consentida pelo objecto social da Sociedade Comercial, nem estando autorizado pela Assembleia Geral o sócio gerente a realizá-la. Não alegou o Autor, porquanto a estrutura da causa de pedir era diferente, que o preço declarado na escritura e efectivamente pago e entregue à sociedade é bastante inferior ao do valor do mercado e que, por isso, houve intenção dos contraentes de beneficiar o comprador com a diferença entre o preço, o que caracteriza a doação mista. O que se provou foi que as partes outorgaram o contrato de compra e venda pelo mencionado preço constante da escritura, preço que foi realmente pago, entrou nos cofres da sociedade, preço esse que é inferior ao real de mercado, para menos e em mais de metade.
Pretende agora o Autor que o Tribunal recorrido deveria ter feito uso das presunções judiciais consentidas pelos art.ºs 349 e 351 do CCiv e a partir daqueles factos dados como provados, designadamente a diferença entre o preço pago e o preço real de mercado do imóvel, a circunstância de a venda ter sido feita pelo pai (ainda que em representação da Sociedade) ao filho de quem tinha procuração e fez negócio consigo mesmo, para extrair a ilação lógica de que houve intenção de beneficiar o filho comprador.
Distingue-se entre presunções legais ou de direito, estabelecidas pela própria, vinculando a liberdade de apreciação do juiz (art.º 350 do CCiv) e presunções naturais, de facto (praesumptiones facti ou hominis), judiciais, simples ou de experiência que são as que resultam da experiência (máximas de experiência), do curso ou andamento natural das coisas, da normalidade dos factos (regra da via, quod plerumque accidit), sendo livremente apreciadas pelo juiz (art.º 351 do CCiv), valem com as limitações estabelecidas quanto à admissibilidade da prova testemunhal (art.º 351 do CCiv) e a sua força pode ser arredada por simples contraprova. As presunções legais podem ser iuris et iure, absolutas e irrefutáveis ou iuris tantum, admitindo prova em contrário, podendo ocorrer ainda dispensa de prova, circunstâncias em que a lei admite, desde logo, como certo, um dado facto, se não for provado o contrário que é o que ocorre com a posse titulada e a boa fé tal como previsto no n.º 2 do art.º 1260 do CCiv.[11]
No caso concreto não existe presunção legal alguma na vertente de presunção iuris et iure, iuris tantum ou dispensa de prova.
No tocante às presunções judiciais o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a entender de modo uniforme na sequência dos Acórdãos de 21/09/95 e 20/01/98 CJSTJ, III, pág. 14-III e VI, 1.º, 19-II respectivamente o segundo na esteira do primeiro e este por sua vez na do de 18/11/84, BMJ 341/388 ss, com apoio na doutrina de Antunes Varela, RLJ 122/233 que se elas (as presunções) forem ilididas através de prova testemunhal e das respostas quanto ao facto desconhecido não pode a Relação alterar as respostas dadas à matéria de facto a não ser nos casos excepcionais do art.º 712 do CPC; mais recentemente no Acórdão de 22/09/2005, disponível on line no sítio www.dgsi.pt sob o n..º SJ200509220026682, relatado pelo ilustre Conselheiro Lucas Coelho suporta-se o entendimento de que à Relação não está autorizada a modificação da resposta a um quesito, mesmo não provado por via de presunção. No tocante à 1.ª instância e secundando o mencionado professor pode acontecer que o colectivo (quando o haja) considere provados certos factos com base em meros juízos de experiência, considerações de probabilidade ou de razoabilidade e nesses casos a Relação em sede de recurso poderá alterar livremente esta parte da decisão contando que não altere os factos.
No tocante ao uso das presunções judiciais, sendo meio de prova, hão-de incidir sobre factos que oportunamente foram alegados:
I - O juiz não pode servir-se, ao decidir a causa, de facto não articulado oportunamente pelo réu na contestação (na qual deve ser deduzida toda a defesa) e que só veio ao processo mediante a junção aos autos, pelo réu, já na audiência de julgamento, de documentos (art.ºs: 664 e 489, n.º 1, do CPC).
III - Também a prova por presunções judiciais é um meio de prova dos factos alegados em tempo oportuno: o facto que se estabeleça mediante a presunção judicial tem que ser alegado oportunamente. Está vedado ao tribunal estabelecer por presunção judicial um facto não alegado com base em facto também não alegado e que se vá colher a documento junto em audiência para, com ele, julgar verificada excepção não invocada pelo réu na contestação.
       1997-06-26
       Processo n.º 186/97 - 2ª Secção
       Relator: Sousa Inês  *
- Os factos dados como assentes por presunção judicial não podem ser usados na sentença se não foram alegados nos articulados.
       14-10-1997
       Processo n.º 604/97 - 1ª Secção
            Relator: Cons. Ribeiro Coelho *
*
Ora, como se disse o Autor não alegou os factos pertinentes para caracterizar a doação mista.
Incumbia ao Autor a alegação e consequente demonstração em julgamento pelos meios de prova consentidos e enquanto facto constitutivo do seu direito (art.º 342/1 do CCiv) que na diferença de preço efectivamente pago e entregue à Sociedade vendedora e aquele que resultava do mercado, em dobro como se constata, tivesse sido intenção das partes (representadas pela mesma pessoa no caso) a de beneficiar gratuitamente o comprador pela diferença, pois essa alegação e prova é que permite concluir que no caso concreto não estamos perante uma simples compra e venda antes perante uma venda instrumental de uma doação. Também não alegou tal pura e simplesmente.
Nesse sentido e ao invés do que o recorrente sustenta em recurso vai o mencionado Acórdão do STJ de 6/5/98 relatado pelo Ex.mo Juiz Conselheiro Sousa Inês e que de seguida se transcreve, disponível que está no sítio informático www.dgsi.pt :
Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 98B295 
Nº Convencional: JSTJ00035511
Relator: SOUSA INÊS
Descritores: COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CONTRATO MISTO
COMPRA E VENDA
DOAÇÃO
IMPUGNAÇÃO PAULIANA
BOA-FÉ
MATÉRIA DE FACTO
PODERES DA RELAÇÃO
RESPOSTAS AOS QUESITOS
ALTERAÇÃO
Nº do Documento: SJ199805060002952
Data do Acordão: 06-05-98
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL COIMBRA
Processo no Tribunal Recurso: 995/96
Data: 14-10-97
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Área Temática: DIR PROC CIV - RECURSOS.
DIR CIV - DIR OBG.
Legislação Nacional: CPC67 ART712 N1 ART722 N2 N1.
CCIV66 ART612 ART248 ART437 N2.
Jurisprudência Nacional: AC STJ DE 1984/11/08 IN RLJ ANO122 PAG209.
AC STJ DE 1985/02/13 IN RLJ ANO123 PAG49.
AC STJ DE 1995/12/21 IN BMJ N449 PAG273.
Sumário : I - O Supremo pode censurar o julgamento da matéria de facto feito pela relação nos casos previstos no artigo 722, n. 2, do C.P.Civil de 1961.
II - A relação não pode manter a resposta de "não provado" dada pelo tribunal colectivo a um quesito e, ao mesmo tempo, por ilação, fora do quadro do artigo 712 do C. P. Civil, julgar provado o facto perguntado naquele quesito. Este procedimento pode ser censurado pelo Supremo.
III - É contrato misto de compra e venda e doação aquele em que há intenção de beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valor das prestações (coisa transmitida por um lado, e preço pago, pelo outro).
IV - Provado que os pais venderam um imóvel a uma filha por preço muito baixo mas sem "animus donandi" e estando a filha de boa fé, não pode a alienação sofrer impugnação pauliana de credor anterior, sem embargo de a alienação agravar a impossibilidade da satisfação do crédito.
(…)
Para que se esteja na presença de doação mista, como contrato misto de compra e venda e de doação, é necessário que ocorra o requisito subjectivo de ser intenção e vontade dos contraentes beneficiar gratuitamente o adquirente pela diferença de valores das prestações (coisa transmitida, por um lado, e preço pago, por outro).
Só assim se pode dizer que o contrato de compra e venda, como contrato instrumento, serve também a função própria da doação.
Sem juízos pré-concebidos, facilmente se podem encontrar no comércio jurídico hipóteses em que existe grande diferença nos valores das prestações das partes sem que seja lícito falar de contrato de doação mista, precisamente por falecer o requisito de ser vontade dos contraentes que um beneficie gratuitamente o outro.
Dada pessoa é proprietária de um lote de terreno com frente para a via pública, em local urbanizado, mas com fundo insuficiente para erigir a edificação que pretende ; por isso, essa pessoa adquire ao proprietário confinante alguns metros quadrados de terreno que de per si pouco valor têm, mas que aquele, por exigência deste, acaba por pagar a peso de ouro, sem qualquer intenção de beneficiar gratuitamente este. Trata-se de compra e venda e não de contrato misto de compra e venda e doação, ou "doação mista".
Outra pessoa é proprietária de um prédio e necessita urgentemente de realizar dinheiro para satisfazer compromisso inadiável. Por isto sujeita-se a vender aquele prédio por preço vil, aceitando a única oferta que, no curto tempo de que dispunha apareceu. Também aqui, por falta de espírito de liberalidade, não se está na presença de doação mista.
Uma terceira pessoa vende a outra um outro prédio por preço sensivelmente inferior ao seu valor venal e que poderia obter, em consideração de aquele preço permitir ao vendedor receber dado subsídio do Estado e ao comprador beneficiar de isenção fiscal. Também aqui falha a intenção de beneficiar gratuitamente o adquirente.
Voltando à espécie dos autos, sabemos que os primeiros réus venderam à segunda ré dada fracção autónoma por preço muito inferior ao valor real dela.
No entanto, não se pode falar aqui de doação mista precisamente porque não foi feita a prova de ter sido vontade e intenção dos contraentes que os vendedores beneficiassem gratuitamente a compradora pelo que respeita à diferença entre o preço e o valor da fracção autónoma.
Isto é assim atenta a resposta de "não provado" dada pelo Tribunal Colectivo ao quesito décimo-terceiro, a que já se aludiu, no qual precisamente se indagava acerca do espírito de liberalidade das partes ao contratarem.
A Relação teve perfeita consciência desta questão e acabou por assumir uma posição equívoca.
Por um lado, pelo menos declarada e frontalmente, a Relação não alterou a resposta que o Tribunal Colectivo deu ao quesito décimo-terceiro, de não provado para provado.
Mas, por outro lado, por ilação firmada em outros factos provados ( a falada diferença de preço e valor real da fracção autónoma e ser a adquirente filha dos alienantes), a Relação julgou provado o facto cuja resposta de "não provado" manteve.
Não pode ser.
Ou se mantém ou se altera a resposta que o Tribunal Colectivo deu ao quesito.
Uma coisa e outra, ao mesmo tempo, é que não pode ser.
Ora, se foi formulado um quesito acerca de determinado facto, ainda que de natureza psíquica, interna da mente dos sujeitos de determinado contrato, e o tribunal colectivo respondeu negativamente ao quesito, não pode a relação alterar essa resposta com base em presunção judicial, firmada embora em outros factos julgados provados, ou máxima da experiência, fora das situações previstas no art.º 712º, n.º 1, do Cód. de Processo Civil.
Por um lado, este preceito da lei é expresso e terminante no sentido de as respostas dadas pelo tribunal colectivo aos quesitos não poderem ser alteradas pela relação fora das situações taxativamente previstas nessa norma.
Por outro lado, o tribunal colectivo, ao julgar não provado o facto, utilizou a totalidade da prova, inclusivamente teve á sua disposição as presunções, sendo de admitir que haja afastado o que destas pareça resultar em vista das restantes provas, do conjunto de todas elas.
A vida é demasiado rica em acontecimentos e frequentes vezes acontece até o inverosímil ; tantas vezes o que parece não é. A razão de ser de um determinado evento não tem que ser necessariamente uma de duas que se concebam, pois tantas vezes é outra.
Cfr. os Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 1984 (Campos Costa), in Rev. de Leg. e de Jurisprudência, ano 122º, pág. 209, de 13 de Fevereiro de 1985 (Campos Costa), da mesma Revista, ano 123º, pág. 49, e as anotações aí feitas por Antunes Varela, e o de 21 de Setembro de 1995 (Costa Marques), no Boletim n.º 449, pág. 273.
Na espécie, porque não ocorre qualquer das situações previstas no art.º 712º, n.º 1, do Cód. de Proc. Civil. o julgamento da matéria de facto, quanto ao que foi indagado pelo quesito décimo-terceiro, feito pelo tribunal colectivo, tinha que ser respeitado pela Relação.
Ao assim deixar de proceder. a Relação, por erro de interpretação e aplicação, violou o disposto no art.º 712º, n.º 1, do Cód. de Proc. Civil, cabendo a este Supremo tribunal censurar o respectivo julgamento, em obediência ao disposto no art.º 722º, nºs 1 e 2, do mesmo Código.
*
Deverá pois improceder a apelação.
IV- DECISÃO
Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
Regime da Responsabilidade por custas: as custas ficam a cargo do recorrente que decai (art.º 446/1 do CPC).
Lxa., 26/11/09
João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Manuel Leitão leal
Ondina do Carmo Alves

[1] Diploma a que pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionada sem indicação de origem.
[2] Segundo Menezes Cordeiro, Manual do Direito das Sociedades, Almedina, 2007, vol. I, págs. 336/342, a ideia de que a capacidade das pessoas colectivas apenas abrange os direitos e obrigações necessários e convenientes à prossecução dos seus fins, numa estrita leitura do art.º 6/1 do CSC como retoma da fórmula do art.º 160/1 do CCiv tende hoje a ser abandonada, reservando a moderna comercialística um papel limitado a aspectos meramente descritivos, ora reportando-o a um objecto final de conseguir lucros, assim legitimando tudo e mais alguma coisa; refere este autor que a capacidade de gozo das pessoas colectivas não é apesar disso idêntica à das pessoas singulares e que ela pode sofrer limitações ditadas pela natureza das coisas, e legais, como os direitos e obrigações inseparáveis da pessoa singular, limitações estatutárias e deliberativas; a prática de doações ou actuações non profit é hoje uma indústria muito bem gerida pelas instituições lucrativas e que o próprio Estado através do Estatuto do Mecenato alimenta, como modo de atrair mais doações e que só em casos concretos determinadas doações poderão ser inválidas, mas por força de regras específicas e em determinados condicionamentos, tal como, por exemplo, as doações a sócios, inválidas desde que nos termso dos artºs 31 e 32 do CSC.
[3] Mota Pinto Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 1976, págs. 357/358 e Castro Mendes Teoria Geral do Direito Civil, vol. III, AAFDL 1973, pág. 262. Referem estes autores que a venda fraudulenta é amais comum e a propósito da venda de imóveis exemplificam entre outros com o caso da venda aparente que disfarça uma real doação para prejudicar os herdeiros legitimários ou os credores ou a Fazenda Nacional ou para contornar a norma do art.º 953, com o caso da venda simulando um preço inferior ao preço real para prejudicar a Fazenda Nacional ou simulando um preço superior ao real para prejudicar um preferente.
[4] Mota Pinto obra citada página 362; Castro Mendes, obra citada, suportando-se no art.º 241 do CCiv, afirmando a regra da validade do negócio dissimulado reportando-se ao exemplo do negócio simulado de venda e dissimulado de doação, porque a situação jurídica do donatário é por lei mais instável que a do comprador, conforme art.ºs 969 e ss e 2168 e ss do CCiv ambos os negócios são nulos (cfr- págs. 281/283).
[5] Mota Pinto obra citada, pág. 366.
[6] Mota Pinto obra e local citados.
[7] Castro Mendes, obra citada, pág. 269.
[8] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Almedina, 1973, 2.ª edição, vol.  I, pág. 224  e Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 2006, 10.ª edição, pág.373.
[9] Antunes Varela, obra citada, pág. 225.
[10] Antunes Varela, obra citada págs 235/236.
[11] Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, reimpressão, págs. 215/216.